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Revista Estudos Feministas

versão impressa ISSN 0104-026Xversão On-line ISSN 1806-9584

Rev. Estud. Fem. vol.29 no.2 Florianópolis maio/ago 2021  Epub 01-Maio-2021

https://doi.org/10.1590/1806-9584-2021v29n279304 

Seção Temática Gênero, tecnologias e (novas) formas de subjetivação nas práticas esportivas

A generificação dos corpos de atletas trans e políticas de biologização do sexo

Athletes Trans Bodies Generification and Sex Biologization

La generificación de cuerpos de deportistas trans y políticas de biologización del sexo

1Universidade Federal de Sergipe, São Cristóvão, SE, Brasil. 49100-000 - ppged.ufs@gmail.com

2Universidade do Vale do Itajaí, Itajaí, SC, Brasil. 88302-901 - ppgedu@univali.br

3Universidad Nacional de La Plata, La Plata, Argentina. 1900 - cices@fahce.unlp.edu.ar


Resumo:

Objetivamos problematizar o esporte enquanto um dispositivo que interpela os corpos a partir de saberes biológicos e práticas biotecnológicas para a construção de gênero, sexo e sexualidade em atletas. Discutimos essas práticas em situações que envolveram tanto atletas mulheres como transexuais no cenário esportivo nacional e internacional, e os modos como se operaram testes para discernir a que categorias esses sujeitos deveriam pertencer no âmbito esportivo. Nessas situações, os recursos de categorização de sexo, em seus desdobramentos de gênero e sexualidade, foram sustentados sob a égide da biologia e das biotecnologias moleculares e gênicas. Consideramos que a biologia do corpo de atletas não deveria se colocar como recurso discursivo totalizante nas marcações identitárias desses sujeitos.

Palavras-chave: esporte; gênero; sexualidade; biotecnologia; dispositivo

Abstract:

The aim is to analyze sport as a body’s device, challenging it epistemological conception as a biological matter and a biotechnological practice object of gender, sex, and sexuality construction in athletes. We discuss this conceptualization in situations that involved both female and transexual athletes in the national and international sports scene, and the ways in which these examples allow us to rethink subjectivity categories in the sports field. In these situations, the resources for categorizing sex, gender, and sexuality, were sustained under the aegis of biology and molecular and genetic biotechnologies. We believe that the biology of athletes’ bodies should not be seen as a totalizing discursive resource in the identity construction of these subjects.

Keywords: Sport; Gender; Sexuality; Biotechnology; Device

Resumen:

El objeto es problematizar el deporte como un dispositivo que desafía los cuerpos a partir del conocimiento biológico y de prácticas biotecnológicas, lo cual construye relaciones de género, sexo y sexualidad en los deportistas. Para ello, se propone discutir sobre estas prácticas en situaciones que involucraron tanto a deportistas mujeres como transexuales en el ámbito deportivo nacional e internacional, con la intención de observar las formas en que se reconocen las pertinencias de estos sujetos con el campo deportivo. Se interpela que en estas situaciones los recursos para categorizar el sexo, el género y la sexualidad se sustentaron bajo el amparo de discursos biologicistas y biotecnológicos moleculares y genéticas. Se considera que la biología del cuerpo de los deportistas no debiera verse como un recurso discursivo totalizador en las identidades de estos sujetos.

Palabras clave: deporte; género; sexualidad; biotecnología; dispositivo

Introdução

O esporte é, concomitantemente, produto e reprodutor dos sentidos gestados e difundidos na modernidade. Dessa forma, forja-se uma instituição que elabora e sustenta leis/regras e que estabelece critérios para dividir, separar, nomear e categorizar indivíduos por idade, sexo, peso, performances, entre outras classificações. Em síntese, o esporte funciona como paradigma social ao gerar o que Pierre Bourdieu (2008) chama de (dis)posições: a articulação de posicionamentos sociais no mundo, atrelado com modos de dispor sentidos de distinção. Assim como a modernidade, o esporte nomeia para ordenar, para dar fim ao diverso e múltiplo, ou seja, ao caos. Ao tentar pôr fim ao caos cria a norma e, com isso, classifica: distingue, no sentido literal e moral do termo. Dentro dessa classificação normalizadora o esporte cunha espaços delimitáveis (topologias) para os sujeitos serem inseridos, gerando, dessa forma, também o que não é normal, a ‘anormalidade’. Por conseguinte, aqueles que porventura ultrapassarem esses limites passam a fazer parte do que não está autorizado, do não legitimado, previsto, prescrito, e, portanto, colocam-se por fora da norma, são objeto de burla, infração, crime.

Cruzar essas fronteiras das categorias ‘normais’ estipuladas pode implicar em advertências que podem tornar-se sujeitas à imoralidade e, inclusive, no limite, ser objeto de punições. O esporte é um dispositivo de poder individualizante, pois é totalizante homogeneizando o individual. Porém, é importante entender essa totalização no sentido que outorga Tiqqun (2019, p. 119), não como “uma totalização voluntarista a priori, mas como uma calibragem molecular das subjetividades e dos corpos”. O esporte é, portanto, uma forma de poder que individualiza os atletas, sujeitando-os à cultura, às regras, ao mundo. E, no caso deste texto, sujeitos a uma sexualidade prevista, prescrita, almejada com referência ao órgão sexual. Para potencializar a si mesmo o esporte potencializa os esportistas como objetos sobre os quais se descarrega: ‘materializando’ a subjetividade dos(das) atletas nos seus corpos.

Pensar o esporte a partir da modernidade é também pensar no corpo moderno, tal como aquele proposto tradicionalmente no âmbito da ciência hegemônica. Como afirma Paula Sibilia (2002, p. 68), “o saber científico redefiniu o corpo: arrancando-o do homem vivo e escolhendo o cadáver como seu modelo e objeto”. O corpo ficou assim condicionado a uma ideia de natureza pautada em toda uma epistemologia biologicista e fisicalista. Ou seja, as bases epistemológicas ocidentais modernas significaram o corpo em contornos biológicos e físicos, impactando na política e na estética dos seus usos. O assunto da relação entre política e a ‘materialidade’ do corpo passa pelo problema da ordem e das categorias, problema este pautado na necessidade da pressuposição da ordem em relação à subjetividade vivente. Desse processo nasce a conformação estruturalmente aporética que dá base a filosofia política moderna (Roberto ESPOSITO, 2017).

