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Revista Estudos Feministas

versão impressa ISSN 0104-026Xversão On-line ISSN 1806-9584

Rev. Estud. Fem. vol.29 no.2 Florianópolis maio/ago 2021  Epub 08-Maio-2021

https://doi.org/10.1590/1806-9584-2021v29n279309 

Seção Temática Gênero, tecnologias e (novas) formas de subjetivação nas práticas esportivas

Corpo e gênero na experiência inicial de jogadoras de futebol

Body and Gender in the Early Experience of Soccer Players

Cuerpo y género en la experiencia inicial de futbolistas

Talita Machado Vieira1 
http://orcid.org/0000-0002-4794-9649

José Sterza Justo1 
http://orcid.org/0000-0002-5472-9900

Sonia Regina Vargas Mansano2 
http://orcid.org/0000-0002-4406-8803

1Universidade Estadual Paulista, Programa de Pós-Graduação em Psicologia, Assis, SP, Brasil. 19806-900 - posgradu.assis@unesp.br

2Universidade Estadual de Londrina, Departamento de Psicologia Social e Institucional, Londrina, PR, Brasil. 86057-970 - psisoin@uel.br


Resumo:

O presente artigo tem como objetivo compreender de que modo a marca do gênero atravessa a experiência inicial das atletas de futebol com a modalidade. Para tanto, adotamos a perspectiva da cartografia e analisamos entrevistas semiestruturadas feitas com atletas de formação e alto rendimento. A despeito da diferença geracional, os resultados mostraram que as dificuldades encontradas para se inserir no universo futebolístico são similares e ainda se assentam em percepções estereotipadas acerca dos gêneros.

Palavras-chave: futebol de mulheres; psicologia social; gênero; corpo

Abstract:

This article has the goal of understanding how the brand of gender crosses the early experience of female soccer athletes with the sport. To do so, we adopted a cartography perspective and analyzed the semi-structured interviews made with athletes in formation and of high performance. Despite their age difference, we noted that the dificulties they found to get inserted in the soccer universe are similar and they are still based on stereotyped perceptions about genders.

Keywords: Women Soccer; Social Psychology; Gender; Body

Resumen:

Este artículo tiene como objetivo comprender cómo la marca del género cruza la experiencia inicial de las deportistas de fútbol con el deporte. Para eso, adoptamos la perspectiva de la cartografía y analizamos entrevistas semiestructuradas de deportistas entrenados y de alto rendimiento. A pesar de la diferencia generacional, los resultados arrojaron que las dificultades encontradas para ingresar al universo del fútbol son similares y aún se basan en percepciones estereotipadas sobre los géneros.

Palabras claves: fútbol de mujeres; psicología social; género; cuerpo

Introdução

“Menino veste azul e menina veste rosa”. Foi assim que a atual Ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos anunciou e celebrou o início de uma ‘nova era’ no Brasil, após o encerramento da cerimônia de sua posse, em 2 de janeiro de 2019 (FOLHA DE SÃO PAULO, 2019). Em seu discurso, a ministra pontuou as bases do seu pensamento conservador destacando sua filiação evangélica e seu posicionamento contra o movimento feminista e contra os estudos sobre gênero e sexualidade na escola:

a ministra-pastora afirmou, durante sua posse, que o Estado era laico, mas ela era “terrivelmente cristã”. Damares também critica o feminismo, os estudos de gênero e sexualidade, os quais, de modo acusatório, recebem a alcunha de “ideologia de gênero” (Adan SILVA; André NEVES; Suely MASCARENHAS, 2019, p. 34-35).

A ‘nova era’ vislumbrada pela ministra, como é típico do pensamento conservador (Ronaldo de ALMEIDA; Rodrigo TONIOL, 2018), anuncia a promessa de destruição do cenário anterior e retroagir a outros tempos tidos, imaginariamente e à revelia de qualquer conhecimento histórico, como de felicidade e harmonia, como, por mais paradoxal que possa parecer, o tempo da ditadura militar ou o tempo chamado de ‘anos dourados’ no qual as meninas vestiam rosa e os meninos azul (Carla PINSKY, 2014).

Apesar dos retrocessos causados pelas atuais políticas adotadas em várias esferas da vida e, particularmente, nas relações de gênero (Luiz Fabiano ZANATTA et al., 2016), o cenário contribui para o debate das dicotomias dos códigos interpretativos universais pautados na materialidade biológica como fundamento, cujos efeitos permeiam a experiência social dos seres humanos (Oyèrónké OYĚWÙMÍ, 2017).

Estudos mostram a relevância das arenas desportivas, o futebol incluso, para pensarmos sobre as normatividades de gênero e seus efeitos, seja no sentido da sua reprodução, seja do seu questionamento (Wagner CAMARGO; Cláudia KESSLER, 2017; Silvana GOELLNER, 2005; Talita VIEIRA; Danielly MEZZARI, 2019). O presente artigo, que integra uma investigação de doutorado em curso, tem como objetivo compreender como a marca do gênero atravessa a experiência inicial de atletas de futebol com a modalidade. Aqui chamamos a atenção para o futebol de mulheres (Cláudia KESSLER, 2016) que tem, simultaneamente, reivindicado e produzido outros modos de subjetivação na modalidade, historicamente constituída como espaço de formação e afirmação de uma masculinidade viril. A crescente ocupação desse território pelas mulheres contribui para a pluralização do esporte ao afirmar outras protagonistas e desestabilizar formas instituídas do poder nesse contexto, anunciando outros modos de organização e de relação possíveis no/com o esporte.

Dicotomias biológicas e seus efeitos sobre os corpos

Os grandes sistemas duais são paradigmáticos do código de interpretação dominante do mundo ocidental moderno. Sua presença pode ser notada em distintos segmentos da vida. No campo científico, a Psicologia oferece exemplos abundantes, organizando seus principais problemas em pares opostos: indivíduo vs. sociedade, mente vs. corpo, objetivo vs. subjetivo, natural vs. cultural, universal vs. singular (Liliana ESCÓSSIA; Virgínia KASTRUP, 2005; Luís FIGUEIREDO, 2008). Tais polarizações alimentam parte significativa dos juízos de valor e das práticas que dão contornos à organização social do Ocidente. A divisão dos seres humanos em gêneros binários, aspecto constitutivo de nossas vidas cotidianas e comum a diversas formações e espaços sociais, é ilustrativa do ressurgimento dos códigos dicotômicos rígidos, impulsionados pelo conservadorismo na contemporaneidade capitalista.

