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Revista Estudos Feministas

versão impressa ISSN 0104-026Xversão On-line ISSN 1806-9584

Rev. Estud. Fem. vol.30 no.2 Florianópolis maio/ago 2022  Epub 01-Jun-2022

https://doi.org/10.1590/1806-9584-2022v30n286992 

Seção Temática Fazendo Gênero em tempos de pandemia

Em tempo de guerra todo buraco é uma trincheira

In wartime, every hole is a trench

En tiempos de guerra, cada agujero es una trinchera

1Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, RS, Brasil. 90046-900 - ppgedu@ufrgs.br


Resumo:

No artigo, tratamos do ambiente macropolítico no Brasil dos últimos anos, envolvendo os ataques que grupos religiosos fundamentalistas, organizações da nova direita radical e políticos de viés autoritário fazem sobre a escola, na tentativa de impedir a abordagem educacional de questões em gênero e sexualidade. Mostramos a importância da abordagem, na cultura escolar, das questões em gênero e sexualidade. Vinculamos essa abordagem com a educação em e para os Direitos Humanos e com a construção de uma educação democrática. Estabelecemos conexões entre essa vinculação e as lutas mais gerais em favor da democracia, insistindo que as questões em gênero e sexualidade são mais do que temas de estudos, e não são apenas questões da ordem dos costumes ou da moral. Gênero e sexualidade são questões estruturantes da vida política, envolvendo disputas de distribuição de poder.

Palavras-chave: gênero; sexualidade; escola; família; religiões

Abstract:

The article discusses the macropolitical environment in Brazil in recent years, involving the attacks that fundamentalist religious groups, new radical right organizations and authoritarian politicians make on the school, to prevent the educational approach to gender and sexuality issues. It shows the importance of the approach, in the school culture, of gender and sexuality issues. It links this approach with education in and for human rights and with the construction of democratic education. It establishes connections between this link and the more general struggles in favor of democracy, insisting that issues of gender and sexuality are more than subjects of study, and are not just questions of the order of customs or morals. Gender and sexuality are structuring issues of political life, involving disputes over the distribution of power.

Keywords: Gender; Sexuality; School; Family; Religions

Resumen:

El artículo aborda el entorno macro político en Brasil en los últimos años, involucrando los ataques que los grupos religiosos fundamentalistas, las organizaciones de nueva derecha radical y los políticos autoritarios hacen a la escuela, en un intento de impedir el abordaje educativo de las cuestiones de género y sexualidad. Muestra la importancia del abordaje, en la cultura escolar, de las cuestiones de género y sexualidad. Vincula este enfoque con la educación en y para los derechos humanos y con la construcción de una educación democrática. Establece conexiones entre este vínculo y las luchas más generales a favor de la democracia, insistiendo en que las cuestiones de género y sexualidad son más que temas de estudio, y no son sólo cuestiones de orden costumbrista o moral. El género y la sexualidad son cuestiones estructurantes de la vida política, que implican disputas por la distribución del poder.

Palabras clave: género; sexualidad; colegio; familia; religiones

A guerra que se alimenta da guerra

A metáfora da guerra não foi posta aqui por descuido, casualidade, desatenção, equívoco ou exagero. Os conflitos, as divergências de opinião e as negociações em questões que envolvem os marcadores sociais da diferença (pertencimentos de gênero, sexualidade, raça, religião, classe social, geração, região, etnia, tribos culturais, genealogias familiares e estruturas de organização familiar, agrupamentos esportivos, padrões corporais, posições políticas e partidárias, gostos musicais, inserção em redes sociais, preferências de consumo e mais uma infinidade de pertenças que a todo momento agenciam posições de sujeito e sujeita) são próprios da vida em uma democracia. São também componentes fundamentais da cultura escolar, geradores de estratégias pedagógicas que ensinam a viver na diferença, própria do espaço público.

Entretanto, nas últimas décadas, por ação combinada de grupos religiosos fundamentalistas, organizações da nova direita radical e políticos de viés francamente autoritário derivaram em guerra. Tal afirmação vale especialmente para as batalhas morais (Richard MISKOLCI, 2021) em torno de questões em gênero e sexualidade, e, mais particularmente, ainda quando tais embates ocorrem no âmbito do percurso escolar (Cláudia Pereira VIANNA, 2018). Essa guerra não é apenas uma guerra moral, mas um componente estratégico de implementação da racionalidade neoliberal (Pierre DARDOT; Christian LAVAL, 2016). Ela diz de uma reorganização profunda da vida em sociedade, em que a meta neoliberal parece combinar a busca de um estado mínimo, que implica extinção ou privatização de serviços públicos, articulada com a construção de um estado fortemente regrador em questões que envolvem família e moralidade e controle das mulheres. O regramento moral se vincula a encargos que desaparecem da oferta do estado, e passam a integrar as responsabilidades da família, recaindo, em geral, sobre as mulheres. Parte importante dos debates políticos se transfere para a esfera pública técnico-midiatizada (MISKOLCI, 2021) e recai sobre os indivíduos a exigência de adotarem uma performance de “empresários-de-si-mesmos”, o que mais adequadamente poderia ser qualificado como “proletários-de-si-mesmos”, conforme discutido por Ricardo Antunes (2018). Tudo isso implica novas funções de cuidado, educação, saúde e previdência para as famílias (Melinda COOPER, 2017). Com o estado mínimo, derivamos para uma guerra de todos contra todos (e todas contra todas), e um enfraquecimento da noção de coletivo e das estratégias de solução compartilhada. Nesta guerra, as questões em gênero e sexualidade não são questões menores, simples “questões de costumes” ou “pauta de costumes” de segunda categoria frente à “pauta econômica” de primeira categoria, como muitas vezes a imprensa a elas se refere. Gênero e sexualidade são questões estruturantes da vida em sociedade, especialmente em intersecção com raça, classe e geração nos dias de hoje, e fundamentais para uma vida na democracia.

