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Revista Estudos Feministas

versão impressa ISSN 0104-026Xversão On-line ISSN 1806-9584

Rev. Estud. Fem. vol.30 no.3 Florianópolis  2022  Epub 01-Set-2022

https://doi.org/10.1590/1806-9584-2022v30n373882 

Artigos

Ideologia de gênero e o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos

Gender ideology and the Ministry of Women, Family and Human Rights

La ideología de género y el Ministerio de la Mujer, la Familia y los Derechos Humanos

Carmen Hein de Campos1 
http://orcid.org/0000-0002-4672-0084

Márcia Nina Bernardes2 
http://orcid.org/0000-0001-6131-5653

1Centro Universitário Ritter dos Reis, Porto Alegre, RS, Brasil. 90840-440

2Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. 22451-900


Resumo:

A ansiedade sexual e o retorno ao passado patriarcal mítico são elementos de uma política fascista em implementação no Brasil. O patriarca da família funciona como um arquétipo para o governante fascista, privilegiando homens cis e heterossexuais. Trata-se de uma reação violenta aos estudos feministas e queer sobre o gênero que se articula em torno de uma “ideologia de gênero de natureza familista” e espalha pânico contra os feminismos e população LGBTIQ+. Como esse discurso se articula no governo federal? Sustentamos que o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH) é o principal locus de difusão da ideologia familista. Pesquisa documental e uma análise crítico-feminista das principais ações no primeiro ano do atual governo permitem afirmar que o MMFDH fortalece políticas em defesa da família patriarcal, contra os feminismos e os movimentos LGBTIQ+.

Palavras-chave: democracia; reação ao gênero; políticas para as mulheres; políticas para minorias sexuais

Abstract:

The sexual anxiety and a return to the mythical patriarchal past are elements to the fascist mode of governing in implementation in Brazil. The family patriarch functions as an archetype for the fascist ruler that privileges cis and heterosexual men. It is a violent reaction to the gender feminist and queer studies articulated in the affirmation of a “familial gender ideology” spreading panic against feminists and LGBTIQ + population. How this discourse is articulated in the federal governament? We argue that the current Ministry of Women, Family and Human Rights (MMFDH in Portuguese) is the main locus of diffusion of this familial gender ideology. Feminist critical analysis of a documentary research of the main actions during first year of the current governament, allow us to claim that MMFDH has strengthened policies in defense of the patriarchal family, against feminisms and LGBTIQ + movements.

Keywords: Democracy; Reaction to gender; Policies for women; Policies for sexual minorities

Resumen:

La ansiedad sexual y el retorno al pasado patriarcal mítico son elementos de una política fascista en implantación en Brasil. El patriarca de la familia funciona como un arquetipo del gobernante fascista favoreciendo a los hombres cis y heterosexuales. Eso es una reacción violenta a los estudios feministas y queer sobre género articulada en torno de una "ideología de género de carácter familista", sembrando pánico contra los feminismos y la población LGBTIQ. Cómo ese discurso se articula en el gobierno? Sustenimos que el Ministerio de la Mujer, de la Familia y de los Derechos Humanos (MMFDH) es el principal lócus de difusión de esa ideología familista. Investigación documental y un análisis crítico-feminista de las principales acciones durante el primer año del actual gobierno permitem afirmar que el MMFDH fortalece políticas en defensa de la familia patriarcal, contra los feminismos y movimientos LGBTIQ +.

Palabras clave: democracia; reacción al género; políticas para la mujer; políticas para minorías sexuales

Introdução

As democracias estão em risco. Governos eleitos democraticamente ameaçam a democracia, os direitos humanos e as liberdades em diversos países. Diversos autores apontam que os processos de ruptura democrática na contemporaneidade não se dão mais por golpes militares, mas por meio de processos eleitorais democráticos, isto é “O retrocesso democrático hoje começa nas urnas” (Steven LEVITSKY; Daniel ZIBLATT, 2018, p. 16).