‘É menino ou menina?’. Tem-se aí uma pergunta corriqueiramente dirigida às gestantes e que, dificilmente, levantaria grandes problemas em sua resposta. A naturalização da questão, porém, não esconde a carga de fundamentos e expectativas que carrega e a resposta tende a funcionar como um quase-decreto ao implicar o aspirante a ser humano num universo de significados que o antecede. Mesmo de uma perspectiva estritamente ‘biológica’, responder tal pergunta depende de múltiplos fatores, como cromossomos, hormônios e estruturas internas de órgãos, todos subtraídos em favor da primazia anatômica. Ainda que consideremos essa complexidade, será realmente possível estabelecer o sexo insistindo em aspectos exclusivamente ‘biológicos’? Tal definição decorreria de um ato isolado e unilateral? Seria possível extrair do sexo, considerado como corpo material, os fundamentos para a assunção do gênero, entendido como desempenho de papéis sociais? Se assim fosse, não estaríamos a insistir em uma divisão rigorosa que pressupõe a natureza em oposição à cultura e à história?

A bióloga Anne Fausto-Sterling (2002) problematiza a dicotomia estabelecida entre o natural e o cultural e suas implicações para o campo dos estudos de gênero e sexualidade. Sobre a divisão entre sexo e gênero, a autora destaca os problemas que podem decorrer de uma abordagem que tende a identificar, de um lado, o sexo ao corpo e à anatomia e, de outro, o gênero às normas sociais que moldam o comportamento, como duas realidades autônomas e relativamente independentes entre si. Para ela, ainda que a perspectiva contribua para pôr em evidência o caráter construído das desigualdades e da hierarquia que organiza as relações entre homens e mulheres, o corpo permanece inquestionado, um campo neutro e suposto atestado objetivo de uma diferença fundamental. Assim, o corpo, permanece aberto à reivindicação e servindo de suporte aos que procuram as evidências materiais de diferenças que confirmam e acabam por justificar as normas instituídas de gênero e as desigualdades e exercícios de poder que lhes são decorrentes.

Cabe notar que, quando analisamos o corpo, não existe fora, além ou aquém da cultura e das práticas sociais. Ele próprio é produto de conjunturas sócio-históricas, sofrendo variações em seus usos, manipulações e significados (Georges VIGARELLO, 2000; Denise SANT’ANNA, 2011). As evidências somáticas observadas poderiam ser melhor compreendidas se olhadas enquanto efeitos de processos específicos e não como origem ou causa dessas mesmas diferenças. Ao falarmos de corpo como unidade fixa, imutável e universal, porque supostamente pertencente a uma biologia pura, estamos a expulsar essa dimensão viva do humano da própria história, como se fosse possível conceber duas realidades distintas e independentes, em que teríamos o corpo de um lado e o mundo sociocultural que o circunda de outro.

O corpo é a narrativa encarnada de uma época, bem mais um “arquivo vivo” (VIGARELLO, 2000), com disparidades, prescrições e proscrições, do que um oráculo contendo as verdades últimas determinantes da existência. Por ser vivo, é atravessado, marcado e constituído pelas experiências cotidianas que efetua. Quando consideramos, por exemplo, irregularidades no ciclo menstrual feminino, é pouco provável que alguém objete contra o argumento de que isso pode decorrer do estresse. Constatar a desregulação dos hormônios que modulam o ciclo em nada avança a respeito do que a tenha provocado. O que se conhece é o efeito e é sobre isso que se atua quimicamente quando se quer obter algum tipo de controle. Por outro lado, ao olhar para os hormônios sexuais e sua ocorrência em níveis distintos entre fêmeas e machos humanos, parece inadmissível considerar a possibilidade de que possam estar associados aos seus modos e condições de vida. São encarados como fatos em si mesmos, ‘naturalmente determinados’, e, por essa razão, tomados como causas para diferenças constatadas entre homens e mulheres.

Tais argumentos incorrem no problema da matéria como fundamento explicativo e inquestionável das diferenças entre homens e mulheres. Judith Butler (2000) discute o tema a partir do processo de estabilização do sexo no corpo. Ela questiona a suposta neutralidade da categoria ‘sexo’, utilizada como determinante na nomeação do gênero. A oposição entre sexo e gênero tende a pressupor o primeiro como realidade de significação autoevidente de um corpo (aquilo que um corpo ‘é’, o seu ‘sexo’), pertencente ao domínio da natureza e anterior a qualquer construção discursiva socialmente organizada. Porém, segundo a autora, é a partir do momento de nomeação de um ‘sexo’ que o corpo é tornado inteligível. Se um corpo e seu sexo são assimilados a partir dos códigos que os interpretam, como sustentar sua existência pré-discursiva? Seria possível defender que o corpo é o terreno sobre o qual se produz algo, o gênero, permanecendo ele próprio imune a uma produção?

Com frequência, afirmar o caráter discursivo da diferença sexual é levianamente rotulado como pretensão de atribuir ao discurso o lugar de origem ou causa daquilo que ele nomeia. A essa crítica, Butler (2000, p. 119) argumenta: “Afirmar que o discurso é formativo […] significa afirmar que não existe nenhuma referência a um corpo puro que não seja, ao mesmo tempo, uma formação adicional daquele corpo.” O discurso não origina o corpo, tampouco causa a diferença anatômica que se observa (BUTLER, 2000), mas, como prática viva, demarca as condições segundo as quais a existência do referido corpo é tornada legítima. O corpo feminino, em especial de mulheres brancas, por exemplo, teve sua legitimidade, por muito tempo, condicionada à maternidade, sendo a realização de sua sexualidade circunscrita ao âmbito do matrimônio heterossexual, com a finalidade de procriação. Assim, podemos dizer que o corpo é contingente às regulações sociais e históricas que o inscrevem discursivamente na cultura. Esta faz dele um efeito convertido em fundamento da confirmação dos códigos compartilhados que o tornaram inteligível.

Isso não é o mesmo que negar as diferenças que existem entre os humanos, expressão de nossa diversidade. O que está em causa é a recusa em reduzir essas diferenças a uma grade estabelecida a partir da categorização binária do sexo-gênero, uma vez que a diversidade é constatada, inclusive, entre tipos reunidos sob um mesmo agrupamento. Também não podemos ignorar que tais diferenças possam dizer respeito mais aos produtos tornados visíveis por um dado processo do que às suas causas. É preciso cuidar para não inverter os vetores, atribuindo aos efeitos o lugar de origem ou de explicação para os fenômenos observados na dimensão física do corpo.

