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Revista Estudos Feministas

versión impresa ISSN 0104-026Xversión On-line ISSN 1806-9584

Rev. Estud. Fem. vol.30 no.2 Florianópolis mayo/aug 2022  Epub 01-Mayo-2022

https://doi.org/10.1590/1806-9584-2022v30n274733 

Artigos

Negra de pele clara: embranquecimento e afirmação da negritude no Brasil

Light-skinned black woman: whitening and affirmation of blackness in Brazil

Negra de piel clara: blanqueamiento y afirmación de la negritud en Brasil

1Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Departamento de Psicologia Social e Institucional, Porto Alegre, RS, Brasil. 90035-003 - psicodep@ufrgs.br


Resumo:

No presente artigo, sustento uma política de escrita que, baseada nas proposições de autoras como bell hooks e Gloria Anzaldúa, não opera a separação entre vida e escrita, entre pessoal e político. Nesse sentido, partindo de memórias que evocam questões raciais em diferentes períodos da minha trajetória de afirmação como mulher negra de pele clara, esse trabalho objetiva visibilizar aspectos acerca dos processos sócio-históricos de embranquecimento e genocídio da população negra brasileira que atravessam a autodeclaração racial e afirmação da negritude em nosso país. Trazendo contribuições da produção intelectual de bell hooks e Neusa Souza, aponto a potência do exercício da militância e da escrita como chaves antirracistas que nos auxiliam no percurso em direção à desconstrução da branquitude e à superação do que Sueli Carneiro nomeia como a “dor da cor”.

Palavras-chave: raça; branqueamento; negritude; antirracismo

Abstract:

This article supports a writing policy that, based on the propositions of authors such as bell hooks and Gloria Anzaldúa, does not operate the separation between life and writing, between personal and political. In this sense, starting from memories that evoke racial issues in different periods of my affirmation as a fair-skinned black woman, this work aims to show aspects about the socio-historical whitening and genocide processes of the black Brazilian population that go through racial and self-declaration affirmation of blackness in our country. Bringing contributions from the intellectual production of bell hooks and Neusa Souza, I point out the power of the exercise of militancy and writing as anti-racist keys that help us on the path towards deconstructing whiteness and overcoming what Sueli Carneiro pointed as “color pain”.

Keywords: Race; Whitening; Blackness; Anti-racism

Resumen:

Este artículo sustenta una política de redacción que, a partir de los planteamientos de autoras como bell hooks y Gloria Anzaldúa, no opera la separación entre vida y escrita, entre lo personal y lo político. En este sentido, a partir de recuerdos que evocan cuestiones raciales en diferentes períodos de mi trayectoria de afirmación como mujer negra de piel clara, este trabajo tiene como objetivo visualizar aspectos sobre los procesos sociohistóricos de blanqueamiento y genocidio de la población negra brasileña que atraviesa. autodeclaración racial y afirmación de la negritud en nuestro país. Aportando aportes de la producción intelectual de bell hooks y Neusa Souza, señalo el poder del ejercicio de la militancia y la escritura como claves antirracistas que nos ayudan en el camino hacia la deconstrucción de la blancura y superación de lo que Sueli Carneiro denomina como el “dolor por el color”.

Palabras clave: raza; blanqueamiento; negritud; antirracismo

Introdução: vida e escrita

Escrevo para registrar o que os outros apagam quando falo, para reescrever as histórias mal escritas sobre mim, sobre você. Para me tornar mais íntima comigo mesma e consigo.

(Gloria Anzaldúa)

Escrevo inspirada por mulheres. Mulheres que têm me ensinado sobre a não existência da “separação entre vida e escrita” (Gloria ANZALDÚA, 2019, p. 90). Mulheres como bell hooks (1995), cujo trabalho intelectual se fundamenta em uma política do cotidiano, rompendo com o dualismo mente-corpo para tecer um pensamento a partir das experiências vividas. Mulheres como Gloria Anzaldúa, que nos ensina que “[p]ara alcançar mais pessoas, deve-se evocar as realidades pessoais e sociais - não através da retórica, mas com sangue, pus e suor” (2019, p. 93). Em sua carta para nós, mulheres do terceiro mundo, a intelectual chicana nos encoraja a utilizar na escrita tudo aquilo que consideramos importante, sem cairmos no perigo de invocar o universal em detrimento do particular (ANZALDÚA, 2019).

Ancorada em seu convite e inspirada nas escrevivências de Conceição Evaristo (2016) como possibilidade-convite de contarmos nossas histórias, teço aqui uma aposta ética, política e metodológica de narração de minhas histórias como um caminho à compreensão das questões raciais brasileiras e à afirmação da negritude.

Componho uma perspectiva teórico-metodológica que busca se aproximar do que hooks (1995) intitula como política do cotidiano, convoco e sou convocada por memórias que, ao longo do percurso de minha afirmação como mulher negra, evocam em meu corpo o que Sueli Carneiro (2011) chama de “a dor da cor”.

Acompanhada pelos ecos das leituras de obras de hooks, esse texto se sustenta na noção de que o pessoal é também político (hooks, 2019a). É possível, portanto, escrever e produzir conhecimento a partir e em diálogo com nossas experiências individuais, pois o que experienciamos só é passível de existência porque está ancorado em uma produção coletiva e social. Como nos fala hooks (2019a), a produção de uma divisão entre aquilo que é público (enunciado na polis) e o pessoal, aquilo que relegamos à intimidade, ao privado, encontra-se conectada com práticas de dominação que são exercidas sobre nossa vida cotidiana em relacionamentos íntimos, nas formas assumidas pelo racismo, machismo e exploração de classe. Práticas de dominação que atuam “lá onde geralmente estamos feridos, machucados, desumanizados [...]. É por isso que eu acredito ser crucial falar sobre os pontos nos quais convergem o público e o privado, conectar os dois” (hooks, 2019a, p. 24-25).

Como professora de Psicologia Social e Relações Étnico-raciais e Psicologia de uma universidade pública, costumo ressaltar às/aos alunas/os que sujeito e sociedade são coproduzidos, portanto, o movimento de análise para compreender como nos tornamos o que somos (e nossos modos de viver) precisa acontecer na relação entre as experiências cotidianas e pessoais e a esfera macropolítica. Assim há, certamente, momentos através dos quais as leituras que realizamos dialogam com maior intensidade e cumplicidade com nossas próprias experiências. Nesse sentido, utilizando-me de memórias de diferentes períodos da minha vida, teço fios de compreensão de minha existência racializada, convidando você, leitora e leitor, a percorrer um caminho pelo qual, acompanhadas/os de Sueli Carneiro (2011), bell hooks (2019a), Abdias Nascimento (2016) e Neusa Santos Souza (1983), possamos visibilizar aspectos acerca dos processos que atravessam a autodeclaração racial e a afirmação da negritude em nosso país.

Que corpo é esse?