No caso da temática de gênero, sexo e sexualidade, historicamente, o peso da anatomia funciona como fronteira material das relações subjetivas. “A natureza humana é um efeito da tecnologia social que reproduz nos corpos, nos espaços e nos discursos a equação: natureza = heterossexualidade” (Paul PRECIADO, 2014, p. 25). Desse modo, as demarcações materiais distintivas também balizam, por extensão, o corpo de forma simbólica, uma vez que ter um pênis ou uma vagina pressupõe também que o sujeito deve internalizar os usos políticos ‘adequados’ a sua biologia.

O sistema heterossexual é um dispositivo social de produção de feminilidade e masculinidade que opera por divisão e fragmentação do corpo: recorta órgãos e gera zonas de alta intensidade sensitiva e motriz (visual, tátil, olfativa…) que depois são identificadas como centros naturais e anatômicos da diferença sexual (PRECIADO, 2014, p. 25).

Cabe ressaltar, também, que o advento das descobertas genéticas pela via das biotecnologias impacta no campo da biologia, deslocando e/ou reforçando argumentos naturalistas, permeando tanto uma nova assunção definitiva de uma matriz biológica para compreender a vida, os seres humanos e, consequentemente, suas identidades de gênero e sexuais, como também possibilitando uma “artificialização do natural” (Paul RABINOW, 2002). Tanto os saberes da biologia tradicional quanto os da biologia gênica permeada por biotecnologias moleculares geram efeitos nas possibilidades de compreensão, inteligibilidade e definições de gênero, sexo e sexualidade. Ambas as formas de saberes e técnicas permeiam os esportes na classificação dos sujeitos em masculinos ou femininos, embora valham-se de retóricas, técnicas e operações distintas. Desse modo, “o desenvolvimento biotecnológico investe nas possibilidades de intervenção para a construção de um sexo e, não somente, de um corpo” (Viviane Teixeira SILVEIRA; Alexandre Fernandez VAZ, 2014, p. 451). É em torno dessas atribuições arbitrárias que elaboramos os argumentos seguintes neste texto.

Assumimos a premissa de que o esporte atua como um dispositivo de produção de projetos de gênero e sexualidade baseados em discursos científicos calcados na biologia, num primeiro momento histórico, e na biotecnologia molecular, em etapa posterior e contemporânea. Tais discursos que operam no interior do esporte, enquanto dispositivo, fabricam critérios para guiar ações no que tange aos usos do corpo. Para sustentar tal pressuposto trazemos ao texto episódios da carreira esportiva de atletas que romperam as fronteiras das definições anatômico-sexuais tradicionalmente impostas. Consideramos importante destacar que o caso dessas atletas é tomado como exemplo em uma das seções do texto, mas não é exemplar: seus corpos, suas biologias e suas fisicalidades fogem da universalização, se tornam particulares. Assim, o corpo transexual dessas atletas, como veremos, ocupam um lugar desafiante no desporto, e, portanto, podem ser vistos como potência política da interrupção positiva dos parâmetros de ‘normalidade’ na criação de uma identidade que recusa o encaixe em categorias estanques, tanto de gênero como de corpo (Ana SANTOS, 2018). Ou seja, partimos do pressuposto de que a política de produção de sexo e gênero no esporte é um dispositivo de manutenção do campo esportivo como um espaço generificado/categorizado.

O presente ensaio compreende o esporte enquanto um dispositivo que opera e coloca em funcionamento discursos biológicos relacionados ao sexo de atletas, atuando em configurações políticas de gênero e corpos. O dispositivo, para Giorgio Agamben (2009, p. 40), é “qualquer coisa que tenha de algum modo a capacidade de capturar, orientar, determinar, interceptar, modelar, controlar e assegurar os gestos, as condutas, as opiniões e os discursos dos seres viventes”. O referido autor vai chamar de sujeito o que resulta da relação do corpo a corpo entre os viventes e os dispositivos. Assim, assumimos que uma teoria do sujeito só é possível como teoria dos dispositivos, pois “descrever um ente como um dispositivo ou como sendo produzido por um dispositivo é uma prática de desnaturalização do mundo dado, uma operação de colocar a distância o que nos é familiar ou se quer como tal” (TIQQUN, 2019, p. 210). Frente a isso, temos como objetivo interpelar como os corpos de atletas são generificados via biologização do sexo e práticas biotecnológicas no âmbito do esporte, a fim de problematizar modos de atribuição de sentidos e produção de sujeitos generificados em âmbito esportivo, assim como as diversas dificuldades impostas nessa tarefa pela assunção de múltiplas formas de identidades promovidas por atletas transexuais.

Este ensaio foi dividido em duas seções a partir desta introdução: na primeira parte dissertamos sobre a construção da definição do sexo de esportistas partindo da premissa de que tais marcações são históricas e tradicionalmente recorreram aos saberes biológicos para efetivarem-se; e sustentamos, em seguida, o pressuposto de que na atualidade essas produções estão configuradas em saberes de ordem molecular, calcados nas biotecnologias gênicas. Na segunda seção do texto utilizamos o corpo transexualizado de atletas sul-americanas como pano de fundo para discorrer sobre como o esporte se engendra enquanto um dispositivo de produção de gênero, sexo e sexualidade que busca territorializar as distinções corporais e identitárias que escapam a norma social; e como a transexualidade ocupa um lugar privilegiado de embate das tentativas de manutenção da regulação das ambivalências de sujeitos esportistas.

Sexo, esporte, biologia: potência e limites

As definições de sexo, sexualidade e gênero com base em aspectos biológicos são dominantes no campo esportivo. No entanto, é possível (e diríamos até mesmo necessário) problematizar essas relações de produção de sentidos e sujeitos, buscando apresentar que tais modos de fabricação são arbitrários e possuem limites e fragilidades, muitas vezes relegando a planos secundários outras formas de compreensão dessas marcas identitárias. De chofre, cabe ressaltar que assumimos uma conceptualização de sexo e gênero compreendida como os modos pelos quais são construídos, através da cultura e da linguagem, os significados e as diferenças relacionadas às representações culturais de homens e mulheres. É possível inferirmos, desde essa concepção, que gênero atua como um modo de linguagem, ou seja, como instância privilegiada nos modos pelos quais damos sentidos e significados às distintas construções de sujeitos masculinos e femininos.

