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Revista Estudos Feministas

versão impressa ISSN 0104-026Xversão On-line ISSN 1806-9584

Rev. Estud. Fem. vol.29 no.1 Florianópolis jan. 2021  Epub 01-Jan-2021

https://doi.org/10.1590/1806-9584-2021v29n172559 

Seção Temática Heleieth Saffioti - 50 anos d’A mulher na sociedade de classes

Heleieth e as diferentes gerações de feministas do NEIM/UFBA

Heleieth and the Different Generations of Feminist from NEIM/UFBA

Heleieth y las diferentes generaciones de feministas de NEIM/UFBA

Maíra Kubík Taveira Mano1 
http://orcid.org/0000-0002-4201-5636

Cecilia Maria Bacellar Sardenberg1 
http://orcid.org/0000-0002-1896-9800

1Universidade Federal da Bahia, Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre a Mulher (NEIM/UFBA), Salvador, BA, Brasil. 40210-630 - neim@ufba.br


Resumo:

Heleieth Saffioti, estrela maior do feminismo acadêmico no Brasil, foi uma das madrinhas do Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre a Mulher (NEIM), da Universidade Federal da Bahia (UFBA), desde a sua fundação em maio de 1983. Nesses nossos quase 37 anos de existência, já contamos com pelo menos três diferentes gerações de pesquisadoras feministas, todas admiradoras de Heleieth Saffioti e para as quais A mulher na sociedade de classes: mito e realidade ainda tem muito a dizer e fazer pensar. Neste artigo, duas gerações de nossas pesquisadoras - uma das mais antigas (Cecilia) e a outra da mais nova (Maíra) - desenvolvem uma conversa a três com Heleieth, em uma releitura dessa que é sua ‘obra-prima’, e prima não apenas por ser a sua primeira grande publicação, como também por ser a grande contribuição do feminismo acadêmico brasileiro para o mundo.

Palavras-chave: Heleieth Saffioti; gerações de feministas; NEIM/UFBA

Abstract:

Heleieth Saffioti, the brightest star of academic feminism in Brazil, was one of the godmothers of the Center for Interdisciplinary Studies on Women (Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre a Mulher - NEIM), at the Federal University of Bahia, since its foundation in May 1983. In our almost 37 years of existence, we already count on three different generations of feminist researchers, all of them admirers of Heleieth Saffioti and for whom Woman in class society still has a lot to say and to incite reflections. In this article, two generations of our researchers - one of the oldest (Cecilia) and the other of the youngest (Maíra) - develop a conversation with Heleieth, in a reinterpretation of her ‘masterpiece’, which stands not only as her first major publication, but also as the greatest contribution of Brazilian academic feminism to the world.

Keywords: Heleieth Saffioti; Generations of Feminists; NEIM/UFBA

Resumen:

Heleieth Saffioti, la mayor estrella del feminismo académico en Brasil, fue una de las madrinas del Centro de Estudios Interdisciplinarios sobre la Mujer (Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre a Mulher - NEIM), de la Universidad Federal de Bahia, desde su fundación en mayo de 1983. En nuestros casi 37 años de existencia, tenemos al menos tres generaciones distintas de investigadoras feministas, todas ellas admiradoras de Heleieth Saffioti y para las que La mujer en la sociedad de clases: mito y realidad todavía tiene mucho que decir y hacernos pensar. En este artículo, dos generaciones de nuestras investigadoras, una de las más antiguas (Cecilia) y la otra de las más jóvenes (Maíra), desarrollan aquí una conversación con Heleieth, en una reinterpretación de lo que es la ‘obra maestra’ de esa autora, y maestra no solo por ser su primera gran publicación, sino también por ser el gran aporte del feminismo académico brasileño al mundo.

Palabras clave: Heleieth Saffioti; generaciones de feministas; NEIM/UFBA

Introdução

Em outubro de 1999, ano em que comemorávamos, no V Simpósio Baiano de Pesquisadoras(es) sobre Mulheres e Relações de Gênero do Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre a Mulher da Universidade Federal da Bahia (NEIM/UFBA), os cinquenta anos da publicação d’O segundo sexo de Simone de Beauvoir (2009) - publicado originalmente em 1949 -, Heleieth Saffioti brindou-nos com uma conferência sobre “O segundo sexo à luz das teorias feministas contemporâneas” (SAFFIOTI, 2000). Falando em pé, perto da plateia, como sempre preferia fazer nessas ocasiões para melhor dialogar com o público, Heleieth nos ofereceu uma verdadeira aula, estilo ‘pé de ouvido’, sobre O segundo sexo de Simone de Beauvoir, se redimindo ali entre nós por não ter se debruçado mais sobre essa obra no seu livro A mulher na sociedade de classes: mito e realidade, celebrado nesta seção temática.

Essa não foi a primeira, tampouco a última vez, que Heleieth Saffioti marcou presença em um dos nossos eventos. Ela foi uma de nossas madrinhas desde a criação do NEIM, em 1983, tendo participado do Ciclo de Debates “A questão da mulher hoje”, promovido em julho daquele ano, o primeiro evento dos muitos que realizamos desde então contando com sua presença. Dentre tais encontros, destaca-se sua participação em 1992 no seminário de criação da Rede Feminista Norte e Nordeste de Estudos sobre Mulheres e Relações de Gênero (REDOR), quando Heleieth ministrou um minicurso sobre “Gênero”; no lançamento do Projeto “Trilhas do empoderamento de mulheres” de 2007, desenvolvido pelo NEIM em conjunto com o Institute of Development Studies (IDS), do Reino Unido, com grande repercussão internacional; no evento comemorativo dos “20 anos da Constituinte”, de 2008, que contou com a presença de acadêmicas feministas, ativistas e deputadas constituintes; além de sua importante presença nas comemorações dos “25 anos do NEIM”, também em 2008, quando prestamos nossas homenagens a ela.

Bem escreveu Céli Pinto (2014, p. 321), ao afirmar:

Feministas brasileiras de minha geração têm razões de sobra para homenagear Heleieth Saffioti. Quer tenhamos privado com ela ou não, sabemos de sua força, de seu comprometimento com a causa feminista, de sua infinita capacidade de defender suas ideias. Foi um exemplo para todas nós que precisávamos de força e perseverança para a luta, que muitas vezes parecia um suceder de embates perdidos.

Neste momento em que celebramos os cinquenta anos de A mulher na sociedade de classes: mito e realidade e nos damos conta de já se terem passado perto de dez anos sem sua presença física entre nós, cabe-nos, pois, como suas ‘afilhadas acadêmicas’ nos estudos feministas, render-lhe também nossas homenagens, enquanto professoras/pesquisadoras do NEIM. Mesmo porque, nesses nossos quase 37 anos de existência enquanto NEIM, já contamos com pelo menos três diferentes gerações de pesquisadoras feministas, todas admiradoras de Heleieth Saffioti e para as quais A mulher na sociedade de classes: mito e realidade ainda tem muito a dizer e fazer pensar.