Em debates no âmbito dos regimes democráticos, o pensar diferente é visto como discordância, a exigir composição de opiniões para a busca de um consenso articulado, que solucione um problema ou encaminhe a construção de uma política pública. Na escola republicana, é central operar com a noção histórica de modus vivendi, a saber, capacidade de construir acordos entre indivíduos e grupos cujas opiniões diferem (Fernando SEFFNER, 2017). A democracia não é simplesmente o regime político dos consensos, como muito se escuta dizer. Ela é o regime político que melhor lida com os conflitos, os dissensos e com o movimento do direito a ter direitos (Marilena CHAUÍ, 2018), ajudando a produzir alguns consensos, que são sempre provisórios, mas que permitem o encaminhamento dos debates a novos patamares. No clima de guerra movido pelas forças fundamentalistas religiosas e da direita autoritária, a opinião divergente não é vista como válida, ela é a opinião de um inimigo. Essa é a razão do uso da metáfora da guerra. Em uma guerra, não há meramente pessoas que pensam de modo diferente, há inimigos. E inimigos devem ser exterminados. O exercício do diálogo cessa, crescem exponencialmente os discursos de ódio, proferidos em geral como se fossem simples manifestação do direito da liberdade de expressão, que seria um direito sem limites, esquecendo que, nos regimes de direitos, uns direitos moderam os outros de modo constante, em processo articulado. Ao outro, ou à outra, não se reconhece nenhuma legitimidade de opinião. Ele ou ela devem ser eliminados. O uso recorrente do símbolo de arma feita com os dedos, o já conhecido gesto de “fazer arminha”, a indicar o caminho a seguir para resolução de conflitos, é o registro simbólico mais evidente de que há, no Brasil, grupos políticos que advogam essa estratégia, que implica o fim da democracia. Outra estratégia que produz a guerra que se alimenta da guerra é a combinação de argumentação puramente polêmica com o opinionismo. Posso divergir de outra pessoa simplesmente porque tenho gosto por teorias conspiratórias; acho que minha opinião é a melhor apenas por ser minha opinião; refuto o que diz a ciência, porque digo que ali há marxismo cultural; flerto com o terraplanismo, porque percebo nele um grupo político que pode me seguir nas redes sociais; não aceito que me critiquem, apenas aceito críticas de quem é igual a mim; sigo algumas pessoas como mitos, e os mitos estão acima dos erros; utilizo uma retórica recheada de palavrões, pois sei que isso causa impacto e gera notícia. Enfim, não abro espaço para diálogo ou debate, apenas mantenho a guerra polêmica. A midiatização de tais performances causa profundo impacto na cultura escolar, que deve se pautar pela argumentação científica e pelo debate racional e educativo.

É em torno deste cenário que o artigo se move. Seu foco é a escola pública brasileira, e os embates que ali acontecem em questões de gênero e sexualidade, em particular no confronto com as opiniões e demandas das famílias e das instituições religiosas. Em síntese, a posição que avançamos no artigo é de que a escola pública brasileira sofre, atualmente, um processo de tentativa de colonização via imposição de valores das famílias e de algumas religiões sobre ela, o que lhe retira autonomia didática e pedagógica. Vale lembrar que a autonomia escolar e a autonomia docente - a liberdade de ensinar - são princípios previstos na Constituição Federal de 1988, além de serem valores que marcam a cultura política em todas as democracias do mundo. Os entraves na abordagem das questões em gênero e sexualidade, tentados por organizações conservadoras e fundamentalistas, jogam papel decisivo nesta tentativa de colonização da cultura escolar e de fazer prevalecer valores da ordem do privado - família - e da ordem do transcendente - religião, sobre os valores da ordem da ciência e do espaço público. No regime republicano, a cultura escolar deve se reger por valores do espaço público e pelos princípios da ciência, e não por valores do âmbito doméstico e religioso. Tal afirmação não implica desqualificar o que as famílias pensam, ou no que acreditam os membros de confissões religiosas. Implica apenas deixar claro que cada instituição na sociedade tem uma tarefa, e a realiza com autonomia. Não se vai à escola para lá escutar o que já se escutou de mães e pais, ou o que já se escutou de padres e pastores. Justamente se vai à escola para ampliação dos horizontes, no caso, a partir do repositório do conhecimento científico. De posse deste variado leque de posições e saberes, cada um e cada uma vai formando sua opinião e seus juízos de valor para seguir na vida. Desvalorizar o pensamento científico, fazer troça das conquistas em termos de saúde pública, é algo que afeta diretamente a cultura escolar, pois a escola é o lugar da alfabetização científica.

O título do artigo faz alusão ao fato de que, nesta conjuntura de guerra que as forças reacionárias declararam, multiplicaram-se as trincheiras de luta. Algumas das numerosas trincheiras de enfrentamentos situadas nas fronteiras entre escolas, famílias e religiões, e onde as questões em gênero e sexualidade habitam, são: o movimento escola sem partido; o movimento ideologia de gênero; o debate e a aprovação de legislações em torno da educação domiciliar; a criação das escolas cívico-militares; as polêmicas em torno do efetivo direito de uso do nome social nas redes de educação básica e nas universidades; a possibilidade de utilização ou a proibição do uso da chamada linguagem neutra no cotidiano escolar e em produções escritas de caráter educativo; a inserção ou não de tópicos relativos a gênero e sexualidade na produção de livros didáticos; a seleção de questões que vão compor as avaliações de grande impacto - como é notadamente o caso do ENEM; o movimento escola sem pedofilia, uma nova versão do movimento ideologia de gênero. Todas estas trincheiras de luta guardam relação entre si, e ajudam a entender certo movimento macropolítico que descrevemos como tentativas de colonizar o percurso escolar com valores domésticos e religiosos, a assolar as fronteiras entre famílias, escolas e instituições religiosas, três instâncias tradicionais de governamento dos infantis e dos jovens. Em todos esses movimentos, as questões de gênero e sexualidade são determinantes. O título deste subcapítulo faz referência a um movimento da guerra que se alimenta da guerra. Guerra essa que não é feita para um dia assinar o tratado de paz, quando, enfim, vencido o inimigo, retornaremos às nossas casas. A guerra atual implica mobilização constante dos atores sociais, eterna vigilância e insistência nos discursos de ódio, com tensionamento dos limites legais e graves consequências para a manutenção de regimes democráticos, como se analisa em Flávia Biroli (2020) e Juan Marco Vaggione (2020).