Linda Nicholson (2000) argumenta que o gênero é uma construção social de sujeitos masculinos e femininos, sendo, inclusive, as diferenças corporais entendidas como produzidas e construídas culturalmente. Isso não nega a materialidade dos corpos, mas desloca o entendimento para o fato de que inclusive a materialidade e as diferenças entre os corpos masculinos e femininos são construídas culturalmente. Tal proposição no campo de estudos de gênero é referida como construcionismo social. Esse construcionismo social sobre o corpo é efeito da incorporação do social percebida como biológica, o que gera a sensação de que o corporal é pensado na modernidade como uma potência limitada, sendo um dos seus principais escopos as relações de gênero. Sob esse viés, Robert William Connell (1997) sugere que pensemos as práticas que estabelecem saberes e posições de sujeitos masculinos e femininos como ‘projetos de gênero’ desenvolvidos e postos em práticas nas diferentes instâncias culturais.

Incursões teóricas e analíticas sobre a construção de gênero, sexo e sexualidade via dispositivo esportivo já são bem desenvolvidas no campo de estudos de gênero. Análises empíricas, com metodologias etnográficas, acerca da produção de um projeto de sexo e sexualidade de atletas e os modos como estes retratam suas vivências contrapondo-as a representações e estereótipos almejados foram alvo de debates a partir de competições esportivas (Wagner Xavier de CAMARGO, 2018), assim como discussões sobre os modos de feminilidades em relação à potencialização muscular desenvolvida no âmbito do fisiculturismo feminino, discorrendo analiticamente sobre representações de um projeto de gênero para as mulheres (Angelita Alice JAEGER; Silvana Vilodre GOELLNER, 2011).

Ao tomarmos o esporte como locus em que projetos de gêneros são construídos, fabricados, disseminados, caberia questionar quais saberes e critérios são estabelecidos na elaboração desses processos. Dentre as diferentes estratégias postas em movimento para a gerência das classificações de sexo e gênero no esporte, com base em saberes da biologia, podemos citar aquelas realizadas pela Agência Mundial Antidoping (World Anti-Doping Agency - WADA-AMA), organização que estabelece relações com o Comitê Olímpico Internacional (COI) e que regulamenta os usos de substâncias e tecnologias no âmbito do esporte.

Para tal, como exemplo, é possível citar a WADA-AMA (2007), que propõe como mecanismos de ‘detecção de sexo e gênero’ testes para verificar a presença do hormônio do crescimento humano (hGH), pois cada ‘tipo de sexo’ (masculino ou feminino) deve ter um certo nível de presença desse hormônio em seu organismo. Desse modo, a partir de verificações via saberes biológicos, é possível determinar não apenas o doping em esportistas, mas, sobretudo, a que ‘tipo de sexo’ o atleta analisado pertence. Assim, é possível afirmar que testes para verificar o sexo de atletas via saberes de ordem biomolecular são relativamente recentes no campo do esporte de alto rendimento. No entanto, a presença de testes para verificar o sexo de atletas no esporte, não.

O teste para detecção de gênero e sexo iniciou em 1966 no Campeonato Europeu de Atletismo, em Budapeste, Hungria, mas essa era uma ‘preocupação’ já recorrente mesmo antes desse período. O teste era visual, as mulheres atletas eram compelidas a comparecerem nuas diante de médicos ginecologistas para uma inspeção genital visual. Dois anos depois, em 1968, o COI introduziu a mesma política nos Jogos Olímpicos de Verão e nos de Inverno.

No entanto, quando esse teste foi oficialmente retirado dos Jogos Olímpicos, em 1999, conclui-se que a comunidade internacional havia provocado somente uma grande confusão entre atletas mulheres e intersexuais […] O invasivo exame ginecológico foi substituído pelo de análise da cromatina sexual feito a partir da mucosa bucal coletada com uma lâmina e que passa por análise citológica. (SILVEIRA; VAZ, 2014, p. 461-462).

Na atualidade, esse teste se deve ao corrente uso desse hormônio por atletas masculinos e femininos para aumentarem suas performances esportivas, e é através dele que se torna possível verificar a presença e níveis de hGH para que, ao fim, “se busque a validação de marcadores para as diferenças de gênero” (WADA-AMA, 2007, p. 10). No entanto, tais procedimentos, por vezes, se mostram inconclusivos, e os próprios pesquisadores já evidenciaram “distintas alterações nos valores de hemoglobina tanto em competidores de esqui cross-country femininos como em masculinos” (WADA-AMA, 2002, p. 20). Sendo assim, tais variações nas alterações dos valores de hGH mostram a fragilidade dos critérios biológicos que estabelecem limites para definição do que é permitido ou não para um atleta masculino e feminino, e, por conseguinte, em sua classificação de sexo e gênero.

A mesma agência refere, em informações destinadas aos jovens sobre os perigos do uso de esteroides anabolizantes, os efeitos dessas substâncias em sujeitos de diferentes sexos, ressaltando que para os homens pode causar impotência, diminuição de esperma e da libido, enquanto para as mulheres pode causar traços masculinizados, aumento do clitóris e alterações no ciclo menstrual (WADA-AMA, 2008, p. 4). É possível percebermos, nos trechos acima, argumentos baseados em saberes biológicos com finalidades distintas para cada gênero. Para os atletas masculinos, por exemplo, enfatizam-se questões vinculadas à performance sexual, como impotência e libido. Já para as mulheres as alterações elencadas são relativas a ‘traços masculinizados’. Espera-se, portanto, uma relação direta e inequívoca entre sexo, gênero e sexualidade a partir de marcadores biológicos presentes nos corpos de atletas.

Isso está posto não apenas na atualidade dos registros da WADA-AMA, mas em boa parte da história do esporte moderno, pois, quando a mulher começou a participar de modalidades esportivas, em meados da década de 1930 (Silvana Vilodre GOELLNER, 2004), sempre houve provas esportivas separadas por sexo: masculino e feminino. No campo de estudos de gênero, tal modo de pensar essas diferenciações e representações é concebido como fundacionalismo biológico, porque atribui aos sujeitos identidades de gênero correspondentes às suas marcas corporais biológicas (NICHOLSON, 2000), tal como referido acima sobre os malefícios do uso de esteroides anabolizantes em atletas jovens.

É nesse cômputo que se inserem aqueles casos de atletas que possuem características corporais distintas daquelas que comumente se espera, ou pelo menos que o sentido dominante denomina como ‘masculinas’ ou ‘femininas’. A consequência disso é a confusão nas categorias tradicionais de identidade de gênero, colocando, assim, em dúvida e em suspeição a sua participação em competições esportivas oficiais não mistas. Tais casos, quando ocorrem, colocam em discussão não apenas as possibilidades de sexo, gênero e sexualidade no âmbito do esporte, mas, sobretudo, os discursos e mecanismos que sustentam tais definições.