Anzaldúa (2019) nos escreve que “[o] perigo ao escrever é não fundir nossa experiência pessoal e visão do mundo com a realidade, com nossa vida interior, nossa história, nossa economia e nossa visão. O que nos valida como seres humanos, nos valida como escritoras” (p. 233). É a aposta no que fala a intelectual chicana que possibilitou que esta escrita acontecesse, articulando minhas experiências em uma discussão acerca dos processos sócio-históricos de embranquecimento e genocídio da população negra brasileira que atravessam a autodeclaração racial e afirmação da negritude no país. Nesse sentido, é importante ressaltar que negritude, aqui, remonta à noção de negritude de Aimé Césaire (2012), poeta e político martinicano, que marca a proposição de um projeto revolucionário onde “se reivindica a autoria, o protagonismo dos negros em formas de representação de sua experiência” (Simone SCHMIDT, 2019, p. 2).

A afirmação de minha negritude veio de um percurso difícil, como é frequente para tantas mulheres negras e homens negros em um país sustentado sobre o racismo estrutural, agarrado à manutenção da supremacia branca. Tenho consciência de minha passabilidade diante da pele negra que se mostra em sua tonalidade mais clara - a negritude é diversa, a despeito dos estereótipos que a tentam confinar (CARNEIRO, 2011). Esse tom situa minha experiência em um lugar diferente do lugar ocupado por uma mulher negra de pele escura/retinta. Se eu alisar meu cabelo, se tentar me adaptar aos discursos, valores e práticas reverenciados por uma sociedade supremacista branca, provavelmente, há quem não irá me reconhecer como mulher negra.

Filha de um casal inter-racial, vim ao mundo na esteira de uma política de branqueamento da população negra. Aliás, genocídio é como se chama o propósito de tal política (NASCIMENTO, 2016), que, no pós-abolição, trouxe milhares de imigrantes europeus ao Brasil - que, inclusive, constituíram os descendentes do lado branco de minha família. Embora não tendo plena certeza das origens de minha família branca materna, ela provavelmente descende de imigrantes europeus, enquanto minha família negra paterna descende de povos africanos que foram traficados e escravizados por aqui. Com uma mãe branca e um pai negro, nasci em um país onde, como já ouvi em diferentes momentos, posso ser considerada “café com leite”, “moreninha”, “morena”, “cor de cuia”, entre tantos outros termos utilizados na tentativa de apagar, ou, ao menos, camuflar a negritude.

Crescendo em Santa Cruz do Sul, cidade do interior da região sul do país, me acostumei a ver suas ruas centrais enfeitadas com bandeiras da Alemanha durante o mês do outubro e a ouvir, na infância, comentários sobre o meu cabelo que, por vezes, podia ser comparado com uma vassoura. Lembro-me do desejo de ser branca quando, ao sentar ao lado de minhas colegas de escola, via minha pele destoar perto de suas peles brancas. De ficar incomodada com minha família negra me chamar de “negrinha”, como chamava todas as crianças da família. De ouvir as pessoas questionarem se eu era mesmo filha de minha mãe, pois é claro que eu só poderia ser adotada: “pegou uma moreninha pra criar?” - conta minha mãe sobre um episódio de minha infância.

Na adolescência, minha timidez e baixa autoestima fizeram com que eu me escondesse de mim mesma e não pensasse sobre questões raciais. Eu não me via como uma menina negra, tampouco como branca. Mas as interpelações que me forçavam a olhar para mim racializada não cessaram. Eis, então, que surge meu primeiro relacionamento amoroso, estabelecido com um rapaz branco. Um dia ele me conta, indignado, o que ouvira de uma amiga de sua mãe: “teus filhos vão ser uns macacos”. No início de minha graduação em Psicologia, durante o intervalo de um evento do curso, me levanto para ir pegar um café em meio ao aglomerado de estudantes em torno da térmica e ouço: “tu tá servindo?”. Lembro de uma aula sobre Psicologia e saúde mental onde me vi sendo usada como exemplo, pela própria professora da disciplina, de alguém que nunca poderia trabalhar em um Centro de Atenção Psicossocial - CAPS. Entre risos compartilhados com a turma, a justificativa para tal afirmação residia em meu cabelo, pois imagina se um usuário do serviço, em um momento de crise, se agarrasse a ele? Em uma turma prioritariamente constituída por mulheres (com cabelos lisos e longos), por que só eu havia sido mencionada como exemplo?

Em contrapartida, ao final de minha graduação, quando fui preencher o formulário para obtenção do registro no Conselho Regional de Psicologia, comentei com uma colega que eu iria marcar a opção parda, mas que sempre ficava em dúvida frente aos termos preta e parda (categorias utilizadas pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE). Ela, imediatamente, fez uma expressão de surpresa, me dizendo “mas tu é branca”. Semelhante a esse episódio foi o momento em que, deitada na sala de recuperação após o parto do meu filho, a enfermeira (uma mulher branca), que falava comigo de trás de sua mesa, me avisou que eu precisava responder a questões do formulário para nascidos vivos. Chega a pergunta da autodeclaração racial. Eu, ainda me recuperando do esforço do trabalho de parto, respondi que era negra. A enfermeira, explicitamente, em discordância dessa afirmação, repete a pergunta, ao que confirmo minha resposta. Ela, então, levanta-se de trás de sua mesa dirigindo-me um não; se aproxima ao lado da cama na qual me encontrava deitada e me diz que ela vai colocar parda no formulário. E assim foi.

Pergunto-me o que autoriza alguém a decidir, sem ao menos me perguntar se eu concordava, sobre a minha autodeclaração racial. Eu teria preenchido como parda - como em outras situações -, mas não é essa a questão, e sim a relação de hierarquia que se estabeleceu nessa situação. Imagino que seja provável que ela não tinha conhecimento de que, pela categorização do IBGE, pretos e pardos constituem a população negra do país. E quantos/as serão os/as que têm ou procuram compreender as questões raciais que nos constituem? Ambiguidades de nossa democracia racial que nunca passaram de um mito (como discutirei mais adiante).

Hoje não me surpreende mais pensar que, do início de minha graduação até a entrada no doutorado acadêmico (em um espaço de dez anos), eu só tenha recebido a indicação de um texto de um intelectual negro: o geógrafo Milton Santos. O segundo texto - Tornar-se Negro, de Souza (1983) - chegou a mim pela indicação de uma colega da equipe de trabalho de que eu participava, em um projeto da universidade, onde já completava o segundo ano do percurso de doutorado. Minha trajetória pelo mundo da Psicologia me colocou muitas questões: como pensar a afirmação da negritude, em meio a um mundo onde o ideal de branquitude está sempre em pauta? Branquitude essa que, desde a colonização, é cuidadosamente mantida no altar de visibilidade idealizada, a ser sonhada, protegida como a mais querida relíquia que poderíamos ter. Souza (1983), psicanalista negra, na década de 80, já nos mostrava que ter o branco como modelo de identificação torna a aproximação a este mesmo modelo a única possibilidade de tornar-se gente. Como nos falam Maria Aparecida Bento (2014) e Frantz Fanon (2008), o branco constituiu a si mesmo como modelo universal de humanidade. Ser gente, então, é ser branco? Parece que é exatamente isso que temos sido ensinadas/os há centenas de anos.