Criado em um momento em que os movimentos pela redemocratização do país se articulavam, dentre os quais, o movimento feminista, o NEIM congregou, inicialmente, pesquisadoras e professoras com uma história de militância nesses movimentos, como de resto aconteceu com boa parte dos núcleos dessa ordem surgidos na época. Já nossa segunda geração de pesquisadoras vivenciou sua formação feminista na universidade, envolvendo-se na militância a partir do seu engajamento com o NEIM e tendo acompanhado de perto as muitas visitas de Heleieth Saffioti a Salvador. Nossa terceira geração, a mais recente, tem histórico de militância semelhante, mas sua maior parte não desfrutou da presença física de Heleieth entre nós. No entanto, chega ao NEIM por meio de concurso público para cadeiras específicas voltadas às teorias feministas do primeiro curso de Bacharelado em Gênero e Diversidade do país, no contexto da expansão ocorrida via projeto de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (REUNI), entre os anos de 2010 e 2015, e que contou com o empenho também de nossa estrela maior para que se tornasse realidade.

Neste artigo, representantes de duas dessas gerações de nossas pesquisadoras - uma das mais antigas (Cecilia Sardenberg) e a outra da mais nova (Maíra Kubík Mano) - desenvolvem uma conversa a três com Heleieth, em uma releitura dessa que é a ‘obra-prima’ da referida autora - e prima não apenas por ser a sua primeira grande publicação, como também por ser a grande contribuição dos estudos feministas do Brasil para o mundo. Nesse intuito, valemo-nos tanto de memórias quanto de documentos pessoais, dialogando também com os aportes teóricos introduzidos por Heleieth Saffioti e mostrando como eles ainda servem de esteio para o pensamento feminista no Brasil.

Geração mais antiga do NEIM - Cecilia

Em 1980, eu cursava o doutorado em Antropologia na Boston University, época em que se verificava uma marcante revivescência do pensamento marxista por lá, com seminários e cursos especiais durante o verão que trouxeram para Boston pensadores como Nicos Poulantzas, Ernest Mandel, Robin Blackburn e Goran Therborn. Nesse mesmo período, travava-se em periódicos feministas e de esquerda um intenso debate que ficou conhecido como “debate sobre sexo e classe”, envolvendo feministas socialistas, marxistas e radicais (SARDENBERG, 2015).

Ciente de minhas inclinações marxistas e do meu interesse nas questões em pauta nesse debate, uma de minhas professoras sugeriu-me procurar na biblioteca Women in class society, livro de uma socióloga brasileira então recém-publicado. Tratava-se da tradução para o inglês de A mulher na sociedade de classes de Heleieth Saffioti (1978), publicada pela Monthly Review Press com prefácio de Eleanor Leacock, amiga de minha professora e uma das fundadoras da Women in Anthropology Newsletter, editada por um grupo de antropólogas feministas de Boston, do qual eu fazia parte.

Bastante interessada no livro em questão, fui logo tomá-lo de empréstimo. Mas, na ocasião, sobrecarregada de trabalhos a concluir, acabei fazendo uma leitura muito corrida do texto. Mesmo assim, causou-me um forte impacto, de sorte que, alguns anos depois, quando eu já havia voltado ao Brasil e atuava como professora concursada do Departamento de Antropologia da UFBA, pressionei minhas companheiras fundadoras do NEIM a convidar Heleieth Saffioti para participar do Ciclo de Debates comemorativo da criação do nosso núcleo.

Devido a compromissos familiares, porém, estava ausente de Salvador quando Heleieth Saffioti veio para o tal debate. Só fui conhecê-la pessoalmente em 1988 em uma reunião do Grupo de Trabalho (GT) “A mulher na força de trabalho”, da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em (ANPOCS), então por ela coordenado juntamente com Lena Lavinas e do qual eu participava. Fui como debatedora, substituindo outra professora da UFBA que não pôde comparecer. Mas, confesso que aceitei o convite por pura ousadia, me dando conta logo depois de que estaria debatendo as apresentações de pesquisadoras de renome, tais como Helena Hirata, Lena Lavinas e Cristina Bruschini. Sem esquecer que Heleieth Saffioti, já então conhecida como estrela maior e por não poupar críticas em suas avaliações, estaria na coordenação. Verdade é que me apavorei! Eu, uma iniciante (ainda era doutoranda), uma ilustre desconhecida, participando como debatedora em tal evento. Por isso mesmo, mergulhei de cabeça em muitas leituras, a começar por A mulher na sociedade de classes, fazendo copiosas anotações a ponto de gastar um caderno inteiro nessa preparação.

Relendo essas anotações, constato que, inspirada nas observações de Heleieth Saffioti, minha fala se voltou, sobretudo, para as questões tratadas no referido debate sobre sexo e classe, concordando inclusive com alguns dos pontos levantados no livro. Até hoje, porém, tenho profundas dúvidas sobre se o que falei naquele encontro foi muito ruim ou muito bom. Apesar de me tratar com muita gentileza e consideração, Heleieth não comentou nada específico sobre minha apresentação. Creio que deve ter-se compadecido desta (então) pobre iniciante, a ponto de me convidar para ir visitá-la em São Paulo, no seu famoso apartamento da Praça da República, convite por mim aceito. Foi assim que conheci sua imensa biblioteca, ela me disponibilizando seus livros e me incentivando a terminar minha tese. Anos depois, chegou a escrever carta de recomendação para o Chefe do Departamento de Antropologia da Boston University, endossando meu pedido de reintegração ao Programa de Doutorado para que eu defendesse minha tese, mesmo tendo estourado todos os prazos. Certo é que, desde aquele encontro da ANPOCS, fomos construindo uma relação de amizade cultivada até seus últimos dias, razão pela qual tomo a liberdade de chamá-la aqui, carinhosamente, apenas pelo prenome.

É bom lembrar que, embora fosse bastante rígida em suas críticas, Heleieth agia com justiça e às vezes até mesmo com certa humildade, reconhecendo seus erros e se desculpando sempre que possível, a exemplo da sua autocrítica em relação a Simone de Beauvoir, expressa na sua conferência proferida no simpósio do NEIM, comemorativo dos cinquenta anos de O segundo sexo:

Eu não me perdoo (até escrevi isso neste artigo que vai sair nos Cadernos Pagu), eu não me perdoo por não ter percebido um plágio feito pela Betty Friedan. Eu li O segundo sexo em 1962, quando eu comecei minha vida acadêmica, e depois houve um intervalo grande porque o livro da Betty Friedan, que foi publicado em 1963, eu só li mais tarde, creio que em 1966. Eu não me lembro quando eu li porque levou um tempo para chegar ao Brasil, chegou a tradução francesa, nem foi o livro em inglês. Então, demorou mais e como eu naquela época tinha uma implicância muito grande com Simone, com as concepções, não todas, mas a concepção metodológica que ela utilizou em O segundo sexo - naquela época a definição de cultura não contemplava a práxis e eu havia feito uma opção metodológica em que a práxis era nuclear - eu recusei aquilo que eu chamava de culturalista. Na época era, hoje já não é mais porque cultura não é só um conjunto de normas, valores, crenças, etc., cultura envolve práticas também, então hoje é diferente. Mas aí eu li, eu tinha lido a Simone e depois li o livro da Betty Friedan, que se chama A mulher mistificada (foi traduzido pela Vozes, mas eu li em inglês, então eu li na década de 60, antes de escrever esse primeiro livro que alguns de vocês conhecem) e eu não percebi que havia plágio porque eu entrei na onda do método. A Betty Friedan já tinha uma outra maneira de encarar as coisas, não era via cultura, porque Simone dedica o segundo volume inteiro, que é muito maior do que o primeiro, ao estudo dos escritores, dos que escreveram sobre assuntos que interessavam analisar e ela dava uma importância muito grande à escritura e eu fugi disso. Fugindo disso, havia muito pouca literatura, eu caí na Betty Friedan, não percebi que ela havia plagiado O segundo sexo. Eu aprendi isso muito recentemente, só que eu não tive tempo de voltar a ler Betty Friedan. Eu aprendi lá no colóquio de janeiro com feministas americanas - não foi uma só, foram várias. Elas sabiam de memória trechos e mais trechos de O segundo sexo e de A mulher mistificada, e a única coisa que variava era a língua; um era escrito em inglês e outro em francês. Então, vejam vocês isso: para mim foi super importante ter aprendido isso, agora eu preciso voltar a ler A mulher mistificada. As americanas são suficientemente agressivas para descobrir uma coisa e falar nas bochechas da cidadã e contar para o mundo, escrever a respeito disso. (SAFFIOTI, 2000, p. 32-33).

