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Revista Estudos Feministas

versão impressa ISSN 0104-026Xversão On-line ISSN 1806-9584

Rev. Estud. Fem. vol.29 no.2 Florianópolis maio/ago 2021  Epub 10-Maio-2021

https://doi.org/10.1590/1806-9584-2021v29n279318 

Seção Temática Gênero, tecnologias e (novas) formas de subjetivação nas práticas esportivas

Tribuna 77 e a defesa de LGBTQI+ nos estádios

Tribuna 77 and the Defense of LGBTQI+ in the Stadiums

Tribuna 77 y la defensa de LGBTQI+ en los estadios

Luiza Aguiar dos Anjos1 
http://orcid.org/0000-0002-4885-0763

1Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais, Timóteo, MG, Brasil. 35180-008 - dfg-tm@cefetmg.br


Resumo:

O futebol é um esporte historicamente associado aos homens e à masculinidade cis-heteronormativa. O engajamento daqueles que não se adéquam a esse modelo faz-se, então, cercado de obstáculos. Recentemente, alguns coletivos de torcedores têm proposto alternativas às formas hegemônicas de vivência desse esporte, com vias a torná-lo menos excludente a diversos grupos, inclusive à população LGBTQI+. Neste texto de caráter descritivo, analiso os posicionamentos acerca de tal pauta por um desses grupos: a torcida gremista Tribuna 77. Utilizei como fontes uma entrevista com um de seus integrantes e as publicações realizadas em sua página no Facebook. Verifiquei que a torcida defende noções de diversidade e pluralidade partindo do pressuposto de que esses valores são inerentes a uma ‘cultura de Grêmio’, argumento especialmente endossado pelo pregresso acolhimento a uma torcida gay, a Coligay.

Palavras-chave: futebol; torcida; homossexualidade; homofobia

Abstract:

Football is a sport historically associated with men and cis-heteronormative masculinity. The engagement of those who do not fit this model is then surrounded by obstacles. Recently, some supporters’ groups have proposed alternatives to the hegemonic ways of experiencing this sport, intending to make it less exclusive to different groups, including the LGBTQI+ population. In this descriptive text, I analyze the positions on such an agenda by one of these groups, the Grêmio supporters’ group Tribuna 77. I used as sources an interview with one of its members and the publications made on its Facebook page. I found that they defend notions of diversity and plurality based on the assumption that these values are inherent to a ‘culture of Grêmio’, an argument especially endorsed by the previous reception of a gay supporters’ group, Coligay.

Keywords: Football; Supporters’ groups; Homosexuality; Homophobia

Resumen:

El fútbol es un deporte históricamente asociado con los hombres y la masculinidad cis-heteronormativa. El compromiso de quienes no se ajustan a este modelo se ve rodeado de obstáculos. Recientemente, algunos grupos de aficionados han propuesto alternativas a las formas hegemónicas de vivir este deporte, con formas de hacerlo menos exclusivo para diferentes colectivos, incluida la población LGBTQI+. En este texto descriptivo, analizo las posiciones sobre tal agenda de uno de estos grupos: el hinchada del Grêmio Tribuna 77. Utilicé como fuentes una entrevista con uno de sus miembros y las publicaciones realizadas en su página de Facebook. Encontré que la multitud defiende las nociones de diversidad y pluralidad partiendo del supuesto de que estos valores son inherentes a una ‘cultura de Grêmio’, un argumento especialmente respaldado por la recepción previa de una hinchada gay, Coligay.

Palabras clave: fútbol; hinchada; homosexualidad; homofobia

Introdução

Não é novidade que o futebol masculino é um espaço permissivo a manifestações homofóbicas.1 O preconceito também se materializa na imposição de que os atletas, protagonistas do jogo, necessariamente são ou devam ser heterossexuais. Tabu e polêmica são palavras comumente acionadas para abordar a presença de homossexuais nesse esporte (Luiza Aguiar dos ANJOS, 2014), muitas vezes tratada no campo das hipóteses dada a crença no funcionamento da heterossexualidade compulsória. Assumir-se gay é visto como um risco à carreira e à segurança dessas pessoas. Mesmo performar uma masculinidade que não coadune com a virilidade esperada e valorizada é prejudicial. Não à toa são raros os jogadores que tornam pública sua homossexualidade, o que se denomina informalmente como ‘sair do armário’. No Brasil, não há exemplos nos grandes clubes. A exceção nacional é o goleiro Jamerson, de apelido Messi, que atuou em equipes de pequena expressão do Campeonato Potiguar. Não há também dirigentes e treinadores publicamente assumidos.

Encontra-se aí um exemplo de funcionamento emblemático da cis-heteronormatividade, o conjunto de prescrições que sob as matrizes heterossexual e cisgênera impõe-se como organizadora de nossa subjetivação, em um modelo supostamente coerente, superior, natural (Amana Rocha MATTOS; Maria Luiza Rovaris CIDADE, 2016). Apesar disso, há resistências que emergem dentro da própria dinâmica das redes de poder (Michel FOUCAULT, 2012).

Vem da arquibancada o exemplo de maior sucesso na participação de pessoas LGBTQI+2 no futebol brasileiro: a Coligay. Foi uma torcida do Grêmio (RS) que esteve em atividade entre 1977 e os primeiros anos da década seguinte. Enfrentando e subvertendo a tradição de virilidade da cultura gaúcha (Ruben George OLIVEN, 1992), ostentava a homossexualidade em seu nome e em suas performances orgulhosamente ‘afeminadas’, ornando kaftas e adereços espalhafatosos, entoando músicas irônicas e emitindo gritos histéricos. Encontrou dificuldades, mas conseguiu se manter na arquibancada, conquistar o respeito de outros gremistas, obter uma sala no estádio para seus materiais, participar de desfiles institucionais e ser frequentemente elogiada nos periódicos locais por seu apoio e fidelidade (Luiza Aguiar dos ANJOS, 2018).

Foi extinta por questões particulares. Desarticulou-se em decorrência da saída de seu líder. Parece, entretanto, improvável que fosse capaz de continuar atuando por muito mais tempo. Nos anos seguintes, estádios e torcidas organizadas (TO) seguiram um movimento de crescente ‘masculinização’, tanto pela redução do público de mulheres, como pela exaltação cada vez maior de valores viris (Fernando da Costa FERREIRA, 2017). Aumentaram também os episódios de violência (FERREIRA, 2017; Rosana da Câmara TEIXEIRA, 2003).

O fato de que outras torcidas gays daquele período também parecem ter acabado ao longo da década de 1980, não havendo dados de suas existências nos anos seguintes, é um indício a favor dessa hipótese (ANJOS, 2018), e não se tem notícia de outras agremiações formadas desde então. Outro sinal é o insucesso da Fla-Gay. Líderes dessa torcida do Flamengo (RJ) anunciaram a intenção de sua fundação em 1979, a qual nunca chegou a se concretizar devido à intensa resistência de outras torcidas organizadas, endossadas pelo então presidente do clube, Márcio Braga (Maurício Rodrigues PINTO, 2017; ANJOS, 2018).