Como pode que, em pleno século XXI, temos ainda poucas produções no campo da Psicologia que pautem a racialidade como ponto de análise na constituição psíquica da população de um país fundado pela violência colonial, pela escravidão e pelo genocídio de sua população negra e indígena? Por que, quando se trata de discussões psis, podemos pautar a discussão sobre diferenças de gênero e, inclusive, de classe, mas quando se trata de negros e brancos, isso não se torna uma questão relevante? Para quem isso pode ser uma questão irrelevante? Como pode que, frente à questão racial, achemos sempre uma resposta, uma justificativa que nos permite fugir/fingir que, no campo psi, não precisamos discutir e estudar raça, racismo, negritude e branquitude, pois o que importa é a famosa “singularidade do sujeito”? Como pode aceitarmos discussões sobre as mudanças de nosso tempo, sobre o uso da tecnologia, mas ainda continuarmos ouvindo que a questão racial não é relevante porque a dinâmica do inconsciente é sempre a mesma? Ouvi, em uma equipe da qual fazia parte, que essas questões (no caso, raciais) deveriam ser tratadas em terapia ou nos movimentos sociais. Isso significava que ali, entre a equipe que trabalhava com crianças em um contexto de vulnerabilidade social, isso não era importante. Como é possível tecermos análises profundas sobre a cultura, mas acharmos que está tudo bem, se não falarmos dos efeitos de ser negra/o e branca/o nessa mesma cultura? Na supremacia branca, enquanto sistema de dominação e privilégios (hooks, 2019a), a sustentação do pacto narcísico da branquitude, que silencia frente ao racismo, defendendo apenas aquilo que lhe permite garantir a manutenção de seus privilégios (BENTO, 2014), é um mecanismo fundamental.

Quantas autoras/es negras/os temos lido durante nossas formações acadêmicas? Por que nunca ouvi falar de Virgínia Bicudo e Neusa Souza durante a graduação? Por que elas, psicanalistas brasileiras, não estão na bibliografia dos currículos? Se recuarmos no tempo e voltarmos à memória da escola, quantas/os foram as/os autoras/es negras/os que lemos? Quantas histórias com personagens negras/os ouvimos? E filmes e séries a que assistimos? Quando faço essas perguntas às/aos estudantes, com raríssimas exceções, há apenas dois livros que são citados: Menina bonita do laço de fita, escrito por Ana Maria Machado, em 1986, e a série de livros Sítio do Picapau Amarelo, de Monteiro Lobato (2020) (escritor abertamente entusiasta do movimento eugenista brasileiro). Como pode, então, que em um país com mais da metade de sua população sendo negra, só conheçamos dois livros com personagens não brancos em nossa infância? Vale lembrar que a autora e autor citados são pessoas brancas. Como nós, especialistas no campo psi, em pleno século XXI, ainda insistimos em discursos que sustentam que os processos da constituição subjetiva de uma criança branca podem ser parâmetro para todas as outras? Como pode uma criança que vê seu semelhante e a representação de sua imagem em todos os espaços de visibilidade, sobretudo, em todos os espaços pelos quais aquilo que é considerado belo, saudável e bom, representar os valores positivos da humanidade, passar pelos mesmos processos subjetivos de uma criança que aprende, ao longo de seu desenvolvimento, o peso da desigualdade racial que estrutura nossas relações e a ensina a rejeitar a si mesma como caminho para “torna-se gente” (SOUZA, 1983)?

Em meio a esses questionamentos e episódios e me encontrando com outras mulheres negras pelas andanças acadêmicas, fui reconhecendo a negritude que me constitui, construindo minha identidade como uma mulher negra de pele clara - tonalidade que sempre marco para situar meu lugar de experiência da negritude. Nesse caminho, meu encontro com Tornar-se Negro, de Souza (1983), e Mulheres, raça e classe, de Angela Davis (2016), foi fundamental. Esse foi meu primeiro encontro com intelectuais negras (entre tantos que estavam por vir), que me ajudou a voltar o olhar sobre a minha negritude e entender as amarras de um ideal branco que também operava sobre mim.

Incômodo e branquitude: que lugar é esse?

Recentemente, passei a notar que, sempre que eu ia me apresentar marcando meu lugar de fala, no qual incluo ser uma mulher negra de pele clara, me sentia como se eu estivesse me justificando, pedindo desculpas por assumir esse lugar. Entendia que esse sentimento deveria estar amarrado ao racismo que nos atravessa, mas demorei para compreender os meandros sobre como isso ocorria em mim. Levei bastante tempo para conseguir falar sobre isso abertamente, mesmo no espaço de terapia. Houve diversos momentos em que tudo o que conseguia fazer era nomear o meu incômodo sobre me sentir em uma zona de onde tanto era olhada pelos outros, como aprendi a olhar para mim mesma, como alguém sem lugar.

A compreensão das diferentes nomeações que marcam meu corpo e que, também, dizem de uma experiência coletiva, nos leva a um ponto analítico central: nossas relações fundamentadas em uma matriz colonial que sustentou a construção de um projeto de nação brasileira sob um paradigma de dominação, com parâmetros e valores civilizatórios eurocêntricos que corroboram sistemas de dominação globais, como o supremacista branco, o patriarcal e o capitalista (hooks, 2019a).

A empreitada colonial europeia, à conquista do chamado Novo Mundo, é apontada como tendo dado início ao maior escândalo da história da humanidade: a escravização do povo negro (NASCIMENTO, 2016). A colonização brasileira efetuada pelos portugueses fez do nosso o território da rota do Atlântico que recebeu o maior número de africanas/os traficadas/os. De acordo com o Projeto Voyage (banco de dados online de acesso livre), estima-se que o número de africanas/os traficadas/os que desembarcaram no Brasil, entre os anos de 1501 a 1900, seja de 4.821.126 pessoas. Os efeitos disso se traduzem na violência racial perpetuada por um país cujo maior mito é o da democracia racial.

A colonialidade que nos constitui produz uma narrativa complexa, originada na Europa, através da qual a civilização ocidental celebra suas conquistas e glorifica o advento da modernidade, ao mesmo tempo que esconde a violência colonial utilizada para isso, não existindo, portanto, modernidade sem colonialidade: “a América não era uma entidade existente para ser descoberta. Foi inventada, mapeada, apropriada e explorada sob a bandeira da missão cristã” (Walter MIGNOLO, 2017, p. 4).