Por certo, algumas vezes, Heleieth também foi suficientemente ‘agressiva’, tal como as americanas, chegando mesmo a “descobrir uma coisa e falar nas bochechas da cidadã e contar para o mundo” (lembro aqui a discussão nada amigável entre ela e Boaventura de Sousa Santos em um evento em Pernambuco). Mas, no nosso relacionamento de amizade, predominou o respeito mútuo e, da parte dela, sempre muita generosidade. Quando da minha volta ao Brasil depois de ter defendido minha tese, época em que me encontrava um tanto desfalcada, sem verbas para comprar um carro, Heleieth me telefonou oferecendo o carro de seu marido, que havia falecido pouco antes. O carro estava em Araraquara e necessitando de consertos bastante custosos, o que, somando-se ao valor do transporte para Salvador, tornava-o um presente caro. Ela então se ofereceu para vendê-lo e me enviar o dinheiro para dar entrada em um novo, mas eu, já envergonhada, lhe agradeci, recusando essa gentil oferta para não a explorar ainda mais.

Revirando minhas papeladas, encontro algumas mensagens que trocamos ao longo dos anos. Dentre as quais, um e-mail enviado em junho de 2006, logo depois de um seminário do NEIM no qual discutíamos as ‘trilhas do empoderamento de mulheres’. Nessa mensagem, Heleieth se refere a um bate-boca entre ela e uma das participantes:

16 de jun. de 2006 às 22:28

Heleieth <heleieth@uol.com.br> escreveu:

Querida Cecília

Não sei onde botei o papel em que anotei o e-mail da Professora XXXXX, a quem prometi um texto que deverá ser o 4º cap. de meu último livro, caso haja reedição. Por favor, faça chegar a ela, dizendo-lhe que não o enviei antes por total impossibilidade (passei malíssimo com dores da fibromialgia). Meu emocional já estava ferido pela Opus Dei e ficou ainda muito pior com os risos de XXXXX. Pensei muito sobre o quê vc me disse. Se ela houvesse rido uma vez, poderia ser coincidência. Ocorre que ela riu durante minha apresentação de meu pensamento e uma segunda vez, quando eu respondia a sua pergunta. Perguntou para empentelhar, porque não tinha interesse na resposta. […] Eu, felizmente, não sei tudo, uma vez que não sou deusa. Grande abraço a todas. Beijo especial a vc.

Heleieth

Como de costume, Heleieth faz uso da ironia nessa mensagem, afirmando, por exemplo: “Eu felizmente, não sei tudo, uma vez que não sou deusa”. Aliás, como ela própria reconheceu em entrevista concedida a Natalia Pietra Mendéz (SAFFIOTI, 2010b, p. 291), gostava de ‘brincar’: “Eu brinco com as coisas porque cria um clima muito mais propício à aprendizagem, faço muita brincadeira, muita piada. Você leu aquele artigo ‘A violência doméstica ou a lógica do galinheiro?’ É bem jocoso!”. Na mensagem em questão, contudo, Heleieth escrevia em um momento difícil por ter sido removida de seu posto como professora da Pós-Graduação em Ciências Sociais da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP) pela “Opus Dei” (nas palavras dela), em represália a sua defesa pública da legalização do aborto. E se via também às voltas com as dores causadas pela fibromialgia que a acompanhou por muitos anos, até seus últimos dias. O que não a impedia de, durante suas visitas a Salvador para participar de nossos eventos, dar umas fugidinhas conosco para tomar suas cervejinhas (não eram poucas!), derrubando algumas de nós que porventura ousássemos acompanhá-la na dose. Ela, sem perder a linha, sempre elegante nos seus vestidos e conjuntos de linho engomado…

Creio que ela gostava mesmo de participar de nossos eventos, o que se verifica em sua resposta ao nosso convite para participar do simpósio comemorativo dos 25 anos do NEIM, realizado em 2008, no qual ela seria homenageada. Isso aconteceu no mesmo ano em que passei por três cirurgias complicadas, razão pela qual Heleieth expressa sua preocupação quanto a minha saúde na mensagem em questão, reproduzida aqui na íntegra:

Heleieth heleieth@uol.com.br

22 de out. de 2008 às 12:38

Querida Cecília,

Estou me sentindo bastante lisonjeada com o convite do NEIM. Fiquei especialmente contente por haver sido você a portadora do convite, pois isto significa que você está bem de saúde. Foi uma preocupação constante minha com sua saúde, depois que ouvi o relato de Ana Alice. Que bom saber que você está firme no combate!

É evidente que jamais deixaria de atender a um convite do NEIM. Não sei se mereço tanta homenagem, mas, já que vocês assim decidiram, é melhor fazê-la enquanto estou por aqui, uma vez que o grupinho minúsculo das três pioneiras está passando para o lado de lá. Carmen da Silva já se foi, Rose Marie Muraro tem a saúde bastante abalada e eu também estou batendo os pinos. Obrigada, amigas.

Vi que a homenagem será à noite, na abertura. Gostaria de saber se será chic. Devo levar roupa condizente com a situação? Devo apresentar algum trabalho?

Procurarei entender-me com XXXX sobre os vôos. Se puder, XXXXX, envie-me o programa, a fim de que possa marcar minha viagem de volta.

Um abraço apertado a todas do NEIM e um grande beijo a você.

Heleieth

Ela também nos ofereceu seu apoio em um momento difícil para nós, quando, como parte da reestruturação de órgãos da UFBA, em 2009, o NEIM perdeu sua condição de órgão suplementar e, assim, sua autonomia administrativa, seu status de unidade orçamentária e outras prerrogativas que decorriam desse estatuto jurídico. Encaminhamos na época uma nota pública a companheiras feministas e instituições parceiras, na qual nos pronunciávamos contra a conversão compulsória do NEIM em órgão complementar, defendendo a necessidade da criação do Instituto de Estudos Interdisciplinares sobre Mulheres, Gênero e Feminismo (INEIM), que já havia sido aprovado pela Egrégia Congregação da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, para abrigar o Curso de Bacharelado em Gênero e Diversidade e o Programa de Pós-Graduação em Estudos Interdisciplinares sobre Mulheres, Gênero e Feminismo e o também aprovado Departamento de Estudos de Gênero e Feminismo. Heleieth foi uma das primeiras companheiras a trazer-nos seu apoio, remetendo-nos a carinhosa mensagem abaixo:

De: Heleieth heleieth@uol.com.br

Assunto: Re: Pronunciamento do NEIM

Data: Quarta-feira, 7 de Outubro de 2009, 16:15

Cecília,

Assim que recebi sua msg, enviei carta ao reitor, com cópia para quem de direito. Estou na maior torcida para que recuperem o perdido e conquistem mais.