O nosso argumento não pretende ser um manifesto de negação da dimensão material como parte da experiência corpórea. Outrossim, pauta-se pela defesa da indissociabilidade entre o corpo e as práticas sociais, uma vez que

nossas experiências corporais devem sua existência ao nosso desenvolvimento em culturas e períodos históricos particulares. […] À medida que crescemos e nos desenvolvemos, nós, literalmente e não só “discursivamente” (isto é, através da linguagem e das práticas culturais), construímos nossos corpos, incorporando a experiência em nossa carne mesma. (FAUSTO-STERLING, 2002, p. 59).

Futebol e a produção do corpo gendrado

Dentre as tantas práticas sociais e jogos discursivos nos quais o corpo é forjado, destacam-se aqueles relacionados ao futebol. O mundo do futebol é importantíssimo como usina de simulações e de produção de simulacros do corpo, a maioria dicotomizados. Pela popularidade, valorização e visibilidade do futebol na cultura brasileira, como também na de muitos outros países, o corpo aí forjado se irradia como ideal para o conjunto da sociedade. De maneira geral, ainda prevalece a concepção de que o corpo irradiado do campo de futebol para o imaginário social deva ser o corpo de um homem, tanto suporte quanto projetor de uma virilidade agressiva e da alta performance física (Eliene FARIA, 2009; João MOURA, 2019).

Retomamos o argumento de que desde o momento em que se nomeia o ‘sexo’ de um corpo este é já inserido num universo de expectativas, discursos, práticas e vivências institucionais que preveem para ele uma trajetória social específica, conforme sua morfologia genital. Mesmo a dita nomeação encontra-se já enredada aos códigos culturais, sendo que o sexo parece não existir fora ou além do gênero, pois

não há como recorrer a um corpo que já não tenha sido interpretado por meio de significados culturais; consequentemente, o sexo não poderia qualificar-se como uma facticidade anatômica pré-discursiva. Sem dúvida, será sempre apresentado, por definição, como tendo sido gênero desde o começo. (BUTLER, 2003, p. 29).

A tomada da morfologia corporal como fundamento inquestionável na designação do sexo oblitera o fato de que o próprio corpo é olhado desde um sistema histórico e social organizado em torno da noção de diferença sexual para fazer funcionar uma heterossexualidade compulsória. O ‘sexo’ não é um atributo neutro e sua nomeação implica o corpo num campo político-discursivo que o constituirá para torná-lo viável e inteligível para o sistema no qual está inserido. O que se defende aqui é que tanto o gênero quanto o sexo e, em última análise, o próprio corpo são efetivamente alvos de moldagem por parte do plano político-discursivo que circunscreve suas existências. Isso ocorre mediante práticas institucionais diversas que, reiteradamente, buscam estabilizar uma coerência linear entre o ‘sexo’ de um corpo e o gênero que lhe é atribuído.

As vivências possibilitadas tendem a produzir marcas e são efetivamente “incorporadas” (FAUSTO-STERLING, 2002, p. 59). É no corpo que a cultura se faz natureza. Butler (2000) afirma que o processo de sedimentação do sexo e do gênero no corpo não se limita ao ato isolado e inicial que nos nomeia como ‘ele’ ou ‘ela’. A norma binária é continuamente reafirmada sobre o corpo, inscrevendo-se sobre ele e produzindo-o em conformidade com aquilo que ela estabelece. O corpo sexuado, resultante da citação reiterada da norma, converte-se em fundamento de sua legitimidade, alimentando seu poder enquanto tal. A autora identifica esse processo no conceito de performatividade, que

é sempre uma reiteração de uma norma ou conjunto de normas. E na medida em que ela adquire o status de ato no presente, ela oculta ou dissimula as convenções das quais ela é uma repetição […] sua aparente teatralidade é produzida na medida em que sua historicidade é dissimulada (BUTLER, 2000, p. 121).

A atuação performativa envolve um mecanismo complexo e diversificado que opera por meio de inúmeros segmentos da sociedade, como a família, a educação, as práticas desportivas, os saberes da medicina e da psicologia, que, em graus variados, constituem e são constituídos pela norma do sexo binário. No plano das relações interpessoais, destacamos a importância dos estereótipos de gênero como estratégia para o funcionamento da referida norma. O estereótipo é uma categoria conceitual tradicional no campo da Psicologia Social. Pode ser compreendido como uma série de crenças, expectativas e juízos em relação a um conjunto de pessoas que apresentam um atributo comum, marcando uma identificação de grupo que pode ser positivada ou negativada. Existem, por exemplo, estereótipos raciais, geracionais, corporais, de gênero, relacionados às profissões, à sexualidade, entre outros.

Os estereótipos de gênero orientam-se pela morfologia corporal capturada pelo conjunto de expectativas formadas sobre o que é supostamente adequado ou não para cada humano. Aïna Chalabaev et al. (2013) fazem uma demarcação conceitual relativa aos estereótipos e papéis de gênero, considerando o primeiro como uma categoria descritiva de crenças e o segundo como conjunto de normas prescritivas. Em nosso entendimento, ambos os conceitos se retroalimentam e atuam conjuntamente na constituição de sujeitos gendrados. Nesse caso, mais do que marcar uma identificação grupal, os estereótipos de gênero atuam como meios de citação da norma do sexo, apontada por Butler (2000, 2014), fazendo persistir a organização sexual binária, reiterando-a na vida dos sujeitos em diferentes espaços e momentos.

Se pensarmos sobre sua presença no âmbito do futebol, o papel dos estereótipos de gênero torna-se notório no processo de produção do corpo. Ao abordar o contexto que antecedeu a proibição do futebol de mulheres no Brasil (1941-1979), Goellner (2005) mostra como a ideia de uma suposta ‘natureza feminina’ moldava as orientações sobre as práticas esportivas consideradas adequadas ou impróprias para elas. Sob o argumento de preservação da dita ‘natureza’, à época amplamente radicada nas ideias de fragilidade e maternidade (Fábio FRANZINI, 2005), criavam-se dispositivos sociais que pretendiam operar uma modelagem corporal e subjetiva das mulheres. Se o corpo é estritamente um produto da natureza e expressão natural de uma essência feminina ou masculina, por que o empenho para conduzi-lo por práticas capazes de moldá-lo tal qual a essência pressuposta?