Nesse processo, os valores civilizatórios europeus foram impostos por políticas de dominação que incluem diferentes estratégias ao genocídio do povo negro. Valores que permeiam todas as situações que narro ao longo dessa escrita, pois, se meu cabelo deveria ser de outro tipo, se o tom da minha pele é motivo de especulação e sugestões de combinações exóticas, se foi possível achar que o lugar cabível a mim em um evento universitário era servindo café no intervalo da tarde, é porque o parâmetro da normalidade, do sujeito verdadeiramente humano, é o corpo branco. Se hoje, como professora, é possível ouvir de colegas colocações que dizem não saber como eu passei em uma banca de aferição racial do concurso público porque tenho traços finos, justificando, antes de qualquer resposta que eu pudesse oferecer, que só me aceitaram por causa do meu cabelo; se é possível ser interpelada (após falar sobre colonialidade e racismo na academia, em uma discussão pública), com a pergunta sobre se eu já pensei em “ir a um psiquiatra?”, pois minha fala pareceu permeada de raiva, é porque existe uma posição hierárquica e de autoridade constituída às pessoas brancas, no cotidiano de nossas relações, que segue sustentando a branquitude como sistema de opressão.

Essas cenas são possíveis de existir no contemporâneo porque a violência colonial produziu uma noção racial hierarquizada, pela qual o sujeito branco (masculino, cisheteronormativo, cristão, elitista e europeu) se colocou no centro do que considerou como modelo universal de humanidade (BENTO, 2014), em contraponto a todas/os produzidas/os como outras/os, pertencentes aos povos negros e indígenas, passíveis de, nesse processo, terem sido desumanizadas/os, exploradas/os, escravizadas/os aqui pelas terras tupiniquins.

Após o longo período de tensionamentos e lutas que permitiram o processo de abolição da escravatura, o país se viu como um território formado por uma população que, em sua maioria, era constituída por afrodescendentes - justamente aqueles corpos não brancos que as lógicas de um projeto moderno-colonial colocavam como inferiores, pois civilização, progresso e razão diziam respeito exclusivamente à branquitude. Importante compreendermos que branquitude não se refere apenas à cor da pele, mas a um sistema de dominação racial, simbólica e material (BENTO, 2014; Lourenço CARDOSO, 2010) que consolida a superioridade branca e a subalternidade de outros grupos étnico-raciais: “branquitude é um lugar de privilégios simbólicos, subjetivos, objetivos, isto é, materiais palpáveis que colaboram para construção social e reprodução do preconceito racial e racismo” (CARDOSO, 2010, p. 611). Um lugar estrutural de onde o sujeito branco vê os outros e a si mesmo, desta forma, se institui como uma posição de poder, um lugar do qual se pode atribuir ao outro aquilo que não se atribui a si mesmo (CARDOSO, 2010).

No início do século XX, questões relativas ao desenvolvimento, industrialização e progresso da nação acompanhavam o cenário político brasileiro. Impulsionadas por ideais eugenistas, o branqueamento da população, com vistas à purificação da raça, passava a ser uma política governamental cujas estratégias incluíram a abertura do Brasil para a imigração europeia de países como Alemanha e Itália - o Rio Grande do Sul, estado onde nasci, foi um dos que recebeu grande número desses imigrantes. Não é por acaso que cresci ouvindo de diversas pessoas que minha família era brasileira, não apenas quando interrogada em relação ao meu sobrenome, mas porque meu corpo e de meu pai não nos faziam parecer ser “alemães” na cidade cujo hino inicia com a seguinte frase: “Por sobre nossas lindas terras/ Loiro imigrante andou...”.

Nesse projeto político de embranquecimento, sou a concretização de um produto calculado. Como mestiça, filha de um casal inter-racial (de mãe branca e de um pai negro de pele escura), carrego tanto a descendência de africanas/os traficadas/os para nosso país como escravas/os, como de imigrantes europeus aos quais o Brasil abriu suas portas na década de 30, por meio de políticas de incentivo à imigração que visavam ao “desaparecimento do negro através da ‘salvação’ pelo sangue europeu” (NASCIMENTO, 2016, p. 85). Entender esse processo não significa olhar para minha família e julgá-la como cúmplice desse projeto político de branqueamento da nação, como cúmplice de um genocídio da população negra colocado em curso desde a abolição da escravatura. O encontro entre meu pai negro e minha mãe branca foi um acaso possível entre pessoas que circulam pelo mesmo território. Pessoas que, nas andanças de seu cotidiano, se conhecem e se apaixonam.

Esse é um ponto importante de nos determos ao discutir as estratégias racistas que forjam nossos olhares. Já participei de conversas onde relacionamentos inter-raciais foram condenados. Quando uma mulher branca se refere a possíveis filhos de um relacionamento inter-racial como “macacos”, aí também está colocada uma condenação. Mais do que referenciar a existência de mulatas/os (forjadas/os no meio do caminho entre negritude e branquitude), o que está em jogo nesse discurso é a produção do não humano. Na possibilidade de afirmações como essa se encontra a articulação de uma política de dominação supremacista branca que cria processos subjetivos ao nosso embranquecimento e que deseja, em ultima instância, nossa eliminação. Em meio às feridas abertas sobre a pele negra, a política de branqueamento mostra seus dentes afiados, em um sorriso sarcástico.

Confusão racial, ou a falácia do “somos todos iguais”

Em contraposição a perspectivas que tentam entender e explicar a constituição do país, e da América Latina como um todo, exclusivamente, pela relação estabelecida com os europeus (portanto, uma formação que se deu pela branquitude), Gonzalez (1988) propõe a noção de Amefricanidade para a constituição de

[...] um olhar novo e criativo no enfoque da formação histórico-cultural do Brasil que, por razões de ordem geográfica e, sobretudo, da ordem do inconsciente, não vem a ser o que geralmente se afirma: um país cujas formações do inconsciente são exclusivamente europeias, brancas. Ao contrário, ele é uma América latina cuja latinidade, por inexistente, teve trocado o t pelo d para, aí sim, ter seu nome assumido com todas as letras: Améfrica Ladina. [...] Nesse contexto, todos os brasileiros (e não apenas os “pretos” e “pardos”do IBGE) são ladinoamefricanos (GONZALEZ, 1988, p. 69, grifos da autora).

Segundo a autora, a presença negra no Novo Mundo torna a América Latina, inclusive em suas formulações inconscientes, muito mais ameríndia e africana do que latina. No entanto, essa presença e suas contribuições em nossa constituição não são apenas encobertas pelo véu ideológico do branqueamento, como também são recalcadas por classificações eurocêntricas que relegam a contribuição negra apenas à cultura popular e ao folclore nacional. O processo de classificação do social e as técnicas jurídico-administrativas advindas das metrópoles ibéricas, ao nos estratificarem racialmente, “dispensaram formas abertas de segregação, uma vez que as hierarquias garantem a superioridade dos brancos como grupos dominantes” (GONZALEZ, 1988, p. 73).