Nos últimos anos, é possível identificar uma série de iniciativas que promovem desestabilizações na primazia cis-heteromasculina do futebol. Equipes e ligas que congregam LGBTQI+s, movimentos de mulheres torcedoras, ações de repúdio ao machismo e à homofobia, ‘saídas do armário’ de jogadores estrangeiros, desenvolvimento do futebol de mulheres etc.

Apesar disso, sujeitos cujos corpos não se adéquam à norma continuam receosos quanto a frequentar estádios. Dois episódios recentes justificam o sentimento. Em 2014, surgiram, na rede social Facebook, comunidades de torcedores que se posicionam contra o machismo e a homofobia. As autointituladas ‘torcidas queer’ ou ‘torcidas livres’ foram alvo de inúmeras ameaças e hostilidades, o que fez com que optassem por não levar suas manifestações à campo (PINTO, 2014). Em 2017, por sua vez, a torcida Banda Alma Celeste, do Paysandu, estendeu na arquibancada uma bandeira com as cores do arco-íris, símbolo LGBTQI+, em apoio a uma ação do governo do estado de combate ao preconceito. O gesto gerou revolta em membros de outra torcida organizada do clube, a Terror Bicolor, que os agrediram como represália.

Em que pesem os exemplos evidenciarem reações violentas à iminência de convívio com pessoas, performances e valores divergentes aos atualmente hegemônicos demonstram também que há grupos interessados em contrapor essa lógica. Este texto tem como objetivo analisar as ações de um coletivo que vem atuando nesse sentido: gremistas da Tribuna 77. Discuto acerca de seus posicionamentos e estratégias referentes à presença de pessoas LGBTQI+ no futebol e à homofobia, e, sob seu ponto de vista, de que modo suas ações têm sido recebidas.

Explicito que não ignoro a multiplicidade e fluidez dos processos de subjetivação e identificação de pessoas LGBTQI+. Assim, reconheço a identidade política reivindicada por esse grupo e as aproximações entre diferentes sujeitos que o compõem baseadas em rupturas com normas de gênero e/ou sexualidade, mas não compactuo com uma noção essencialista, estável, fixa ou única sobre suas performances, identificações, experiências e demandas.

De forma complementar, quando remeto à uma identidade torcedora também pressuponho que há diversas e contingentes formas de vínculo clubístico e de sua manifestação.

Por fim, é importante mencionar que o Grêmio é um clube com origens germânicas e que ao longo de sua história adquiriu certa fama de racista, da qual busca se livrar com maior ou menor esforço conforme o período e as circunstâncias. Nos últimos anos, em especial após o episódio de racismo que protagonizaram contra o goleiro Aranha, é evidente a intensificação de tal preocupação (Gustavo Andrada BANDEIRA, 2019). A resposta envolve defender uma tradição de pluralidade, não apenas rememorando e valorizando negros importantes de sua história, mas também sua antiga torcida gay (ANJOS, 2018).

A escolha da Tribuna 77 é pertinente por ser uma torcida que dota de legitimidade e reconhecimento no universo do futebol porto-alegrense, em especial no que se refere a uma postura crítica. Observações informais demonstram que torcedores, meios de comunicação e o próprio clube - que já a convidou para reuniões - a reconhecem como uma torcida militante em pautas atribuídas ao espectro político da esquerda, entre as quais o combate à homofobia. Pessoas e grupos contrários a suas posições, por outro lado, tentam ameaçá-la e desqualificá-la, evidenciando que a legitimidade não é consensual e se encontra sob disputa. Tal torcida, assim, tenta desnaturalizar a cis-heteromasculinidade do torcer hegemônico, defendendo formas alternativas que proporcionam maior acolhimento a sujeitos historicamente rejeitados, uma iniciativa alinhada a tantas outras manifestações contemporâneas que têm emergido no universo esportivo em defesa da apropriação desse espaço por outros corpos.

Como fontes, recorro a uma entrevista de um de seus integrantes, Roger Canal, e de postagens da página do coletivo no Facebook no intervalo de março de 2016, quando foi criada, a abril de 2020. Utilizo também observações de uma partida assistida junto ao grupo na Arena Grêmio em 2017.3

A entrevista seguiu os princípios teórico-metodológicos da História Oral (Verena ALBERTI, 2010). O integrante em questão é um dos fundadores e uma liderança orgânica do grupo, que não possui hierarquia formalizada. Foi indicado por vários gremistas como ideal para retratar a trajetória e princípios da torcida, e se mostrou acessível quando fiz contato.4 Segui a perspectiva da História Oral temática, partindo de um assunto específico e preestabelecido, a fim de acessar as memórias do entrevistado sobre uma questão particular: a atuação militante da Tribuna 77, em especial com relação às questões afeitas à população LGBTQI+. Me interessava também compreender seu engajamento na rememoração da torcida Coligay.

A entrevista foi realizada em uma tarde de 15 de agosto de 2017, em uma lanchonete de Novo Hamburgo (RS), data e local escolhidos pelo entrevistado. Nosso diálogo foi gravado e passou pelas seguintes etapas: transcrição, conferência de fidelidade, copidesque, pesquisa (inserção de notas de rodapé, que contextualizam ou explicam palavras, expressões ou citações mencionadas), conferência pelo entrevistado (que tem liberdade para fazer alterações no texto), assinatura da carta de cessão, revisão final e publicação no repositório digital da Universidade a que o projeto de pesquisa está vinculado.

A utilização do conteúdo da página do Facebook da torcida é pertinente diante da notável presença digital de agrupamentos torcedores cujo ideário político possui grande centralidade, casos de torcidas antifascistas e torcidas queer ou livres, por exemplo (Alison Rodrigues SOARES; Luiz Felipe ZAGO, 2018; PINTO, 2014).

Explicito que os comentários e formas de interações (curtidas e compartilhamentos) não foram considerados no corpus, pela viabilidade da pesquisa - dado o amplo volume de comentários - e prioridade atribuída nas mensagens oferecidas pela Tribuna em detrimento da resposta dos receptores que com ela interagiam.

Em maio de 2020, a página da torcida contava com 6.971 curtidas e 7.075 seguidores. Para fins de comparação, a Geral, maior torcida do clube, possuía 571.105 curtidas e 574.872 seguidores. Ela é alimentada regularmente, geralmente com duas ou três postagens semanais. Os conteúdos publicados são escritos por determinados integrantes do grupo, é uma responsabilidade compartilhada. A equipe que participa da escrita varia conforme o momento, tendo de duas a seis pessoas diferentes, dentre as quais - mas nunca apenas - se encontra Roger. Eventualmente, há textos elaborados de forma colaborativa por membros do grupo de WhatsApp da Tribuna.5 Os conteúdos envolvem as partidas (das equipes masculina e feminina) ou ações extracampo do Grêmio, atividades da torcida e suas manifestações na arquibancada, posicionamento do grupo sobre temas diversos, datas comemorativas nacionais ou mundiais, datas comemorativas do futebol, registros de episódios antigos da história do clube.