Forte beijo

HIBS

Dentre as mensagens que guardei das muitas trocadas ao longo dos anos, a última recebida foi em janeiro de 2010. Com sua impagável ironia, Heleieth me cumprimentava pelo nascimento de minha netinha, Luana, ocorrido no final de dezembro:

Heleieth Iara Bongiovani Saffioti heleieth@uol.com.br

5 de jan. de 2010 às 16:19

CECÍLIA

Parabéns pela linda e rechonchuda neta. Linda! Filho casado é isto: a família aumenta sem que tenhamos controle.

Forte abraço e muitos beijos.

Heleieth

Lembro-me, porém, que a última vez que conversamos antes do seu falecimento foi em junho de 2010, quando liguei para convidá-la a participar de um seminário do Observatório de Monitoramento da Aplicação da Lei Maria da Penha (OBSERVE), o consórcio de instituições e organizações feministas sediado no NEIM/UFBA, que aconteceria no final de outubro daquele ano (SARDENBERG; Márcia TAVARES, 2016). Ela não pôde aceitar o convite, vez que já tinha se comprometido com outro evento na mesma época, mas endossou com apreço nossa iniciativa, solicitando que lhe enviássemos cópias dos trabalhos a serem apresentados. Lamentavelmente, não tivemos tempo para acatar seu pedido. Ela se foi pouco mais de um mês depois da realização do referido evento.

Durante as mais de duas décadas em que Heleieth e eu cultivamos nossa amizade trocando as mensagens aqui publicadas, jamais discutimos sua obra maior, A mulher na sociedade de classes. Conforme aludi acima, minha primeira leitura do livro foi bastante corrida. Mas, em preparação para aquele debate na reunião do GT “A mulher na força de trabalho” da ANPOCS, debrucei-me mais demoradamente sobre o referido livro, fazendo anotações, guardadas até hoje, que utilizei no mencionado debate da ANPOCS. Revendo-as, porém, me dou conta de que minha leitura foi então bastante induzida pelas observações de Eleanor Leacock na introdução da tradução em língua inglesa. Ou seja, fiz uma leitura de A mulher na sociedade de classes a partir de uma perspectiva antropológica, marxista, de linhagem feminista.

De fato, feminista de formação marxista, Eleanor Leacock havia prefaciado antes também a tradução em inglês de A origem da família, da propriedade privada e do Estado, de Frederich Engels, na edição publicada em 1978, bem como de Ancient society, de Lewis Henry Morgan, um dos chamados ‘pais da antropologia’, cuja obra inspirou tanto Marx quanto Engels. Baseando-se nas obras desses autores (e de autoras feministas) e nas suas próprias pesquisas sobre os Montagnais-Naskapi, grupo de coletores-caçadores do Canadá (LEACOCK, 1981), Eleanor Leacock sustentou a perspectiva de que apesar da universalidade da divisão sexual do trabalho, isso não se traduzia na subordinação universal das mulheres através da história. Segundo a autora, as mulheres gozavam de muita autonomia nas sociedades ditas igualitárias, a exemplo dos Montagnais-Naskapi, documentando, a partir de seus estudos, como a influência dominadora das missões jesuítas e a introdução do comércio de peles entre esses povos, em consequência da invasão europeia das Américas, ou seja, do colonialismo, resultou na domesticação e na subordinação das mulheres. Essas ideias são bem trabalhadas por ela na coletânea Myths of male dominance (LEACOCK, 1981), que reúne vários de seus trabalhos e prenunciam uma crítica feminista à colonialidade de gênero, avant la lettre.

Causa surpresa, portanto, o fato de Eleanor Leacock não tecer críticas à visão de Heleieth de uma suposta subordinação universal das mulheres (uma perspectiva que a própria Heleieth iria mais tarde criticar) em sua introdução de A mulher na sociedade de classes, na qual incluiu também a leitura de dois artigos de Heleieth publicados em inglês (SAFFIOTI, 1975, 1977). Aparentemente, Leacock não tinha interesse em enveredar por essa polêmica, atendo-se ao que lhe pareceu como principal contribuição de Heleieth aos estudos feministas: a situação das mulheres nas sociedades capitalistas.

Nesse tocante, Eleanor Leacock exalta a importância das considerações de Heleieth quanto à marginalização econômica da mulher no capitalismo, processo este resultante da necessidade da formação de um exército industrial de reserva a ser convocado - ou descartado - conforme as necessidades do capital. Leacock bem ressalta que, ao contrário da visão dominante de que essa situação marginalizada da mulher resulta de sua posição na família, Heleieth inverte essa lógica, argumentando serem as necessidades do capital que contribuem para a manutenção de um modelo de família baseado na divisão sexual do trabalho e na domesticação das mulheres - uma perspectiva que mais tarde seria também defendida por Michele Barrett (1980) ao analisar a relevância da “family household” para o capitalismo em Women’s oppression today. Para Heleieth, porém, no que concorda em parte Leacock, tal processo se respalda, por um lado, no “complexo de masculinidade” e, por outro, na “mística feminina”, conceito este tomado emprestado de Betty Friedan (1971), cuja publicação original é de 1963.

Acrescente-se que é dentro desse contexto que Heleieth traz à baila a questão do trabalho doméstico no capitalismo - tópico que também suscitou longos e calorosos debates nos idos dos anos 1970 e 1980 -, posicionando-se contra a noção de que esse trabalho, embora fundamental, seja “produtivo” no sentido do pensamento marxista. Para Heleieth, no que também concordo, o trabalho doméstico contribui de forma indireta para a mais-valia capitalista, o capital valendo-se dele para pagar salários menores, já que esse trabalho reduz o custo da reprodução diária da força de trabalho e, assim, para o barateamento da reprodução da mercadoria força de trabalho como um todo. Anos depois, Heleieth publicaria resultados de sua pesquisa sobre o emprego doméstico no capitalismo (SAFFIOTI, 1979), obra que contribuiu para uma discussão dessa questão ainda hoje relevante em nossa sociedade.

De fato, em A mulher na sociedade de classes Heleieth prenuncia questões ainda atuais, a exemplo do que ela posteriormente identificaria como a simbiose entre patriarcado, racismo e capitalismo (SAFFIOTI, 1976), mostrando como seu entrelaçar se processou historicamente na sociedade brasileira. Por certo, tal questão foi melhor trabalhada por ela em O poder do macho (SAFFIOTI, 1987), livro escrito, nas suas palavras, “para jovens”, sendo também abordada no artigo “Rearticulando gênero e classe” (SAFFIOTI, 1992), no qual ela retrabalha pontos levantados nesse sentido já em A mulher na sociedade de classes. Sem dúvida, sua abordagem se aproxima da perspectiva de Patricia Hill Collins (1993) sobre matrizes de opressão que se cruzam e imbricam, dando margem a posições vulneráveis na intersecção de gênero, raça e classe (SARDENBERG, 2015).