O artigo é fruto da fala do autor na mesa intitulada “Guerra ao gênero no contexto escolar: desafios e resistências”, no Seminário Internacional Fazendo Gênero 12, acrescido de pontos, oriundos tanto do debate que ali se instaurou, quanto de leituras posteriores. As falas na referida mesa buscaram refletir sobre processo iniciado desde meados da década de 2010, notadamente no Brasil, mas igualmente em outros países da América Latina, em que ameaças à liberdade de ensinar de professores e professoras se conjugaram com ataques à abordagem de questões em gênero e sexualidade nos currículos escolares. Tal reação conservadora, com origem em posicionamentos oficiais e movimentos políticos da Santa Sé a partir do Vaticano, e em seguida amplificados, no Brasil, pela atuação das religiões neopentecostais de viés fundamentalista (Amanda SILVA; Maria Rita de Assis CÉSAR, 2017), revelou, aos poucos, um processo de longa duração. Tal processo se configura como uma reação conservadora na forma de “contrarrevolução sexual”, que tem seu início logo após a realização de duas conferências mundiais que tiraram diretrizes progressistas em torno de muitos aspectos da vida humana, notadamente nas questões de gênero e sexualidade. A primeira delas foi a Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento, também conhecida como Conferência do Cairo, realizada em setembro de 1994 (UNFPA Brasil, 2007). Em seu relatório final, estabeleceram-se claras conexões entre Direitos Humanos, qualidade de vida, direitos das mulheres, equidade de gênero e saúde reprodutiva. O Brasil teve participação destacada nesta conferência, e incorporou em seu ordenamento legal as resoluções, de modo, por vezes, um tanto tímido ou desigual, de modo, por vezes, mais vigoroso. A segunda foi a IV Conferência Mundial Sobre a Mulher, ocorrida em setembro de 1995 em Pequim (UNFPA Brasil, 1995). Tomando como marco uma avaliação crítica das decisões e conquistas das três conferências anteriores sobre a condição da mulher, e elegendo como metas-chave as políticas públicas para a igualdade, o desenvolvimento e a paz, sua Plataforma de Ação articulou o conceito de gênero, a noção de empoderamento e o enfoque da transversalidade, em forte diálogo com o campo dos Direitos Humanos. O Brasil compareceu a esta conferência com grande delegação oficial, e igualmente suas deliberações foram incorporadas em nossas políticas públicas, de modo diverso. Os efeitos das decisões destas duas conferências logo se fizeram sentir no país, na forma de programas e políticas públicas, produção de materiais didáticos, ações em educação, saúde, no enfrentamento da violência e em outros âmbitos. O empenho de movimentos sociais, de governos e o regime democrático de então foram fundamentais para estas conquistas.

Para o foco deste artigo, que analisa os impactos de toda essa movimentação no território escolar, exaustiva literatura já investigou as grandes transformações no panorama curricular, nas estratégias pedagógicas e nos modos de gestão educacional participativa que os anos de intensidade democrática e inclusão fomentaram na escola pública brasileira. O ingresso de novos públicos na escola, o retorno a ela de pessoas que não haviam conseguido conjugar necessidades de trabalho com dedicação aos estudos, ou que haviam sido expulsas do percurso escolar por conta de situações de estigma e preconceito, a abertura de possibilidades para fazer o percurso escolar em escolas de turno integral, criaram, progressivamente, condições para que o território escolar se configurasse como um espaço público, apostando na já citada noção de modus vivendi. Tal se verificou no avanço, também, das políticas de educação em e para os Direitos Humanos, na abordagem de temas transversais em gênero e sexualidade em todas as disciplinas escolares, enorme produção de cartilhas, sequências didáticas, roteiros educativos, filmes, vídeos, livros para formação docente, programas de educação continuada no tema. Todos estes movimentos encontraram opositores. A emergência mais vigorosa de tal oposição data de, pelo menos, a década de 2010, quando se multiplicaram processos e interpelações, inicialmente administrativos, e depois judiciais, contra professores e professoras que abordavam questões em gênero e sexualidade na escola, ou, mesmo, outros temas genéricos em termos de valorização da diversidade e inclusão. Ameaças a equipes docentes e escolas que mantinham programas educativos contra o preconceito e a favor do respeito à diversidade sexual e de gênero logo ganharam as páginas da mídia. Tivemos um nítido recuo nas diretrizes das políticas públicas de inclusão e valorização da diversidade, acentuado com o golpe de 2016 contra o governo de Dilma Rousseff que, igualmente, fragilizou nossa democracia, conforme debatido em Luis Felipe Miguel (2018).

Lidar com aprendizados e com negociações em termos de relações de gênero e sexualidade não apenas é elemento estruturante da vida em uma democracia, como se faz mais importante ainda quando pensado no percurso formativo escolar. No Brasil, com obrigatoriedade de lei e conquistas feitas durante o período democrático recente, a escolaridade obrigatória, com o nome de Educação Básica, vai dos 4 anos, com o ingresso na Educação Infantil por dois anos, segue com os 9 anos de Ensino Fundamental, onde as taxas atuais de frequência alcançam mais de 95% da população na faixa etária vinculada à escola em qualquer local do país, e segue por mais 3 anos de Ensino Médio, onde as taxas de frequência estão longe das ideais, mas, mesmo assim, já experimentaram grande melhora em relação ao passado. Nesta longa etapa formativa, que vai dos 4 anos de idade até praticamente os 18 anos, feita em mais de 80% dos casos em escola pública (municipal, estadual ou federal), a abordagem de questões em gênero e sexualidade é fundamental, e ajuda a configurar uma educação democrática e é auxiliada pela educação em e para os Direitos Humanos. Os movimentos de caráter reacionário, fundamentalista e patriarcal que tentam impedir a escola de cumprir seu papel formativo não atingem apenas a própria instituição escolar, atingem a democracia brasileira e o caráter republicano do estado.