Me debruço sobre esse conteúdo a partir da perspectiva de uma análise discursiva (Stuart HALL, 1997), preocupada em compreender como o conhecimento produzido pelos discursos - tomados sob uma perspectiva foucaultiana - relacionam-se com o poder, regulando condutas, construindo identificações e subjetividades, bem como definindo a forma como as coisas são representadas, pensadas, praticadas. Dialogo com produções sobre futebol e torcidas, analisadas sob o viés das Ciências Humanas e Sociais. A dimensão de gênero e sexualidade é pautada nos Estudos de Gênero pós-estruturalistas.

O texto tem um caráter descritivo e se organiza em três momentos, seguido das considerações finais. Primeiro, apresento a Tribuna 77 abordando sua origem, modo de atuação e princípios. Em seguida, apresento uma análise de como o coletivo se relaciona com a temática da homossexualidade no futebol. Um último tópico dedica-se a discutir como a rememoração e valorização da Coligay é acionada nas manifestações do grupo.

A Tribuna 77

A Tribuna 77 surgiu por iniciativa de um grupo de gremistas, em sua maioria moradores de Novo Hamburgo, município da Região Metropolitana de Porto Alegre. Já eram frequentadores assíduos de estádio e alguns tinham passagens por torcidas organizadas.

O coletivo tem como antecedentes a participação em uma dissidência da Geral ocorrida em 2008. Chamada de Velha Escola ou Portão 18, partiu da insatisfação com os rumos tomados pelo agrupamento e buscava retomar suas origens: “surge no espaço que foi fundada originalmente a Geral com uma exacerbação dos valores gaúchos e das barras-bravas” (Francisco Carvalho dos Santos RODRIGUES, 2012, p. 131). Roger sintetiza seus incômodos: “uso da torcida como máquina política, favorecimento a políticos, favorecimento à política interna do clube e dinheiro” (Roger CANAL, 2017, p. 5).

O grupo acabou não perdurando, mas algumas das pessoas ali envolvidas foram amadurecendo ideais que desejavam para suas experiências torcedoras.

Nós começamos a reunir um pessoal lá e se deu um movimento muito grande, mas também tinha muita gente e não era aquilo que a gente queria. Havia muito tradicionalismo, havia muito da cultura gaúcha. Nós também estávamos engatinhando na ideia de fazer torcida e de como fazer para que tenha uma linha de pensamento (CANAL, 2017, p. 11).

É no contexto que antecede a transferência da casa gremista do Olímpico para a Arena, em meio ao ativismo que se opunha a essa mudança e ao discurso de modernização que a acompanha e justifica, que efetivamente foram se constituindo enquanto um coletivo, uma torcida (Renato LEVIN-BORGES, 2018; CANAL, 2017). Oficialmente, é em 2012, ano em que a transferência de estádio se efetiva, que é fundada a Tribuna 77.

A crítica principal que mobilizavam se baseava não apenas na troca de estádio, mas nos princípios neoliberais, gentrificadores e higienistas que guiam o processo de arenização (LEVIN-BORGES, 2018), que teve início na década de 1990 e alcançou seu ápice no período que antecedeu a Copa do Mundo de 2014 (Gilmar MASCARENHAS, 2014). A arquitetura das chamadas ‘novas arenas’ está alinhada à elitização do público frequentador, “disposto a pagar caro por tecnologia, conforto e segurança. Um público ‘familiar’, ‘ordeiro’, que vai ao estádio consumir o espetáculo, e não buscar tradicionais formas de protagonismo que não interessam ao novo modelo de futebol-espetáculo” (MASCARENHAS, 2014, p. 216).

Não se trata apenas de uma mudança de público pela exclusão econômica, como da normatização do torcer a partir de uma maior atenção e vigilância aos torcedores e suas práticas. O controle envolve orientações para que o público assista aos jogos sentado, proibição ou restrições no uso de artefatos tradicionais como bandeirões, faixas, sinalizadores e foguetes, punições a comportamentos desautorizados (BANDEIRA, 2019).

Diversas torcidas organizadas e coletivos de torcedores e torcedoras têm expressado seu descontentamento com a mudança da experiência do torcer proporcionada pelas arenas e a transformação da composição social das pessoas que as frequentam, excluindo frações mais pobres da população (Felipe LOPES; Bernardo Borges Buarque de HOLLANDA, 2018a, 2018b). É comum que essa mobilização faça uso da expressão ‘contra o futebol moderno’.

Nascida de forma orgânica na arquibancada, à primeira vista, a manifestação da Tribuna 77 não se diferencia de outras torcidas gaúchas inspiradas nas hinchadas ou barras6 argentinas. Expõem trapos,7 estendem barras verticais das cores do clube, utilizam papel picado e bobina para jogar para o alto e, muitas vezes, cantam as mesmas músicas entoadas pelas demais (ainda que também possuam composições próprias), mantendo o apoio constante e cadenciado, definido como ‘alento’. Esse modelo no Brasil foi inaugurado pela Geral, espalhando-se em outros agrupamentos gaúchos e, mais adiante, por outros estados, os quais costumam se definir como barras ou movimentos.

A Tribuna, por sua vez, se apresenta como um “coletivo multicultural de torcedores gremistas” (LEVIN-BORGES, 2018; CANAL, 2017), pois seus ideais e suas estratégias de atuação excedem o futebol. É uma existência que transita entre movimento, coletivo e torcida (ou barra). Além da presença nos estádios, promovem atividades acadêmicas, culturais e sociais, entendendo que a “ocupação desses espaços de pensamento potencializa sua linguagem e complementa as mensagens ‘outras’” que transmitem (Otávio Nogueira BALZANO; João Alberto Steffen MUNSBERG; Gilberto Ferreira SILVA, 2018, p. 5). São exemplos divulgados em suas redes: Sarau da Tribuna 77, rodas de conversa, debates, Natal solidário, Dia das Crianças, festa de fim de ano. Também participou de protestos públicos como a manifestação em prol de justiça pelo assassinato de Marielle Franco (um ano após o ocorrido) e da Greve pela Educação, ambos em 2019.

Ainda que coerente, a identificação do grupo a partir de outro termo, que não torcida, parece acompanhar um esforço de diferenciação dos coletivos torcedores perante as Organizadas (Isabella Trindade MENEZES, 2017), processo que se dá também por um distanciamento espacial. A Tribuna se reúne no setor Superior Norte, enquanto a Geral ocupa a área inferior do mesmo lado do estádio. Roger explica: “A nossa única saída foi migrar para um lugar bem longe de tudo aquilo que a gente odiava. Não é que odiava né, nós não concordávamos e realmente [há uma] repulsa mesmo, não tem como conviver com isso” (CANAL, 2017, p. 7). Ele identifica que ‘isso’ se refere não apenas às discordâncias na relação com a política do clube, elementos previamente citados como motivações para sua saída da Geral, como o modo que se manifestam, ignorando o caráter preconceituoso de algumas expressões.