O caso das corredoras Caster Semenya e María José Martínez-Patiño são exemplos dessa situação. A primeira passou por suspeita de identidade de sexo por ter características masculinas, porém não era portadora do cromossomo Y e, como efeito disso, foi confirmada como mulher. A segunda tinha todas as características femininas necessárias para ser intitulada como mulher, porém, ao realizar exame de determinação de sexo, verificou-se que era portadora de cromossomo Y, sendo, então, ‘descategorizada’ como mulher. Para além disso, ela acabou por ficar num ‘não lugar’, tendo em vista que também não era homem. Como bem salienta Anne Fausto-Sterling (2002), os testes utilizados pelo Comitê Olímpico Internacional não conseguem fazer aquilo que se pretende, que é determinar o sexo de alguém. “Não existe o isso ou aquilo. Antes, existem nuances de diferença, rotular alguém homem ou mulher é uma decisão social” (FAUSTO-STERLING, 2002, p. 15).

A limitação do modo de compreender os gêneros a partir de uma perspectiva somente biologicista acarreta essa ausência de posições para determinados sujeitos, tendo em vista o fato de que em tal marco aceita-se somente duas possibilidades: masculino ou feminino. Guacira Lopes Louro (2004, p. 209) corrobora esse argumento ao afirmar que tal modo de pensar, que é base, premissa e pressuposto do pensamento binário sobre sexo e gênero “institui uma consequência, afirma e repete uma norma, apostando em uma lógica binária pela qual o corpo, identificado como macho ou fêmea, determina o gênero”.

Aqueles corpos que não se encaixam nesse suporte binário de sexo e gênero acabam por ser tomados como “refratários - até heréticos. Eles não cabem naturalmente em classificações binárias; só o instrumento cirúrgico pode fazê-los caber.” (FAUSTO-STERLING, 2002, p. 15). Os corpos de que tratamos acima, das corredoras Semenya e Patiño, são encaixados nessa ambiguidade e indeterminação e, justamente por isso, devem ser postos à prova, mesmo que para isso se crie uma série de aparatos, saberes, técnicas e tecnologias para dar lugar a eles, ainda que esse lugar seja provisório.

Outros registros acerca das tentativas de regulação de sexo e gênero no esporte abundam em discussões culturais e científicas. Se insere nesse escopo, por exemplo, o que se convencionou denominar de ‘des-feminização’, processos compreendidos como práticas que, pela busca do aumento da performance esportiva de atletas mulheres, acabam gerando marcas corporais não classificadas adequadamente como femininas ou relacionais àquela identidade de gênero. Tal fenômeno dominou discussões no cenário esportivo em torno do mundo e gerou a necessidade, também, de realização de testes de ‘detecção de sexo e gênero’. Silveira e Vaz (2014) afirmam que, com a expansão da indústria fármaco-química das últimas décadas, assim como da manipulação dos hormônios e a criação dessas substâncias na forma sintética, uma nova gestão política e técnica do corpo, do sexo e da sexualidade, encontra lugar. Esse pressuposto se fundamenta na obra Testo junkie: sexo, drogas e biopolítica, de Paul Preciado (2018), no qual o autor disserta sobre os modos como, na modernidade, sexo e gênero foram modificados via “tecno-fabricação” dos corpos a partir da descoberta da testosterona sintética, dos esteroides anabolizantes e de toda uma infinidade de outras drogas que ele define como sendo da “era farmacopornográfica”, oriunda de um investimento biotecnológico da indústria química de manipulação hormonal.

Assim, as já desafiadoras ambiguidades de sexo e gênero no esporte ganham novos capítulos com o advento de tecnologias que fabricam outras possibilidades e realidades biológicas vinculadas às marcações de sexo, devendo, então, ser resolvidas a fim de que se mantenha a tão almejada divisão por sexo nas categorias esportivas. Como referem Silveira e Vaz (2019, p. 471), a respeito das marcações de sexo e gênero em mulheres esportistas atravessadas pelas possibilidades biotecnológicas, “se não houver feminilidade coerente com a matriz heterossexual, e se essas mulheres deixam de ser claramente diferentes dos homens, a integridade nas categorias homens e mulheres está perturbada […]”. Portanto, a relação causal que vincula uma matriz biológica com uma expectativa de gênero estabelecida nos corpos dos atletas no campo heteronormativo do esporte deve ser policiada para que seja efetivada.

Além disso, o advento das biotecnologias gênicas e as possibilidades de compreensão e manipulação dos seres humanos em nível molecular coloca mais desafios para os esportes. Como afirmam Carlos Roberto Bueno Júnior e Marcelo Gomes Pereira (2010, p. 231), a determinação do sexo de um(uma) atleta, “tema polêmico no esporte de alto rendimento e alvo de grandes discussões em diversos tribunais esportivos”, já pode ser resolvido com maior facilidade. Por meio da biologia molecular, seguem os autores, “é possível realizar um teste relativamente simples com este objetivo” (BUENO JÚNIOR; PEREIRA, 2010, p. 231).

Essas recorrências nos conduzem aos modos pelos quais o corpo pode ser atravessado pelos saberes das biotecnologias moleculares na produção de identidades de gênero. Bueno Júnior e Pereira (2010) comentam, ao revisar os usos da biologia molecular no esporte de alto rendimento, sobre o caso da corredora sul-africana Semenya, já comentado anteriormente, que ao consagrar-se campeã mundial aos 18 anos de idade em uma prova de 800 metros no Campeonato Mundial de Atletismo em 2009 atraiu a atenção internacional devido a sua constituição e aparência física, considerada forte e musculosa para uma mulher daquela idade. A fim de sanar toda e qualquer dúvida, a atleta foi submetida a um teste de sexo a partir de saberes da biologia molecular, e assim, foi constatado seu ‘verdadeiro sexo’.

