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Revista Estudos Feministas

versão impressa ISSN 0104-026Xversão On-line ISSN 1806-9584

Rev. Estud. Fem. vol.29 no.2 Florianópolis maio/ago 2021  Epub 01-Maio-2021

https://doi.org/10.1590/1806-9584-2021v29n260462 

Artigos

Cultura da computação para além da normatividade: participações e produções

Computing Culture Beyond Normativity: Participations and Productions

Cultura de la computación más allá de la normatividad: participaciones y producciones

Leander Cordeiro de Oliveira1 
http://orcid.org/0000-0001-9887-8839

Pricila Castelini1 
http://orcid.org/0000-0002-1399-9082

Patrícia da Silva Leite1 
http://orcid.org/0000-0003-4934-3584

Leonelo Dell Anhol Almeida1 
http://orcid.org/0000-0002-0222-9138

Marília Abrahão Amaral1 
http://orcid.org/0000-0001-9327-223X

1Universidade Tecnológica Federal do Paraná, Departamento de Computação, Campo Mourão, PR, Brasil. 87301-006


Resumo:

A área de computação pode ser considerada um espaço normativo nas perspectivas de gênero e, apesar das recentes problematizações que vêm ocorrendo, as discussões sobre as questões de exclusão, invisibilização e apagamento de figuras históricas ainda são incipientes. Seguindo esta reflexão, neste artigo, pretendemos questionar a cultura da computação enquanto construída pelos sujeitos da norma, abordando estas questões de forma participativa, a fim de promover espaços de fala e de atuação que estão relacionados a mudanças culturais, práticas e filosóficas da área. Essas discussões ocorreram em oficinas participativas e, como desdobramento, foram desenvolvidos dois artefatos para proporcionar a visibilização de figuras históricas desconsideradas pela área, a apresentação de conceitos da computação a partir da diversidade, fomentando os debates sobre gênero na área de computação.

Palavras-chave: cultura da computação; oficinas participativas; questões de gênero

Abstract:

Computing area can be considered a normative space within gender perspective and despite its social dissemination and the recent gender problematizations that are occurring in the area, discussions about exclusion, invisibility and erasure of historical figures are still incipient issues. Following this reflection, this article intends to question computing culture as constructed by normative people, approaching these questions in a participatory way to promote speech and acting spaces that are related to cultural, practical and philosophical changes in the computing area. These discussions took place in participative workshops where were developed two artifacts as unfolding to promote visibility of historical figures that are disregarded by the normative computing culture, the presentation of computing concepts in a non-gendered way, fomenting debates about gender in computing area.

Keywords: Computing Culture; Participative Workshops; Gender Issues

Resumen:

El área de la computación puede ser considerada un espacio normativo en términos de perspectiva de género y, a pesar de las recientes problematizaciones que se han venido produciendo, las discusiones sobre los temas de exclusión e invisibilidad de personajes históricos son aún incipientes. Siguiendo esta reflexión, este artículo pretende cuestionar la cultura de la computación construida por los sujetos de la norma, abordando estos temas de manera participativa con el fin de promover espacios de discurso y actuación que se relacionen con los cambios culturales, prácticos y filosóficos en el área. Estas discusiones se llevaron a cabo en talleres participativos, y como resultado, se desarrollaron dos artefactos para dar visibilidad a personajes históricos desatendidos por el área, la presentación de conceptos informáticos basados en la diversidad, fomentando debates sobre género en el área informática.

Palabras clave: cultura de la computación; talleres participativos; cuestiones de género

Introdução

Autoras como Teresa De Lauretis (1987) e Judy Wajcman (2006) explanam que, ao questionar gênero nas áreas e espaços padronizados, evidenciam que há problemas culturais, sociais e também teóricos, pois as normas estão/são reforçadas nos discursos que nos cercam como parte de nossas experiências sobre ser e estar na sociedade.

A área de computação pode ser considerada um desses espaços normativos e suas particularidades foram abordadas em trabalhos que discutem gênero e feminismos na área. A pesquisa de Wajcman (2006) identifica os efeitos das relações de poder e de gênero na área de computação e, sobretudo, a falta de reconhecimento de mulheres que participam desta área. O trabalho de Maria Clara Lopes Saboya (2009) relata que os efeitos das relações de poder na área são construídos a partir de valores masculinos e androcêntricos. A pesquisa de Michelle Pinto Lima (2013) discute os valores masculinos e androcêntricos na área de computação, atribuídos como verdade científica e universal, e impedem a entrada e a permanência de pessoas que diferem dos padrões culturais vigentes na área. As pesquisas dessas autoras trazem um contexto em comum, as discussões na área tecnocientífica sob os valores normativos e androcêntricos. Essas perspectivas críticas salientam uma “cultura da computação” que é padronizada e reforçada por sujeitos da norma, e são elas que utilizamos como propósito de discussão nesta pesquisa.

As iniciativas de Shaowen Bardzell (2010; 2018) trazem uma agenda feminista na área de computação, em particular na área de Interação Humano-Computador (IHC), para pensar nas interações e participações das pessoas no processo, no desenvolvimento e no uso de tecnologias digitais. Ainda assim, articular um viés de estudos de gênero é como pisar em areia movediça, pois o suporte teórico de estudos e debates ainda tem foco centrado na questão das mulheres, desconsiderando outras participações que tenham pautas atreladas aos feminismos além de uma visão binária. Essa percepção é discutida em IHC por Bardzell (2018) e nos estudos de feminismos por Joana Maria Pedro (2011). Compreende-se, nesta visão, que a participação de mulheres é importante, porém é preciso atrelar outras participações que ressaltem situações excludentes de grupos subalternizados, como populações LGBTI+, pessoas com deficiência e questões de raça e etnia e classe (BARDZELL, 2018; PEDRO, 2011).

Portanto, as discussões de gênero, na área de computação, precisam se expandir, particularmente quando se pensa nas apropriações1 (conceito baseado nos trabalhos de Luis Flávio Silva COUTO; Marcelo Fonseca Gomes de SOUZA, 2013), usos e desenvolvimento de artefatos. Pesquisas como a de Verónica Sánz (2016) relatam que, quando se trata de pensar no design de produtos/software/hardware, a escassa participação de grupos subalternizados no processo reforça modelos tradicionais e padronizados por sujeitos da norma, majoritariamente brancos, masculinos e heteronormativos.

Reconhecida por ter como foco a relação entre o ser humano e as tecnologias computacionais, a IHC é considerada, neste artigo, como um espaço para problematizar as discussões sobre gênero e feminismos na área da computação, as exclusões de mulheres, assim como outros grupos e marcações sociais, ampliando a compreensão das tecnologias computacionais em relação com o mundo. Estão envolvidas, por exemplo, questões sobre como o desenvolvimento e a apropriação de tecnologias computacionais podem influenciar as vidas de pessoas, inclusive pessoas em situações de pobreza ou de vulnerabilidade social (Yvonne ROGERS, 2012), pautas que estão atravessadas pelas discussões feministas e de gênero. A IHC é definida por Steve Harrison, Deborah Tatar e Phoebe Sengers (2007) como uma área que aborda a interação entre pessoas e computadores não apenas como um processo informacional, mas também como meio que reflete e refrata os significados dos artefatos e dos contextos em que estes são produzidos, uma vez que artefatos e contextos estão intrinsecamente relacionados.