Segundo nos aponta Viviane Modda Oliveira (2019), pode-se dizer que o conceito de patriarcado, como patriarcalismo, na concepção weberiana, já se faz presente em A mulher na sociedade de classes. É claro que Heleieth não usa nesse livro o termo “patriarcado”, mas concordo que esse conceito já começa a se esboçar na sua discussão do “complexo de masculinidade”, sendo depois melhor trabalhado por ela em Gênero, patriarcado e violência (SAFFIOTI, 2015), originalmente publicado em 2004. E, mais tarde, no artigo “A ontogênese do gênero” (SAFFIOTI, 2008), Heleieth desenvolve uma discussão que considero fundamental sobre a “ordem patriarcal de gênero”, articulando as noções de relações de gênero e de patriarcado, antes tidas como incompatíveis, trazendo com esse artigo uma de suas principais contribuições teóricas. Como ela própria explica, em entrevista concedida a Natalia Mendéz:

Nesse trabalho da ontogênese do gênero, eu mostro que o conceito de gênero é muito vago, não passa de uma categoria gramatical. Agora, podemos usá-lo? Podemos, ele é ótimo, economiza papel! Agora ele é válido? Ele é, mas o conceito, quanto mais extenso, menos profundo ele é, é o caso do gênero. Gênero serve para a história inteira, mas, quando eu digo gênero, eu não sei quem manda em quem. Mas se eu disser “ordem patriarcal de gênero” aí eu sei que se trata de uma fase do gênero patriarcal, e o título já comunica ao leitor, ao ouvinte, a direção do vetor da dominação. (SAFFIOTI, 2010b, p. 293-294).

Em A mulher na sociedade de classes, Heleieth segue também os passos de Simone de Beauvoir e Betty Friedan, tecendo críticas relevantes à Psicanálise Freudiana, além de dedicar um capítulo inteiro à crítica à Antropologia que, na verdade, resume-se mais a uma crítica a Margaret Mead. Por certo, Heleieth reconhece a importância das considerações de Mead no tocante às variações culturais sobre masculino e feminino em Sexo e temperamento (MEAD, 1979) - publicado originalmente em 1935 -, mas é bastante crítica à postura, hoje vista como essencialista, de Mead (1949) em Male and female, livro publicado no mesmo ano de O segundo sexo. Observe-se que Eleanor Leacock (1981) - publicação original de 1952 - também teceu críticas contundentes a Margaret Mead, em uma resenha elaborada alguns anos depois da publicação de Male and female. Até eu já fiz críticas desse teor à referida obra, ressaltando, porém, a relevante contribuição de Sexo e temperamento para a construção do conceito de gênero (SARDENBERG, 2000). Mas, como antropóloga que sou, me incomoda a crítica de Heleieth a Margaret Mead transformar-se ali em uma crítica à Antropologia como um todo, ou, como afirmou ela anos depois, ao seu “culturalismo”.

Não resta dúvida, porém, de que a Antropologia - como, de modo geral, também outras ciências - merece críticas severas pelo viés androcêntrico que tem marcado todo o seu desenvolvimento (SARDENBERG, 2014). E é bom lembrar que nos idos dos anos 1960, quando Heleieth elaborava seu tratado sobre as mulheres no capitalismo, havia poucas publicações antropológicas acessíveis a pesquisadores no Brasil. Ademais, foi somente a partir de meados dos anos 1970 que a crítica feminista à antropologia passou a ganhar espaço, inclusive com os trabalhos da própria Eleanor Leacock e de coletâneas celebradas, como as organizadas por Michele Rosaldo e Louise Lamphere (1974), Rayna Reiter (1975) e a de Ruby Rohrlich-Leavitt (1975), e esta última conta inclusive com um artigo da própria Heleieth Saffioti. Desde então, avançamos bastante nesse sentido, construindo-se, nesse processo, uma antropologia feminista, fundamentada nas epistemologias críticas (SARDENBERG, 2014).

Vale lembrar também que na publicação original de A mulher na sociedade de classes Heleieth inclui uma nota afirmando não se tratar de um livro ‘feminista’. Perguntada por Natalia Mendéz por que assim procedera, eis o que Heleieth responde:

(NPM): Na nota preliminar do livro, há uma frase que diz não se tratar de um livro feminista. Por que a senhora fez essa afirmação?

(HS): Hoje eu não faria. Porque eu ia muito à televisão, me convidavam muito e toda a vez que eu ia à televisão, você sabe, o que interessa para este tipo de sociedade é denegrir o feminismo. Eu escrevi um artigo fazendo uma classificação dos feminismos, não sei se você conhece, é velho esse artigo, trata do feminismo liberal, socialista, são cinco tipos de feminismo. Hoje a minha compreensão do processo é diferente. (SAFFIOTI, 2010b, p. 289).

Mas, adiante, ela acrescenta:

não é que eu não fosse feminista. É que os meios de comunicação pegavam sempre o que era pior para usar como rótulo de feministas. Então, houve uma corrente que nunca foi muito expressiva, mas que era a pior, que era das feministas radicais. Elas nunca foram radicais do ponto de vista político. Elas eram radicais porque advogavam uma sociedade só de mulher. E eu sou partidária do radicalismo, mas do radicalismo político, o que este não era. Toda a vez que eu ia à televisão ou ao rádio, eu tinha que explicar de que feminismo eu era, por isso que saiu assim. (SAFFIOTI, 2010b, p. 290).

No livro, porém, Heleieth tece sua crítica ao feminismo sufragista, liberal, uma crítica por certo pertinente. Mas não se deve esquecer que o feminismo, enquanto pensamento ou movimento, também se transformou consideravelmente nesses cinquenta anos desde a publicação de A mulher na sociedade de classes. Ademais, tal como Simone de Beauvoir, que também criticou o feminismo dito ‘burguês’, Heleieth veio juntar-se às nossas lutas, definindo-se por um feminismo antirracista e anticapitalista, cujos princípios já se faziam vislumbrar em A mulher na sociedade de classes.

Resta ainda observar que o entusiasmo de Heleieth com as organizações de mulheres de esquerda e das classes trabalhadoras, se bem que não muito realista para a época da escritura de A mulher na sociedade de classes - essas organizações de mulheres eram então frágeis, sem autonomia, tuteladas diretamente pelos partidos comunistas (Ana Alice COSTA PINHEIRO, 1981) -, vem finalmente se confirmando. Tais organizações e as ditas ‘feministas de partido’ também vêm marcando seu espaço nas lutas feministas contemporâneas, constituindo-se como uma das importantes linhagens do feminismo atual na sociedade brasileira.