Tu sabe que isso [cânticos que podem ser classificados como machistas, racistas ou homofóbicos] é uma assunto antigo que fez parte da nossa saída da Geral e da construção de novos caminhos, digamos assim né. Porque nós não concordávamos com essa história de macaco, daí começamos a nos dar conta que estávamos repetindo um discurso racista, que a torcida às vezes cantava como brincadeira por alguma coisa, mas não tinha… O discurso por trás era além do folclore. Então foi um, digamos que foi um soco no estômago ter se dado conta de toda essa repetição que… E é muito difícil ter um gremista que nunca cantou macaco, é bem difícil, bem difícil… Eu cantei já e pô, autocritica é fundamental! (CANAL, 2017, p. 11).

A rejeição ao termo macaco, ainda frequentemente usado por tricolores gaúchos para se referir pejorativamente aos rivais do Internacional - e por vezes a qualquer outro adversário - foi o princípio da construção de um posicionamento mais amplo, reconfigurando suas manifestações tendo em vista também discussões sobre machismo e homofobia: “Foi uma coisa gradativa, não sei te explicar. Não começamos a fazer reuniões pra falar sobre homofobia, sobre machismo, sobre não sei o que. Começamos a coletar ideias” (CANAL, 2017, p. 12). Eram influenciados pelo conhecimento que buscavam sobre torcidas progressistas de outros países, como a do Saint Pauli (da Alemanha) e do Rayo Vallecano (da Espanha) (CANAL, 2017).

O processo levou a se afirmarem como antifascistas. Em suas diretrizes explicitam: “reiteramos nossa postura antifascista, ou seja, somos contra qualquer tipo de discriminação, seja ela racial, étnica, classe social ou de gênero sexual.” (TRIBUNA 77, 2016d). Soares e Zago (2018) verificaram que o entendimento do antifascismo como sinônimo de repúdio a preconceitos é uma constante nas páginas das diferentes torcidas antifascistas de clubes brasileiros.

No Brasil, a formação dessas torcidas começou virtualmente, com páginas no Facebook, ainda que as pessoas que as compõem estejam presentes nos estádios, seja como torcida própria, integrando outras TOs, seja de forma independente - expondo ou não suas mensagens. A primeira delas foi a Ultras Resistência Coral, do Ferroviário (CE), criada em 2005, e logo congêneres se multiplicaram (SOARES; ZAGO, 2018).

A comunidade Grêmio Antifascista surgiu de forma independente à Tribuna 77, mas pelas pautas comuns se aproximaram. A página foi criada em 2014, no dia seguinte ao já mencionado ‘caso Aranha’. O momento é representativo do esforço de reconhecer a existência de preconceito no clube e optar por seu enfrentamento. Mas só em 2016 ganharam maior notoriedade - passou de aproximadamente trezentos para mais de onze mil seguidores. O catalisador foi uma postagem na qual manifestavam revolta com a disseminação de uma foto do então deputado federal Jair Bolsonaro com uma camiseta do Grêmio, durante uma visita a Porto Alegre (LEVIN-BORGES, 2018). Um trecho afirma:

Grêmio é o clube que em 1977 teve a primeira torcida gay no Brasil e devemos lembrarmo-nos de nosso passado e presente plural para rechaçarmos esse fascistóide que vem aglomerando os desejos de uma classe média cansada de si mesma, abandonada no vácuo do consumismo e já incapaz de criticismo. Jair Messias Bolsonaro, essa camiseta é para negros, brancos, gays, lésbicas, transexuais, muçulmanos, judeus, ateus, cristãos, umbandistas… de todos, menos do senhor e dos teus asseclas igualmente fascistas. Racistas, fascistas e machistas não passarão!” (LEVIN-BORGES, 2018, p. 8).

A materialização da Grêmio Antifascista nos estádios passou pela relação construída com a Tribuna 77, onde primeiro expuseram seu trapo e com quem muitos de seus membros torciam (LEVIN-BORGES, 2018). Por divergências de posicionamento e estratégias, os dois coletivos distanciaram-se, mas ainda há integrantes da Grêmio Antifascista que seguem torcendo junto aos tribuneiros. E o escudo antifascista que produziram no momento de união segue exposto na Superior Norte e nas ações da Tribuna 77.

É evidente a centralidade do ideário político da torcida, com frequência, transbordando o universo do clube e do futebol (LEVIN-BORGES, 2018). Alguns de seus trapos ilustram isso: “FCK NZS” (fuck nazis, fodam-se os nazistas), “Marielle presente”, “Cultura de Grêmio pela diversidade” (com cores da bandeira trans), “refugees welcome” (refugiados são bem-vindos), “ama o Grêmio F. B. P. A. combate o racismo”, “Nem uma a menos”, “Luther King”, “Muhammad Ali”, “Lugar de mulher é no estádio”, “Ditadura nunca mais”. O movimento lista como suas pautas principais a luta pela “redemocratização dos espaços de futebol, o resgate e a manutenção do patrimônio histórico e cultural do clube e o combate a todos os tipos de preconceitos” (BALZANO; MUNSBERG; SILVA, 2018, p. 5).

Também destacam sua posição pacífica. Em suas diretrizes, afirmam: “Repudiamos a violência e suas manifestações. Queremos as crianças, e a doçura, ao nosso lado para que juntos possamos construir um mundo diferente”. Também aí há uma distinção com relação às Organizadas, nas quais as brigas fazem parte do cotidiano de uma parte dos integrantes (TEIXEIRA, 2003). Essa postura antiviolência é um aspecto comum em barras brasileiras (MENEZES, 2017; Mauro MACIEL JÚNIOR, 2019), distanciando-as também daquelas de cuja performance se apropriaram, as barras argentinas.

O princípio posto em prática: as manifestações contra a homofobia

A festa sempre foi uma característica nossa e até hoje, na 77, acontece isso. Muitas pessoas se aproximam pela festa e se afastam quando veem que a festa tem um propósito político. Mas não de fazer politicagem, mas de se saber o que se canta, saber o trapo que se coloca… Tem o porquê das coisas, as ideias têm fundamento, desde um cântico até um papel picado (CANAL, 2017, p. 11).

Tendo assistido a um jogo em meio à Tribuna 77, pude vivenciar a experiência torcedora que promovem. Naquele dia, justificaram o princípio do apoio constante que trazem da inspiração das hinchadas, alentando durante toda a partida. Com exceção do setor ocupado pela Geral, o restante do estádio é menos atuante. Pessoas assistem aos jogos sentadas e cantam ou gritam apenas nos momentos de maior emoção. Assim, pela animação contínua, a Tribuna se apresenta como alternativa àqueles que se interessam por acompanhar a partida dessa forma, mas que por qualquer motivo não querem ou não podem fazer isso junto à Geral.