Tal histórico deixa marcas que ainda são sentidas pela modalidade em diversos aspectos (Leila SALVINI; Wanderley MARCHI JÚNIOR, 2016). No plano concreto, a ênfase pode ser colocada nas diferenças de oportunidades de acesso à modalidade, falta de espaços e equipes para iniciação esportiva e para desenvolvimento de prática sistemática, número restrito de competições, bem como nas condições de trabalho precarizadas que dificultam a dedicação exclusiva ao esporte (Fernanda HAAG, 2018; Osmar SOUZA JÚNIOR; Heloisa REIS, 2018).

Já no plano simbólico, podemos destacar a dificuldade que meninas e mulheres podem encontrar para se identificarem com a modalidade (FRANZINI, 2005). Em partes, resultado da violência simbólica (Pierre BOURDIEU, 2012) que, ao irradiar representações e sentidos de um futebol hegemônico espetacularizado praticado por homens cis-hétero, acaba por instituí-lo como norma, estabelecendo uma hierarquia vertical entre as diferentes manifestações do ludopédio (KESSLER, 2016). Ainda no âmbito simbólico, destaca-se o enfrentamento aos preconceitos, como o questionamento público acerca de sua sexualidade e a utilização de aspectos relacionados a ela para tentar desqualificá-las (Caroline ALMEIDA; Mariane PISANI; Luciano JAHNECKA, 2013). Outra forma de preconceito com a qual se deparam é a focalização dos aspectos físico-estéticos que as objetificam e erotizam no discurso midiático, conforme correspondam a um padrão de beleza europeu (Doiara dos SANTOS; Ana Gabriela MEDEIROS, 2012).

Os estereótipos de gênero parecem ter desdobramentos amplos na vida das garotas e mulheres que se dedicam ao futebol. Não se trata exclusivamente dos modos pelos quais o corpo sexuado é materializado, sendo necessário levar em consideração, também, os efeitos que são produzidos na vida de atletas, homens e mulheres, face à organização gendrada e desigual da instituição esportiva (GOELLNER, 2013). A concepção que pressupõe o corpo sexuado como realidade material com significação em si mesma também serve de fundamento para formulação de estereótipos de gênero que atuam na vida social. Tais estereótipos, por sua vez, funcionam como citação reiterada da norma que os cria, sedimentando o ‘sexo’ e o gênero no corpo. Como a marca do gênero poderia afetar a aproximação, o acesso e a prática do futebol por garotas? Essa questão será trabalhada ao longo do artigo.

Traçados de um caminho investigativo

Partindo da perspectiva da cartografia (Gilles DELEUZE; Félix GUATTARI, 2011), foram realizadas entrevistas semiestruturadas com atletas de um clube de futebol do interior de São Paulo. A cartografia diz respeito ao acompanhamento de processos que constituem os problemas investigados (Laura BARROS; Virgínia KASTRUP, 2015). Para Suely Rolnik (2016), a cartografia

é um desenho que acompanha e se faz ao mesmo tempo que os movimentos de transformação da paisagem. Paisagens psicossociais também são cartografáveis. A cartografia, nesse caso, acompanha e se faz ao mesmo tempo que o desmanchamento de certos mundos - sua perda de sentido - e a formação de outros (ROLNIK, 2016, p. 23).

A cartografia pressupõe a criação de mapas movediços, provisórios e parciais, “[…] inteiramente voltado[s] para uma experimentação ancorada no real” (DELEUZE; GUATTARI, 2011, p. 30). A cartografia se aproxima mais de um conjunto heterogêneo de pistas, um modo de conceber a relação entre a pesquisa e as pesquisadoras, do que de um rol de procedimentos que prescrevem o caminho a ser seguido.

As entrevistas foram realizadas individualmente, nas dependências do próprio clube ou em um espaço próximo ao alojamento. O contrato de participação foi firmado mediante a assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido e do Termo de Assentimento, no caso das atletas menores de idade.1 Os nomes utilizados aqui para identificar as entrevistadas são fictícios.

Participaram da pesquisa nove atletas: quatro da categoria de base e cinco da equipe principal, cujas idades variavam entre 16 e 35 anos. No aspecto étnico-racial, a partir da autodeclaração das atletas, tínhamos a seguinte distribuição: quatro atletas negras, uma atleta indígena, três atletas brancas e uma atleta que disse não se identificar com nenhuma categoria racial ou de cor. Embora não tenhamos solicitado a informação quanto à classe econômica, ao longo das entrevistas cinco delas referiram a si ou a suas famílias como tendo ‘alguma condição’ ou sendo de classe média, ao passo que as outras quatro definiram-se como de origem pobre ou popular. Entre as atletas da base, todas cursavam o ensino básico. Já entre as atletas da equipe principal, a escolaridade estava assim distribuída: duas com ensino médio completo, uma com superior incompleto e duas com superior completo.

Elas apresentavam ampla experiência no esporte, tendo participado de conquistas expressivas por seus clubes ou pela seleção, inclusive Olimpíadas e Jogos Pan-americanos. Além do clube onde foi realizada a pesquisa, as atletas da equipe principal já tiveram passagem pelas seguintes agremiações: Joana - Guarani; Viviane - Atlético-MG, Baylor University (EUA) e seleção brasileira; Sandra - SAAD, Palmeiras, Botucatu, Centro Olímpico, Avaldsnes (Noruega) e seleção brasileira; Paula - Braga (Portugal) e seleção brasileira; Fabíola - Ipatinga, Atlético-MG, Iranduba, Flamengo e seleção brasileira. Entre as atletas da base, apenas uma delas declarou ter tido experiência em outro clube (Rio Branco, de Americana-SP). As demais relataram ter participado de escolinhas mistas de futebol.

Seis informantes residiam em alojamentos disponibilizados pelo clube, duas moravam com as suas famílias e uma em residência própria. As entrevistas partiram de um roteiro composto de três eixos temáticos que contemplavam a trajetória esportiva, a experiência do futebol vivido como trabalho ou formação para o trabalho, e as condições atuais da vida atlética. Neste artigo, nos dedicaremos ao escrutínio do material obtido no primeiro eixo, formado pelas seguintes questões: Como você se aproximou do futebol? Ao longo da sua trajetória no esporte, quais experiências foram mais relevantes? Você passou por categoria de base ou teve algum tipo de formação específica para jogar? Como foi? O que pensa sobre esse momento da base na sua formação e de outras atletas? A análise das entrevistas foi elaborada a partir de três encontros de natureza distinta com o material produzido.

O primeiro encontro já foi para realização das entrevistas e o tipo de dado que resultou desse momento emergiu das sensações despertadas, que pode ser identificado ao que Kastrup (2015) nomeia como rastreio e toque, ações que se caracterizam por uma atenção aberta que se desloca e percorre o campo numa espécie de varredura inicial.