Para finalizar esta seção, devo ressaltar que, apesar das limitações impostas a um trabalho pioneiro, A mulher na sociedade de classes se mantém como obra emblemática dos estudos feministas no Brasil. Confesso, porém, que me vejo muito mais alinhada com os trabalhos mais recentes de Heleieth (principalmente “A ontogênese do gênero”, 2008), incluindo-os sempre em minhas bibliografias de disciplinas que tratam das teorias feministas. Por certo, a parte histórica de A mulher na sociedade de classes, referente ao Brasil, permanece atual, mas há que reconhecer que essa obra pioneira exige um bom embasamento da teoria marxista para ser bem absorvida, razão pela qual tenho optado por incluir outros trabalhos de Heleieth para leitura de nossas alunas e alunos.

Para cursos de graduação que ofereci por muitos anos ao alunato do Curso de Ciências Sociais, a sugestão era O poder do macho (SAFFIOTI, 1987), livro que Heleieth escreveu precisamente para jovens, e que introduz uma importante discussão sobre a simbiose entre machismo, racismo e capitalismo na sociedade brasileira. Nos cursos de pós-graduação, tenho trabalhado os artigos “Rearticulando gênero e classe” (SAFFIOTI, 1992), no qual ela retoma alguns pontos levantados em A mulher na sociedade de classes, e, meu preferido, “A ontogênese do gênero” (SAFFIOTI, 2008), textos que também têm constado das bibliografias recomendadas no processo de seleção para os cursos de Mestrado e Doutorado do Programa de Pós-Graduação em Estudos Interdisciplinares sobre Mulheres, Gênero e Feminismo (PPGNEIM), fazendo, portanto, parte do processo de formação de diferentes gerações de feministas acadêmicas no NEIM.

Geração mais nova do NEIM: Maíra

Nas próximas páginas, tentarei, a partir de um percurso cronológico individual, refletir sobre as diferentes gerações dos feminismos brasileiros tendo como referência central a vida e a obra de Heleieth Saffioti, com o objetivo de acrescentar elementos para pensarmos sobre como se dá a transmissão intergeracional da práxis feminista, ou seja, da transmissão do ideário feminista, com seus princípios, valores, metodologias, saberes e formas de ação através do tempo. Conhecer as autoras e sua forma de pensamento por meio de seus textos é uma maneira fundamental de se aproximar delas. Contudo, falar sobre transmissão intergeracional do feminismo é não apenas tratar das teorias, mas também das práticas. O feminismo se apoia eminentemente sobre a práxis. As histórias de vida, dificuldades em atuar na academia com essa temática, posturas tomadas e mesmo as divergências políticas importam. Assim, a memória que eu tenho de Saffioti não é apenas minha, mas é aquela construída coletivamente, pelas impressões e narrativas transmitidas das mais velhas para as mais jovens.

A primeira vez que ouvi falar em Heleieth Saffioti foi durante a graduação em Ciências Sociais na Universidade de São Paulo. Eu começava a militar no movimento estudantil e me aproximei de um agrupamento político que tinha como uma de suas principais referências Florestan Fernandes. Aos poucos, fui descobrindo o grupo de intelectuais ‘ao redor’ de Florestan, como Octavio Ianni, Antonio Candido e, obviamente, Saffioti. Foi, portanto, a partir do marxismo, e não do feminismo, que eu cheguei à sua obra. E, apesar de ter sido na faculdade, não foi dentro das salas de aula que tomei conhecimento daquela que, como afirma Céli Regina Pinto (2003), tem o texto fundador da produção acadêmica sobre as mulheres brasileiras.

Naquele momento, início dos anos 2000, A mulher na sociedade de classes: mito e realidade já estava esgotado havia muitos anos. Encontrei o meu exemplar em um sebo que ficava na Av. Paulista. Trata-se da segunda edição, de 1976. A primeira é de 1969. A seguinte só sairia em 2013, pela Editora Expressão Popular, ligada a movimentos sociais como o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Temos aí um longo hiato - não da autora, que seguiu publicando, mas de seu principal livro.

Saffioti escreveu A mulher na sociedade de classes em plena ditadura civil-militar, entre 1966 e 1967. Foi apressada por Florestan, seu orientador, para que ela pudesse obter o título que lhe garantiria estabilidade como docente na Universidade do Estado de São Paulo (Unesp). Naquela época de perseguições, prisões e desaparecimentos de intelectuais, era uma tentativa de se salvaguardar. Enquanto a chamada segunda onda feminista eclodia no norte global, o Brasil vivia um momento sombrio. Disse Saffioti, em entrevista a Renata Gonçalves e Carolina Branco: “Imagina publicar um assunto daqueles que não pertencia à academia, não era considerado legítimo, não tinha nenhuma legitimidade, feito por uma mulher e ainda comunista que metia a lenha na Igreja católica.” (SAFFIOTI, 2011, p. 80). Eu não conseguia nem imaginar. Relatos como o de Rose Marie Muraro dão conta do clima de pavor vivido nesse período, em especial após o Ato Institucional nº 5, no final de 1968: “Em junho de 1971 eu conheci Heleieth Saffioti, fui a Araraquara conversar com ela, eu apavorada de ser fichada pelo SNI [Serviço Nacional de Informação], mas começamos a discutir a mulher na sociedade de classes.” (MURARO, 1987 apudPINTO, 2003, p. 47). Sobre esse encontro, Saffioti relembra:

A Rose tem uma origem muito religiosa, muito católica, tanto que a Ação Popular (AP) surgiu na casa dela - agora há pouco ela me ligou, ela me liga a todo minuto. Então, as idéias não batiam. Eu só fui conhecer a Rose depois que meu livro fez sucesso, não apenas aqui, mas na França. O pessoal que estava na França lia, fazia seminários, e depois foi publicado nos Estados Unidos. E quando a Rose Marie Muraro trouxe a Betty Friedan - porque lançou o livro dela e trouxe-a - é que ela foi me conhecer, ela é que se deslocou, foi a Araraquara para me conhecer. Embora não soubesse nada de Marx, estudava feito louca porque eu queria ser marxista. (SAFFIOTI, 2011, p. 73).

Apesar da modéstia de Saffioti ao dizer que não sabia nada de Marx, A mulher na sociedade de classes é um livro que utiliza amplamente o materialismo histórico-dialético como método. Aliás, no momento da escrita dessa obra, Saffioti não se identificava inicialmente, naquele período, como feminista por considerar-se marxista (PINTO, 2014), colocando, portanto, a centralidade de sua análise na classe, e não no gênero - é interessante pensar como, até hoje, essa tensão está presente. No livro, Saffioti reflete inicialmente sobre como a instauração do modo de produção capitalista impactou as mulheres, para, em seguida, apresentar as proposições - ou a ausência delas - socialistas para as mudanças estruturais e, finalmente, tratar do feminismo e de suas limitações. Acredito, contudo, que a contribuição de A mulher na sociedade de classes que mais me impactou esteja em sua segunda parte, quando a autora se debruça sobre o Brasil e percebe, no modo de produção escravista, a origem da imbricação entre sexo,1 raça e classe que marca as desigualdades em nossa sociedade. Assunto contemporâneo, trazido em especial pelo conceito de interseccionalidade, vemos ali em Saffioti já algumas chaves para a análise da realidade brasileira com lentes de gênero. Por fim, ao tratar da psicanálise, ela vai ao encontro de Betty Friedan e Simone de Beauvoir no que Céli Pinto chamou de “o inimigo comum”: “Com argumentos muito diversos e partindo de posturas também muito distintas, as três autoras em tela atribuem a Freud uma espécie de condenação da mulher à inferioridade, por sua essência.” (PINTO, 2014, p. 328).