Ora, o que parece estar em pauta aqui através das novas discursividades da biologia permeadas por saberes das biotecnologias gênicas é a final(mente!?) definição de sexo e, consequentemente, de gênero, encontrada a partir de testes biológicos que analisam a amplificação do cromossomo Y, “retirado mediante esfregaço bucal para a extração do RNA mensageiro deste tecido e [a] tentativa de amplificação por meio da reação em cadeia da polimerase (PCR)” de parte desse cromossomo, o qual é encontrado apenas nos homens (BUENO JÚNIOR; PEREIRA, 2010, p. 243). Não havendo presença desse cromossomo, está identificado o sexo e, então, o gênero do atleta - ou seja, o sexo é o gênero e vice-versa. Portanto, a definição de sexo e gênero se dá por meio de processos biológicos que deduzem tais acepções a partir da presença ou não de um determinado cromossomo, isto é, do cromossomo Y. Destacamos, aqui, como aporte para essa discussão, o seguinte trecho:

Se o caráter imutável do sexo é incontestável, talvez o próprio construto chamado “sexo” seja tão culturalmente construído quanto o gênero; a rigor, talvez o sexo sempre tenha sido o gênero, de tal forma que a distinção entre sexo e gênero revela-se absolutamente nenhuma. Se o sexo é, ele próprio; uma categoria tomada em seu gênero, não faz sentido definir o gênero como a interpretação cultural do sexo (Judith BUTLER, 2003, p. 25).

O caso de Semenya também expõe outra contradição do esporte de alto nível: o esporte requer, de forma contínua, “uma superação de performance, exigindo que as atletas sejam mais fortes, mais musculosas, mais rápidas. Ao mesmo tempo, essas mulheres precisam ser configuradas dentro dos padrões sociais heteronormativos, e com seu sexo comprovado” (SILVEIRA; VAZ, 2014, p. 466). Desse modo, na menção dos autores, as atletas que “desenvolvem músculos e força enfrentam o risco da virilização e da masculinização” (SILVEIRA; VAZ, 2014, p. 467). Frente a tal situação, surge a preocupação com a desmasculinização de seus corpos: independentemente do esporte, precisam se manter femininas.

As marcações de sexo tradicionalmente recorreram aos saberes biológicos para se efetivarem, e na atualidade recorrem, também, aos saberes de ordem molecular, calcados nas biotecnologias gênicas. O esporte, com a mesma matriz moderna, se alicerça nesse arcabouço para classificar seus atletas, e é desses processos que derivam as definições de esportistas masculinos e femininos. No entanto, os critérios para tais definições não dão conta das ambivalências e ambiguidades que são próprias dos seres humanos. E nisso reside o fato de que as estratégias de saber-poder, que vão na direção de conformação de identidades preditas, esperadas e almejadas, encontram formas de resistência que ocorrem tanto por parte da natureza como por parte da própria manipulação dela.

Se, por um lado, as técnicas, os saberes, os recursos, os mecanismos e as discursividades biológicas e biotecnológicas gênicas podem ser arcabouços de sujeição, no caso de atletas generificados, por outro, podem ser mecanismos de resistência, tendo em vista que as promessas das tecnologias gênicas se embasam justamente nas possibilidades de moldar o ser humano, alterando substancialmente sua natureza de modo artificial (RABINOW, 2002), a critério de seus próprios interesses. Talvez aqui resida, por exemplo, o caso de atletas transexuais como potencialidade conceitual perturbadora limitada pelos sentidos dominantes.

Biotecnologia molecular na construção da sexualidade: gênero como projeto político?

Uma política construída diretamente pelo bios arrisca-se

sempre a subordinar violentamente a bios à política

(ESPOSITO, 2017, p. 27).

A história recente da inserção de atletas trans vem causando litígios no cenário esportivo mundial. No cenário latino-americano, como ilustração para este ensaio, destacamos atletas como Jessica Millamán (hóquei na grama, Argentina), Mara Gómez (futebol, Argentina), Yanelle Zape Mendonza (atletismo, Colômbia), Tiffany Abreu (voleibol, Brasil) e Ignacia Trinidad Rozas (atletismo, Chile). Essas atletas são bons exemplos das tensões que este estudo analisa, por terem feito a transição de gênero via alterações físicas e biológicas, grosso modo, são sujeitos que nasceram física e biologicamente como homens e posteriormente tornaram-se mulheres, o que, segundo discursividade biológica, apresenta vantagens físicas (vantagens musculares expressas em força, velocidade e potência) sobre suas adversárias. Os argumentos e posicionamentos em relação a esses casos foram diversos, porém, os que nos interessam são aqueles relacionados ao empoderamento de pessoas trans pautados sempre pela argumentação de cunho biológico sobre a influência no desempenho físico.

Inclusive os argumentos contrários a esse discurso também são evidenciados para mencionar que não há vantagens. Em janeiro de 2020, aos 23 anos, Mara Gómez foi contratada pela equipe do Club Atlético Villa San Carlos, da cidade argentina de La Plata, para disputar a liga profissional argentina de futebol feminino. O time do Villa San Carlos era o lanterna do campeonato dentre dezessete equipes e contratou Mara para tentar uma reabilitação no segundo turno evitando assim o rebaixamento para a segunda divisão. Sobre algumas de suas características atléticas, uma matéria jornalística publica as palavras do treinador da equipe que diz o seguinte sobre Mara Gomez: “É rápida e tem ótima finalização. Ao contrário do que as pessoas pensam, ela não é tão forte. Tenho várias meninas que são muito mais fortes e, mesmo sendo rápida, tenho meninas que são mais rápidas. É inteligente, aprende rápido. E ela faz gol, que é o que nos falta”, descreveu o técnico do clube, Juan Cruz Vitale (ISTO É, 2020).

Em um escopo semelhante, o caso da também argentina Jessica Millamán tensionou o hóquei de grama quando foi impedida em 2014 de participar dos torneios femininos na sua cidade. O motivo? A sua genitália: Jessica nasceu com pênis. A questão é que na Argentina qualquer cidadão maior de idade ou menor, acompanhado pelos seus progenitores ou tutores, pode escolher a sua identidade de gênero automaticamente, graças à Lei 26.743, conhecida como a Lei de Identidade de Gênero. Jessica, já na maioridade, optou pela identidade feminina, e a partir daí queria competir como tal. O caso chegou até à justiça civil e inclusive ao Comitê Olímpico Internacional, determinando que ela, sendo juridicamente mulher, podia jogar no time feminino de hóquei, abrindo precedente internacional de que a divisão esportiva, pelo menos em alguns esportes, não é genital ou sexual, mas de gênero.

Dentre os argumentos apresentados sempre sobressaem aqueles relacionados à diferença biológica do corpo dessas atletas e suas implicações na performance esportiva, um posicionamento político sustentado pela racionalidade científica da biologia e da fisicalidade, tendo como pano de fundo, as Ciências Naturais. No caso particular da atleta brasileira de voleibol Tiffany, o argumento da potência biológica se acentua ainda mais, já que ela jogou profissionalmente como homem, e na sequência também como mulher, o que provocou também o debate no interior do esporte: no final das contas, por que dividir as competições por sexo?