No Brasil do pós-abolição, garantir a hierarquia racial andava junto com a eliminação da dita ameaça negra. Estupro e imigração foram recursos utilizados para a produção de um processo de miscigenação que visava eliminar a população afrodescendente, tarefa que exigia a produção de “produtos de sangue misto: o mulato, o pardo, o moreno, o parda-vasco, o homem-de-cor, o fusco, e assim por diante” (NASCIMENTO, 2016, p. 83). A convicção nessa política genocida foi tamanha que o delegado brasileiro presente no Primeiro Congresso Universal das Raças (em Londres, em 1911) fez a seguinte previsão: “que, até o ano 2012, o Brasil estaria livre do negro e de seu mestiço” (NASCIMENTO, 2016, p. 87).

Portanto, o terrível legado da escravidão no Brasil não cessou seus efeitos após a abolição da escravatura, em 1888. Jogada à própria sorte, a população negra enfrentaria o peso de um projeto político para sua eliminação. Como mostra Gonzalez (1988), o racismo latino-americano soube ser suficientemente sofisticado para manter subordinados negras/os e indígenas a partir da produção do desejo de embranquecimento. O mesmo opera com força total na internalização da superioridade do colonizador pelo colonizado, pois aqui, por nossas terras, o racismo tem assentamento na sutileza, no disfarce e escamoteamento através das teorias de miscigenação, assimilação e democracia racial. Para Lélia Gonzalez (1988), somos um exemplo evidente de racismo por denegação - que constitui a forma mais eficaz de alienação das/os discriminadas/os.

A análise da autora me faz lembrar de muitas situações experienciadas em um país onde se pode reconhecer o racismo, ao mesmo tempo que quase ninguém se reconhece enquanto racista (Kabengele MUNANGA, 2017). Quando vou buscar meu filho na escola e vejo que ele é o único aluno negro daquela unidade; quando estou aguardando sua saída da escola, em meio a mães e pais brancas/os e sou olhada da cabeça aos pés. De quando ouço de um colega (homem branco) que ele tem medo de se posicionar frente ao silenciamento coletivo de docentes e enfrentar o pacto narcísico da branquitude que ele mesmo reconhece, pois tem medo de sofrer represálias futuras; quando respondo a ele que eu não tenho escolha em me calar frente a situações de racismo. Qual é o lugar de um corpo negro na universidade? E de uma mulher negra, mãe e lésbica? Meu corpo, como único negro em meio a um coletivo de professoras/es brancas/os, se vê cansado de narrativas que ora lançam o estereótipo da negra raivosa, ora daquela que precisa ter paciência com a branquitude, ora daquela que é simplesmente ignorada quando diz que é preciso pensar as implicações da branquitude nos processos de ensino-aprendizagem.

A fabricação do branqueamento, ao promover a mestiçagem produziu, também, a confusão racial da qual nos fala Carneiro (2011): é a partir dela que diferenciações como as categorias do IBGE de pretos e pardos, dentro da raça negra, têm funcionado

[…] como elementos de fragmentação da identidade negra e impedindo que esta se transforme em elemento aglutinador no campo político para reivindicações coletivas por equidade racial, pois, ao contrário do que indica o imaginário social, pretos e pardos (conforme nomenclatura do IBGE) compõem um agrupamento que, do ponto de vista dos indicadores sociais, apresenta condições de vida semelhantes e igualmente inferiores quando comparadas ao grupo branco (CARNEIRO, 2011, p. 67).

Nesse sentido, essa compreensão sobre essa suposta ‘confusão racial’ precisa ser deslocada do lugar de individualização das questões raciais. É preciso assumir um olhar que se movimente entre a esfera das experiências pessoais e o âmbito macropolítico para que possamos compreender que as práticas que sustentam a colonialidade das nossas relações têm relação direta com um projeto de embranquecimento que aposta suas fichas na produção da miscigenação que produz mulatos/as utilizados/as como símbolo para sustentar o mito da democracia racial (NASCIMENTO, 2016).

Os efeitos dessa política genocida continuam perdurando entre nós. Em um país onde, segundo os dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios do IBGE, relativa ao primeiro trimestre de 2020, a população branca representa 42,7%, a parda 42,2% e a preta 9,2% (lembrando que ambas constituem a população negra), os maiores índices de violência e desigualdade recaem sobre a população negra brasileira (IBGE, 2020). A colonialidade que estrutura as relações em nosso mundo (re)produz sistematicamente lugares de subalternidade a essa mesma população.

Desde muito cedo, aprendemos a reconhecer a supremacia branca de nossa sociedade em todos os seus âmbitos - vivemos em um país que é muito efetivo no processo de ensino da hierarquia das relações entre brancos, negros e indígenas. Não surpreende que o último país a abolir a escravidão produza estatísticas com números que deveriam ser inaceitáveis entre nós, brasileiras e brasileiros. Números que, em contrapartida, grande parte da população parece já ter naturalizado. Porcentagens que nos mostram como, nos últimos 10 anos, o homicídio de pessoas negras aumentou 33,1%, frente a 3,3% dos não negros; que a mesma taxa entre mulheres negras aumentou 29,9%, contra 4,5% de mulheres não negras (IPEA; FBSB, 2019).

Números que conformam situações de racismo nas quais crianças são assassinadas todos os dias com tiro de bala perdida, com tiro pelas costas, como Ágatha Félix (EL PAÍS, 2019).1 Números que representam vidas perdidas, violentadas por uma sociedade que, perversamente, promove o discurso de que vivemos em uma (suposta) democracia racial.

Forjados no seio dessa democracia racial inexistente, a/o mulata/o constitui o produto de uma política de transição - de sujeitos negros a sujeitos embranquecidos, que tem como busca final a branquitude. Isso não porque sujeitos negros nascem com um sentimento de inferioridade frente aos padrões da branquitude, mas porque a produção de uma assimetria, de uma hierarquização das relações raciais em nosso país tem como base estratégias de dominação e coação que têm como efeito tanto a produção de uma subcultura, como o processo de identificação de pessoas negras com pessoas brancas (NASCIMENTO, 2016).

Hoje, ao olhar para o processo de afirmação de minha negritude, vejo que algo fundamental que me possibilitou não seguir um ideal de branquitude como algo que parecia naturalizado para uma vida adulta que se iniciava em meio a uma cidade que, pela colonização alemã, exaltava as características fenotípicas europeias, foram as experiências e memórias revisitadas na relação com minha avó paterna e as reuniões da família (negra). Momentos em que sua casa se transformava em uma grande comunidade falante e alegre, principalmente nos domingos que passávamos juntas/os. Afeto e cuidado coletivo era o que estavam me ensinando sobre negritude, a despeito dos estereótipos que uma sociedade supremacista branca nos impõe.