Com a ampliação dos ataques à liberdade de ensinar e com a possibilidade de abordar questões em gênero e sexualidade no currículo escolar, foi ficando visível um movimento de reação contra as conquistas do período democrático brasileiro. Tal movimento, embora com marcas próprias brasileiras, ocorre em sintonia com um movimento mundial de enfraquecimento das democracias, conforme discutido em Wendy Brown (2019). A democracia não é atacada na forma de golpes e tanques de guerra, com deposição de eleitos e troca por ditadores. Ela vai sendo minada “por dentro”, vai perdendo conteúdo, substância, até se transformar em ritual de eleições que não traz mais condições de mudanças nem de redução das desigualdades. Neste artigo, estamos defendendo a tese de que os ataques e tentativas de proibição de abordagem em questões de gênero e sexualidade na escola pública brasileira se articulam com tal movimento, fornecendo uma cor local ao visível enfraquecimento de nossa democracia. Há estreitas conexões entre o enfraquecimento de regimes democráticos, e os impedimentos em debater e aprovar políticas públicas de equidade de gênero e respeito pela diversidade de orientação sexual. Não se trata apenas de um incômodo das forças conservadoras e fundamentalistas religiosas com o conceito de gênero, mas da declaração de guerra contra o feminismo como movimento social, político e cultural. Não se trata apenas de um incômodo de religiosos e pessoas de direita com a visibilidade LGBTQIA+, mas de efetiva guerra contra a possibilidade de que tais identidades de orientação sexual possam ter uma vida viável, com direitos assegurados em lei tais quais aqueles que existem para pessoas heterossexuais. Passamos a um período em que o conceito de gênero e suas conexões de pesquisa têm sido objeto de descrédito, com o uso da expressão “ideologia de gênero” que, a um só tempo, toma ideologia como sinônimo de falsidade, e gênero como construção não teórica e não científica. Com essa manobra, retorna-se ao chamado “gênero natural”, ou seja, mulheres e homens, vestindo rosa e azul, e fazendo “coisas de mulher” e “coisas de homem”. Há uma reificação dos desempenhos tradicionais do feminino e do masculino, em estreita sintonia com a também tradicional noção de família e sua conhecida hierarquia patriarcal. A isso se soma a proposição de “cidadão de bem” que domina o discurso oficial do atual governo, a indicar que os “de bem” são homens, brancos, heterossexuais, casados, urbanos, de classe média alta, adeptos de valores patriarcais, que possuem vínculos com a religião cristã em alguma de suas formas, performances masculinas guiadas por uma estética militarizada para resolução violenta de conflitos.

Embora o foco do artigo esteja na tentativa de proibição de abordagem de questões em gênero e sexualidade nas escolas, não perdemos de vista que tal fenômeno é articulado com outros. O primeiro deles diz respeito às ameaças à construção democrática produzida no Brasil a partir da Constituição Federal de 1988. O segundo é não perder de vista que as conquistas em termos de equidade de gênero e respeito à diversidade sexual, obtidas no período democrático que se consolida a partir de 1988, estão absolutamente entrelaçadas com um processo de inclusão cidadã no país, e ampliação da densidade democrática. Tais processos trouxeram um reflexo importante para a consolidação de um estado de direito no país, com garantia de procedimentos legais que melhoram a qualidade de vida de grupos e populações - como é o caso da legislação de direito ao nome social, das decisões acerca do casamento entre pessoas do mesmo sexo, da regulamentação do processo transsexualizador pelo Sistema Único de Saúde, dentre muitos outros no campo do gênero e da sexualidade, e em sintonia com as conquistas em termos de raça, classe, geração. O período democrático que referimos acima, e que estamos situando a partir da proclamação da Constituição Federal de 1988, experimenta recuos sensíveis nos dias de hoje. Os movimentos sociais e correntes políticas que vigorosamente contribuíram para a ampliação dos direitos de cidadania no país são hoje em dia criminalizados, o que se verifica com o feminismo, o movimento LGBTQIA+, o próprio movimento negro, dentre outros. A transformação destes movimentos sociais, e de suas proposições de políticas públicas de inclusão em inimigos, configura o clima de guerra que acentuamos, no qual não há simplesmente pessoas que pensam diferente, há inimigos a serem eliminados. Em sintonia com todo esse processo, as agendas que buscavam justiça social, protegendo populações vulneráveis, sofrem ataques, em nome da racionalidade neoliberal, que insiste no sujeito livre e empreendedor de si mesmo. Neste clima de guerra, as garantias legais arduamente obtidas são jogadas por terra. É o que tratamos no item seguinte, analisando um conjunto de movimentos específicos que atacam o campo educacional e que, em conjunto, trazem como marcas comuns a preocupação com as questões de gênero e sexualidade e o enfraquecimento da condição democrática do país.

Em tempo de guerra, calam-se as leis

Tivemos atenção, no tópico anterior, em deixar indicado que as conquistas de ampliação da democracia no campo da saúde sexual e reprodutiva e dos direitos sexuais, conforme discutido em Roger Raupp Rios (2006) e Paulo Roberto Iotti Vecchiatti (2018), ficaram em boa medida asseguradas em termos legais, muitas vezes, via decisões judiciais, ou a partir de atos dos legislativos. Elas foram obtidas, em particular, por coletivos de movimentos sociais, apoiados por redes sociais envolvendo feministas, LGBTQIA+, culturas juvenis, homens contra a violência de gênero, artistas, articulação com movimentos de raça. Mas, como o título acima indica, em tempos de guerra, as leis podem se tornar letra morta, e serem, inclusive, derrubadas em definitivo. Pensar os tempos de guerra como estados de exceção ajuda a entender o processo. Tomo aqui alguns elementos da noção de estado de exceção a partir de Giorgio Agamben (2004), complementados pela leitura de Márcia Rosane Junges (2014), dos textos de palestrantes do XI Simpósio Internacional IHU, intitulado “O (Des)Governo Biopolítico da Vida Humana” (IHU, 2010), e de um conjunto de artigos sobre o filósofo Giorgio Agamben, reunidos nos Cadernos IHU em Formação (IHU, 2013).

O objetivo é mostrar que a multiplicação de movimentos contrários às conquistas democráticas, combinada com a disseminação de discursos de ódio, traz o já denominado efeito de guerra que se alimenta da própria guerra, e que isso implica implícita aceitação da ideia de necessidade de um estado de exceção, como é próprio das guerras. Se a guerra termina, o estado de exceção terminaria. Mas, como se percebe pelo título, falamos de uma guerra que se alimenta da guerra. As guerras atuais não terminam nunca, então o estado de exceção, igualmente, não termina nunca. Muitas vezes, rimos quando lideranças religiosas fundamentalistas ou da extrema direita denunciam supostas movimentações, como a possível instauração de uma ditadura gayzista; a presença de um marxismo cultural disseminado por todos os lugares, que “faz a cabeça” dos sujeitos sem que eles percebam; a denúncia de que, nas universidades públicas, os alunos passam os dias em orgias e no consumo de drogas; a afirmação de que o ex-presidente norte-americano Barack Obama é um comunista de carteirinha; a divulgação de que a vacina contra a COVID-19 injeta um chip de produção chinesa no organismo, possibilitando nosso controle pelas forças do mal; a possibilidade de existência de um exército de seres reptilianos escondidos nos corpos de simples mortais, que pretende dominar o planeta; a certeza de que a terra é plana e de que há interesses ocultos em nos fazer acreditar que ela é redonda; a denúncia de que estamos cercados de satanistas por todos os lados, o que se confirma em casos de homicídios violentos; a percepção de que o movimento descontrolado das bolsas de valores é fruto direto dos rituais de adoração a um carneiro sagrado, e um sem número de discursos no mesmo tom. Ocorre que essa produção constante alimenta um estado de guerra que, por sua vez, alimenta a ideia de necessidade de manutenção de um estado de exceção, onde o cumprimento das leis pode ser atropelado, em nome de necessidades urgentes, derivadas de uma percepção de estado de crise. A crise não é mais um evento passageiro em nossa sociedade, muito menos algo de curta duração, é um dado permanente da estruturação do social, a exigir de todos e de todas sacrifícios. E a forçar o consenso de que não é o momento de seguir as regras do bem viver, em função da preservação da nossa própria segurança, muitas vezes confundida com a manutenção do regime de desigualdade em que estamos mergulhados. A pandemia de COVID-19 ajudou a alimentar tal percepção, em várias direções, para além do que é o objetivo deste artigo. A combinação sensação de crise e discursos de ódio que enfatizam a guerra contra o outro, sempre visto como um inimigo a ser eliminado, deságua no estado de exceção.