Ao revisitar os áudios para efetuar as transcrições, tivemos um segundo encontro, agora mais próximos do gesto de pouso que reconfigura o campo atencional conferindo maior focalização sobre o material (KASTRUP, 2015). Nossa pergunta-guia para esse momento era: O que foi dito?. No terceiro encontro, nos dedicamos à escuta das gravações das entrevistas, tendo como questão orientadora: Como foi dito?. Procedemos dessa maneira por considerar que na transição do dito para o escrito parte do que é comunicado pode se perder (David SILVERMAN, 2000), como silêncios, hesitações, recalcitrâncias, variações de entonação. Destacou-se aquilo que Kastrup (2015) nomeia como reconhecimento atento, no qual a paragem sobre os aspectos que ativaram nossas sensibilidades, nos movimentos anteriores, cria a intersecção entre passado e presente, memória e percepção, num processo que constrói diferentes versões para o mapa do trabalho de campo. Os dados são apresentados na forma de fragmentos e então analisados.

O ‘democrático’ futebol brasileiro: meninas em campo

Um dos primeiros desafios das futebolistas é enfrentar os preconceitos que visam atingi-las no âmago de si mesmas, nas referências primordiais de si dadas pelos seus corpos. Os modos de experimentação das possibilidades corporais e do movimento são organizados de maneiras diferentes no bojo de uma cultura de gêneros binários. Um processo refinado e contínuo de treinamento dos gestos performativos que cria corpos masculinos e femininos. No primeiro caso, estimulação para inculcar a virilidade, a potência e a força; no segundo, restrição para estabelecer a leveza, a graciosidade e a delicadeza, são alguns dos estereótipos que alimentam e direcionam os modos de movimentação permitidos e esperados. Os significantes produzidos pelas performances que se referem ao corpo são tomados como expressão de um aspecto supostamente essencial, considerado imune aos atos culturais, ocultando seu caráter de construção (BUTLER, 2003).

A menina corporalmente ativa é logo rotulada ‘menina-macho’, ‘sapatão’, assinalando a confusão que ela instaura no sistema dicotômico da inteligibilidade cultural. Está a transgredir a fronteira definida para seu corpo e seu ‘ser’, pelo que sua ação se encontra sujeita a penalizações de diversas ordens. Aqui, apresentaremos a discussão dessas questões focalizando as experiências iniciais das atletas com o futebol.

Entre as entrevistadas, os espaços informais, a rua ou a própria casa, tiveram papel importante na sua história com a modalidade, como local de iniciação ou de prática complementar lúdica. Joana, atleta da equipe principal, que afirma ter iniciado sozinha em casa, relata que, após algum tempo, passou a praticar o esporte na rua com um grupo de garotos: “Depois, eu comecei a jogar bola com os moleque na rua […] ficava o dia inteiro na rua [risos] jogando […] Fugia, ia pra onde minha mãe não queria que fosse […] Chorava quando minha mãe e meu pai num deixavaMeu padrasto”. Na pesquisa de Mariane Pisani (2016), as entrevistadas também indicaram a rua como espaço de iniciação esportiva e afirmaram terem começado a jogar futebol com os garotos.

A aproximação com o jogo por intermédio dos meninos sinaliza a falta de equipes e de competições especificamente para garotas (Helena ALTMANN, 2015). Argumento que é complementado pela afirmação de Carolina de Almeida e Mariane Pisani (2015) sobre o surgimento tardio de escolinhas de futebol para meninas, segundo as autoras, ocorrido por volta dos anos 2000.

Como sugere a análise de Haag (2018), a figura masculina parece ser elemento mediador entre as garotas e o futebol. No caso elucidado pelos nossos dados, a presença de primos ou irmãos nesses grupos parece facilitar a participação das garotas na brincadeira, amenizando eventuais conflitos com a família, como o narrado por Joana. A fala de Carolina, jovem da base, mostra que a presença de um membro da família pode atuar como uma espécie de fiança para a prática do futebol por garotas:

aí eu comecei a brincar com os amigos dele [primo] e tals. E ele jogava numa escolinha. Aí eu pedi, falei: “Mãe, deixa eu participar da escolinha com, com o D.?”. Aí, minha mãe falou: “, mas… cê só vai jogar enquanto ele estiver lá, se ele sair você não joga mais” (CAROLINA).

O excerto se soma à fala de outras informantes que também comentam a iniciação esportiva com irmãos ou primos. Tais relatos sugerem que a entrada e a permanência das mulheres, sobretudo quando jovens, em espaços públicos com finalidades de lazer ou recreação, como a rua ou as escolinhas de futebol, ainda se encontram relativamente associadas à presença de um acompanhante do sexo masculino, preferencialmente ligado à família, que atua como mediador desse acesso.

A escola também foi apontada como local importante para o contato com a modalidade. A dinâmica nesse espaço manifesta outra linha das dificuldades encontradas para praticarem o futebol, em decorrência de estereótipos de gênero. Referindo-se ao chavão ‘mulher não sabe jogar bola’, Viviane, da equipe principal, nos conta sobre sua experiência de ser sempre escolhida por último na escola:

a gente num podia,? […] no começo, quando eu tava na escola, aí todo mundo escolheu o time e eu era sempre a última,? […] Era chateante,? Porque vocêaliAcho que todo mundo quer o direito dede fazer o que gosta (VIVIANE).

As avaliações que aparecem no relato de Viviane atestam a reiteração da fronteira entre o que é ‘de menina’ e o que é ‘de menino’, definindo os espaços e as práticas autorizadas e impedidas para elas e para eles. O mecanismo também esteve presente na fala de Alice, atleta da base, e mostra que seu funcionamento é operado por agentes distintos. No excerto abaixo, a jovem amapaense relata o estranhamento que sua presença provocava nos meios futebolísticos.

O que que elafazendo aqui no meio da gente?”. Contando que o futebol é pra meninos e tudo mais […] Teve uma vez, acho que em 2011, fui jogar um campeonato […] Aí, a técnica do outro time… É… Falou que eu num podia jogar, porque eu era menina e ela não ia deixar eu jogar. Aí eu fiquei muito triste. Comecei a chorar do lado de fora […] Eu achei uma coisaMuitoMuito chata,? (ALICE).