Entretanto, a condição híbrida entre torcida e movimento ativista amplia a possibilidade de surgirem frequentadores que, ao menos a priori, não se identificam com sua ideologia, como exposto na citação de Roger. O uso de expressões preconceituosas é um debate recorrente. Ele defende o esforço de conscientização, reconhecendo a existência de uma “pedagogia do insulto” (Rogério Diniz JUNQUEIRA, 2009) que no futebol gaúcho8 naturaliza termos como macaco, bicha, viado, puta, mas também acreditam em sua possibilidade de desconstrução. Na partida que acompanhei, assisti a uma situação que materializava tal questão. O estádio em coro, entoava uma música que faz uso do termo ‘macacada’, em alusão aos colorados.9 A Tribuna endossava o cântico. Mas, antes que o termo fosse dito, um integrante gritou “macacada não, galera! Macacada não!”. Não deixaram de cantar, mas substituíram a expressão ofensiva. Notei que uma pessoa seguiu a versão original. Não houve uma reprimenda individual. Apenas a insistência do lembrete, quando o verso estava prestes a se repetir.

São situações que não perpassam o cotidiano de outros grupos que detêm certas semelhanças com a Tribuna 77. As torcidas antifascistas e as torcidas queer, por exemplo, também são contrárias ao uso de termos preconceituosos, mas muitas não frequentam os estádios enquanto coletivo, engajando-se nessa disputa de outra forma, tendo as plataformas virtuais como espaço privilegiado de manifestação (SOARES; ZAGO, 2018). As barras brasileiras, por sua vez, estão presentes na arquibancada e assemelham-se ao grupo gremista pelo princípio da não violência (além da performance e não institucionalização), mas costumam se isentar da discussão quando se trata de violência verbal (MACIEL JÚNIOR, 2019). Essa omissão também é notada em agrupamentos torcedores que se opõem ao “futebol moderno” (LOPES; HOLLANDA, 2018a). Há mesmo alguns desses grupos que protagonizam discursos homofóbicos, sexistas e xenófobos (Dino NUMERATO, 2015). Destaco, assim, que há certa heterogeneidade entre esses coletivos torcedores. Compartilham de algumas pautas, mas não todas, e têm realidades específicas em sua estrutura e modo de atuação. Em que pese a possibilidade de encontrar padrões de alianças, estes não devem ser generalizados ou igualados.

Torcidas que abraçam uma mesma luta também apresentam suas nuances, divergências ou mesmo incoerências. Soares e Zago (2018) mencionam, por exemplo, que Ernesto Che Guevara é uma figura idolatrada entre muitas torcidas antifascistas, apesar das práticas violentas contra homossexuais no regime ditatorial cubano do qual foi um líder (Douglas PINHEIRO, 2018). Por outro lado, mencionam que a Grêmio Antifascista - que, lembro, possuiu relações com a Tribuna 77 - deletou uma publicação que o enaltecia. No texto em que justificam a exclusão, reconhecem a importância de Che na “busca de uma alternativa ao imperialismo capitalista estado-unidense”, mas ressalvam seu “papel controverso e opressor em relação à comunidade LGBT+”. Destacam ainda que “há documentação, relatos e assunção do próprio Che de seu erro, motivos mais que suficientes para compreendermos que mesmo aqueles no nosso lado de determinadas lutas podem produzir fascismos” (SOARES; ZAGO, 2018, p. 9). O distanciamento desse agrupamento da Tribuna é outra evidência da existência de discordâncias e conflitos entre grupos com posicionamentos políticos similares.

A primeira manifestação da Tribuna 77 em relação à comunidade LGBTQI+ ocorreu no ano de 2016. Uma mensagem no Facebook, acompanhada de uma imagem da Coligay, dizia:

17 de maio, Dia Mundial de Combate a Homofobia10 e expressamos nosso orgulho pela Coligay e pela diversidade Tricolor. Uma das páginas mais bonitas escritas na histórica arquibancada do velho Estádio Olímpico Monumental.

Reiteramos nossa postura na luta por um futebol de todos e para todos, baseado no respeito e na cultura de Grêmio que há décadas é pioneiro no respeito às diferenças e à diversidade.

Que possamos manter viva esta chama!

Antifascistas sempre! (TRIBUNA 77, 2016a).

O endosso à pauta de combate à homofobia é feito em conexão ao universo do futebol e do Grêmio, algo recorrente em seus posicionamentos. Ou seja, quando abordam fatos que emergem fora do campo esportivo - como a Greve pela Educação ou o combate à ditadura, por exemplo - buscam conectá-los com esse contexto. A estratégia parece dar maior sentido à presença daquele conteúdo em uma página de um coletivo de torcedores e torcedoras. Mais além, nota-se que apresenta a ‘cultura de Grêmio’ como referência do futebol defendido pelo coletivo, caracterizado pelo respeito às diferenças e à diversidade, e tendo como símbolo a existência de uma torcida gay em sua história. Assim, o Grêmio serviria de símbolo na luta por um esporte de todos e para todos.

A próxima manifestação se deu menos de um mês depois da primeira, em 14 de junho, a qual expunha repúdio ao atentado a uma boate LGBTQIA+ de Orlando (Estados Unidos), que deixou cinquenta mortos e cinquenta e três feridos (G1, 2016). A mensagem novamente referenciava a Coligay - trazendo uma foto sua - e reafirmava que o Grêmio era detentor de uma trajetória de defesa à diversidade. Além disso, disponibilizam textos literários que dialogam com o tema do preconceito de gênero e orientação sexual, o que coaduna com a perspectiva de sensibilização e conscientização a que se propõem: “São trechos contra a homofobia e a transfobia, não necessariamente em forma de combate braçal ou de discurso, mas também de uma luta que é travada a partir de declarações de afeto. De Caio Fernando Abreu a Roberto Bolaño, que esses textos sirvam para todos como armas de ‘combate’.” (TRIBUNA 77, 2016c).

O atentado motivou também uma ação no estádio. Em partida do Campeonato Brasileiro contra o Cruzeiro, levaram uma bandeira do arco-íris para a arquibancada, ação depois na página do grupo.

O gesto foi suficiente para que recebessem ameaças, ainda que também elogios (CANAL, 2017). O estádio é o palco do espetáculo futebolístico e onde manifestações desse tipo ganham maior projeção, reconhecimento e visibilidade, amplificando tanto reações de apoio, quanto de repúdio. A ocorrência de respostas violentas evidencia a recusa de parte da torcida gremista a manifestações como essa, em especial na arquibancada, local em que podem ser imediatamente tomadas como motivo de rechaço pelos adversários. Também reforça a importância da manutenção de uma imagem do clube vinculada a valores de masculinidade e virilidade, e que não permite qualquer associação com a homossexualidade, nem mesmo um gesto de solidariedade em um episódio de violência.

Em 2017, o coletivo voltou a sofrer intimidações por causa similar. Em função do aniversário da estreia da Coligay, levaram um trapo para o jogo seguinte à data com os dizeres “Coligay 40 anos”, exposto em local de destaque na arquibancada.