A IHC é evidenciada como uma área interdisciplinar, pois agrega temas e objetivos diversos, envolvendo áreas como o design, a psicologia, as letras, as humanidades, entre outras (Jeffrey BARDZELL; BARDZELL, 2015; ROGERS, 2012). As discussões em IHC sobre experiência das pessoas com os sistemas sociotécnicos que podem, de acordo com Thomas Hughes (1986), ser entendidas como a inter-relação entre a ciência, sociedade e a tecnociência, de modo inseparável, que envolvem contextos sociais, políticos, culturais, e também os aspectos técnicos (BARDZELL; BARDZELL, 2015). Essas discussões também propiciam uma aproximação com estudos feministas, estudos de gênero e teorizações queer. Pesquisas como as de Susan Star (1991), Bardzell e Bardzell (2015) e Ann Light (2011), por exemplo, promovem críticas a partir da IHC aos modelos normativos e levantam discussões sobre a área como algo predominantemente masculino.

Para Bardzell (2010), a mediação entre pessoas e artefatos computacionais deve envolver os compromissos centrais do feminismo. Assim, a autora articula que é preciso considerar “agência, realização, identidade e reconhecimento, equidade, capacitação, diversidade e justiça social” (BARDZELL, 2010, p. 1, tradução nossa) em todas as fases da interação entre pessoas e tecnologias. Para Luiz Ernesto Merkle e Marília Abrahão Amaral (2013), a área de IHC, dentro da computação, pode ser um intermediário para promover “a participação de grupos reiteradamente sub-representados, por cortes de classe, gênero, raça e etnia, geração e capacidade” (MERKLE; AMARAL, 2013, p. 1).

Para fundamentar discussões como essa, autoras e autores da área de IHC buscam teóricas feministas como Wajcman e De Lauretis, que observam os problemas de gênero e propõem formas de repensar tecnologias a partir, por exemplo, de uma perspectiva gendrada. Essa perspectiva de De Lauretis (1987), com o conceito de tecnologias de gênero, traz a questão de que as tecnologias produzem gênero e que este é também compreendido como tecnologia, o que se dá em uma construção mútua. Deste modo, consideramos que tecnologias computacionais também são gendradas e estão presentes nestas relações e atravessamentos, ao tempo em que também influenciam a construção do próprio gênero.

Ao considerar a área de IHC para abordar discussões sobre a participação e a inclusão de grupos sub-representados na área da computação, percebe-se também a oportunidade de se utilizar de referenciais teóricos relacionados à própria IHC para realizar ações participativas. O Design Participativo (DP),2 por exemplo, aborda tanto possibilidades e alternativas futuras, quanto propostas de soluções de demandas atuais que causam ou causarão desdobramentos na vida das pessoas envolvidas (Susanne BØDKER; Morten KYNG, 2018).

A participação por meio do DP é relevante para este trabalho por ter, dentre seus princípios, a colaboração entre projetistas e pessoas da comunidade, envolvendo e valorizando as habilidades e as visões de todas as pessoas participantes, assim como a redistribuição de poder e de recursos (BØDKER; KYNG, 2018).

A realização de oficinas3 para discutir gênero na área se apresenta como uma maneira democrática para mudanças, particularmente pelo DP ter sido recentemente revitalizado para abordar questões sociais (BØDKER; KYNG, 2018). Essa revitalização propõe a participação de pessoas nas decisões da sua comunidade (BØDKER; KYNG, 2018).

Assim, o DP pode ser uma ferramenta para propor espaços de fala e atuação nas decisões sobre projetos que os envolvem (BØDKER; KYNG, 2018). Nesta pesquisa, isso se relaciona com mudanças culturais na computação. O objetivo do DP pode ser, a partir de ações participativas, atender a demandas das pessoas e suas comunidades de modo que projetistas compreendam como criar em conjunto artefatos relevantes (BØDKER; KYNG, 2018).

Com base no contexto apresentado, neste artigo, temos como objetivo, por meio de oficinas, questionar a cultura da computação enquanto construída pelos sujeitos da norma (WAJCMAN, 2010). O artigo se desenvolve em um diálogo com os estudos de gênero e com as reflexões de uma oficina que resultou em duas propostas de artefatos para promover discussões que problematizem a normatividade na área de computação.

Este trabalho está dividido em cinco seções, além da introdução. A segunda seção apresenta as discussões sobre a área de computação não normativa e os princípios e valores do design participativo. A terceira seção relata a oficina realizada com estudantes para propor a criação participativa de artefatos para discutir a cultura da computação. A quarta seção discute as experiências interativas com os artefatos criados. A quinta seção apresenta algumas reflexões sobre a pesquisa realizada. Por fim, a última seção apresenta as conclusões da pesquisa.

A cultura da computação para além da normatividade

As pesquisas de Saboya (2009) e de Lima (2013) evidenciam as inquietações e experiências sobre normatizações na área de computação no Brasil. Além disso, as autoras identificam disparidades de gênero e valores androcêntricos em relação ao masculino heteronormativo reforçado na área. Nesse contexto, buscamos compreender a aproximação entre a área de estudos em gênero e a área de computação, com propostas participativas para questionar e problematizar as normas em torno da cultura da computação.

Ainda há pessoas invisibilizadas e/ou que não são reconhecidas por suas contribuições na área de computação. Exemplo disso é a história de Katherine Johnson, Dorothy Vaughan e Mary Jackson, mulheres negras que contribuíram com códigos matemáticos para computação da NASA, mas eram invisibilizadas pelas questões de gênero e raça (Beatriz SANZ, 2017). Existem outros exemplos que serão tratados na sequência, como Ada Lovelace, Alan Turing e Hedy Lamarr. Estes exemplos demonstram que muito do cenário das contribuições de mulheres e de outros sujeitos foge a um ideal de norma, conforme pesquisas de Saboya (2009), Lima (2013) e Wajcman (2006), que identificaram a importância de retomar o contexto da participação das mulheres, por exemplo, como forma de questionar as normatizações e disparidades de gênero que compõem a área de computação no século XXI.

A pesquisa de Saboya (2009) identificou barreiras estruturais de acesso e permanência de mulheres na área de computação. Tais barreiras envolvem ascender profissionalmente no mercado de trabalho por serem mulheres; e/ou demorar mais para atingir melhores salários e cargos por serem casadas e terem filhos. Além disso, a pesquisa de Pricila Castelini (2018) identificou, com a participação de estudantes e egressas de cursos na área de computação, que as mulheres precisam se destacar mais do que os homens para serem reconhecidas; sofrem prejulgamento, assédio e sentimento desfavorável por serem mulheres em uma área predominada por homens.

Lima (2013) acrescenta a discussão de que histórica e culturalmente os homens foram destinados à esfera pública e produtiva e as mulheres à esfera privada e reprodutiva. Essa separação público e privado é legitimada por um contexto que reforça estereótipos binários. Além disso, a autora identifica que, no Brasil, 79,9% das carreiras na computação são compostas por homens. As pesquisas de Saboya (2009), Lima (2013) e Castelini (2018) comentam esse fato e também feministas que discutem espaço do trabalho nas esferas públicas e privadas como Helena Hirata e Danièle Kergoat (2007), que apontam essa distribuição como sistêmica e hierárquica.

Ainda em relação à maior participação masculina, De Lauretis (1987), discute que os espaços tornam-se gendrados, ou seja, marcados predominantemente por um gênero. A discussão do termo gendrado de De Lauretis (1987) pode, por exemplo, ser percebida em formulários que representam oficialmente um sistema sexo-gênero ao assinalar (F) para feminino, no qual os espaços normativos criam barreiras estruturais, invisíveis, que afastam quem não se encaixa. Um exemplo seria o estereótipo nerd ainda marcado como o sujeito universal na área de computação, centrado em um sujeito masculino, heterossexual e branco.

Nesse cenário de inter-relações, os sujeitos são representados pelo contexto, que envolve aspectos culturais, sociais, políticos, entre outros. Essas ideias de estereótipos e normatizações são criticadas por De Lauretis (1987) ao pensar na construção do ser humano como sujeito, tendo em vista que os significados mudam, não são fixos e estáveis, ocorrem dentro e fora do contexto e, portanto, estão em processo.