A eleição de Jair Bolsonaro, em 2018, para a Presidência da República no Brasil deve ser compreendida dentro deste cenário. É visível seu pouco apreço aos processos e instituições democráticas, mas a classificação de suas estratégias autoritárias -como fascismo, populismo, ou autoritarismo- ainda é controversa. O termo fascismo é controvertido para designar o quadro político em que vivemos contemporaneamente face às experiências históricas do fascismo no século passado, mas entendemos que é possível identificar políticas fascistas em andamento mesmo que não estejamos (ainda) sob um Estado fascista, a partir de Jason Stanley (2018) e Umberto Eco (2020).

O “fascismo eterno” (Ur-fascismo) de Eco (2020) enuncia características típicas de governos fascistas presentes em Stanley (2018). O culto à tradição ou o passado mítico, o irracionalismo (rejeição à modernidade) ou o anti-intelectualismo, o medo da diversidade sexual e de raça, o elitismo ou a hierarquia, o apelo à pátria ou à ideia de nação, a ideia de guerra permanente ou o “nós” x “eles”, o apelo ao heroísmo ou à lei e à ordem, a vontade de poder transferida para questões sexuais ou a ansiedade sexual (machismo, homofobia) são traços verificados em governantes fascistas.

Destacamos o “retorno ao passado patriarcal mítico” e a “ansiedade sexual” como elementos centrais ao modo fascista de governar. O patriarca da família funciona como um arquétipo para o governante fascista centralizador e autoritário. Uma parte importante do projeto de fascistização da sociedade consiste em assegurar as hierarquias patriarcais que privilegiam homens cis e heterossexuais, em detrimento das liberdades conquistadas pelas mulheres e minorias sexuais após décadas de lutas democráticas.

Por meio de pesquisa documental e de análise crítico-feminista, argumentamos que a ansiedade sexual e o retorno ao passado mítico fundamentam uma reação violenta ao gênero e aos avanços aos direitos das mulheres e pessoas LGBTQ+ que se articula em torno da “ideologia de gênero familista” (Carmen Hein de CAMPOS; Márcia Nina BERNARDES, 2019, p. 1) visando criar pânico moral contra feministas e população LGBTIQ+ e está presente no governo Bolsonaro. O “combate” ao gênero permeia o discurso de todo o governo. Na reunião do G20 em 2019, o então ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, orientou os diplomatas brasileiros sobre a “ideologia de gênero” e instruiu oficiais para que, em negociações em foros multilaterais reiterassem “o entendimento do governo brasileiro de que a palavra gênero significa o sexo biológico: feminino ou masculino (Tácio LORRAN, 2019). Contudo, sustentamos que o atual Ministério da Mulher da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH) é o principal locus de difusão dessa ideologia de gênero familista violadora dos direitos das mulheres e das minorias sexuais. A partir da análise das principais ações no primeiro ano de mandato do Presidente Bolsonaro, afirmamos que o MMFDH tem fortalecido políticas em defesa da família patriarcal, contra os feminismos e os movimentos LGBTIQ+. Assim, este artigo objetiva compreender como as políticas governamentais (neo)fascistas do MMFDH minam a democracia brasileira, os direitos das mulheres e das minorias sexuais.

O artigo estrutura-se em três momentos de discussão. Inicialmente, a partir da análise de Stanley (2018) e em conversa com Eco (2020), articulamos os conceitos de fascismo, “ansiedade sexual” e retorno ao passado mítico com a família patriarcal e as restrições às liberdades de mulheres e minorias sexuais. Após, exploramos os conceitos de “reação violenta ao gênero” e “ideologia de gênero familista” (CAMPOS; BERNARDES, 2019) no atual governo, especialmente no MMFDH, que sustentam as políticas do governo Bolsonaro, e examinamos suas implicações para as liberdades conquistadas pelos movimentos feministas e LGBTIQ+. Por fim, debatemos as políticas específicas implementadas pelo MMFDH no primeiro ano de mandato da atual Presidência, sustentando que as políticas de gênero, especialmente as destinadas a enfrentar as diversas formas de violências contra as mulheres, são instrumentalizadas pelo MMFDH para a defesa da família patriarcal, o que entendemos ser uma ameaça aos direitos humanos de mulheres e minorias sexuais e à democracia brasileira.