‘Fiquei triste’, ‘achei uma coisa chata’, ‘era chateante’ foram os termos escolhidos por Viviane e Alice para descrever como se sentiram em relação aos episódios de preconceito. As situações mencionadas confluem com o que Butler (2003, p. 241) aponta como consequências punitivas para a performance inadequada do gênero: “Os gêneros distintos são parte do que ‘humaniza’ os indivíduos na cultura contemporânea; de fato, habitualmente punimos os que não desempenham corretamente o seu gênero.” Os relatos das informantes nos mostram que tais fronteiras, estabelecidas e reiteradas a partir de práticas e discursos baseados em estereótipos, produzem efeitos de subjetivação que contribuem para circunscrever um sujeito gendrado, internamente coerente e culturalmente inteligível (BUTLER, 2003).

Tais aspectos reúnem um conjunto de referenciais associados ao futebol que participam do processo pelo qual a ‘menina’ torna-se seu gênero. Assim como ‘a menina veste rosa e o menino veste azul’, como disse a ministra já citada neste artigo, as tecnologias de gênero, além das cores, também operam pelos esportes, distribuindo-os dicotomicamente entre homens e mulheres. Além de não poder vestir azul, não poderia também jogar futebol e fazer tantas outras coisas consideradas ‘de homem’. Obliterações que não foram suficientes para dissuadir as entrevistadas de praticar a modalidade e persistir na construção de uma carreira, mas que podem levar a conflitos, uma vez que produzem efeitos nas percepções sobre si como meninas e atletas. Assim, a persistência na carreira demanda um processo de negociação com os demais e com elas mesmas na construção de um pertencimento e de uma identificação com o futebol. Obstáculo extra que se soma a tantos outros já enfrentados pelas futebolistas em nosso país (ALMEIDA; PISANI, 2015; SOUZA JÚNIOR; REIS, 2018).

A compreensão do gênero a partir de uma base interna ou como derivação de uma natureza supostamente neutra dissimula suas raízes históricas e sociais, dificultando seu questionamento enquanto categoria política de organização e produção dos corpos e das relações (BUTLER, 2003). Entendido como núcleo de um ‘eu’ ou uma ‘identidade’, a farsa do gênero coerente permanece blindada e quando surgem situações que poderiam colocá-la à prova é o próprio ‘ser’ do sujeito que se torna inquerido. Sandra, atleta experiente e medalhista olímpica, ao falar sobre os jogos de futebol na escola, recorda que sua participação não era facilmente assimilada nem por ela mesma. Assim, jogar futebol com os meninos, na escola, resultava de um processo de negociação com eles e com elas próprias.

Na escola, eu tinha muita vergonha, sempre fui muito tímida. Mas, mesmo assim, às vezes, tinha alguns jogos, algumas coisas e eu tava lá no meio com os meninos. A única, a única! […] Demorou um pouco pra eu jogar, na verdade, porque eu falei assim “ah, só eu de menina, só eu”. Às vezes eu tocava na bola e ficava meia tímida […] eu brincava, às vezes, mas eu sentia ainda que… era uma coisa muito diferente,? Aquela menina jogando no meio daquele monte de meninos (SANDRA).

No contexto escolar, Priscila Dornelles (2007) mostra que a segregação entre meninos e meninas é uma prática adotada por alguns professores de Educação Física, cujas razões se baseiam em concepções estereotipadas sobre os gêneros. Segundo a autora, essa prática se apoia no entendimento de que a disposição dos garotos e o desinteresse das meninas seriam inerentes ao seu ‘sexo’. Uma manifestação possível da ideia de linearidade causal entre sexo, corpo e gênero, que discutimos a partir de Butler (2000, 2003) e Fausto-Sterling (2002). Altmann (2015) destaca que o estabelecimento escolar tem um papel fundamental, seja na reprodução, seja na diminuição das desigualdades observadas entre meninos e meninas na experimentação desportiva. Referindo-se especificamente ao futebol, a autora em tela aponta que, muitas vezes, a escola pode ser o único espaço que possibilita às garotas uma aprendizagem sistematizada.

A partir dos relatos das atletas mais jovens, notamos que a negociação com os garotos para superar a segregação inicial nem sempre assegura a participação efetiva. A fala de Bianca mostra que a presença de uma garota em campo permanecia recoberta de desconfiança por parte dos colegas, sendo assinalada pela jovem como uma situação de preconceito da qual se recorda:

Ah, lembro, mas, tipo, não chegou a serdeclaradamente. Era só, tipo, entre olhares, quando eu pedia pra, pra jogar bola com os meninos, eles falavam “Nossa, mas você é uma menina” é… “você pode se machucar”. E, tipo, eles me deixavam jogar, mas sempre com umaum pé atrás. (BIANCA).

Tal desconfiança, entendida como uma manifestação de preconceito, por vezes se convertia em dinâmicas que lhes impossibilitavam de participar do jogo. Nas falas de várias atletas da base foi recorrente a menção a episódios em que, mesmo estando dentro do campo ou quadra, não conseguiam jogar, pois não recebiam a bola de seus companheiros:

Ah, de preconceito sempre tem,? Principalmente quando a gente joga com menino “ah, ela é menina! Num toca nela”, “Ah, ela é fraca, num toca nela” (MARINA).

[...] os moleque num tocava pra mim. Aí eu só ficava lá, correndo atrás da bola […] Ninguém tocava a bola pra mim. Às vezes, o meu primo tocava, mas era bem difícil também (CAROLINA).

[...] os garotos não tocavam a bola por eu ser menina. Não confiavam muito […] eu ficava muito frustrada. Porque eu estava dentro de, da quadra… Eu fazia parte do time, mas eles não tocavam a bola pra mim (ALICE).

Se antes os garotos se opunham à entrada das meninas nas quatro linhas, como vimos anteriormente nas falas de Sandra e de Viviane, nas gerações mais jovens observamos que seu impedimento ao jogo pode se dar de forma encoberta. O exemplo narrado pelas jovens nos ajuda a pensar sobre a importância de processos pedagógicos e de sensibilização paralelos à criação de outras sociabilidades nas relações de gênero na vida em geral e no desporto em particular.

No quadro institucional do futebol (Caroline ALMEIDA, 2019; Diogo MAGRI, 2019) e das políticas públicas para mulheres (BRASIL, 2013), assiste-se à adoção de medidas para aumentar a presença e participação das mulheres nas diversas esferas que compõem a modalidade. As formulações apresentadas, no entanto, são usualmente pautadas em descrições genéricas e estipulam punições que incidem sobre as equipes masculinas dos clubes em caso de descumprimento. Tais medidas, associadas a um contexto mais amplo de luta e de conquistas das mulheres na sociedade, contribuem para que se institua uma espécie de ‘discurso politicamente correto’ sobre a presença das mulheres no futebol. A combinação entre seu caráter vago e punitivo, tanto no âmbito do clube quanto interpessoal, faz com que seja capaz de provocar algumas mudanças no modo como o problema se apresenta, mas não atua sobre as condições que desencadeiam o processo.