Algumas pesquisas têm trazido o olhar de diferentes intersecções além da questão feminista para problematizar a computação. A pesquisa de Jane Stout e Heather Wright (2016) trata de LGBTQs no ambiente da computação. Já as pesquisas de Erin Cech e Tom Waidzunas (2011) e Kathryn Trenshaw et al. (2013) abordam questões de pessoas LGBs e LGBTs, respectivamente, nas engenharias. Abi Grogan (2014) discute o contexto do trabalho e das empresas de TI para as pessoas LGBTs. Diana Bilimoria e Abigail Stewart (2009), por sua vez, consideram a universidade, de uma maneira geral, para estudantes LGBTs. Mesmo que estes estudos discutam questões relacionadas às pessoas LGBTs, ainda assim, o fazem de maneira identitária. É importante, neste sentido, refletir acerca das relações de poder que permeiam os estereótipos de gênero ou sexualidade, os binários masculino/feminino, heterossexual/homossexual.

Na área de computação, é importante considerar questionamentos sobre as razões que mantêm e reforçam a cultura da computação. Esses questionamentos são iniciais e devem estar pautados no cuidado em não manter as discussões somente no entorno das identidades, para que as ações desenvolvidas não reiterem as relações de poder.

Questionar as áreas normativas e estereótipos que se naturalizam na cultura da computação é considerar que existem diversos sujeitos e modos de ser e estar na sociedade. De acordo com De Lauretis (1987), é por meio da história, da cultura e da sociedade que gênero se constrói. Portanto, gênero, para ela, não é a representação de uma pessoa, de ser um sexo ou outro, mas uma relação social. O que a autora discute em seu texto é que problematizar gênero não é limitar-se à questão de aproximar mulheres dessas discussões. Não se trata em negar os questionamentos sobre a história do patriarcado, por exemplo, em que as mulheres têm que se submeter aos homens, mas, além disso, considerar que existem vários conjuntos “inter-relacionados de relações sociais - relações de trabalho, classe, raça, sexo-gênero” (DE LAURETIS, 1987, p. 10) que envolvem a história e refletem nas áreas normativas, como, por exemplo, se constitui a cultura da computação. Neste sentido, pensando no conceito de tecnologias de gênero trazido pela autora, podemos refletir sobre os diferentes aparatos tecnológicos como artefatos, discursos e práticas que influenciam diretamente a construção das relações de gênero, processo que também pode ser percebido pelas tecnologias computacionais. Nesse caso, as tecnologias computacionais são construídas e estão construindo as relações de gênero.

Os espaços participativos formais e não formais são meios para aproximar as abordagens feministas e de gênero, fortalecer e incentivar a participação e a permanência de diversas pessoas. Essa abordagem, sobre uma ótica feminista na área de computação, foi valorizada com as discussões de Bardzell (2010; 2018) na área de IHC. Bardzell (2018) considera uma IHC que pense na participação das pessoas no processo, no desenvolvimento e no uso de tecnologias digitais, tendo em vista a necessidade de uma agenda em IHC que contemple perspectivas feministas e de gênero.

Bardzell (2010) propõe uma agenda que envolva a abordagem e o compromisso feminista para pensar a teoria e a prática no design. Os compromissos são: “agência, realização, identidade e reconhecimento, equidade, capacitação, diversidade e justiça social” (BARDZELL, 2010, p. 1, tradução nossa). Uma proposta mais recente da autora apresenta essa perspectiva da agenda a partir de uma prática reflexiva em um projeto de DP em Taiwan (BARDZELL, 2018). Essa apropriação de conceitos feministas e práticas participativas é recorrente na pesquisa da autora e é relevante para relacionar as discussões e pesquisas sobre gênero que envolvam um contexto democrático.

A participação, na presente pesquisa, está calcada nos princípios e valores do DP, que teve sua origem na Escandinávia nos anos 19704 mais como uma agenda cooperativa e política do que como ferramentas ou técnicas (BØDKER; KYNG, 2018; Clay SPINUZZI, 2002).

Neste sentido, inspirado nos princípios do DP e com o intuito de discutir situações que envolvem diversas parcelas da sociedade e seus interesses, neste trabalho, utilizamos uma técnica do DP como um guia para oficinas cujos objetivos envolvem questionar a cultura normativa da computação, particularmente a partir de temas relacionados aos estudos de gênero. Com isso, a oficina e os encontros realizados propiciam questionamentos sobre a cultura da computação, uma vez que esse tema envolve mudanças que apresentam desdobramentos para diversas pessoas em diferentes estágios de atuação na área, como estudantes, docentes e pesquisadores, o que pode acarretar mudanças em áreas além da academia, relacionadas com a computação.

Vale lembrar que as técnicas de DP não são especificações rígidas, lineares e com passos bem definidos, mas, sim, meios para auxiliar a comunicação entre pessoas que pode resultar em ações iterativas e flexíveis (Michael J. MULLER; Jean Hallewell HASLWANTER; Tom DAYTON, 1997). Além disso, acerca da aplicação dessas técnicas, para serem consideradas ações de DP, precisam estar de acordo com os princípios, valores e motivações democráticos que fundamentam o DP, caso contrário, essa aplicação, ainda que se aproprie de termos do DP, não realiza ações participativas, o que pode resultar na exploração, objetificação, manipulação ou ilusão das pessoas envolvidas (MULLER; HASLWANTER; DAYTON, 1997).

Oficina participativa

Com base nos princípios e valores discutidos anteriormente, foi organizada uma oficina com o objetivo de envolver as pessoas participantes para pensar a cultura da computação para além da normatividade. Nessa oficina, utilizou-se da técnica de DP chamada “oficina do futuro” ou future workshop (Robert JUNGK; Norbert R. MÜLLERT, 1987). Ela foi utilizada originalmente para participação política de grupos que buscavam engajar interesses e criar futuros desejados (Rene Victor Valqui VIDAL, 2006); tinha como objetivo que as pessoas identificassem problemas cotidianos e propusessem mudanças de modo democrático e participativo. A oficina do futuro apresenta um caminho aberto, um guia, com fases para seu desenvolvimento, porém, ela pode ser modificada conforme a apropriação de cada grupo de organizadores e para cada finalidade.

A oficina5 do futuro, realizada com uma técnica de DP, foi parte de uma disciplina cursada pelos/as autores/as, intitulada “Computação, Sociedade e Inclusão”. Nessa disciplina, discutiu-se sobre maneiras de repensar a cultura da computação. Para isso, o tema central da oficina foi pensar e criar artefatos que promovam a apresentação da área de computação não reafirmando sua cultura normativa.

Foram convidados/as diversos/as estudantes para participar da oficina, sendo que estiveram presentes somente quatro estudantes da área de computação e de design, conforme apresentado a seguir.6

1. LR (Personalidades - Dupla 1). É graduada em design gráfico. Possui mestrado em Tecnologia e Sociedade e faz doutorado na mesma área. Tem experiência na área de Desenho Industrial, com ênfase em Design Gráfico. Seus interesses de pesquisa têm como foco os Estudos de Gênero e Estudos Feministas e suas intersecções com os estudos e desenvolvimento de jogos digitais

2. JL (Personalidades - Dupla 1). É graduado em Design com habilitação dupla em Comunicação Visual e em Projeto de Produto. Realizou um intercâmbio para estudar Design e Desenvolvimento de Jogos na Universidade de Ciências Aplicadas de Oulu. Vem trabalhando no mercado criativo nos últimos dez anos, com conhecimentos e experiência em comunicação visual, marketing estratégico e branding. Além disso, possui aptidão em desenvolvimento de jogos, gestão de projetos e em trabalhos colaborativos multidisciplinares.