Quando dizemos de um estado de exceção, ou de um regime de exceção, para os fins da argumentação que aqui se necessita, enfatizamos a ideia de que a necessidade não tem lei, ou não pode observar a lei. Se efetivamente convencermos as famílias de que os professores e as professoras são “estupradores intelectuais” e potenciais pedófilos, como se encontra nos materiais de divulgação dos movimentos escola sem partido e ideologia de gênero, medidas inusitadas serão entendidas como necessárias para proteger as crianças na escola. Podemos ter a produção de uma situação de concordância voluntária com a aceitação do estado de exceção nas escolas, em que modos de controle excepcionais - como filmar aulas sem autorização e postar em redes sociais, ou divulgar o endereço de residência da professora, permitindo que os pais exerçam ali formas de coação - e punições draconianas - demissão sumária do serviço público - sejam aceitas como necessárias. O estado de exceção implica práticas de governo da vida e das populações em que a concentração de poder em determinados órgãos ou pessoas - as polícias, as milícias, alguns grupos de pais e mães, determinadas lideranças religiosas fundamentalistas vistas como míticas e em posição supostamente acima do bem e do mal - é vista como desejável. A definição de certos grupos de pessoas - como os militares e os policiais - como cidadãos de bem os coloca, neste contexto de guerra que se alimenta da guerra, como tendo direitos que os demais não têm. É o caso do quase aprovado regimento que buscava ampliar de modo considerável o excludente de ilicitude, que coloca os atos policiais acima da ilegalidade, pois produzidos em contexto de guerra - a ação de tomada de uma favela, por exemplo. Não há como deixar de registrar conexões entre tal argumentação, que afasta o policial da punição porque estaria envolvido em situação que lhe provocou medo, surpresa ou violenta emoção; e a argumentação que, por décadas, livrou homens que matavam mulheres a sangue frio da devida prisão, pois seriam crimes acontecidos em contexto de legítima defesa da honra, e tais homens estariam em momento de forte emoção também. Com isso, a aplicação da lei ordinária, que prevê condenação prisional para quem mata outra pessoa - nestes casos, por vezes de modo bárbaro, e com recursos que impossibilitaram a defesa da vítima -, é colocada em suspensão, e se aplica uma sentença de exceção, derivada do entendimento de que o contexto era um contexto de exceção, tomado por violentas emoções. A alegação de necessidade de certos atos discricionários, porque nos encontramos em um estado de exceção, na prática, afasta para fora do direito à vida aquelas populações mais vulneráveis, nas quais se incluem mulheres, negros e negras, LGBTQIA+, jovens pobres especialmente quando meninos e negros, crianças e famílias moradoras de rua, migrantes, indígenas, homens e mulheres que se dedicam à prostituição, moradores das periferias como um todo. O que ocorre é que, para tais populações, o estado de exceção já estava em vigência desde sempre. Agora, assistimos a uma ampliação de seu paradigma, a abarcar novas populações, criminalizando fortemente muitos movimentos sociais - está aí a classificação de atos terroristas para muitas manifestações de descontentamento com os regimes estabelecidos, permitindo punições extremamente duras, pois os atos passam a ser classificados praticamente como crimes de guerra.

O terreno da educação pública tem sido um verdadeiro campo de disputas e batalhas em torno dessas questões. A centralidade do campo educacional para estes enfrentamentos deriva de uma constatação simples: cada vez mais se vive a infância e a juventude em estreita conexão com a escola. A vida infantil e juvenil é cada vez mais escolarizada, e nisso o Brasil segue tendência mundial. Mesmo com todos os percalços e desigualdades, a média de anos de escolarização avança no Brasil e no mundo, e o tempo que se passa na escola também se amplia, em especial por dois fatores: cada vez as crianças são escolarizadas mais cedo, e cada vez se passa mais tempo na escola durante o dia, inclusive no formato da chamada escola de turno integral. Mais ainda, se há demanda que une famílias pobres, ricas e de classe média, é pela existência de escolas que possam ter a guarda das crianças e jovens durante o dia todo, permitindo que seus pais possam trabalhar. Educar é cada vez mais um empreendimento institucional, e a escola seu lugar de preferência. Viver a infância e a juventude é cada vez mais algo que se passa na escola, ou em relação a ela, e isso é algo a ser celebrado, em um país onde, por tanto tempo, o acesso à escolarização ficou restrito a poucos e poucas. O empreendimento educacional no Brasil mostra números robustos. De acordo com os dados consolidados mais recentes, oriundos do Censo Escolar 2020 (MEC, 2021), a população escolar brasileira na Educação Básica era de 47,3 milhões de matrículas, com alunos e alunas vinculados/as em 179,5 mil escolas, sejam elas municipais, estaduais, privadas ou da rede federal. Os dados de 2020 mostraram uma redução de 1,2% na comparação com o ano anterior, o que pode ser explicado como um dos efeitos do período de pandemia. Tomando os dados por etapas de geração, temos que, na faixa de 4 a 5 anos, na Educação Infantil, o percentual de atendimento escolar é de 92,9% da demanda. Na etapa seguinte, os chamados Anos Iniciais do Ensino Fundamental, 99,7% da população de 6 a 14 anos frequentam a escola. A etapa a seguir, os chamados Anos Finais do Ensino Fundamental, é frequentada por 11,9 milhões de alunos, e 99,7% desses estudantes o fazem no turno diurno. Na etapa final da Educação Básica, o Ensino Médio, os dados do Censo 2020 da Educação Básica mostram que 89,2% da população de 15 a 17 anos frequentaram a escola. Tivemos 83,3% dos alunos do Ensino Médio estudando em turno diurno e 16,7% no período noturno. Quase 95% dos alunos frequentaram escolas urbanas. Para além das modalidades listadas acima, lembramos que existem a Educação de Jovens e Adultos (EJA), a Educação Especial e a Educação Técnica e Profissional, todas elas agregando contingentes expressivos de jovens. Nosso propósito com esses dados é retornar à afirmação já feita: não se pode mais pensar as trajetórias infantis e juvenis na sociedade brasileira sem ser em estreita conexão com a escola. Por mais problemas que tenha, a escola pública brasileira tornou-se central na formação de crianças e jovens. Com isso, ela atrai cada vez mais a atenção de interesses privados e de grupos sociais interessados em influenciar nos seus rumos.