Intervenções de caráter mandatório e ‘politicamente correto’ (por exemplo, ‘não se deve excluir as garotas que querem jogar’) têm seu valor, mas, quando adotadas isoladamente, continuam limitadas em termos das mudanças que são capazes de produzir. Isso porque desconsideram as reformulações a que a prescrição está sujeita quando é apropriada no cotidiano das relações, associando-se aos elementos do poder instituído que, historicamente, tem produzido dinâmicas hierarquizadas na organização do futebol brasileiro, privilegiando sua matriz espetacularizada e protagonizada por homens cis-héteros. A discussão de Almeida (2019) é elucidativa a respeito do tema:

nota-se a existência de um “telhado de vidro” no que diz respeito às carreiras de mulheres nos órgãos constitutivos da CBF e, de certa forma, na própria constituição do Futebol Feminino no Brasil. Às mulheres, por enquanto, só é permitido chegar até determinado ponto (ALMEIDA, 2019, p. 80).

Assim, tais medidas parecem produzir deslocamentos formais que possibilitam a ampliação da presença de garotas no campo ou na quadra. Todavia, parecem manter inalterados os mecanismos que perpetram a segregação das meninas no meio desportivo, nomeadamente no futebol, resultando num quadro em que a menina está em campo/quadra, mas continua sem jogar.

A fala das atletas sublinhava que, para conquistar um lugar e uma função dentro do/a campo/quadra, era preciso que comprovassem sua habilidade com a bola. Viviane relatou que ficava por último no momento de escolha das equipes entre os garotos da escola, complementando em tom descontraído: “eu era sempre a última,? Nos primeiros dias,? Aí, depois quevai jogando e que elesque você, assim, sabe jogar,?” (VIVIANE). Marina ilustra a questão, ao afirmar que seu primeiro treinador, em escolinha mista, não a colocava durante os jogos, em razão de ela ser menina: “cheguei nele e perguntei o porquê. Ele disse que por eu ser menina. Eu poderia treinar, mas jogar eu não iria jogar” (MARINA). Diante da declaração do treinador, a jovem do Mato Grosso do Sul decidiu procurar um lugar em que, segundo ela, fosse bem-vinda e pudesse jogar. Acabou por encontrar uma equipe de garotas e conseguiu melhorar suas habilidades esportivas. Quando o treinador pediu para que ela voltasse, recusou.

Ao ser perguntada se havia notado alguma diferença entre os dois tipos de treino, sua resposta foi direta: “Nenhuma! Acho que tinha mais empenho das meninas, por querer mostrar quem elas realmente é do que com os meninos” (MARINA). Porém, quando a habilidade futebolística delas ultrapassava a de seus companheiros, as repreensões e o risco de exclusão da brincadeira também emergiam, como relata Bianca:

Tipo, eu pedia pra jogar, aí, eles deixavam. Aí, se eu fosse melhor do que eles, no outro dia, eles já num deixavam mais. E isso era… Era meio chato. Aí, tipo, eu ia procurar outros lugares pra brincar (BIANCA).

Era preciso ser boa, mas não era permitido ser melhor do que eles. A naturalização criada no Brasil do futebol como ‘jogo de homem’, se atualiza constantemente nesses episódios que povoam o cotidiano. Arlei Damo (2006, p. 1) ressalta a importância da modalidade como “arbitrário cultural” que, mesmo sem ser declarado, participa do processo pelo qual o menino se experimenta no papel de homem, como agente viril e ativo. Com efeito, a masculinidade viril constitui-se como referente central a partir do qual se estabelece uma normatividade da prática do futebol. Assim, o menino ou o homem convertem-se nos parâmetros para definição da qualidade do jogo e da performance individual. A menina que joga bem, joga ‘como menino’, como comenta Joana a propósito de uma orientação que recebeu da professora de Educação Física: “ela via que eu… que eu tinha noção, que eu sabia jogar futebol. Que parecia muito com muito dos meninos ali jogando também” (JOANA).

A percepção das próprias garotas a respeito de suas habilidades parece ser guiada pelo referencial masculino. Bianca, por exemplo, afirmou que começou a vislumbrar o futebol como carreira a partir de seu desempenho entre os garotos: “Quando eu vi que, tipo, eu conseguia me destacar no meio deles. É, porque, querendo ou não, menina é mais frágil […] tem suas fraquezas. E, quando eu conseguia me destacar no meio dos meninos, eu pensei e falei ‘Não, é isso que eu quero!’” (BIANCA). Tanto Bianca quanto outras informantes consideraram que a prática do futebol com os garotos, não obstante as dificuldades de participação já relatadas, contribuiu para seu desenvolvimento no futebol. Tal entendimento também esteve presente na investigação conduzida por Rita Lima (2013), em que tanto as garotas quanto seus treinadores e familiares consideravam que a prática mista do futebol favorecia o desenvolvimento esportivo das meninas. Nada declaravam, porém, sobre contribuições da prática mista para a formação desportiva (e social) dos garotos.

Os excertos mostram a reprodução da ideia que reafirma e naturaliza o masculino e o viril como normas do futebol, tanto entre profissionais da área do desporto (como a professora de Joana) quanto entre as próprias garotas. Tal perspectiva colabora para ratificar a concepção de gêneros binários estáveis, lineares e internamente coerentes, apresentada por Butler (2003). A menina que não apenas joga, mas joga bem ‘como menino’ ou ‘melhor que o menino’, comete falta, torna-se transgressora e fica suscetível à penalização.

As informantes relataram embates com garotos ou técnicos quando elas os superavam nos certames futebolísticos. Carolina sintetiza a questão da seguinte maneira: “Tomar uma caneta de outro moleque é normal, mas tomar uma caneta de uma menina? Aí num dá! […] você fazer um jogo de corpo com um moleque e perder? É normal. Agora, você fazer um jogo de corpo com uma menina e perder? Cê é maluco!” (CAROLINA). Jogar futebol já as coloca no terreno do ‘estranho’, do que é confuso, porque transitam entre as fronteiras, jogar melhor que um garoto parece tornar mais agudo o estigma de ‘garota estranha’. Segundo a jovem, situações como as exemplificadas por ela motivavam reações violentas por parte dos garotos que se sentiam publicamente vexados, sendo hostilizados entre os colegas e cobrados de modo mais enérgico pelos treinadores.