No texto “Dilemas insurgentes no esporte: as práticas esportivas dissonantes” Wagner Xavier de Camargo (2016) pondera os corpos dissonantes a partir dos Gay Games e dos jogos paralímpicos para discutir em que medida tais práticas esportivas teriam potencial disruptivo em relação a uma normatividade instituída. Sobre as múltiplas categorizações do esporte, o autor atenta que:

Pensando num futuro em que as categorias “sexo/gênero”, “eficiência”/“deficiência”, “masculino”/“feminino”, “juvenil”/“máster” fossem eliminadas dos sistemas de competição tanto de esportes individuais como coletivos, seria preciso pensar nos modos de pontuação, controle de resultados, classificação e, no limite, seria preciso ressignificar a ideia de competição, do modo como a conhecemos atualmente no esporte-espetáculo. (CAMARGO, 2016, p. 1.347).

Na esteira desse debate, faz-se necessário abarcar o conhecimento acerca das diversas manifestações esportivas, enfatizando o alto rendimento, as discursividades e seus mecanismos reguladores, como as federações esportivas e a Agência Mundial Antidoping (WADA-AMA). Nesse sentido, é preciso destacar que todas essas atletas sul-americanas trazidas ao texto cumprem com o que está previsto nos regulamentos nacionais e internacionais sobre a participação de atletas, logo, os clubes que as contratam não estão agindo de modo irregular. No texto dos regulamentos é abordada a participação de atletas trans, desde que estas estejam em tratamento hormonal há no mínimo doze meses, como é o caso das atletas aqui citadas.

Em 2016, o Comitê Olímpico Internacional (COI) alterou sua resolução para permitir a participação de pessoas trans em competições internacionais, desde que atendessem às exigências clínico-hormonais imputadas pela entidade (como terapia hormonal de controle do nível de testosterona no sangue, por exemplo). Sua resolução anterior, mais rígida e que datava de 2004, exigia a cirurgia de mudança de sexo completa, terapia hormonal direcionada e o reconhecimento legal da mudança emitido pelo país de origem do(a) atleta, o que dificultava a participação de atletas trans e mantinha-os reclusos a competições específicas, como o Gay Games (Rafael Marques GARCIA; Erik Giuseppe Barbosa PEREIRA, 2019, p. 1).

A corredora chilena Ignacia Trinidad Rozas também cumpre com o que consta na regulamentação do COI; no entanto, o COI dá total liberdade para os países e suas respectivas federações de permitir ou não a participação de atletas trans em suas competições. Todavia, o Chile ainda não está permitindo tal inserção. No dia 8 de março de 2019, em um cerimonial em homenagem ao dia da mulher, a atleta Ignacia foi condecorada no Palacio de La Moneda (sede da Presidência da República do Chile). Cada ministro chileno fez a indicação de uma mulher para ser homenageada, a indicação do nome de Ignacia foi feita pela Ministra do Esporte, Pauline Kantor Pupkin. A escolha da ministra se deu pela luta da corredora Ignacia Livingstone para tentar se tornar a primeira atleta trans do Chile.

O depoimento da atleta acarretou o convite para treinar no Club Atlético de la USACH, contudo, por questões políticas, Ignacia ainda não pode competir oficialmente, mesmo já tendo passado pelo tratamento hormonal durante um ano. A batalha para se converter na primeira transexual a competir oficialmente em seu país gerou uma parceria entre a Federação Chilena de Atletismo (FEDACHI) e o Movimiento de Integración y Liberación Homosexual (MOVILH) para a elaboração de “un protocolo para que los deportistas que vivieran una condición similar pudieran unirse al deporte sin mayores trabas, siempre y cuando cumplieran con los niveles hormonales que World Athletics exige” (Ignacio LEAL, 2020).

Para o COI a fisicalidade deixou de ser um impedimento uma vez que regulamenta que não é necessário fazer a cirurgia de mudança de sexo para disputar competições femininas. Mas, o corpo não abandonou a sua interpretação como biologia: para o COI, para ‘ser mulher’ basta que a atleta tenha um nível de testosterona abaixo de 10 nanomols por litro de sangue. Todas as atletas sul-americanas aqui citadas foram ou são testadas regularmente e quando competem estão em cumprimento com as regras. No entanto, a polêmica não para por aí, uma série de críticas dos opositores a essas participações afirmam que apenas doze meses de tratamento hormonal, nesse caso, não altera significativamente o corpo da atleta. Vejamos o que se passou com Tiffany no cenário do voleibol brasileiro.

A divergência entre especialistas em fisiologia do esporte e endocrinologia é sobre os ganhos de Tiffany antes do tratamento hormonal, e se isso daria a ela uma vantagem em relação às outras atletas. De acordo com os médicos, ao se submeter ao tratamento Tiffany comprovadamente perdeu força, velocidade e resistência. Por outro lado, a transição de Tiffany se deu quando ela completou 30 anos. Coração, pulmões, parte óssea e musculatura foram formados com produção hormonal masculina (GLOBO ESPORTE, 2018).

Tais argumentos colocam em evidência a polêmica envolta com os processos de transformação do sexo de atletas, e baseiam-se, unicamente, em lógicas e racionalidades biológicas. Essa problemática de ser homem ou mulher via níveis de testosterona também foi alvo da nova regulamentação da Federação Internacional de Atletismo. Em novembro de 2018 a instituição que regulamenta o atletismo mundial, a International Association of Athletics Federations, sinalizou novas regras que seriam aplicadas para atletas femininas que produzem altas taxas de testosterona de forma natural. O documento regulamenta que as mulheres com hiperandrogenismo - distúrbio endócrino caracterizado pelo excesso de andrógenos como testosterona - serão obrigadas a tomar medicamentos para reduzir as taxas de testosterona. Isso atingiu diretamente a atleta Caster Semenya, bicampeã olímpica (2012 e 2016) e tricampeã mundial (2009, 2011 e 2017) dos 800 metros rasos, que se manifestou: “Lamento muito ter sido colocada novamente como alvo. Não quero falar novamente sobre essa regra, somente quero correr ao natural, sem medicamentos, como eu nasci” (UOL, 2018).