A partida era contra o Deportes Iquique, do Chile, e era válida pela primeira fase da Copa Libertadores da América. Tratando-se de uma competição internacional, o estádio estava cheio, contribuindo para a repercussão da homenagem.

Nós chegamos, abrimos a faixa no lugar e as pessoas não acredi… Eu lembro que foi meio incrédulo. Todo mundo ficou meio, tipo assim, “o que que esses caras estão fazendo?” Teve bastante gente que xingou. Rolou um questionamento brutal […] rolou bastante enfretamento, rolou bastante questionamento, mas rolou muito apoio, mas muito apoio. Foi muito… […] então, tipo assim, as reações foram as mais diversas, mas eu acho que elas foram bem mais positivas do que essas reacionárias, que houve bastante. Houve ameaça, houve tudo que se pode imaginar (CANAL, 2017, p. 23).

Há alguns anos, a Tribuna 77 possui uma bandeira com seu escudo sobre as cores do arco-íris e o texto “Cultura de Grêmio pela diversidade”. Nas imagens de eventos externos ao estádio, a presença dela é frequente. Cito, como exemplos, o I Sarau da Tribuna 77 (em 2017), a comemoração pelo título do Campeonato Gaúcho de 2018 pela equipe feminina e o I Encontro Latino-Americano de Torcidas e Coletivos Antifascistas (em 2018). Além disso, entre os produtos que vende com sua marca, há alguns que usam o arco-íris como estampa, reforçando o vínculo da torcida com a comunidade LGBTQI+.

Apesar disso, no estádio, o arco-íris aparece apenas em situações pontuais, diferentemente de outras bandeiras e trapos, sempre estendidos ou mantidos durante um certo período. Segundo Roger, a possibilidade de torná-la fixa foi considerada. O receio de agressões foi um dos argumentos que os levou a rejeitar a ideia.

Eu acho que a bandeira do antifascismo que nós já levantamos, ela é uma bandeira ampla, ela já pega a bandeira do arco-íris. Então, tipo assim, isso foi um motivo bastante em discussão: “Ah! Vamos ter uma bandeira do arco-íris constante?” Votar não, sim… O que que pode dar? Porque é bastante diferente tu ter um motivo específico e levar, e em um jogo lá aparecer com uma bandeira. Assim, tu pode ter certeza que a reação ela é forte, é forte, ela é bem forte. E nós sentimos isso na pele e fomos emboscados por isso, por causa de uma bandeira né… Claro que não foi só por isso, mas foi também! (CANAL, 2017, p. 26).

Tendo como referência as publicações do grupo, desde a homenagem à Coligay houve outras duas manifestações no estádio. Ainda em 2017, estenderam um trapo com a mensagem “Grêmio FBPA contra a homofobia 17.05” (TRIBUNA 77, 2017a). E, em dezembro de 2019, estrearam sua bandeira com estampa em referência ao orgulho trans, em azul branco e rosa (TRIBUNA 77, 2019a).

Apesar da tímida presença na arquibancada, a pauta de apoio à comunidade LGBTQI+ segue presente de outras formas. Anualmente, realizam postagens no Dia Internacional contra a LGBTfobia (17 de maio) e no Dia Internacional do Orgulho LGBT (28 de junho).11 Em 2020, publicaram ainda uma mensagem pelo Dia Nacional da Visibilidade Trans (29 de janeiro). Ao longo dos aproximadamente cinco anos em que alimentam a página, identifiquei sessenta e três publicações que abordam a temática LGBTQI+, seja nos textos, seja nas imagens que os ilustram. Destas, dezoito trazem uma referência apenas na imagem, por vezes de forma discreta. Como exemplo, uma convocação para um jogo, ilustrada pela torcida, com a bandeira do arco-íris ao fundo. As outras quarenta e cinco tratam diretamente do assunto, das quais dez eram dedicadas às datas ligadas ao Movimento LGBTQI+ previamente citadas; três celebravam o aniversário de fundação da Coligay; e onze compartilhavam vídeos ou reportagens, alguns dos quais contando com entrevistas de integrantes.

Algumas publicações diziam respeito a eventos públicos, a maioria promovidos pelo próprio coletivo. Em 2017, o I Sarau da Tribuna 77 contou com uma fala de Léo Gerchmann, que em anos recentes havia lançado obras sobre o Grêmio que envolviam temas da homossexualidade, negritude e racismo: Coligay: tricolor e de todas as cores (2014) e Somos azuis, pretos e brancos (2016). Promoveram também o lançamento do livro Uma história do torcer no presente, de Gustavo Bandeira, que trata do comportamento de torcedores no contexto de recente modernização do futebol, problematizando (entre outros elementos) ofensas verbais baseadas em raça, gênero e sexualidade, inclusive abordando a rememoração da Coligay. Organizaram ainda uma Roda de Conversa com o fundador e líder dessa torcida, Volmar Santos, que foi também um convidado especial da festa de final de ano do coletivo, em 2019.

Outro evento divulgado foi a “Roda de Conversa Mobilização na Arquibancada: o combate ao preconceito no futebol”, no qual integraram a mesa. Organizada pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, previa a companhia de representantes da Inter Antifascista, que não compareceram. Situação inversa similar também ocorreu: no I Encontro Nacional Direito de Torcer, que reuniu torcidas e coletivos antifascistas no Estádio Beira-Rio, casa do Internacional, não houve presença de gremistas. Observações de Gustavo Bandeira e Marina Dantas (2020) reforçam a suspeita de que as desavenças alimentadas a partir do clubismo são desafios a uma luta conjunta, em prol de pautas comuns. Segundo o autor e a autora, “movimentos progressistas de torcedores de Grêmio e Internacional não participam em conjunto de atos de rua, de notas de repúdio ou de eventos políticos e acadêmicos” (BANDEIRA; DANTAS, 2020). Por outro lado, identificam que grupos de mulheres desses mesmos clubes, conseguem dividir tais espaços, o que não necessariamente se repete em outras agremiações.

Sem idealizar ou tomar como modelo único a atuação da Tribuna 77, identifico no discurso do coletivo uma contribuição para tirar pessoas LGBTQI+ da condição de abjetas, definidas por Judith Butler (2002, p. 161) como “todo tipo de corpos cujas vidas não são consideradas ‘vidas’ e cuja materialidade é entendida como ‘não importante’”. Reconhecem sua existência, sem defender uma perspectiva assimilacionista.

A Coligay para a Tribuna 77

A exaltação da importância da Coligay para o futebol brasileiro e o Grêmio é frequente nas ações da Tribuna 77. Entre as sessenta e três publicações da temática LGBTQI+ na página do coletivo, trinta a mencionam. Personalidades relacionadas à torcida - casos de Volmar Santos e Léo Gerchmann - já foram protagonistas de seus eventos. Além disso, em sua sede há uma grande foto do grupo decorando uma das paredes.12 Criaram ainda uma página no Facebook específica para divulgar conteúdos sobre ela, intitulada Coligay Memória.13

A antiga torcida é tratada como fonte de inspiração do coletivo: “não serve apenas como influência, mas como norteio na forma de fazer e sentir Gremismo” (TRIBUNA 77, 2018); “nos deixou o exemplo de como torcer e servir ao clube.” (TRIBUNA 77, 2019b). É até um dos motivos da escolha do número 77 do nome da Tribuna (CANAL, 2017; LEVIN-BORGES, 2018).