3. LC (Criptógrafo - Dupla 2). É graduado em Bacharelado em Sistemas de Informação. Participou como bolsista do Programa de Educação Tutorial - Computando Culturas em Equidade (PET-CoCE). Pesquisou em Informática na Educação em seu Trabalho de Conclusão de Curso. Faz Especialização em Gestão de TI.

4. BP (Criptógrafo - Dupla 2). É acadêmico de Bacharelado em Sistemas de Informação. Participou como bolsista do Programa de Educação Tutorial - Computando Culturas em Equidade (PET-CoCE). É estagiário em uma instituição do mercado financeiro na área de TI.

A oficina ocorreu em quatro fases de desenvolvimento, adaptadas das fases originais da oficina do futuro.7 Na primeira, fase “preparação”, o organizador e as organizadoras apresentaram o contexto da área a ser problematizada, considerando o tema central já abordado: a construção de artefatos que promovam a apresentação da área de computação sem reafirmar sua cultura normativa. As pessoas discutiram sobre as diversas esferas da sociedade em que agregam a área de computação, por exemplo, a educação, a política, a saúde, entre outras. Essa discussão foi conduzida a partir de duas questões: a) “quem possui amplo acesso a recursos computacionais?”; e b) “quem está incluído(a) nos processos de construção desses artefatos?”.

Após o contexto apresentado na “preparação”, a participante LR comentou que

uma empresa aboliu gênero do banheiro e no início era estranho todas as pessoas utilizarem o mesmo espaço, mas, a partir disso, as pessoas começaram a perceber que banheiro não tem gênero e, nessa perspectiva, pode-se refletir que pessoas também não deveriam/precisariam ser classificadas por seu gênero e/ou sexualidade.

A percepção dessa participante relaciona-se com o que De Lauretis (1987) debate em seu texto sobre os espaços tornarem-se gendrados e que, por meio da repetição destas marcas/categorias, essas relações tornam-se naturalizadas na memória das pessoas, ou seja, quando o banheiro é marcado para o masculino ou feminino também fica naturalizado que existem (somente) essas duas categorias, no entanto, quando essas normas são alteradas, repetidas e reiteradas elas também podem mudar as referências das pessoas.

A segunda, fase “crítica”, envolveu a discussão, em duplas, sobre as problematizações da área de computação em relação a aspectos sociais e culturais. No momento de socialização, uma das pessoas da dupla 1 comentou sobre

os binarismos e segregação que evidencia ou menospreza as faculdades intelectuais de um grupo, caindo no essencialismo e determinismo biológico. Isso implica a escolha de uma carreira e não outra. Um exemplo seriam os jogos que reforçam estereótipos de gênero: jogos para meninos, que são complexos, e para meninas, que devem ser simples, porque elas não conseguem acompanhar, isso é essencializado, ao mesmo tempo que existe a construção social da mulher como multitarefa, que cuida dos filhos, da casa, característica que os homens não têm.

Neste trecho, a participante da dupla 1 afirma que os estereótipos são reproduzidos na criação de jogos. Isso dialoga com a percepção de De Lauretis (1987) com a proposta de tecnologias de gênero e algumas teóricas feministas de IHC que discutem sobre desenvolver para algum gênero, como, por exemplo, jogos para mulheres e não desenvolver com, ou seja, envolvê-las nos processos e também compreender as relações intrínsecas entre gênero e tecnologia.

A dupla 2 relatou que é difícil tentar encontrar referências em gênero e computação, por exemplo, os cânones não têm um rosto, falta representatividade, pois as referências são normalmente os livros usados durante o curso e a representatividade é homem, branco, heterossexual.

Durante a terceira fase, que foi adaptada e chamada de “desenvolvimento”, as pessoas participantes trabalharam na criação de protótipos de jogos que estivessem relacionados com as problematizações elencadas na fase “crítica”. Com o objetivo centralizador da dinâmica, os/as participantes pensaram em artefatos que trouxessem envolvimento e engajamento da diferença no fazer computacional. Deste modo, a dupla 1 trabalhou na questão de pessoas que influenciaram a área e acabaram sendo invisibilizadas historicamente. A dupla 2, por sua vez, consolidou suas discussões em torno de desmistificar algum conceito da computação, para pessoas que não conhecem a área. Neste caso, o conceito escolhido foi “criptografia”.

Na quarta fase, intitulada “playtest”, as duplas socializaram os contextos e as características dos artefatos que criaram. A dupla 1 situou sua produção, na qual “a ideia era estimular o interesse das pessoas da computação e das pessoas marginalizadas neste meio e que não têm conhecimento da área”. A ideia de que as mulheres têm suas contribuições historicamente apagadas na computação, por exemplo, é um fato usado na dinâmica do jogo quando os/as jogadores/as precisam descobrir como essa pessoa contribuiu com seu trabalho para a área. A dupla 2 se inspirou na Cifra de César, um método de criptografia baseado na substituição de letras. Comenta-se que foi utilizada por Júlio César para a comunicação cifrada em atividades militares. O processo de substituição é baseado na alteração de letra da mensagem por outra letra que esteja posicionada a um número constante de deslocamentos no alfabeto (Christof PAAR; Jean PELZL, 2010). Nesta pesquisa, o “Criptógrafo” é um artefato composto por dois discos usados para a substituição de letras, codificando ou decodificando textos.

Criptógrafo e Personalidades Versão 1

O artefato da dupla 1, denominado “Personalidades” (Figura 1), foi estruturado para que as pessoas, ao jogarem, fossem apresentadas a personalidades pouco conhecidas da área de computação e seus feitos. É interessante notar que houve uma preocupação na escolha da personalidade para ser usada no jogo, sendo que esta não se encontra dentro das perspectivas normativas da área de computação.

Hedy Lamarr foi atriz em Hollywood, tendo trabalhado para a invenção de um sistema de comunicação para o exército dos Estados Unidos na época da Segunda Guerra Mundial. Devido à sua fama como atriz, Hedy era uma mulher muito exposta na mídia, e teve uma vida conturbada. Quando se reflete acerca das pessoas reconhecidas da área da computação, Hedy Lamarr muitas vezes acaba sendo deixada de lado, embora muitas tecnologias computacionais contemporâneas dependam de seus feitos enquanto cientista (CASTELINI, 2018). Com essa personalidade, a dupla 1 buscou trabalhar a questão de pessoas que são invisibilizadas dentro da área, apresentando fatos e curiosidades sobre a vida de Hedy Lamarr, o que possibilita conhecê-la tanto em sua atuação de pesquisa, quanto nas demais esferas de sua vida. Ao refletir sobre os estereótipos da área da computação (SABOYA, 2009; LIMA 2013), é possível perceber que Hedy Lamarr se encontra fora dessa construção. Nota-se que a área não é feita necessariamente por representações estereotipadas, mas se constitui por uma diversidade de sujeitos, apesar dessa diversidade ser apagada.

A dupla 2 criou um artefato com dois alfabetos (Figura 2), ordenados em dois discos sobrepostos que giram livremente. A partir de uma senha, que indica como os discos devem ser posicionados, é possível fazer a decodificação de uma mensagem escolhida pela dupla. A mensagem escolhida era do filósofo Mikhail Bakunin, e dizia: “É preciso que compreenda que não existe liberdade sem igualdade”. Ao contextualizarem a razão da escolha dessa mensagem, os participantes pontuaram que, mesmo que o artefato possa ser usado em diferentes contextos, essa mensagem traz um importante posicionamento sobre as questões da igualdade e da liberdade. Nota-se, neste caso, que um conceito computacional foi utilizado de maneira diversificada e “desplugada”, ou seja, foi trabalhado de maneira lúdica e sem o uso do computador. Isso possibilitou trazê-lo para realidades diferentes e de maneira contextualizada com as discussões ocorridas no decorrer do encontro. O objetivo da dupla, por meio do artefato criado, também se destaca por oportunizar a participação de diversas pessoas sem conhecimento prévio sobre a computação, ou que não participam dela (MERKLE; AMARAL, 2013).