Fruto do contexto acima, e em sintonia com compromissos do Brasil em relação a objetivos mundiais em educação e bem-estar da população, se transfere para a escola uma série de aprendizados que, décadas atrás, estavam nas mãos das famílias. Esse processo é muito nítido, e se verifica inclusive pela tramitação e eventual aprovação de leis em câmaras municipais, assembleias legislativas e câmara federal. São propostos, e por vezes passam a integrar o currículo escolar: o ensino religioso, a educação das relações étnico-raciais, o ensino de Libras, o empreendedorismo econômico, a educação para a mediação de conflitos, a educação sexual, a educação alimentar, a educação para o trânsito, a economia doméstica, a educação financeira, o ensino do holocausto, a formação em ética e cidadania como tema transversal, a elaboração de projetos de vida, as preocupações e cuidados com o meio ambiente, os projetos em torno dos temas trabalho e consumo consciente. É em grande parte por conta desse processo que as forças conservadoras centram hoje em dia tantas ações no sentido de colonizar a educação escolar, pois percebem que a escola assume cada vez mais um protagonismo na gestão dos infantis e dos jovens. Com a escola de turno integral, há crianças e jovens que dialogam durante a semana mais com professores e professoras e com seus colegas do que com seus próprios pais. Na impossibilidade prática de abolir a instituição escolar - embora as propostas de educação domiciliar em curso -, o que se verifica é que as forças conservadoras - dentre as quais as religiões têm um papel destacado - buscam justificar que o percurso educativo se faça em estado de exceção. Ou seja, sujeito a controles extraordinários das famílias e das religiões, e a regramentos que, na prática, expulsam as populações LGBTQIA+, e insistem em relações de gênero que não são igualitárias, com evidente subordinação das mulheres aos homens.

No caso da instituição religiosa, não é demais lembrar que educação já foi monopólio religioso no ocidente por séculos, e no oriente de modo um tanto similar em muitos locais. Também - não por acaso - a expressão religiosa “magistério da igreja”, para dizer de suas funções, utiliza um termo próprio do espaço escolar, magistério, para valorizar sua missão. Há uma grande perda de espaço das escolas confessionais, substituídas por grupos privados leigos e pelo avanço da escolarização pública. Todos estes movimentos são utilizados para ajudar a disseminar o pânico entre certas famílias - e entre as lideranças religiosas fundamentalistas - de que as crianças estão caindo sob o domínio de professores e professoras das redes públicas. É necessário, então, colonizar o espaço público da educação por valores da família e da religião, assegurando uma sintonia entre o que se diz em casa, no púlpito e na sala de aula. Tal sintonia já existiu no Brasil, quando a escola era predominantemente confessional, ou, quando, já criada a escola pública brasileira, ela era conduzida por valores católicos. Nunca é demais lembrar que, já bem entrado no regime republicano brasileiro, um dos critérios para formação de professoras normalistas, em escolas públicas, era a comprovação de seu pertencimento a uma paróquia católica, e a entrega de seus certificados de batismo e de primeira comunhão. Tais marcas ainda estão presentes na concepção educacional de muitos grupos, mas elas já se perderam legalmente, com o avanço da educação pública, e com as estratégias de valorização da diversidade e de inclusão de todos e todas na escola. Estabelecer a precedência dos valores religiosos e familiares sobre os valores da cultura escolar ofende a autonomia escolar, princípio constitucional não apenas no Brasil, mas na esmagadora maioria dos países. Ofende também a tarefa escolar de alfabetização científica, pois muitos dos achados da ciência e das razões públicas que dali derivam - em termos de saúde das populações, por exemplo - vão na direção contrária do que preceituam valores religiosos. E vai contra a diversidade dos marcadores sociais da diferença que hoje se encontra na população escolar, fruto dos fortes processos de inclusão que colocaram praticamente todo mundo para dentro da escola, o que os números demonstram. No campo educacional, as forças conservadoras exercem uma desconfiança sistemática acerca dos direitos conquistados pelos grupos vulneráveis, que são vistos como nocivos à sociedade. Dada tal instabilidade, essas forças buscam usar os dispositivos legais de estado para suprimir ou minimizar a abordagem desses direitos na escola. Ao fazerem isso, o que ocorre é que se excluem não apenas temas de estudo, mas pessoas, pois as classes escolares comportam, nos dias de hoje, a população LGBTQIA+ em todos os níveis, fruto dos processos de inclusão. No período democrático, a cultura escolar ficou marcada por valores de justiça social, mediação de conflitos, inclusão, respeito pela diversidade, mesmo que em níveis desiguais e sem o alcance universal que se desejaria. Com isso, a tradicional marca de exclusão do percurso escolar, representada pelas reprovações e evasões, que desde sempre atingiram os já vulneráveis, ficou menos intensa.