1977 foi um ano chave dentro do Grêmio, que representa todos esses ideais que nós levamos adiante. O Grêmio em 1977 era um clube progressista valendo, né? Não só na formação de futebol e na maneira de se pensar dentro do Grêmio, mas nas arquibancadas, com aceitação da Coligay, com o Grêmio começando a construir um estádio através da força da sua torcida, tendo um presidente humanista, um cara progressista. Então esse ano, além desse título, que quebrou a hegemonia do Inter e começou uma construção vitoriosa pro Grêmio, de reerguer seu estádio e terminar lá no Campeonato Mundial, ele foi fundamental. Acho que 1977 hoje soaria [como] um ano atual […] (CANAL, 2017, p. 6).

A fala insere a Coligay, entre um conjunto de elementos do ano de 1977, que fazem com que o Grêmio seja identificado como ‘progressista valendo’. A narrativa já anuncia algo constante nos discursos da Tribuna: um alinhamento nos valores que constituem e guiam o Grêmio e a Coligay, os quais são também os pilares de seu coletivo.

Outras publicações contribuem para a compreensão da representação que alimentam da extinta torcida gay gremista. É caracterizada como “transgressora e vanguardista” (TRIBUNA 77, 2017b), promotora de um “carnaval subversivo” (TRIBUNA 77, 2020) e um “farol mundial na luta contra o preconceito nos espaços esportivos” (TRIBUNA 77, 2018).

Roger vai além: “eu encaro como um movimento multicultural e não como uma torcida” (CANAL, 2017, p. 21); “eram militantes de uma causa” e “a Coligay, na época, abrigava muitas mulheres no estádio, então foi um reduto das mulheres também, tipo assim, de resistência feminina e feminista também” (CANAL, 2017, p. 20); “aposto que tinha muita gente que eram guerrilheiros da época da ditadura que frequentavam a tribuna com eles. Com certeza, com absoluta certeza” (CANAL, 2017, p. 22). A pesquisa de Anjos (2018), que se debruça sobre posicionamentos e engajamentos políticos da Coligay, não confirmou essas impressões. Ao que parece, a admiração pelo caráter ousado, rebelde e subversivo daquele agrupamento levou Roger a supor uma atuação politizada também fora dos estádios. O que, tendo em vista seus valores e princípios, faria dela uma referência ainda mais exemplar. Há, assim, certa idealização da Coligay.

Complementarmente, a torcida é apresentada como um reflexo de características tidas como intrínsecas ao clube que apoia, um símbolo da “cultura de Grêmio” (TRIBUNA 77, 2016c). A lembrança da Coligay acompanha a valorização do Grêmio como “clube plural e inclusivo” (TRIBUNA 77, 2017b), “que há décadas é pioneiro em ações inclusivas para com o direito às diferenças e à diversidade” (TRIBUNA 77, 2016b). Essa perspectiva, então, positiviza a Coligay e, ao tomar suas características como virtudes essenciais do Grêmio, positiviza o próprio clube.

Esse modo de dar sentido à existência da Coligay em relação ao Grêmio não é, contudo, consensual ou hegemônico. Trabalhos que observaram o modo como gremistas interpretam a torcida identificaram diferentes perspectivas (ANJOS, 2018; BANDEIRA, 2019): 1) visibilizar a Coligay é ou pode ser positivo para o clube; 2) Coligay é motivo de piada sobre o clube; 3) Coligay é pouco importante ou irrelevante para o clube; 4) Coligay foi importante para o clube, como qualquer torcedor, torcedora ou torcida; 5) desconhecem (ou dizem desconhecer) a Coligay.

A primeira forma vai ao encontro da perspectiva da Tribuna 77, ainda que as motivações apresentadas pelas pessoas que a defendem tenham particularidades. Algumas dão ênfase a seus méritos esportivos, como a fidelidade e animação; outras destacam o vanguardismo do Grêmio no acolhimento à torcida; e há ainda quem vislumbre na sua lembrança uma possibilidade de atrair LGBTQI+s que torcem (ANJOS, 2018). Parece ser hegemônica, entretanto, a perspectiva de que a Coligay é indesejada, uma vez que torna o Grêmio motivo de chacota (ANJOS, 2018; BANDEIRA, 2019).

Defensores de posições opostas têm, todavia, um objetivo comum: zelar pela imagem, história e tradição do Grêmio. A divergência se dá, assim, sobre os valores que alimentam a grandeza do clube que amam e apoiam. Enquanto a Tribuna 77 endossa a diversidade e a pluralidade, para outras pessoas ou grupos a virilidade é um de seus bens mais preciosos, motivo pelo qual existências como a da Coligay deveriam ser esquecidas e ocultadas. Entendo, assim, a construção de uma identidade gremista amparada na noção de diversidade - para isso ignorando momentaneamente elementos outros de sua história e política14 - como parte de um jogo discursivo de convencimento (Matheus da Silva MEDEIROS; Mónica Graciela ZOPPI-FONTANA, 2019).

Essas diferenças e disputas se materializam também em outros símbolos elegidos por torcedores e torcidas. A masculinidade e agressividade endossada pelas Torcidas Jovens, por exemplo, são visíveis em lemas, bandeiras, mascotes, músicas que fazem referência à guerra, ao universo militar, ao perigo e à morte, e a personagens famosos por sua força e bravura (TEIXEIRA, 2003). A gremista Geral, por sua vez, agrega elementos da tradição gaúcha aos ideais de torcedor já recorrentes em outros agrupamentos. A referida torcida apresenta como lemas a tríade amizade, trago e alento, assim interpretada por Rodrigues (2012, p. 35):

lealdade aos seus amigos de arquibancada; a coragem de se embebedar e se sacrificar em nome do time, prova de sua masculinidade expressos pela palavra “trago” - bebida; e por fim o alento, que é a condição primordial para o novo modelo de torcedor organizado inaugurado junto com o modelo da Geral do Grêmio, aquele que canta e empurra o time sem parar.

Seus trapos têm mensagens que ilustram isso: “Imortal Tricolor - Lara Vive”, “Borrachos15 da Geral”, “Cuidado, risco de avalanche”, “Sirvam nossas façanhas de modelo da toda terra” (trecho do hino do estado), “Jamais nos matarão - 26/11/2005” (data da marcante partida batizada de “A Batalha dos Aflitos”), “Peleando16 até a morte” (RODRIGUES, 2012).

Já a Tribuna aciona outros elementos para valorizar o Grêmio. Além das mensagens que dialogam com o universo extradesportivo já mencionadas, são comuns as homenagens a jogadores, dirigentes, funcionários, torcedores e torcedoras, escolhidos não apenas por uma trajetória profissional de sucesso, mas também pelo aparente alinhamento com os valores da torcida. São exemplos: Elis Regina, Elza Soares, Gilberto Gil e Lupicínio Rodrigues.