Por outro lado, é preciso frisar que os processos pedagógicos de iniciação esportiva, assim como competições esportivas vinculadas às categorias de base de atletas também implicam em formações de gênero distintas, e nesses processos existem diferenças em relação aos modos de ensinar e de participar de determinado esporte. Assim, o processo de formação de um atleta passa por mais de dez anos de práticas diárias de esportes relacionados a um modelo desportivo marcado por um projeto de gênero, com performances técnicas, táticas e físicas particulares, e essa formação não é possível de ser alterada com tratamento e terapia ao longo de doze meses.

A ausência de discussão no que tange à influência dos processos pedagógicos de iniciação e formação esportiva no desempenho esportivo dessas atletas é compreensível frente ao peso atribuído somente às características biológicas, visto que a partir do século XIX há uma tomada de poder sobre o humano via estatização do biológico (ESPOSITO, 2017). A biologia então passa a ser um componente de jurisdição política. Biomedicina e direito se entrelaçam passando a ditar os parâmetros políticos de corpos aptos a serem ou não esportivos. O esporte não fica imune a esse processo, pois também pauta exacerbadamente sua política na biologia do corpo, a biocracia esportiva gira em torno de utilização de um esquadrinhamento quantitativo do corpo biológico para gerir os critérios de suas ações estabelecendo assim a norma. Qual o objetivo por trás dessa biologização do esporte? Fazer do mundo esportivo um tecido biopolítico contínuo, e, em todo esse processo, quem vigia é a norma.

Nesse sentido, Tiqqun (2019) afirma que o que mais importa no dispositivo é a norma: “O que é preciso compreender, com efeito, é que todo dispositivo funciona a partir de um casal - inversamente, a experiência mostra que um casal que funciona é um casal que faz dispositivo” (TIQQUN, 2019, p. 232-233). Um casal, e não um par ou uma dupla, pois todo casal é assimétrico, comporta um maior e um menor.

O maior no dispositivo é a norma. O dispositivo agrega o que é compatível com a norma pelo simples fato de não o distinguir, de deixá-lo imerso na massa anônima, portadora do que é “normal” […] O termo menor no dispositivo será, portanto, o anormal. É isso que o dispositivo faz existir, singulariza, isola, reconhece, distingue e então reagrega, mas enquanto desagregado, separado, diferente do resto dos fenômenos (TIQQUN, 2019, p. 233).

Entrementes, Esposito (2017) nos alerta que, a esse primeiro trânsito categorial do dispositivo, segue-se um segundo. E esse segundo está destinado a deslocar a anormalidade do terreno intraespecífico para as fronteiras da mesma dimensão humana. Ou seja, dizer que o degenerado é um anormal significa empurrá-lo para uma zona de indistinção não inteiramente compreendida pela categoria de ‘homem/ser humano’ - o abjeto. “Ou, talvez melhor, ampliar essa última até incluir sua própria negação: o não homem do homem, ou seja, o homem-besta” (ESPOSITO, 2017, p. 151).

A interpretação do corpo como biológico funciona como dispositivo esportivo para homogeneizar os corpos: o corpo do esporte é universal. Na decisão ontológica esportiva moderna a biologia ganha um papel metafísico, porque ela passa a ser o juiz que define quem é homem e quem é mulher no corpo transexual. O esporte é um mundo de possibilidades, porém, a universalização do corpo via biologia parece confiscar a pluralidade de outros corpos, dada a predominância de um modo de existência universal que tende a abortar justamente a emergência de outros modos de existência.

O que os dispositivos materializam é apenas a mais notória das imposturas da metafísica ocidental, que se condensa no adágio “a essência precede a existência”. Para a metafísica, o existente é somente um predicado da essência: inclusive, de acordo com ela, todo existente só atualizará uma essência, esta que será para ele primeira. Segundo essa doutrina aberrante, a possibilidade, isto é, a ideia, precederia as coisas; cada realidade seria um possível que, além disso, adquire a existência (TIQQUN, 2019, p. 244-245).

Por isso a estética causada pelo corpo ‘anormal’ dessas atletas tem uma potência política para se pensar o corpo no esporte, pois ele cria novas formas de territorialização à medida que reconfigura nossas percepções a ponto de nos questionarmos se tais práticas poderiam ser o prenúncio de novas estéticas corporais no esporte. A conquista dessas atletas nos faz pensar o ‘patológico’ ou o ‘anormal’ como possibilidade de ampliação de fronteiras, uma nova ‘norma’ de corpo, ou seja, uma nova ‘norma’ de vida.

Outro dado importante no que tange à fisicalidade dessas atletas é o fato de que algumas delas se submeteram às mais variadas cirurgias de feminização. Tomemos aqui como exemplo as atletas Yanelle e Tiffany.

A colombiana Yanelle Zape Mendoza, em 2015, gerou uma expressiva expectativa diante da possibilidade de se tornar a primeira atleta trans a participar de uma Olimpíada. Anteriormente, a corredora entrou para a história de seu país ao ser a primeira desportista trans a competir em uma competição oficial na Colômbia. O sonho de competir nas Olimpíadas do Rio de Janeiro em 2016 não foi alcançado, pois a atleta não conseguiu atingir os índices estipulados pela Federação Colombiana de Atletismo (FECODATLE) para correr os 100 e os 200 metros rasos na citada competição. Os índices eram, respectivamente, de 11,32 e de 23,20 segundos. A transição de mudança de sexo de Yanelle começou em 2011, na Espanha, onde vivia, e depois continuou com as intervenções cirúrgicas na Suíça. A atleta, nascida em Cali, “redujo la nuez de Adán, se hizo una mamoplastia, también la orquiectomía - extirpación de los testículos - y luego la vaginoplastia, no sin antes realizar terapia hormonal y tener sesiones con siquiatras y sicólogos” (Jheyner A. DURANGO, 2016). Além disso, Yanelle espera pela segunda cirurgia de voz para diminuir a entonação do agudo que coloca em dúvida seu ‘já ser mulher’.

De igual modo, Tiffany Abreu “revelou em suas redes sociais que passou por uma cirurgia de feminização facial, um procedimento que suaviza traços do rosto para deixá-lo com aspecto mais feminino” (VEJA, 2018). A ‘anormalidade’ do corpo ‘híbrido’ de Yanelle e Tyffany as transformaram em monstros sob as lentes da modernidade. Na mitologia, o termo grego Hybris (deusa que para os gregos personificava o exagero e a insolência) remete à ideia de ligação, em que a mistura de coisas de ordem distintas resulta em algo excessivo, ou algo em falta. De tal modo, isso está ligado com o termo monstro, presente tanto na mitologia, quanto na ciência moderna (Cláudia MADEIRA, 2010). Para escapar à sina de suas anatomias Yanelle e Tiffany recorreram à cirurgia estética.