O processo de desmonte da democracia e dos valores dos Direitos Humanos vem atingindo fortemente a escola pública brasileira. Conforme já discutido em Seffner (2020a; 2020b), uma criança, quando ingressa na escola, ingressa em um longo percurso dentro de uma cultura, a cultura escolar. A cultura escolar é composta pela articulação entre um conjunto de atores (alunos e alunas, professores e professoras, gestores e gestoras, famílias); instituições (as próprias escolas, as instituições de coordenação dos sistemas de ensino como secretarias e outras); discursos e linguagens (comunicação com forte empenho na escrita, baseada nos conhecimentos validados da ciência, dispostos em manuais didáticos que passam por avaliação e reconhecimento dos pares) e um grande conjunto de práticas historicamente consolidadas (modos de avaliação, regimes disciplinares, práticas cívicas e culturais, rituais de passagem entre os anos escolares e entre os níveis, resultados esperados a cada etapa, relação com os materiais educativos, modos de lazer e convívio entre estudantes e entre turmas bem como com os e as docentes, estratégias de formação para a cidadania e valores do convívio no espaço público). A cultura escolar se baseia na gestão democrática da escola e na autonomia docente, princípios definidos na Constituição Federal de 1988. A escola é a única instituição pública, citada expressamente na Constituição Federal, da qual se diz que deve ter gestão democrática. Ataques à democracia por certo trazem prejuízos para a cultura escolar. A cultura escolar e, mais propriamente, o cotidiano escolar - o dia a dia da vida escolar - desde sempre são marcados por um delicado equilíbrio entre muitos elementos: atenção à tradição científica; gestão democrática da escola; liberdade de ensinar; direito à educação; liberdade de aprender; direito de igualdade e de não discriminação; garantia da liberdade de expressão; respeito a demandas das culturas juvenis.

O equilíbrio entre tais elementos é garantido pela crença coletiva em alguns valores: educação democrática, educação em e para os Direitos Humanos, claras e adequadas regras de modus vivendi, estratégias de mediação de conflitos, atenção aos valores republicanos que norteiam o espaço público, valorização do pensamento científico e de saberes tradicionais. Os tempos que vivemos, marcados pelo avanço do anti-intelectualismo, hostilidade à ciência, ataques a professores e professoras, tentativas de submeter os valores da cultura escolar àqueles das famílias e das religiões, erosão dos regimes democráticos e dos ideais republicanos, forte apego a soluções ao estilo “empreendedorismo individual” e a formas violentas, predomínio do “opinionismo” em assuntos educacionais - bastante representado pela conhecida afirmação “no meu tempo se fazia de tal ou qual modo e funcionava”, ou então “eu fui educado assim ou assado e era bom”, tornam difícil à escola cumprir seu papel social e cultural. O contexto político atual implica riscos ao próprio direito à educação, e afeta o regime de equilíbrio dos elementos citados. A proibição de abordar questões em gênero e sexualidade na escola traz pelo menos dois grandes riscos. Se tomadas como temas de estudo, impedir a abordagem de gênero e sexualidade compromete a vocação do currículo escolar como percurso de aprendizagem científica e ampliação de conhecimentos. Gênero e sexualidade são temas tanto das tradicionais aulas de Ciências ou Biologia, quanto das disciplinas das Humanidades, da Educação Física, da Língua Portuguesa e das Artes. Tomadas como questões, impedir que se discuta acerca das relações de gênero e sexualidade implica não colocar em debate um conjunto significativo de relações sociais que marcam a cultura escolar, onde um menino gay está sentado ao lado de um menino heterossexual na sala de aula; onde uma menina evangélica faz seus trabalhos em dupla com uma menina de pertença afro; onde um trabalho em grupo reúne quatro garotos, cada um com modos de viver sua masculinidade bastante diferente dos demais. A cultura escolar é apropriada para o aprendizado da vida na diferença, o que é uma das marcas do espaço público e a escola, mesmo quando privada, é sob esse aspecto um espaço público. Tentar impedir ou dificultar a abordagem dos temas e questões em gênero e sexualidade compromete tanto a vocação de alfabetização científica da escola quanto seus propósitos de formação para uma convivência cidadã no espaço público. Quando se aborda gênero e sexualidade estamos falando em distribuição de poder, privilégios e direitos, na sociedade e na escola, e este constitui um tema importante na formação dos jovens e para a vida na democracia.

No período democrático iniciado com a Constituição Federal de 1988, a escola pública brasileira foi criticada - não na forma de uma guerra, mas por meio de críticas racionais e construtivas - pelas forças progressistas, por ter sido quase sempre, no Brasil, um instrumento de discriminação para as populações mais vulneráveis, dentre as quais se incluem as mulheres jovens e a população juvenil LGBTQIA+ e, particularmente, jovens negros e negras. Essas críticas abriram um campo de colaboração entre redes de ensino e movimentos sociais, e o Brasil ficou conhecido no mundo pela produção de materiais didáticos, em linguagem das culturas juvenis, acerca de gênero e sexualidade, e em conexão com as infecções sexualmente transmissíveis e a aids. Esse legado de colaboração, de criação de políticas públicas como o Brasil sem Homofobia e programas como o Escola sem Homofobia, se encontra atualmente sob ataque. A escola defendida pelos discursos neoliberais é aquela que reduz a educação à esfera do consumo e da meritocracia, e que busca retirar dos docentes a liberdade de ensinar. Os ataques à democracia atacam também a diversidade cultural própria da cultura escolar, bem como a diversidade religiosa, de gênero, de raça, de orientação sexual, de classe social, de modelos de família, de ideias políticas, que marca o conjunto de alunos e alunas em qualquer sala de aula de escola pública.

Os grupos sociais que compõem movimentos de ataque à escola buscam implantar um ensino tecnocrático, burocrático - nas palavras do movimento escola sem partido, os professores são simples burocratas do conhecimento - e, sobretudo, um ensino supostamente isento de valores. O caráter simultaneamente político e pedagógico de qualquer proposta de ensino é negado, e por conta disso se entendem as críticas ao pensamento de Paulo Freire. Contrariamente ao que está posto na Constituição Federal de 1988, a educação não é vista como um direito de todos e todas, mas apenas daqueles e daquelas que tiverem mérito comprovado segundo exames e provas construídas por equipes externas às escolas. Os exames e provas são vistos como supostamente isentos de valores, não refletindo aspirações de classe e marcas culturais dos grupos que os elaboram. Nega-se a presença do racismo, da homofobia, da lesbofobia, da transfobia, do sexismo, do machismo, do preconceito por lugar de nascimento e de origem familiar - todos eles arrolados pela conhecida expressão “mimimi”, que indica, de modo pejorativo, a dor dos grupos vulneráveis, tomados como pessoas que estão sempre a reclamar. Tais propostas educacionais nada mais são do que a reificação dos valores ocidentais, brancos, cristãos, de classe média, patriarcais, heterossexuais. Elas impedem que a escola construa seu projeto político pedagógico em diálogo contextual com o lugar onde se situa, com as demandas das culturas juvenis, com as marcas sociais e econômicas da comunidade a que atende, e de olho nos grandes debates políticos do país e do mundo. A posição de docentes que entendem a abordagem das questões em gênero e sexualidade na escola associadas ao campo da educação em e para os Direitos Humanos é atacada, com acusações de doutrinação. Defendemos que as abordagens se façam em sintonia com a produção científica e com os princípios da educação democrática. Ao mesmo tempo, reconhecemos que o pensamento científico deve ser analisado criticamente. A ciência é, em geral, de viés branco, masculino, ocidental, classista. Não há contradição em manter-se no campo científico, e, ao mesmo tempo, buscar uma inserção crítica racional a ele. A ciência avança justamente por conta de raciocínios argumentados, e tal é tarefa da escola, também, ensinar a debater com argumentação.