Fonte: Autoria própria

#PraTodoMundoVer Foto de um conjunto de oito (8) cartas, feitas com papel e canetas coloridas e três (3) círculos de papel (vermelho, azul e amarelo). Algumas cartas têm um título e um texto. Carta “Feitos”: “Desenv. sistema de rádio p/ guiar os torpedos da aliança durante a WWII”. Cartas “Desafios”: “Relacionamento abusivo”; “Atriz”; “Julgada por sua aparência e sexualidade”. Carta “Hedy Lammar”: “(1930-1958) Austríaca; Casou-se 6 vezes; Fugiu p/ os EUA”. As outras três cartas têm as seguintes informações: “wi-fi, bluetooth, CDMA”; “redes”; “comunicação entre computadores”

Figura 1 Artefato criado pela Dupla 1, denominado “Personalidades” 

Fonte: Autoria própria

#PraTodoMundoVer Foto de uma folha de papel com letras formando um círculo, com um círculo de papel menor preso no centro desse círculo por um barbante. No primeiro círculo, as letras estão misturadas. No segundo círculo, também há letras na sua borda, de 1 a 9, de A a Z. Ao lado direito, a mensagem criptografada “R QJRAT4Z 1SR AZOQJRRBMP 1SR BPZ R7T4R VTDRJMPMR 4RO TKSPVMPDR” e a senha “A-P”

Figura 2 Artefato criado pela Dupla 2, denominado “Criptógrafo” 

Experiências interativas com o “Criptógrafo” e o “Personalidades”

Com o intuito de promover a utilização do “Criptógrafo” e do “Personalidades”, estes foram experienciados8 por dois grupos diferentes: o primeiro grupo era composto por docentes de escolas públicas do ensino médio e fundamental da cidade de Curitiba; e o segundo grupo era composto por estudantes de graduação e pós-graduação de cursos de diferentes áreas, como direito, psicologia, computação e também de formação interdisciplinar.

Experiência Interativa 1

No primeiro encontro, estavam presentes 13 docentes da Rede Pública de Ensino do Estado do Paraná. Os/as docentes interagiram com o “Criptógrafo” e o “Personalidades”, que sofreram algumas modificações pontuais em relação à versão criada na oficina, adaptados digitalmente e posteriormente impressos para estes encontros.

O “Criptógrafo”9 passou por pequenas mudanças, conforme pode ser observado nas Figuras 3 e 4: inclusão do nome do autor da mensagem criptografada e inclusão de instruções sobre como encontrar a senha para descriptografar a mensagem. Deste modo, esse artefato é categorizado como um quebra-cabeça, pois o objetivo da pessoa que o utiliza é encontrar a solução do enigma (Ernest ADAMS, 2010) por meio da descriptografia da mensagem.

Fonte: Autoria própria

#PraTodoMundoVer A imagem apresenta a mensagem criptografada “R QJRAT4Z 15R AZOQJRRBMP 15R BPZ R7T4FR VTDRJMPMR 4RO T65PVMPMR (OTLKPTV DPL5BTB)” e a indicação no canto inferior esquerdo “Senha: A-A + 2 no sentido horário”

Figura 3 Mensagem para ser descriptografada 

Fonte: Autoria própria

#PraTodoMundoVer A imagem apresenta dois círculos formados por letras e números em suas bordas. O círculo maior e externo tem as letras espalhadas de maneira aparentemente aleatória. O círculo inferior e menor tem as letras e números ordenados (1 a 9 e de A a Z)

Figura 4 Criptógrafo atualizado 

Ao utilizarem o “Criptógrafo”, os/as docentes consideraram o quebra-cabeça relevante para apresentar o conceito de criptografia para pessoas que não são da área de computação. Os/as docentes discutiram sobre o artefato propiciar diversas possibilidades de apropriação e modificação para ser utilizado em diferentes contextos de disciplinas e por diferentes pessoas. Também sugeriram alterações no quebra-cabeça, para adequá-lo ao seu público (estudantes do ensino fundamental e médio), tais como: a) diminuir a quantidade de elementos para realizar a criptografia; e b) substituir as letras e números por figuras ou imagens, para que possa ser utilizado por crianças com menor idade. Os/as docentes destacaram o fato de o quebra-cabeça não reforçar barreiras estruturais e de acesso (SABOYA, 2009) para quem não conhece a área, além de apresentar o conceito de forma “desplugada” e de baixo custo, contribuindo para uma maior participação.

As colocações dos/as docentes são pertinentes por corroborarem as discussões sobre a cultura da computação, particularmente por apontarem a relevância do quebra-cabeça enquanto artefato que pode ser apropriado por outras pessoas para apresentar conceitos da área, neste caso, a criptografia, o que pode contribuir para que pessoas fora das normatividades da área a conheçam e se envolvam, desconstruindo-a como masculina, branca e heteronormativa (SABOYA, 2009; LIMA, 2013). Deste modo, o próprio quebra-cabeça, por não apresentar marcadores diretos de gênero, atua como um artefato para propiciar mudanças na cultura da computação. Essa característica do “Criptógrafo” ainda pode ser abordada sob a perspectiva do conceito de tecnologias de gênero de De Lauretis (1987), como um meio para pensar o gênero de maneiras não diretamente marcadas, uma vez que o “Criptógrafo” foi elaborado com o objetivo de ser utilizado por diferentes pessoas, sem que houvesse um reforço dos marcadores de gênero. Esclarecemos, desta forma, que, mesmo que as marcações de gênero não estejam diretamente presentes no artefato, estas serão construídas a partir da forma como as pessoas interagem com ele ou o percebem enquanto tecnologia. O artefato “Personalidades” (Figura 5) passou pelas seguintes modificações para a primeira experiência: as regras foram alteradas para que as pontuações estivessem explícitas nas próprias cartas; e foram incluídas as informações e fotos sobre outras duas personalidades, Alan Turing e Ada Lovelace, além de Hedy Lamarr, que havia sido apresentada originalmente.

Estas pessoas foram escolhidas por terem seus feitos ou partes de suas vidas invisibilizadas (WAJCMAN, 2006; SABOYA, 2009) dentro da área. Ada Lovelace trouxe contribuições para a programação de softwares e Alan Turing desenvolveu um modelo teórico para o computador universal. Ambos têm subjetividades muitas vezes apagadas. Turing foi condenado por ser homossexual (David LEAVITT, 2006), enquanto Ada, por ser considerada uma mulher à frente do seu tempo, protagonizou escândalos e morreu jovem usuária de ópio (Maria do Carmo MARTINS, 2016, p. 14).

Ao ser utilizado pelos/as docentes, o “Personalidades” apresentou situações que tornaram a experiência das pessoas menos proveitosa, o que, em alguns casos, acabou gerando frustração. Em relação a isso, os/as docentes evidenciaram que, para se alcançar o objetivo do “Personalidades” (identificar o feito daquela personalidade na área de computação), era necessário conhecimento prévio sobre as pessoas apresentadas (Alan Turing, Ada Lovelace e Hedy Lamarr). Essa situação evidencia o nível de invisibilização destas pessoas frente a personalidades populares na área, como, por exemplo, Steve Jobs e Bill Gates. Os/as participantes que utilizaram o “Personalidades” apontaram que, mesmo com essa dificuldade, foi interessante conhecer pessoas que estão fora do viés normativo da área, conforme discutiram Wajcman (2006) e Lima (2013). Percebe-se que isso pode influenciar o desencadeamento de um processo de desconstrução para a cultura da área. Além disso, o custo das dicas (o fato de se perder pontuação ao usar uma dica) foi apontado como um elemento desmotivador, uma vez que o/a jogador/a parecia sempre perder pontos, até que eventualmente apresentasse a resposta correta sobre o principal feito daquela personalidade, algo que foi modificado na versão seguinte.