Conforme se pode constatar, mesmo com condições adversas, as garotas persistiram e persistem na criação de um território para si como jogadoras. Aspecto que também foi destacado pela pesquisa de Salvini e Marchi Júnior (2016), em que as atletas se reconheciam como guerreiras, por seguirem na luta para afirmar sua modalidade e seu trabalho, não obstante as dificuldades encontradas no percurso. É um jogo acirrado dentro e fora de campo, como também é enfatizado por Luiza Anjos et al. (2018). São jogos de poder que ocorrem dentro e fora do gramado, envolvendo diferentes adversários e disputas.

Considerações finais

Neste artigo, debruçamo-nos sobre as experimentações iniciais de um grupo de meninas e mulheres atletas com sua modalidade de ofício e formação: o futebol. Uma das primeiras e mais abrangentes constatações investigação, corroborada por diversos estudos, é que o futebol constitui um espaço privilegiado para o gendramento que visa construir relações de poder na dicotomização entre masculinidade e feminilidade. Conforme mostrado pelas entrevistas, as mulheres que tentam enveredar pelo mundo do futebol acabam defrontando-se com preconceitos e grandes barreiras provenientes da família, de colegas, de professores, de treinadores e de outros agentes sociais. Muitas delas, inclusive, podem sentir um certo estranhamento sobre si mesmas quando se percebam atraídas pela prática do futebol. Prevalece a crença de que futebol ‘não é coisa de mulher’ e isso porque seu corpo, visto como demasiado fraco e lento, não seria adequado para a prática do referido esporte.

Entretanto, a crença e a racionalização não questionam as condições sociais de produção do corpo da mulher e do homem, nem a quantidade e a qualidade das experiências desportivas que lhes foram ofertadas, tampouco os processos de negociação que as mulheres precisam realizar consigo a fim de positivar suas vivências e autoimagens para persistir na prática do futebol. Igualmente, é uma concepção que desconsidera a possibilidade de definição do corpo a partir das potências que ele é capaz de efetuar, insistindo em um pensamento das essências.

Fica evidenciado o quanto o marcador de gênero e os estereótipos que lhes são correspondentes atravessam a experiência das atletas em sua iniciação desportiva e na prática lúdica do futebol. A dificuldade para encontrar e reunir outras garotas para jogar coloca como condição a participação em equipes mistas, seja na rua, seja na escola ou em escolinhas de futsal/futebol. Acesso e participação que, geralmente, são condicionados ou facilitados pela mediação de uma figura masculina próxima.

Longe de significar uma integração, a experiência de prática mista mostrou o encontro, desde a mais tenra idade, com uma série de preconceitos e de formas de exclusão direta ou indireta. Vivências que participam dos processos de subjetivação e, por vezes, levam-nas a se perceberem como figuras estranhas, demandando constantes negociações para criar formas de pertencimento e identificação com a modalidade, a fim de persistirem na prática.

Conforme constatamos, mesmo entre gerações distintas, as manifestações de preconceito se fizeram presentes nas experiências de aproximação e iniciação esportiva das entrevistadas. Como ficou demonstrado, as práticas de exclusão ou de anulação da presença de meninas nos gramados e quadras têm passado por um refinamento, tornando-se mais sutis. É indiscutível a importância das medidas adotadas no âmbito da política institucional do desporto, visando mitigar as desigualdades de gênero observadas, mas é necessário que sejam complementadas pelo trabalho no nível das relações cotidianas de modo a inculcar valores de apreço e defesa das diferenças.

Isso nos traz um alerta para o futebol de mulheres no atual cenário político do país. A revisão de um horizonte ético, pautando-se pela defesa e valorização das diferenças no âmbito das práticas e relações cotidianas, torna-se uma tarefa tão difícil quanto necessária frente às forças de extrema direita instaladas na política institucional brasileira. As mulheres futebolistas, assim como outros segmentos de nossa sociedade nos quais tais diferenças têm ganhado visibilidade e se transformado em instrumento de luta para a conquista de um território existencial, estão com dificuldades redobradas diante de discursos radicalmente conservadores que circulam abertamente pelo tecido social brasileiro. Destacamos a importância de estudos futuros para acompanhar as experiências de meninas e mulheres futebolistas, a fim de atentar para os efeitos destrutivos que esses discursos possam acarretar para suas vidas e carreiras. Ressaltamos que, a despeito das inúmeras investidas e dificuldades que obstaculizaram seu envolvimento com futebol, as entrevistadas forjaram meios para sustentar uma vida possível e desejante, nos gramados e fora deles.

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1A assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido foi realizada pela coordenação da equipe feminina.

Como citar este artigo de acordo com as normas da revista: VIEIRA, Talita Machado; JUSTO, José Sterza; MANSANO, Sonia Regina Vargas. “Corpo e gênero na experiência inicial de jogadoras de futebol”. Revista Estudos Feministas, Florianópolis, v. 29, n. 2, e79309, 2021

Financiamento: Bolsa de Doutorado DR II concedida pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo, Fapesp, processo 2017/18130-9

Consentimento de uso de imagem: Não se aplica

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Recebido: 03 de Fevereiro de 2021; Aceito: 06 de Maio de 2021

tmachadovieira@gmail.com

jose.justo@unesp.br

mansano@uel.br

Talita Machado Vieira (tmachadovieira@gmail.com) é doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Unesp de Assis. Bolsista FAPESP, com estágio sanduíche na Faculdade de Desporto da Universidade do Porto, Portugal. Mestra em Psicologia pela Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Assis e Graduada em Psicologia pela Universidade Estadual de Londrina (UEL).

José Sterza Justo (jose.justo@unesp.br) é Professor Livre-Docente do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da Universidade Estadual Paulista (Unesp) de Assis. Doutor em Psicologia e Mestre em Psicologia Educacional pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP).

Sonia Regina Vargas Mansano (mansano@uel.br) é Professora Associada do Departamento de Psicologia Social e Institucional da Universidade Estadual de Londrina (UEL) e docente do Programa de Pós-graduação em Psicologia e do Programa de Pós-graduação em Administração da UEL. Bolsista Produtividade do CNPq - Nível 2. Doutora e Mestra em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP).

Contribuição de autoria: Talita Machado Vieira: concepção, coleta e análise de dados, elaboração do manuscrito, redação, discussão dos resultados. José Sterza Justo e Sonia Regina Vargas Mansano: análise de dados, elaboração do manuscrito, redação, discussão dos resultados.

Conflito de interesses: Não se aplica

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