O gênero e a sexualidade presentes em todas as trincheiras

Nosso objetivo foi estabelecer nexos sobre os processos de ordem macropolítica, que envolvem questões em gênero, sexualidade e cultura escolar, vertidos na forma de batalhas nos dias de hoje, notadamente entre escolas, famílias e religiões, e inseridas na grande guerra contra a democracia. Recordamos os movimentos sociais, em mistura de caráter autoritário, antidemocrático, fundamentalista religioso e francamente reacionário, que insistem em limitar ou eliminar as possibilidades de discussão das questões em gênero e sexualidade na escola: escola sem partido; ideologia de gênero; movimento em prol da educação domiciliar, que mais propriamente pode ser chamada de educação doméstica, pois traz um traço evidente de domesticação dos processos educacionais; movimento e legislação já aprovada de criação das escolas cívico-militares; movimentos que visam impedir o efetivo direito de uso do nome social nas redes de educação básica e nas universidades, direito já aprovado em várias instâncias e locais; movimento que busca impedir a utilização da linguagem neutra no cotidiano escolar e em produções escritas de caráter educativo; movimento que luta pela retirada de tópicos em gênero e sexualidade nos livros didáticos patrocinados pelo Programa Nacional do Livro Didático PNLD; movimento que visa interferir na produção das questões que compõem as avaliações de grande impacto no país, notadamente o ENEM, retirando dali menções a questões em gênero e sexualidade; escola sem pedofilia, uma nova versão do movimento ideologia de gênero. E o movimento de propagação de discursos negacionistas - por exemplo, negando a opressão feminina e negando a escravidão - e o de negação da ciência, com conteúdo de anti-intelectualismo. Em todos esses movimentos, há uma oposição entre as diretrizes escolares de um lado, e as vontades de determinadas famílias e determinados grupos religiosos de outro. Dissemina-se, no imaginário social, a ideia de que as famílias e religiões têm precedência no debate sobre os temas em gênero e sexualidade, e que a escola não poderia abordá-los ou, quando abordaria, deveria fazê-lo reiterando as ideias de famílias e grupos religiosos. Os grupos religiosos que interferem no debate são todos vinculados ao tronco das religiões judaico-cristãs.

O movimento escola sem partido visa coibir a liberdade de ensinar - preceito constitucional de que desfrutam docentes em todos os níveis de ensino - e dissemina a noção de que professores e professoras devem gozar de restrita liberdade de expressão. Vários temas são objeto de sanção em suas manifestações, e gênero e sexualidade estão entre os mais frequentes. O movimento ideologia de gênero já traz no nome seu envolvimento com as questões de gênero, e se envolve com sexualidade. Atua nos dias de hoje em estreita sintonia com o movimento escola sem partido. O movimento em prol da educação domiciliar tem nas questões de gênero e sexualidade sua argumentação principal, o que apareceu de modo claro no processo que terminou no STF, onde a família manifestava receio de que sua filha, ao cursar o Ensino Fundamental, pudesse ser influenciada no sentido de desenvolver o que ali se chamou de “sexualização precoce”. O movimento de criação das escolas cívico-militares, já formalizado em legislação, revela preocupação com o estabelecimento de padrões estritos de gênero pela leitura do regimento das ditas escolas, e das matérias que, a todo momento, saem na imprensa, onde o controle sobre os desempenhos de gênero e sexualidade de alunos e alunas é vigiado. No ordenamento regimental dessas escolas, estão evidentes os traços patriarcais de privilégio dos meninos sobre as meninas. Nos demais movimentos, que se ocupam da linguagem neutra, da retirada de questões sobre gênero e sexualidade em livros didáticos e exames nacionais, na impossibilidade de discutir gênero e sexualidade na escola pelo temor de que tal abordagem abra caminho para a pedofilia, dizem de si mesmos nas preocupações com os temas deste artigo.

A tarefa para professores e professoras que se dispõem a trabalhar as questões em gênero e sexualidade na escola é árdua. Há amparo legal para a abordagem destas questões, conforme se analisa no manual produzido em conjunto por organizações da sociedade civil e representantes dos ministérios públicos (AÇÃO EDUCATIVA, 2018), bem como pelas sucessivas vitórias obtidas junto às instâncias superiores de tribunais no país. Situar as questões em gênero e sexualidade no campo da educação, no contexto atual, é mais ou menos como tentar parar a guerra e os discursos de ódio e iniciar um diálogo argumentado. Não podemos responder ao discurso de ódio das forças fundamentalistas com novos discursos de ódio, mas, certamente, a abertura de espaços de diálogo é tarefa árdua, e só pode ser conduzida em movimentos coletivos, evitando a exposição isolada de docentes.

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Como citar esse artigo de acordo com as normas da revista: SEFFNER, Fernando. “Em tempo de guerra todo buraco é uma trincheira”. Revista Estudos Feministas, Florianópolis, v. 30, n. 2, e86992, 2022.

Financiamento: Não se aplica.

Consentimento de uso de imagem: Não se aplica.

Aprovação de comitê de ética em pesquisa: Não se aplica.

Recebido: 12 de Abril de 2022; Revisado: 16 de Maio de 2022; Aceito: 25 de Maio de 2022

fernandoseffner@gmail.com

Fernando Seffner (fernandoseffner@gmail.com) é Professor Titular da Faculdade de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Departamento de Ensino e Currículo. Tem licenciatura Plena em História, mestrado em Sociologia e doutorado em Educação (UFRGS). Docente e orientador junto ao Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGEDU), na linha de pesquisa Educação, Sexualidade e Relações de Gênero. Coordenador do Grupo de Estudos de Educação e Relações de Gênero GEERGE

Contribuição de autoria: Não se aplica

Conflito de interesses: Não se aplica

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