Considerando a primeira experiência, o “Personalidades” passou por algumas alterações. Deste modo, com o objetivo de torná-lo mais propício para a aprendizagem e continuar sua proposta original de ser um jogo, foram elaboradas regras e objetivos mais estruturados (ADAMS, 2010). O “Personalidades”10 passou a ser um jogo cooperativo (Figura 5) no qual os/as jogadores/as possam aprender sobre as personalidades apresentadas, independentemente de conhecerem previamente seus fatos de vida e feitos profissionais. As cartas apresentadas na Figura 5 são apenas um exemplo da estrutura de cartas do jogo. Conforme apresentado anteriormente, há também cartas com informações sobre Ada Lovelace e Alan Turing, usadas para compor a dinâmica e a estrutura do jogo.

Fonte: Autoria própria

#PraTodoMundoVer A imagem apresenta o modelo de cinco (5) cartas do jogo “Personalidades”. A carta à direita está maior que as outras e contém a foto de Hedy Lamarr, sua data de nascimento e morte (1930-1958) e sua nacionalidade: “Austríaca”. A foto de Hedy está em preto e branco e ela tem cabelos cacheados até o ombro, de cor escura. Ela está usando uma camisa branca com um broche na gola e um paletó preto. Na parte direita da imagem estão mais quatro (4) cartas do jogo com o título no topo, um ícone no lado esquerdo do título e o número de pontos no lado direito do título. Na parte central de cada carta, um texto com informações sobre Hedy. A carta “Feito”, com o ícone de uma medalha e indicação de 10 pontos, tem a frase “Desenvolveu sistema de rádio para guiar os torpedos da Aliança durante a Segunda Guerra Mundial”. A carta “Fato”, com o ícone de duas espadas se cruzando e indicação de 1 ponto, tem a frase “Relacionamento abusivo”. A carta “Influenciou” com o ícone da peça de um quebra-cabeça e indicação de 2 pontos, tem a lista de itens “Wi-fi”; “Bluetooth”; e “CDMA”. A última carta não tem ícones ou pontuação, mas tem como título “Gabarito-Hedy”. E a lista de informações: “Feito: Desenvolveu sistema de rádio para guiar os torpedos...”; “Fato: Relacionamento abusivo”; “Fato: Atriz”; “Fato: Julgada por sua aparência e sexualidade”; “Influência: Wi-fi; Bluetooth; CDMA”; “Influência: Redes”; e “Influência: Comunicação entre computadores”

Figura 5 Cartas do jogo “Personalidades” 

Experiência Interativa 2

Na segunda experiência com os artefatos, agora considerados quebra-cabeça e jogo, estavam presentes 10 estudantes. Destes, 8 da área de computação, 1 da área de direito e 1 de área interdisciplinar (com foco em psicologia).

Os/as participantes, tal como na experiência 1, indicaram que o “Criptógrafo” pode ser utilizado para apresentar conceitos da área de computação para pessoas que ainda não têm conhecimento sobre a área. Além disso, indicaram que, por apresentar conceitos básicos sobre criptografia, o quebra-cabeça pode não ser muito interessante para pessoas que já têm conhecimento sobre a área, mas ainda assim é um artefato interessante para manipular conceitos computacionais de maneira lúdica e não digital. As colocações dos/as estudantes são relevantes por destacarem as características não normativas do quebra-cabeça, como a não existência de marcadores de gênero de maneira direta, por exemplo. Por meio dele, é possível discutir a criptografia como um conceito da área de computação sem reforçar uma cultura normativa.

Nessa experiência, as pessoas participantes indicaram que o “Personalidades” pode ser uma ferramenta relevante para apresentar discussões sobre a cultura da computação, particularmente em aulas de cursos da área. Um dos participantes sugeriu que os jogos são uma boa maneira de começar uma aula ou apresentação e fecharia com uma discussão sobre o que foi apreendido e novas reflexões. Esse tipo de proposta denota a relevância dos princípios do DP na construção contínua dos artefatos, particularmente quando essas contribuições são oferecidas por pessoas que fazem parte da área da computação e desejam mudanças em sua cultura (BØDKER; KYNG, 2018).

Os/as participantes apontaram ainda que o jogo pode ser melhorado com o aumento da variação das personalidades que ele apresenta. Além disso, indicaram que seria interessante acrescentar uma terceira personalidade como parte do desafio do jogo, como aponta um participante, que disse que colocaria uma personalidade a mais, 3 para definir [como objetivo do jogo] e uma [personalidade] sobrando [para criar obstáculos durante o jogo].

Por fim, os/as participantes indicaram que as personalidades apresentadas podem ser pessoas mais conhecidas da área ou de períodos mais recentes. Como sugestão, um participante apontou que colocaria personalidades de épocas mais próximas, talvez até jogar duas vezes, uma [vez] com personalidades mais atuais e uma segunda [vez] com personalidades mais antigas. Durante a discussão desse ponto, foi indicada a possibilidade de apresentar personalidades como Bill Gates e Steve Jobs, para realçar as diferenças (pessoais e profissionais) entre eles e personalidades invisibilizadas. Entretanto, essa alteração mudaria o objetivo do jogo de apresentar somente pessoas invisibilizadas da área. Ampliar as personalidades abordadas pelo jogo também permitiria pensar uma maior amplitude em relação às representações de gênero, sexualidade e demais marcadores que são construídos a partir das cartas do jogo. Entendendo-o pela perspectiva das tecnologias de gênero, por ser um artefato pensado para apresentar representações históricas dentro da área, esta pode ser feita a partir de uma leitura que pense as relações de gênero pela ótica das diversidades.

Discussão dos Resultados

Com o objetivo de pensar a cultura da área para além das normatividades, a oficina participativa foi organizada para que, coletivamente, fossem construídos artefatos que fomentem a discussão dessa questão principal de pesquisa. No que diz respeito a essas problematizações, as pesquisas de Saboya (2009), Lima (2013), Wajcman (2006) e Merkle e Amaral (2013), apresentadas na seção 2, demonstram que valores normativos estão presentes na computação e áreas relacionadas, construindo situações de exclusão, silenciamento e invisibilização de diversos grupos.

Durante a oficina participativa para a criação dos artefatos, as discussões trouxeram a importância de conhecer figuras históricas da área da computação que não recebem reconhecimento. Isso fomentaria uma percepção sobre suas vidas de modo que essas venham a ser conhecidas a partir de pontos que costumam estar invisibilizados dos registros históricos. Também foi um ponto centralizador durante a conversa a importância de apresentar a área para as pessoas que não fazem parte dela, ou que a conhecem, mas não a percebem como uma possibilidade de atuação devido às construções normativas.

Essas problematizações, ao serem abordadas para a construção do artefato “Personalidades”, fizeram com que os/as envolvidos/as na oficina participativa pesquisassem e trouxessem fatos, feitos e influências sobre Hedy Lamarr. Seguindo esta lógica, outras personalidades (Ada Lovelace e Alan Turing) foram adicionadas em momentos posteriores, trazendo diferentes resgates de marcadores socioculturais que perpassam a vida dessas pessoas e que acabam sendo desconsiderados no resgate histórico da área.