Essas memórias, junto ao encontro de todas as mulheres negras que hoje me inspiram, me ajudaram a curar minha “dor da cor” (CARNEIRO, 2011). Se passei anos sem resposta para o que eu era em um mundo que se autorizava a me chamar de “moreninha”, “da cor do pecado”, foi minha avó e suas/seus filhas/os que sempre me nomearam como “negrinha”. Mesmo que, naquela época, eu tenha desejado não ser negra, imaginando que minhas pernas pudessem ser mais branquinhas, como eram as de minhas colegas na escola; mesmo que, na adolescência, eu vivesse de cabelo preso para domar seu volume que tanto me incomodava. Eu ainda não percebia que o que eu tentava domar era a negritude em mim.

Subjetividades constituídas em meio a um projeto de embranquecimento

Nos anos 80, entre as poucas produções no campo da psicanálise sobre a temática racial e processos de constituição psíquica de pessoas negras, a psicanalista Neusa Santos Souza (1983), ao escrever sobre construção da emocionabilidade e identidade do negro brasileiro em meio aos processos de sua ascensão social, nos mostra os meandros dessa produção de inferiorização sobre o que é relacionado à negritude, através do que podemos chamar de uma manutenção da supremacia branca. Como afirma a autora, a “história da ascensão social do negro brasileiro é, assim, a história de assimilação aos padrões brancos de relações sociais” (SOUZA, 1983, p. 23). Suas análises vão ao encontro do que aponta Fanon (2008), ao mostrar como o negro, ao não encontrar confirmação de sua humanidade no outro (sujeito branco, constituído como universal), aprende a olhar a si através do olhar do colonizador. A fim de poder conquistar espaços que o branco ocupa, deseja ser como este, negando a si mesmo: “O negro quer ser branco. O branco incita-se a assumir a condição de ser humano” (FANON, 2008, p. 27).

Se nos tornamos negras/os em um país de classe, ideologia, estética, comportamentos, exigências, expectativas brancas (SOUZA, 1983), como não sucumbir à tentativa de apagamento de nossa negritude? Como não sucumbir ao feitiço de encantamento que a branquitude nos joga, se, como nos diz Grada Kilomba (2019, p. 18), “[n]ós vivemos em um cubo branco (white cube)/que tem uma relação muito problemática com a negritude”? Segundo a autora (artista interdisciplinar e escritora negra), a sociedade branca, patriarcal e capitalista na qual vivemos é narcisista. Em sua performance e leitura decolonial do mito de Narciso, Kilomba (2019) nos conta sobre como esse personagem representa e constitui a branquitude que nos cerca, acompanhada sempre de seu mais leal e fiel amante não correspondido: o Eco, aquele que constitui o consenso da branquitude, que tudo repete e que tudo confirma.

Sim, há possibilidades de resistência. Nossos ancestrais sempre lançaram mão de estratégias para que, mais do que sobreviver, pudessem (re)existir. A luta de quem nos antecede é o que nos permite estarmos vivos, estarmos ocupando espaços de ascensão social, como a própria experiência da minha trajetória que, através das lutas cotidianas das gerações que me antecedem, me possibilitou ser, hoje, a primeira doutora da família e primeira professora em uma universidade.

Celebrar as conquistas é tão importante quanto compreender os efeitos do racismo sobre a experiência emocional da população negra, em meio a uma sociedade constituída pelo ideal de supremacia branca, e a possibilidade de que negras/os respondam positivamente ao apelo da ascensão social que coloca como imperativo valores, status e prerrogativas brancas (SOUZA, 1983). Para a autora, um negro que “se empenha na conquista da ascensão social paga o preço do massacre mais ou menos dramático de sua identidade” (SOUZA, 1983, p. 18). Se a única forma de ascender socialmente é negando sua negritude, tomando o branco como modelo de identificação, essa se torna também sua “única possibilidade de ‘tornar-se gente’” (idem). Mas como se tornar aquilo que nunca se poderá ser? O fato de ser inteligente, bela e com bons recursos financeiros não será garantia de êxito a uma pessoa negra, pois “o Ideal do Ego do negro, que é em grande parte construído pelos ideais dominantes, é branco. E ser branco lhe é impossível” (ibidem, p. 40). Como versa Kilomba (2019, p. 19), o racismo “[c]oloca-nos fora da Humanidade”.

Nesse sentido, a produção da equação humanidade = pessoas brancas é, talvez, o mais avassalador e perverso efeito racista produzido pelo ideal de supremacia branca. E, aqui, voltamos à força da política de embranquecimento da população brasileira que, em curso há décadas como estratégia genocida sobre os sujeitos negros, continua a produzir a confusão racial que nos habita, a qual nos leva a usar a miscigenação como forma de justificativa da nossa incapacidade de nos autodeclararmos racialmente (CARNEIRO, 2011).

Carneiro (2011) chama atenção para o enfrentamento necessário ao que denominou “a dor da cor”. Desde os tempos sombrios da escravidão, a manipulação da identidade de negras/os de pele clara (mulatas/os, morenas/os, entre tantos outros termos utilizados para se referir à negritude sem nomeá-la) tem sido usada como paradigma estético humano na escalada pelo branqueamento, como carta de alforria ao estigma da própria negritude:

[U]m tom de pele mais claro, cabelos mais lisos ou um par de olhos verdes herdados de um ancestral europeu são suficientes para alguém que descenda de negros se sentir pardo ou branco, ou ser “promovido” socialmente a essas categorias. E o acordo tácito é que todos façam de conta que acreditam (CARNEIRO, 2011, p. 64).

Mesmo considerando a positividade do fato de que, em relação às categorias para autodeclaração racial utilizadas pelo IBGE, pretos e pardos representam a população negra de nosso país, a autora nos fala de um certo temor pardo no qual caberiam todas e todos que não se consideram ou não desejam ser reconhecidas/os como negras/os, amarelas/os ou indígenas. Todas/os que encontram no termo pardo uma “zona cinzenta onde possam se abrigar, se esconder e se esquecer de sua origem renegada” (CARNEIRO, 2011, p. 64).

Seguindo as reflexões da filósofa, outra estratégia utilizada em uma sociedade racista é o aprisionamento do outro (constituído como diferença) em imagens fixas e estereotipadas que, no cenário brasileiro, dizem respeito às imagens da negritude e dos povos indígenas, ao mesmo tempo que destina aos considerados racialmente hegemônicos - ou seja, as pessoas brancas - o privilégio de serem representados (e, portanto, vistos) em sua diversidade: há pessoas brancas loiras, morenas, ruivas e até mesmo brancos/as que apresentam um alto grau de morenice sem que isso as faça deixar de se sentirem brancas/os, como no caso dos espanhóis, que menciona a autora. A branquitude, portanto, é policromática, plena em sua diversidade, “negritude, no entanto, padece de toda sorte de indagações” (CARNEIRO, 2011, p. 64, 71).