Na edição de 1976, esta que encontrei no sebo, há uma nota, escrita por Saffioti em 1975, explicando o quanto os movimentos feministas haviam crescido entre uma e outra publicação, espaçadas por uma década:

Este livro foi escrito entre dezembro de 1966 e fevereiro de 1967. Desde então, a literatura científica sobre o assunto cresceu enormemente. Substancialmente também cresceram os movimentos feministas. Nos Estados Unidos, na França, na Itália e em outros países, as mulheres movimentam-se visando a obter leis que lhes assegurem o controle de seu corpo e justiça na situação de trabalho e na sociedade em geral. (SAFFIOTI, 1979, p. 7).

Cabe notar que 1975 foi o ano internacional da mulher celebrado pela Organização das Nações Unidas (ONU) e um marco na reconstrução dos movimentos feministas no Brasil. Como relembram Ana Alice Costa e Cecilia Sardenberg:

Pode-se dizer que os estudos sobre a mulher no Brasil, com uma perspectiva de transformação da condição feminina, têm início nos anos 60 com o trabalho pioneiro de Heleieth Saffioti, A mulher na sociedade de classes. Entretanto, devido às nossas condições históricas específicas, só nos anos 70, notadamente a partir das comemorações do Ano Internacional da Mulher, é que estes trabalhos começarão a ganhar maior impulso. (COSTA, SARDENBERG, 2014, p. 32).

Nascida no início dos anos 1980, quando o regime ensaiava a abertura, tal realidade ecoava distante para mim. Muraro e Saffioti, como muitas outras citadas neste artigo, entraram na classificação que minha geração faz como “feministas históricas”. Nem sempre simpática, essa referência guarda o reconhecimento do trabalho intelectual militante de todas aquelas oriundas dos feminismos que atravessaram a ditadura - muitas delas no exílio -, passaram pela anistia e participaram da redemocratização.

Miriam Grossi define, em um texto de 1998, as “feministas históricas” como:

aquelas que participaram das mobilizações do período conhecido como a “primeira década da mulher”, entre 1975 e 1985, engajadas no movimento feminista “autônomo” há mais de 15 anos e que estão hoje na meia-idade. Estas mulheres, que no período da sua adesão ao feminismo, no final dos anos 70, militavam nas suas horas vagas em diferentes grupos feministas sem receber nenhuma remuneração, se tornaram progressivamente assalariadas da causa das mulheres. Este assalariamento deu-se de diferentes formas: tanto pela profissionalização de alguns antigos grupos autônomos que se transformaram em reconhecidas organizações não governamentais, quanto pela criação de espaços feministas em diferentes instituições, como no serviço público e na universidade. (GROSSI, 1998, p. 5).

Céli Pinto (2003) faz uma classificação semelhante ao apontar algumas áreas de atuação das feministas na redemocratização. Saffioti trilhou o caminho acadêmico. Da Unesp, foi para a PUC/SP, universidade onde cursei a graduação em Comunicação Social com habilitação em Jornalismo. Nesse período, no entanto, não sabia que ela era docente do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais. Só descobri isso quando, já formada, vi que seu nome constava na lista de 447 docentes demitidos em 2006.

O passaralho foi justificado pela Fundação São Paulo, mantenedora da PUC-SP, como necessário para sanar o déficit da instituição. Um abaixo-assinado mobilizado por intelectuais e políticos circulou em defesa de Saffioti. De acordo com matéria publicada pelo jornal Folha de S. Paulo na ocasião, havia a suspeita de que Saffioti tinha ingressado na lista após escrever um artigo pró-descriminalização do aborto para o site da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB). Em resposta, o padre Juarez de Castro, porta-voz da instituição, negou a perseguição ideológica, mas reafirmou o preconceito etário: “Os critérios para a lista já foram divulgados [idade avançada e avaliação de desempenho, entre outros]. Ela sempre defendeu coisas como essa e nunca houve problema.” (Fabio TAKAHASHI, 2006). Saffioti tinha então 72 anos.

Mais do que uma questão etária, estamos aqui diante de um problema de substituição geracional. Como afirma Alda Britto da Motta (2010), a definição de velhice é tão arbitrária quanto a de qualquer outra idade, porém, citando Remi Lenoir, “no caso tem o agravante de que se tornar ‘velho’ significa, em verdade, tornar-se ‘velho demais para exercer determinada atividade ou ter acesso, de forma legítima, a certas categorias de bens ou posições sociais’.” (LENOIR, 1998, p. 68 apudMOTTA, 2010, p. 240).

Portanto, se para a minha geração de feministas aquelas designadas como “históricas” eram objeto de reverência, admiração e até temor, para as instituições não necessariamente há uma valorização de sua trajetória e de seu conhecimento. A demissão é, pelo contrário, uma interrupção abrupta do processo de transmissão intergeracional do feminismo que encontra na universidade um espaço privilegiado. Transmissão esta que, obviamente, não é realizada em uma única direção, como se um dos lados fosse emissor e o outro mero receptor da mensagem, tampouco de maneira suave.

Ruídos e até rompimentos na transmissão intergeracional podem também ser causados pelas relações de poder entre as próprias feministas. Como aponta Julia Paiva Zanetti em seu estudo sobre jovens feministas no Rio de Janeiro:

Ainda que vistas como uma possibilidade de continuidade do legado do movimento, são frequentemente colocadas na condição de herdeiras, condição que se alteraria somente pela ausência das “feministas históricas”. Em uma relação permeada pela desconfiança da inexperiência, as jovens militantes não possuem uma longa vivência ou um profundo conhecimento do movimento, nem representam instituições ou têm títulos que as legitimem. E, mesmo que possuíssem, dificilmente seriam suficientes para disputar com aquelas que têm décadas de militância. Assim, as relações de poder nesse campo são bastante desiguais, o que torna a inserção dessas jovens no movimento um desafio ainda maior. (ZANETTI, 2010, p. 2).

Na academia, há uma problemática adicional que é a da própria hierarquia institucional. Assim, nos degraus para acessar o conhecimento e obter as titulações, as “feministas históricas” estão na posição de orientadoras, líderes de grupos de pesquisa, palestrantes e referências bibliográficas, o que denota uma posição de poder.

Uma anedota bastante comum, aliás, é, ao ter contato com uma delas, dizer que ouviu e viu sua bibliografia falar. E Saffioti é, nesse sentido, também uma grande referência. Em uma pesquisa que fizemos por ocasião dos dez anos do Programa de Pós-Graduação em Estudos Interdisciplinares sobre Mulheres, Gênero e Feminismo (PPGNEIM), analisamos as teses produzidas pelas discentes e percebemos que Saffioti era a principal referência de autora brasileira (Ivia ALVES; Silvia Lúcia FERREIRA; Maíra MANO, 2016, p. 113). Saffioti divide a posição com Cecilia Sardenberg, coautora deste artigo e fundadora do PPGNEIM, ambas com 36 citações. Entre as/os estrangeiras/os, Joan Scott encabeça a lista (com 48 citações), seguida por Pierre Bourdieu (38 citações), Sandra Harding (35 citações) e Michel Foucault (33 citações). Embora A mulher na sociedade de classes seja sua obra mais celebrada, o livro mais citado de Saffioti é o último que ela publicou em vida, de 2004, Gênero, patriarcado e violência (Ed. Fundação Perseu Abramo).