As problematizações levantadas sobre o apagamento de figuras históricas que fogem às construções normativas da área contribuem para que outras pessoas não se reconheçam e não desenvolvam um interesse pela computação, discussões que estiveram presentes. Essa construção traz à tona os valores normativos que, dentro de configurações específicas de masculinidade, raça, etnia e classes sociais, delimitam a quais pessoas a área será acessível ou a quais ela será excludente (DE LAURETIS, 1987). Tal problematização, apesar de recorrente durante a criação do jogo, apareceu de modo mais ameno durante as experiências interativas. Ainda assim, foram discutidas as questões no entorno dessas personalidades, sendo o foco das discussões seus feitos e fatos sobre a vida, o que salienta o apagamento histórico e a normatividade tratados nas discussões iniciais.

Dando ênfase na discussão das questões problematizadas, os participantes da oficina pensaram em aliar um conceito da área de computação, no caso, a criptografia, com uma frase que trouxesse as problematizações sobre as normatizações da área. O “Criptógrafo” foi pensado para possibilitar a articulação dessas ideias e uma discussão a partir da descoberta da frase. A frase escolhida pelos/as criadores/as se relaciona com a problemática da exclusão discutida durante a oficina participativa, principalmente no que diz respeito aos valores de liberdade e igualdade pretendidos pelos/as participantes na criação dos artefatos.

A interação com o artefato despertou curiosidade durante os encontros, no entanto, a característica de discussão sobre a frase descoberta e, consequentemente, a problematização sobre esta, não foi levantada pelos organizadores do encontro em nenhuma das experiências interativas, o que pode ser considerada como uma limitação desta pesquisa em relação às potencialidades do artefato. O contexto de discussão sobre o artefato “Criptógrafo”, nas duas experiências interativas, focou na apresentação de conceitos iniciais da computação sem marcadores normativos para pessoas que desconhecem a área, além de sua facilidade de replicação em diferentes contextos e do baixo custo.

Uma das contribuições que pode ser ressaltada nesta pesquisa é discutir sobre feminismos, relações de gênero e trazer duas experiências a partir do contexto situado brasileiro com a perspectiva teórica de feministas da tecnociência e com abordagens participativas em IHC e DP. As pesquisas na área de computação no Brasil e em IHC geralmente apontam as diferenças de gênero entre masculinidades e feminilidades, discussão trazida por Pedro (2011), ao falar sobre gênero para além dos binarismos e categorias como as citadas no início deste artigo.

Ao relacionar as pessoas que criaram esses artefatos com o arcabouço teórico e metodológico adotado, pode-se perceber que as problematizações foram válidas e os valores foram trazidos para pensar a área de maneira (a) mais aberta - menos normativa; (b) mais participativa - pela possibilidade de as próprias pessoas proporem como discutir, e pela consequente discussão e proposição de meios para subsidiar tais discussões; e (c) mais inclusiva - envolvendo pessoas diversas, de dentro e de fora da universidade e da área de computação. Tanto os/as participantes da oficina participativa e das experiências interativas, quanto as personalidades e mensagens trazidas por elas, construíram discursividades que fogem às normas da área, uma vez que essas discussões e problematizações são incomuns na cultura da computação.

Considerações finais

As normatizações e binaridades discutidas sobre a cultura da computação criam barreiras estruturais e de acesso às pessoas que não correspondem ao estereótipo nerd, representação privilegiada da área que é centrada em um sujeito masculino, branco e heterossexual (DE LAURETIS, 1987). Essas representações são e estão reforçadas nos discursos, na cultura, na política e na sociedade. As teorias de gênero discutem que essa representação envolve a construção do ser humano como sujeito, que está em constante processo de transformação, portanto, as representações mudam, os significados mudam e os contextos também (DE LAURETIS, 1987).

As pesquisas que aproximam gênero da área de computação e discutem as disparidades entre homens e mulheres apresentam dados desse cenário: as barreiras de acesso e permanência, as construções que levam a tal configuração, entre outras importantes estatísticas de participação. Muito embora seja fundamental compreender esse quadro, é preciso observar que algumas pessoas, grupos e discussões acabam permanecendo fora do centro dos debates da área. É importante que as discussões da computação acompanhem as discussões de gênero dentro das perspectivas de que há diferentes feminismos e, portanto, ao adentrar nessas epistemologias, devem reconhecer e afirmar a importância dos estudos de gênero, feminismos e interseccionalidades nas mais diversas abordagens.

Nesta pesquisa, a perspectiva teórica adotada parte dos feminismos da tecnociência de De Lauretis (1987) e Wacjman (2006), as quais olham para a ciência e a tecnologia como indissociáveis e propõem críticas à representação masculina. As críticas das autoras são apropriadas a partir dos estudos em IHC (BARDZELL, 2018) com propostas de repensar currículos, documentos, aulas e produções que confrontem as normatizações e aproximem as pessoas da área de computação. Representatividade, nessa aproximação e no que tange às discussões feministas e de gênero, é imprescindível, no entanto, não é suficiente; é preciso considerar que há problemas sociais, culturais, econômicos e políticos (PEDRO, 2011), historicamente situados, que a transcendem.

Neste sentido, o presente artigo teve como objetivo propor questões e problematizações sobre as normatividades em torno da cultura da computação. Por meio de oficinas participativas, foram levantadas discussões sobre a área e suas normatividades e artefatos foram criados como meios para fomentar essas discussões.

A realização de oficinas pautadas nos princípios e valores de DP, com o intuito de discutir as questões de gênero e a cultura normativa da área de computação, é uma das maneiras de envolver diferentes pessoas de modo democrático, para evidenciar e questionar problemas socioculturais. Deste modo, as pessoas, independente de se identificarem com o estereótipo da área (SABOYA, 2009), podem contribuir para a discussão, construção e transformação dos sistemas sociotécnicos, uma vez que influenciam e são influenciadas no processo de construção da área de computação e da sociedade. Da mesma forma, também estão localizadas na construção das relações de gênero.

As experiências com o jogo e com o quebra-cabeça propostos na oficina participativa contribuíram para que pessoas de diferentes áreas e formações pudessem interagir com artefatos que estimulam discussões acerca da área de computação, problematizando os marcadores normativos de gênero presentes em sua construção e contribuindo para apresentar informações sobre pessoas invisibilizadas da área. Isso reforça a relevância de construções coletivas e participativas, uma vez que os valores sociais, culturais e políticos que são incorporados nos artefatos podem propiciar percepções diferentes das pessoas que os utilizam, de modo que essas pessoas podem ser influenciadas pelas decisões tomadas na construção de tecnologias, culturas e sociedades.

As discussões apresentam indícios sobre a possibilidade de mudanças na área da computação, principalmente quando pessoas da área, como os estudantes de computação que criaram o “Criptógrafo”, apresentam-se dispostas e interessadas em realizar essas problematizações. As experiências relatadas neste artigo reforçam a relevância de envolver quem não está na área nas discussões sobre sua cultura, contribuindo para a redistribuição de poder e para a construção de uma sociedade mais democrática, importantes agendas nos estudos de gênero.

Ao realizar discussões com base nas questões de gênero e IHC, esta pesquisa se limitou às problematizações em torno da cultura da computação e na possibilidade de questioná-la por meio de artefatos criados em contextos que provocaram reflexões sobre o tema. Entretanto, outras pesquisas podem ser pautadas em métodos e/ou referências diferentes, ainda que tenham objetivo similar de questionar a cultura da computação.