Aprisionadas/os aos estereótipos sobre ser negra/o produzidos por uma sociedade supremacista branca, muitas vezes não vemos, não reconhecemos e, por vezes, não queremos reconhecer a presença e existência de negros/as de pele clara. Carneiro (2011) sustenta que, independente da miscigenação de casamentos inter-raciais, famílias negras apresentam grande variedade cromática,

[…] herança de miscigenações passadas, que, historicamente, foram utilizadas para enfraquecer a identidade racial dos negros. Isso é feito pelo deslocamento da negritude, que oferece aos negros de pele clara as múltiplas classificações de cor que por aqui circulam […] (CARNEIRO, 2011, p. 72).

A mestiçagem como estratégia de uma política de branqueamento, portanto, genocida, ao produzir a figura do/a mulato/a, ofereceu ao mito da democracia racial um excelente produto à sua própria sustentação. Como evidencia Munanga (2017), essa figura é manipulada pela ideologia racial brasileira tanto para escamotear os problemas como para impedir propostas de ações afirmativas. Munanga (2017) e Carneiro (2011) são unânimes ao afirmarem que, em sua especificidade, o racismo brasileiro, ao dividir suas vítimas entre pretos e pardos, produz desmobilização, diminuindo a coesão e a força política de reivindicações para o coletivo da população negra. Cria, assim, “a ambiguidade dos mestiços, dificultando o processo de formação de sua identidade quando, ainda não politizados e conscientizados, muitos deixam de assumir sua negritude e preferem o ideal de branqueamento” (MUNANGA, 2017, p. 41).

Os efeitos disso, como elucida Carneiro (2011), atravessam, colonizam nosso tempo e espaço, nossos corpos e subjetividades que passam a se constituir sustentadas pelas narrativas da confusão racial e, sobretudo, da mestiçagem como justificativa e prova de uma democracia racial que nunca se efetivou pelas terras batizadas de Brasil.

Para amar a negritude: militância e escrita

[...] encontrar a voz é um ato de resistência. Falar se torna tanto uma forma de se engajar em uma autotransformação ativa quanto um rito de passagem quando alguém deixa de ser objeto e se transforma em sujeito. Apenas como sujeitos é que nós podemos falar.

(bell hooks)

Se a branquitude é Narciso que se enamorou pela própria imagem (KILOMBA, 2019), se é feitiço (espalhado por toda sociedade) que nos encanta para que procuremos em nosso reflexo a semelhança, o espelhamento de uma imagem branca - tarefa que leva tantas/os de nós a sucumbirmos às águas fundas de um lago onde nunca encontramos respaldo para nossos corpos e tonalidades negras -, como resistir, diante desse cubo branco que não cansa de tentar nos colocar fora da humanidade? (idem)

Aqui, quero novamente trazer as contribuições da produção intelectual de duas grandes intelectuais negras: a potência do exercício da militância, em Souza (1983), e a escrita para um processo de autorrecuperação, conforme nos fala hooks (2019a). Dois pontos que podem funcionar como chaves antirracistas que nos auxiliam no percurso em direção a uma cura da “dor da cor” (CARNEIRO, 2011).

Souza (1983) nos aponta a militância como meio de nós negras/os recuperarmos nossa autoestima (e talvez, não apenas recuperarmos, mas a construirmos como meio de afirmação de nossa existência). Militância como condição de cura, como possibilidade de construção de outro Ideal de Ego para nós negras/os, que não nos force a olhar para nós tendo como referência aquilo que não somos, ou seja, a branquitude que nos desumaniza. “Um novo Ideal de Ego que lhe configure um rosto próprio, que encare seus valores e interesses, que tenha como referência e perspectiva a História. Um Ideal construído através da militância política, lugar privilegiado de construção transformadora da História” (SOUZA, 1983, p. 44) e que, construído através da militância, possa se fundamentar na nossa amefricanidade (GONZALEZ, 1988), nos implicar coletivamente na luta pela afirmação da negritude e superação da supremacia branca.

Junto à militância, articulo o convite que hooks (2019a) nos faz sobre a escrita como uma possibilidade de autorrecuperação que, nesse texto, se soma ao exercício de pensarmos ferramentas-chave para um processo de cura da “dor da cor” (CARNEIRO, 2011). Assim, podemos pensar o caminho da militância em conexão com uma prática implicada no processo de autorrecuperação: o exercício da escrita. hooks (2019a) nos mostra como a linguagem também se configura como um lugar de luta, a partir do qual a escrita pode ser exercida como possibilidade de um despertar à consciência crítica. Ao narrar como foi seu processo de produção do livro Eu não sou uma mulher?, a autora menciona que

[…] ao escrever aquele livro, fui compelida a confrontar a realidade das mulheres negras, nossa história negada e enterrada, nossas circunstâncias presentes. O pensamento, a escrita, foi um ato de restauração, permitindo que e me recuperasse […]. Eu chamo essa experiência de “autorecuperação” (hooks, 2019a, p. 77).

Em hooks (2019a; 2019b), autorrecuperação e amar a negritude são processos que se conectam. Ao nos afirmar que o racismo é aprendido, hooks (2019b) nos diz que podemos e precisamos, também, ensinar a amar a negritude como forma de combatê-lo. Um ensinamento que precisa ser exercido em nossas práticas cotidianas. Isso me remete ao vídeo de um TED a que assisti tempos atrás, onde Gládis Kaercher (2018), professora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, nos conta sobre a percepção do racismo em sua trajetória de vida e sobre como a aposta em um trabalho pautado em uma prática antirracista emergiu. Ela, acompanhada de uma colega, foi a inventora da proposta da paleta de cores de um estojo de lápis (efetivamente) cor de pele (KAERCHER, 2018), pois pele é um órgão que tem muitos tons.

Como nos mostra Carneiro (2011), a despeito da tentativa de seu não reconhecimento, não é apenas a branquitude que é policromática, mas também a negritude. É disso que nos fala Kaercher (2018), quando efetiva uma prática antirracista que busca proporcionar às crianças uma experiência positivada da negritude, através da qual ela pode ser vista e vivenciada com alegria. Nesse sentido, como ressalta hooks, “a desconstrução da categoria ‘branquitude’ […] para esse processo de desaprender atitudes e valores supremacistas brancos” (2019b, p. 50) é central. Portanto, a interrogação que Carneiro (2011) nos coloca é fundamental:

Em termos de saúde mental, o que significam um ego e uma subjetividade inflados pelo sentimento de superioridade racial? […] Nesse sentido, [a] desconstrução da brancura como ideal de ego da sociedade é imperativo para a libertação e cura de todos: negros, brancos, indígenas, orientais. E talvez nisso resida o papel mais estratégico que os psicólogos têm a cumprir (CARNEIRO, 2011, p. 81).