No recurso à cirurgia estética, é perceptível o cruzamento de uma exigência normativa própria a um grupo social, a determinado momento de sua história, por um lado, e, por outro, a singularização dessa norma em um indivíduo particular que se forjou um ideal e procura, com ou sem razão, realizá-lo concretamente (David LE BRETON, 2019, p. 289-290).

Estas mudanças corporais via cirurgia estética encontram eco num dos itens da resolução de 2004 do COI que estabelecia regras para que atletas transexuais pudessem ser incluídos(as) em competições olímpicas. Uma das regras dizia que os(as) atletas deviam possuir em sua fisicalidade características corporais equivalentes ao gênero em que se harmonizaram para viver. Por isso que essa resolução exigia, por exemplo, a vaginoplastia. No entanto, a resolução de 2004 cedeu lugar à de 2016, já descrita anteriormente.

Todavia, esses dados nos permitem perceber que no território esportivo o que parece perdurar é a forma como se exibe um determinado tipo de feminilidade/masculinidade, ou seja, o modo como a fisicalidade ainda é forte vetor de identidade de gênero. O caso dessas atletas que se submetem a cirurgias para se tornarem mais femininas escancaram essa afirmação, uma vez que a reparação de seus corpos reafirma uma cultura na qual a atividade esportiva não pode comprometer a heterossexualidade. Talvez a ameaça não seja os homens realmente tornarem-se mulheres - ou vice-versa - por meio das biotecnologias gênicas, ou de uma cirurgia de mudança de sexo - biotecnologia molar. O que parece ser mais perturbador é a não existência de uma estabilidade na distinção entre homens e mulheres.

Considerações finais

Procuramos interpelar como ocorrem os processos de definição de identidades sexuais e de gênero no campo do esporte, problematizando alguns registros esportivos relacionados a essa temática e destacando que são os saberes de cunho biológico aqueles privilegiados para realização dessas produções. Situamos as discussões à luz de teorizações construcionistas de gênero que permitem interrogar o caráter fabricado desses projetos de sujeito, os quais implicam numa tentativa de controle e territorialização das ambiguidades e ambivalências que constituem as subjetividades nas suas diferentes formas de existência e experiências que constituem potências limitadas dos corpos. Entendemos que o esporte, enquanto produto da modernidade, é um terreno propício para esses debates, pois opera uma serie de estratégias de produção de identidades generificadas a partir de saberes biológicos e, em última escala, de ordem gênica e molecular.

Ressaltamos que os corpos de atletas trans tomados como dissidentes da norma são atravessados pela biologia e fisicalidade. No caso de atletas transexuais se busca, via terapia exigida para validação da participação dessas atletas nos esportes regulamentados, um tipo de (re)naturalização do corpo e da vida. Aqui se instala um paradoxo, pois a biologia e a fisicalidade são atravessadas pela técnica que as desafiam e as alteram potencializando-as (limitadamente) para além da vida absolutamente natural. Ou seja, como hipotetizar uma política esportiva a partir do biológico se este já não pertence à dimensão do natural visto que é manipulado pela técnica? Como aplicar um artifício à natureza sem desnaturalizá-la?

Compreender o corpo de atletas trans e os demais ‘não corpos do esporte’ via leitura histórica das políticas que os fixaram e legitimaram como ‘inferiores’ ou ‘anormais’ é um passo importante para desnaturalizar o naturalizado e tirá-los das ‘sombras’ - tornando-os visíveis. O corpo como suporte material da política deve ser o ponto de partida para se pensar práticas esportivas pautadas na ética e na estética de corpos particulares, de corpos que resistem a uma modernidade que os fabrica em série para fazer girar as engrenagens das categorias e da norma. Entendemos que o caminho a transitar pressupõe aprofundar a separação da fisicalidade da conceptualização do corpo e, finalmente, com toda a potência, reconfigurar a relação do corpo com a biologia. Concebemos que os conhecimentos biológicos em suas diferentes formas podem permitir importantes saberes sobre o corpo, mas que destes saberes não façamos usos para reduzir e subjugar indivíduos em determinados projetos de sujeito, nesse caso, de sexo e gênero.

É preciso que estejamos atentos aos processos de homogeneização e naturalização dos sujeitos em seus corpos pelo uso de saberes biológicos, tendo como consequência uma ‘universalização’ das subjetividades. Para isso, é fundamental distinguir o corpo como biologia das condições biológicas do corpo para não reproduzir os limites das potencialidades dos corpos.

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Como citar este artigo de acordo com as normas da revista: ZOBOLI, Fabio; MANSKE, George Saliba; GALAK, Eduardo. “A generificação dos corpos de atletas trans e políticas de biologização do sexo”. Revista Estudos Feministas, Florianópolis, v. 29, n. 2, e79304, 2021.

Financiamento: Não se aplica.

Consentimento de uso de imagem: Não se aplica.

Aprovação de comitê de ética em pesquisa: Não se aplica.

Recebido: 03 de Fevereiro de 2021; Aceito: 29 de Abril de 2021

zobolito@gmail.com

george_manske@univali.br

egalak@fahce.unlp.edu.ar

Fabio Zoboli (zobolito@gmail.com) é doutor em Educação pela Universidade Federal da Bahia (UFBA), com pós-doutorado em Educação do Corpo pela Universidad Nacional de La Plata (UNLP, Argentina). Professor do Departamento de Educação Física e do Programa de Pós-graduação em Educação (PPGED) da Universidade Federal de Sergipe (UFS).

George Saliba Manske (george_manske@univali.br) é doutor em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Professor do curso de Educação Física e dos Programas de Pós-graduação em Educação (PPGEDU) e em Saúde e Gestão do Trabalho (PPGSGT) da Universidade do Vale do Itajaí (UNIVALI). Coordenador do Grupo de Estudos e Pesquisas em Estudos Culturais (GEPEC/CNPq).

Eduardo Galak (egalak@fahce.unlp.edu.ar) é doutor em Ciências Sociais pela Universidad Nacional de La Plata (UNLP, Argentina), com pós-doutorado em Educação, Conhecimento e Integração Social pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG, Brasil). Mestre em Educação Corporal pela UNLP. Pesquisador Adjunto do Consejo Nacional de Investigaciones Científicas y Tecnológicas (CONICET, Argentina). Professor ordinário da UNLP, atuando na graduação e na pós-graduação.

Contribuição de autoria: os autores contribuíram igualmente

Conflito de interesses: Não se aplica

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