O tema discutido nesta pesquisa e os artefatos produzidos e continuamente remodelados provêm indícios para essas discussões, particularmente sobre as questões de gênero e sobre mudanças na cultura da computação. Deste modo, é importante que mais pesquisas sejam realizadas, para que se encontrem outros meios que levem a uma computação não normativa, assim como propiciar que pessoas diferentes se interessem e se estabeleçam na área de maneira democrática e não enviesada.

Este tipo de construção propicia importantes desdobramentos que se alinham às discussões de Saboya (2009) e Lima (2013), como reformulações curriculares com módulos para que estudantes, professores e pesquisadores conheçam, posicionem-se, reflitam e debatam criticamente sobre gênero baseado em seus princípios e valores (BARDZELL, 2010; 2018, BARDZELL; BARDZELL, 2015), redistribuição dos postos de trabalho (CASTELINI, 2018), desconstruções nos métodos de desenvolvimento dos artefatos criados e utilizados (SÁNZ, 2016), além de novos processos de apropriação tecnológica (MERKLE; AMARAL, 2013).

Agradecimentos

Agradecimentos ao Grupo PET-CoCE da Universidade Tecnológica Federal do Paraná, campus Curitiba, e aos participantes das oficinas interativas. O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001.

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1Neste trabalho, usaremos o conceito de apropriação de Lacan: a ação de tornar próprio, isto é, fazer com que os conceitos funcionem dentro de um sistema dessemelhante àquele de onde eles surgiram originariamente (COUTO; SOUZA, 2013).

2O Design Participativo (DP), originado na Escandinávia dos anos 1970, iniciou como uma agenda política para fortalecer os trabalhadores e seus sindicatos, de modo que participem das tomadas de decisão sobre a introdução de novas tecnologias computacionais que provocariam mudanças em seus ambientes de trabalho, inclusive decidindo pela não inserção dessas tecnologias, caso assim preferissem (BØDKER; KYNG, 2018).

3Nesta pesquisa, oficina é uma atividade presencial, estruturada por meio de práticas, que são instâncias de técnicas ou métodos do DP.

4Nessa tradição, DP se destacava pela cooperação entre trabalhadores e sindicatos nas discussões sobre a introdução de tecnologias em seus ambientes de trabalho. No caso de adesão dessas tecnologias, as pessoas envolvidas discutiam sobre como essas seriam implementadas e quais mudanças ocorreriam nos processos de trabalho e de capacitação dos trabalhadores (BØDKER; KYNG, 2018; SPINUZZI, 2002).

5O espaço em que ocorreu a oficina participativa foi em um laboratório de computação, de modo que foge do padrão de uma sala de aula tradicional, com as mesas ou bancadas de computadores dispostas lado a lado.

6Os nomes dados para os artefatos foram pensados pelas/os autoras/es posteriormente à oficina em que foram criados como modo de facilitar a escrita deste documento.

7Organizada por Jungk e Müllert (1987), consiste em cinco fases de desenvolvimento. Fase 1 ‘preparação’: discute-se os temas para a realização da oficina. Fase 2 ‘crítica’: apresenta-se o problema aliado a uma técnica de brainstorming para envolver as pessoas participantes em uma discussão. Fase 3 “fantasia’: as pessoas idealizam um futuro para o problema da Fase 2. Fase 4 ‘implementação’: as propostas são verificadas e avaliadas para serem planejadas e concretizadas. Fase 5 ‘desfecho’: discutem sobre mudanças na oficina e em próximas (VIDAL, 2005).

8O espaço onde ocorreram as experiências interativas foi em uma sala menos formal, com mesas dispostas de forma circular e que promovia o contato visual entre todos os presentes, de modo que foge do padrão de uma sala de aula tradicional, com as mesas ou bancadas dispostas lado a lado.

9Para mais informações sobre aspectos técnicos do “Criptógrafo”, acessar o link: https://bit.ly/quebraCabeca-Criptografo.

10Acessar o link para conhecer sobre detalhes técnicos sobre o jogo “Personalidades”: http://bit.ly/jogo-personalidades.

Como citar esse artigo de acordo com as normas da revista: OLIVEIRA, Leander Cordeiro de; CASTELINI, Pricila; LEITE, Patrícia da Silva; ALMEIDA, Leonelo Dell Anhol; AMARAL, Marília Abrahão. “Cultura da computação para além da normatividade: participações e produções”. Revista Estudos Feministas, Florianópolis, v. 29, n. 2, e60462, 2021.

Financiamento: O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001

Consentimento de uso de imagem: Não se aplica

Aprovação de comitê de ética em pesquisa: Não se aplica.

Recebido: 14 de Dezembro de 2018; Revisado: 18 de Novembro de 2020; Aceito: 17 de Dezembro de 2020

leanderoliveira@utfpr.edu.br

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Leander Cordeiro de Oliveira (leanderoliveira@utfpr.edu.br) é graduado em Ciência da Computação pela UNICRUZ, mestre em Engenharia de Computação pelo C3-FURG e doutor em Tecnologia e Sociedade pelo PPGTE-UTFPR. Atualmente, é professor substituto no Departamento de Computação da UTFPR-CM. Tem interesse de pesquisa nas áreas de Interação Humano-Computador (IHC) e Informática na Educação, no campo de Ciência, Tecnologia e Sociedade (CTS), com destaque para as intersecções entre os temas Tecnologias na Educação, Educação em Computação, Computação e Teoria Queer, Arte e Tecnologia

Pricila Castelini (pricilacastelini@alunos.utfpr.edu.br) é graduada em Letras - Inglês e literaturas de Língua Inglesa pela UNICENTRO. Especialista em Estudos Literários e Linguísticos na mesma instituição. Mestra em Tecnologia e Sociedade no PPGTE-UTFPR. Doutoranda na mesma instituição e programa. Pesquisa a partir da perspectiva feminista no campo de estudos em Ciência, Tecnologia e Sociedade e na área de Interação Humano-Computador

Patrícia da Silva Leite (patriciasilvaleite@alunos.utfpr.edu.br) é doutoranda em Tecnologia e Sociedade pela UTFPR e mestre pelo mesmo programa. Especialista em Desenvolvimento iOS (Apple Developer Academy PUCPR) e em Jogos Digitais (PUCPR e PUC-Minas). Graduada em Sistemas de Informação (PUC-Minas). Sua pesquisa envolve a inclusão social e digital de pessoas com deficiência por meio do desenvolvimento de jogos digitais inclusivos. Tem experiência no desenvolvimento de jogos digitais e sistemas computacionais, incluindo projetos educacionais e acessíveis

Leonelo Dell Anhol Almeida (leoneloalmeida@utfpr.edu.br) é doutor em Ciência da Computação pela UNICAMP, onde também realizou pós-doutorado na temática de acessibilidade em Rich Internet Applications colaborativas, mestre em Informática pela UFPR e graduado em Informática pela UEPG. Atualmente, é professor adjunto na UTFPR, onde atua no PPGTE. Seus interesses de pesquisa envolvem: Interação Humano-Computador e Design de Interação, Acessibilidade e Inclusão Digital, Participação e Empoderamento Democrático, interesses desenvolvidos sob o viés dos estudos em Ciência, Tecnologia e Sociedade (CTS)

Marília Abrahão Amaral (mariliaa@utfpr.edu.br) é graduada em Ciência da Computação pela UEL, mestre em Ciências da Computação pela UFRGS, doutora pelo PPGEGC da UFSC. Atualmente, é docente associada na UTFPR, pesquisadora no PPGTE. É tutora do grupo PET Computando Culturas em Equidade. Tem interesse nas temáticas: interação humano-computador, estudos em Ciência Tecnologia e Sociedade, design de interação, informática na educação, educação em computação, gênero em computação

Contribuição de autoria: As/os autoras/autores contribuíram igualmente

Conflito de interesses: Não se aplica

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