Considerações finais

A Tribuna 77 é uma torcida que se apresenta como aliada à causa LGBTQI+, em especial no futebol. Sabendo desse posicionamento, nesse texto me propus a analisar o modo como essa intenção se manifesta.

Ela não defende um futebol inclusivo e de respeito às diferenças a partir de uma construção idealizada hipotética. Apoiam-se na trajetória do Grêmio e em sua extinta torcida gay, interpretados sob a ênfase dos valores que endossam: diversidade, pluralidade, não violência, vanguardismo. Buscam inspiração no que entendem estar na essência do próprio clube. Esse esforço de fazer do clube uma instituição coerente com os elementos que valoriza é algo próprio de torcedores, pois é na tradição de suas agremiações que se apoiam para compor, justificar e legitimar sua identidade torcedora. Elas não são fixas, portanto, e mantém-se sempre sob disputa com aqueles que endossam outras memórias, símbolos, virtudes.

A Coligay surge como argumento que legitima a tradição gremista defendida pela Tribuna 77 e como inspiração. Vista sob uma perspectiva idealizada, a torcida congrega todos os princípios que o coletivo atual abraça. Embora exponha exageros característicos do discurso torcedor, há ali uma narrativa de positivação da homossexualidade no contexto do futebol que não pode ser desconsiderada. Essa alternativa se opõe ao discurso hegemônico que posiciona performances de gênero não normativas em zonas de abjeção.

A Tribuna é ainda um lugar em que gremistas LGBTQI+ podem buscar segurança para frequentar o estádio, como afirmam: “Na entrada interna 438 da arquibancada superior norte da Arena do Grêmio, a comunidade LGBT é bem-vinda e tem seu lugar de respeito”. Segundo Roger há cerca de dez homossexuais, entre homens e mulheres, que frequentam a Tribuna 77. Há também uma mulher trans que, em reportagem do jornal Zero Hora (SPERB, 2019), fez o seguinte relato: “Depois que me assumi, há 10 anos, deixei de frequentar jogos por medo. Eu fiquei sem turma. Sendo uma mulher trans, sei o que pode acontecer. O coletivo é unido, saudável. Aqui me sinto confortável e protegida porque não estou sozinha.” Roger endossa que o grupo tenta proporcionar-lhes um ambiente seguro: “é guarida, ali existe esse espaço e essas pessoas nos procuraram e nós mantemos essa posição bem, bem completa, aqui não tem espaço para esse tipo de preconceito. […] Te dá liberdade de ir lá torcer.” (CANAL, 2017, p. 26).

Finalizo reconhecendo que as fontes que utilizei não permitiram um aprofundamento sobre o cotidiano da Tribuna 77 nos estádios ou fora deles e, em especial, sobre a experiência de integrantes LGBTQI+. Como qualquer coletivo, certamente possuem suas divergências, desafios e conflitos, nem sempre evidentes nos discursos públicos.

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1Sob outros contornos, o mesmo pode ser dito sobre o futebol praticado por mulheres.

2Adoto a sigla LGBTQI+ em referência a lésbicas, gays, bissexuais, travestis, transexuais, transgêneros, queer, intersexuais e outras possibilidades de identificação coletiva de pessoas que não se inserem no referente cisgênero heterossexual. Reconheço que essa sigla não é consensual, visto que há debates políticos mesmo dentro dos movimentos de militância e de estudiosos do tema em torno de qual deveria ser aquela a ser adotada para se referir a tais sujeitos e seus coletivos representativos. Nas fontes desta pesquisa ocorre a alternância entre a utilização de LGBT e LGBTQI+.

3Na ocasião, registrei minhas observações sobre a experiência. Não havia, todavia, a intenção de tornar a Tribuna 77 foco de uma reflexão mais ampla, motivo pelo qual não realizei novas idas a campo com a torcida.

4A entrevista com Roger fez parte de um projeto de pesquisa que não tinha como foco central a Tribuna 77, motivo pelo qual me detive a esse único interlocutor, suficiente para o trabalho em questão. Ainda que ciente das limitações que a falta de outras vozes traz, interpretei que seu relato foi capaz de atender aos propósitos deste texto.

5O grupo conta com cerca de cem pessoas, quantitativo que sofre variações.

6O termo surge da positivação da expressão barra brava, atribuída de forma pejorativa pela mídia para identificá-los sob a ênfase de sua relação com a violência.

7Pequenas faixas produzidas de forma artesanal pelos próprios torcedores: um pedaço de pano em que se pinta uma mensagem ou uma figura.

8Ainda que os termos sejam usados em todo o Brasil, explicito o futebol gaúcho, pois entendo que esse uso envolve contornos regionais específicos.

9A partida não era contra o Internacional, mas é comum que cânticos contra o rival ocorram em todos os jogos do Grêmio.

10O título dessa data criada em prol da luta contra o preconceito motivado por orientação sexual sofre variações.

11Com exceção do dia 28 de junho de 2016.

12A foto pode ser vista na imagem de um dos eventos realizados pela Tribuna 77, disponível na página do Facebook.

13Página criada em setembro de 2018, disponível em Facebook.com/ColigayGremio.

14Reitero que o coletivo não deixa de reconhecer e criticar manifestações de racismo do clube, por exemplo. Todavia, esses episódios não descredibilizariam a essência plural pela qual advogam.

15Sinônimo de bêbados, na gíria regional, derivada do espanhol.

16Sinônimo de brigando ou lutando, na gíria regional, derivada do espanhol.

Como citar este artigo de acordo com as normas da revista: ANJOS, Luiza dos. “Tribuna 77 e a defesa de LGBTQI+ nos estádios”. Revista Estudos Feministas, Florianópolis, v. 29, n. 2, e79318, 2021.

Financiamento: O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior - Brasil (CAPES) - Código de Financiamento 001

Consentimento de uso de imagem: Não se aplica

Aprovação de comitê de ética em pesquisa: A pesquisa que originou este texto insere-se no Projeto Garimpando Memórias, aprovado no Comitê de Ética da UFRGS sob o número 2007710

Recebido: 03 de Fevereiro de 2021; Aceito: 06 de Maio de 2021

luiza.aguiar@cefetmg.br

Luiza Aguiar dos Anjos (luiza.aguiar@cefetmg.br) é doutora em Ciências do Movimento Humano pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), mestre em Estudos do Lazer pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Professora de Educação Física do CEFET-MG. Integra o Grupo de Estudos sobre Futebol e Torcidas (GEFuT/UFMG), o Grupo de Estudos sobre Esporte, Cultura e Corpo (GRECCO/UFRGS) e o Pensando a Educação Física Escolar (IFMG). Suas pesquisas tematizam o gênero e a sexualidade nos esportes, em especial no futebol e nas torcidas.

Contribuição de autoria: Não se aplica

Conflito de interesses: Não se aplica

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