Aqui, como diz hooks, amar a negritude é a afirmação de resistência: “[a]mar a negritude como resistência política transforma nossas formas de ver e ser e, portanto, cria as condições necessárias para que nos movamos contra as forças de dominação e morte que tomam as vidas negras” (hooks, 2019b, p. 63). Nessa direção, militância e escrita são práticas que nos possibilitam operar a não separação entre público e privado, entre eu e política. Ainda que, em um país fundado sobre a violência colonial e o racismo que a sustenta, o processo de tornar-se negra e negro seja, muitas vezes, doloroso, como nos diz Souza (1983):

[S]aber-se negra é viver a experiência de ter sido massacrada em sua identidade, confundida em suas perspectivas, submetida a exigências, compelida a expectativas alienadas. Mas é também, e sobretudo, a experiência de comprometer-se a resgatar sua história e recriar-se em suas potencialidades (p. 18).

Voltando ao ponto que mencionei mais acima, sobre como tenho percebido a mim mesma quase me justificando por me autodeclarar uma mulher de pele negra, reconheço que foram necessários mais de trinta anos para compreender certas nuances do racismo que nos marca, nos subjetiva. Já tinha realizado várias leituras que me desanuviaram questões que nunca tinha entendido pelo viés racial, como, por exemplo, uma autoestima que pouco se estimava, pois, quando não temos formação para compreender as relações étnico-raciais, o entendimento de amor próprio, ao menos no campo da Psicologia, facilmente é apenas compreendido por mecanismos analíticos forjados por uma elite branca europeia para quem o racismo e a violência colonial não se colocam como questão. As leituras foram diversas, mas elas não me pareciam suficientes para que eu pudesse compreender certos processos e experiências vividas. Fui entendendo a necessidade de me aquilombar, embora a zona cinzenta na qual eu me situava - aquela região-espécie de limbo dos pardos - me fizesse hesitar em me envolver com grupos onde eu pudesse, coletivamente, exercer a militância.

Foi ao assumir como docente de uma universidade pública que a possibilidade de aquilombamento se concretizou. Lá, a despeito de práticas que ainda conformam a colonialidade acadêmica e episódios cotidianos de racismo, pude ser parte de coletivos cujas lutas se situam no enfrentamento ao racismo institucional, como o “Coletivo bell hooks: psicologia e políticas do cuidado”,2 onde me encontro com mulheres negras como Daniela, Diônvera e Aline - engajadas em processos de cura e resistência. Ser parte de percursos de ensino e aprendizagem sustentados pela luta antirracista de estudantes negras/os que, pela possibilidade das ações afirmativas, têm ingressado em maior número na universidade, estando, hoje, docente na disciplina de Relações Étnico-Raciais e Psicologia e integrando a Comissão Permanente de Combate ao Racismo Institucional do Instituto de Psicologia da universidade. Junto a esses processos, inspirada por hooks (2019a) a também “erguer a voz”, iniciei um percurso de escrita e de fala sobre o processo de autoafirmação de minha negritude. Nada disso foi simples. E segue não sendo. Mas, nesse percurso, essa escrita pode nascer, também, como possibilidade de autorrecuperação de minha própria “dor da cor”. Assim, em meio a esse processo de formação e compreensão das questões raciais de nosso país, que uma chave se fez presente para mim. Por que mesmo eu me sentia desconfortável por me assumir negra? Filha de um casal inter-racial, eu nunca havia me dado conta das implicações que poderiam surgir com o fato de ser uma menina negra, cuja mãe é branca. Nem que o racismo que nos assola é tamanho que, poderia, inclusive, se atravessar na relação mãe e filha. Me assumir negra me fez dolorosamente perceber que o racismo me colocava em uma posição de justificar, explicar minha negritude a quem se fazia ouvir por mim, mas não só a essas pessoas, também à minha mãe. Era quase um pedido de desculpas por não me espelhar (ao menos, não mais) na imagem da branquitude. A política do desejo pelo embranquecimento que coloniza nossos corpos negros precisa ser levada a sério em todos os âmbitos da sociedade. E é fundamental que nós, psicólogas/os brasileiras/os, possamos compreender esses mecanismos, pois seus efeitos em nossas vidas podem simplesmente nunca serem escancarados. E como pensar práticas de autorrecuperação de processos que nunca são nomeados? O racismo seguirá operando, queiramos nós reconhecê-lo ou não.

Que a luta antirracista possa continuar a nos ensinar a aprender a amar a negritude. Para isso, precisamos seguir sustentando políticas transformadoras que nos permitam olhar para nossa própria história, para as lutas e resistências do povo negro brasileiro para que, assim, possamos abrir espaços para uma mirada e pensamento crítico sobre nós mesmos e sobre as políticas de dominação que se lançam sobre nós. Sobretudo, abrir espaços a um pensamento contra colonial afrodiaspórico brasileiro com o qual possamos seguir afirmando a luta antirracista. E sem sombra de dúvidas, como apontam hooks (2019b) e Carneiro (2011), a desconstrução da branquitude é procedimento fundamental a essa tarefa. A luta continua.

Referências

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1Em setembro de 2019, Ágatha Félix, de oito anos, morreu baleada pelas costas durante uma operação policial no Complexo do Alemão, Rio de Janeiro. Informações disponíveis em https://brasil.elpais.com/brasil/2019/09/21/politica/1569099826_106579.html.

2Coletivo, de que estou na coordenação, institucionalizado na universidade como um programa de extensão que oferece diferentes ações relacionadas à extensão, à formação e à pesquisa. É constituído por estudantes da graduação, pós-graduação, técnicas, profissionais formadas/os e docentes de diferentes regiões e universidades do país. Endereço de nossa rede social: @coletivobellhooks.

Como citar esse artigo de acordo com as normas da revista: RODRIGUES, Luciana. “Negra de pele clara: embranquecimento e afirmação da negritude no Brasil”. Revista Estudos Feministas, Florianópolis, v. 30, n. 2, e74733, 2022.

Financiamento: Não se aplica

Consentimento de uso de imagem: Não se aplica

Aprovação de comitê de ética em pesquisa: Não se aplica

Recebido: 13 de Junho de 2020; Revisado: 24 de Novembro de 2021; Aceito: 10 de Dezembro de 2021

lurodrigues.psico@gmail.com

Luciana Rodrigues (lurodrigues.psico@gmail.com) é Professora Adjunta do Departamento de Psicologia Social e Institucional da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Doutora em Psicologia Social e Institucional pela UFRGS. Colaboradora do PPGPSI/UFRGS. Desenvolve atividades de pesquisa, ensino e extensão relacionadas ao campo das políticas públicas e relações raciais. Curriculum Lattes: http://buscatextual.cnpq.br/buscatextual/visualizacv.do?id=K4257597T6

Contribuição de autoria: Não se aplica

Conflito de interesses: Não se aplica

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