Foi justamente essa a temática do único momento em que tive um diálogo mais longo com Saffioti. Ainda atuante no jornalismo, entrevistei-a para uma matéria sobre violência doméstica quando era editora da versão brasileira do Le Monde Diplomatique, em 2010 (SAFFIOTI, 2010a). Saffioti recebeu a mim e a repórter Mariana Fonseca em seu apartamento na Praça da República, muito próximo de nossa redação. Simpática e atenciosa, Saffioti nos contou um pouco como andava sua vida, cuja principal tarefa no momento era cuidar da mãe idosa - Alda Motta (2010) nos lembra que, entre 60 e 110 anos de vida, coexistem gerações de velhos em um espaço cronológico e social de 50 anos.

Ao responder às perguntas da reportagem, Saffioti trouxe posicionamentos contundentes, como lhe era característico. Ela nos disse que achava que a Lei Maria da Penha não iria “pegar”: “É preciso reeducar homens e mulheres. Esta Lei criminalizou o fenômeno, por meio de seu enquadramento judicial” (SAFFIOTI, 2010a). Então contou-nos uma história de que, logo no início da implementação da Lei, ela participou de um debate em Mato Grosso do Sul, onde apresentou sua posição contrária ao texto. Ao final, uma delegada da região veio conversar com ela dizendo que discordava, mas que tinha se retirado da palestra para resolver exatamente uma situação que Saffioti havia previsto: uma mulher, que havia denunciado o marido horas antes, voltara à delegacia e tinha conseguido entrar na cela dele, onde o casal fez as pazes.

Em dezembro de 2010, cinco meses depois da entrevista ao Le Monde Diplomatique, Heleieth Saffioti faleceu. Agora, escrevo este artigo como docente do Departamento de Estudos de Gênero e Feminismo da UFBA. No NEIM, pude conhecê-la mais, embora ela já não estivesse entre nós. Foi ouvindo histórias sobre como ela foi madrinha do núcleo, suas idas e vindas a Salvador e participações em eventos, que formei, em minha cabeça, uma imagem mais apurada sobre ela. Assim como Cecilia Sardenberg, Saffioti - a quem Cecilia chama de Heleieth, demarcando bem a proximidade da relação - também é bibliografia frequente nas disciplinas que leciono, tanto de teorias feministas quanto de marxismo e política. Permanece viva, nos causos e nos textos, cumprindo uma etapa do ciclo de transmissão intergeracional dos feminismos.

Considerações finais

Heleieth Saffioti representa, certamente, nossa primeira geração de acadêmicas feministas, ainda que no início de sua carreira não tenha se identificado com o feminismo. Ao contrário, conforme observamos, em A mulher na sociedade de classes ela afirma não se tratar de uma obra feminista, reconhecendo-se, porém, posteriormente como tal com a emergência dos feminismos contemporâneos, tendo inclusive destacado a relevância do movimento em questão por tornar visível e confrontar a violência de gênero contra mulheres, objeto maior de seus estudos na maturidade.

Uma homenagem póstuma, um tanto controversa, a Heleieth Saffioti foi oferecida por meio de uma resenha de Women in class society, publicada no American Journal of Sociology em 2014, de autoria de Barbara Celarent - mais tarde identificada como sendo a alcunha de um dos editores desse conceituado periódico. Essa resenha, apesar de pontuar as diferentes contradições teórico-metodológicas dos argumentos de Heleieth Saffioti e suas limitações, ressalta a relevância da sua discussão sobre as mulheres na sociedade brasileira, terminando por fazer um elogio, também um tanto contraditório, ao referido livro, assim afirmando:

The achievement of this book is at once simple and grand. It imagines a group of people - women - and by that imagining itself helps create the group. That the book studies women systematically is essentially its way of making its claim that women exist as a bona fide social group, not simply an sich, but für sich as well. In a social science that consists often of debunking, such work is profoundly creative. All social groups must be so made, whether by charismatic leaders, social movements, or even social scientists. Human life does indeed seem to consist of such daring imaginations, whose implications and results are then lived out by others. Yet we seldom see social scientists so clearly in the act of making such a daring leap. That it was political - even that it was rooted in Saffioti’s own personal experience - means little beside the work of imagination that brought together so diverse a body of sources in the service of social creation. (CELARENT, 2014, p. 1.827).

No mesmo ano, 2014, a Revista Estudos Feministas publicou um dossiê com trabalhos de várias feministas de renome, homenageando Heleieth Saffioti e seu legado. A mídia jornalística, contudo, não concedeu a ela o mérito esperado. Em 2013, quando a feminista radical Sulamith Firestone morreu, a revista New Yorker publicou um obituário belíssimo, longo, escrito pela jornalista Susan Faludi (2013) e intitulado “Death of a revolutionary” [“A morte de uma revolucionária”]. O texto atravessava a vida e a obra da autora e fazia com que a/o leitor/a sentisse uma proximidade - e até certa intimidade - com Firestone. Quando Saffioti faleceu, recebeu notas de lamento, dois ou três parágrafos. Esta seção temática, assim como as outras publicações organizadas em função dos cinquenta anos do lançamento de A mulher na sociedade de classes, deve contribuir com essa lacuna e, quiçá, nos estimular a preservar mais nossa memória feminista.

Referências

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1Preservo o vocabulário utilizado pela autora.

Como citar este artigo de acordo com as normas da revista: MANO, Maíra Kubík Taveira; SARDENBERG, Cecilia Maria Bacellar. “Heleieth e as diferentes gerações de feministas do NEIM/UFBA”. Revista Estudos Feministas, Florianópolis, v. 29, n. 1, e72559, 2021.

Financiamento: Não se aplica

Consentimento de uso de imagem: Não se aplica

Aprovação de comitê de ética em pesquisa: Não se aplica

Recebido: 30 de Março de 2020; Revisado: 29 de Outubro de 2020; Aceito: 10 de Novembro de 2020

cecisard@ufba.br

maira.kubik@ufba.br

Maíra Kubík Taveira Mano (maira.kubik@ufba.br) é doutora em Ciências Sociais pela Unicamp (2015) e professora do Departamento de Estudos de Gênero e Feminismo, da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal da Bahia (FFCH/UFBA), e do Programa de Pós-Graduação em Estudos Interdisciplinares sobre Mulheres, Gênero e Feminismo (PPGNEIM/UFBA). É pesquisadora do Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre a Mulher (NEIM/UFBA).

Cecilia Maria Bacellar Sardenberg (cecisard@ufba.br) é doutora em Antropologia pela Boston University, com estágio pós-doutoral no Institute of Development Studies (IDS), Inglaterra. Professora Titular de Antropologia atuando no Programa de Pós-Graduação em Estudos Interdisciplinares sobre Mulheres, Gênero e Feminismos (PPGNEIM/UFBA). É pesquisadora permanente do NEIM/UFBA.

Contribuição de autoria: As autoras contribuíram igualmente

Conflito de interesses: Não se aplica

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