Fascismo, ansiedade sexual, passado mítico e família patriarcal

O patriarcalismo, o racismo e o classismo são problemas estruturais que a redemocratização brasileira ainda não resolveu. Assim, o discurso contra a diversidade, o gênero, os feminismos e os movimentos LGBTIQ+ não começou no atual governo. Mesmo com a redemocratização do país e com os avanços jurídicos no que se refere à igualdade de gênero, uma contra-ofensiva permaneceu e foi ganhando expressão.

Em 2017 e 2018, o discurso de Jair Bolsonaro ultraconservador no campo dos costumes e liberal na economia -contra a corrupção e contra a esquerda brasileira- condensou parcela expressiva da população. Neste sentido, a conjuntura anti-democrática que vivemos hoje vem sendo construída desde 1990, logo após a redemocratização do país como reação às conquistas democráticas que desafiavam algumas estruturas conservadoras da sociedade brasileira. Ao longo da campanha de Bolsonaro e após sua eleição, esse conservadorismo ganha espaço institucional e intensidade sem precedentes, permitindo-nos falar de fascismo no país.

O fascismo contemporâneo não é o mesmo do século passado. Os fascistas atuais não tomam de assalto o poder, mas utilizam os processos eleitorais para erodirem, por dentro, as instituições democráticas. Mas, se há diferenças entre o fascismo do século passado e as suas manifestações atuais, existem também características permanentes que o fazem eterno (ECO, 2020). Nesse sentido, são muitas as similaridades entre as análises de Stanley e Eco. Para Stanley (2018), “fascista” é qualquer governante ultranacionalista que utiliza estratégias e políticas de poder como a divisão “nós” x “eles” baseada em distinções políticas, étnicas, religiosas ou raciais, o que, para Eco (2020), pode ser pensado como “guerra permanente”. Produz narrativas simplistas para problemas complexos, apontando um “culpado” (um “inimigo”). Outra característica da política fascista é o anti-intelectualismo que se manifesta no ataque às universidades e à ciência, o que, para Eco (2020), verifica-se na rejeição à modernidade, à racionalidade, à intelectualidade. Além disso, a irrealidade ou a criação de uma realidade paralela a partir de narrativas fantasiosas também é uma estratégia de políticas fascistas; a exaltação da lei, da ordem e da hierarquia ou o que Eco (2020) define como elitismo e militarismo; apelos à noção de pátria ou nação (para Eco e Stanley), a desarticulação do estado de bem-estar social, a busca de retorno a um passado mítico em Stanley (2018) ou à tradição em Eco (2020), e a ansiedade sexual para Stanley (2018) ou a derivação do poder para questões sexuais em Eco (2020), são características de políticas fascistas no pensamento desses autores.

Diversos destes elementos estiveram evidentes na campanha eleitoral de Jair Bolsonaro e foram incorporados nas suas políticas governamentais. Apenas para exemplificar, o atual governo tem promovido um ataque sem precedentes às universidades públicas brasileiras, diminuído o seu orçamento, cortado bolsas de ensino e estimulado a denúncia de professores por “doutrinação ideológica” (anti-intelectualismo). Os discursos da divisão ou contra os “inimigos” (esquerdistas, petralhas, pessoas LGBTIQ+, ambientalistas “xiitas” etc.), os apelos à lei, à ordem, ao patriotismo e à religião, como à ordem tradicional, são recorrentes (“o Brasil acima de tudo. Deus acima de todos”)1. Esse apelo exagerado e paranoico ao nacionalismo, em um momento em que a soberania territorial brasileira não sofre qualquer ameaça real e que o próprio governo abre a economia brasileira ao capital internacional, é uma expressão do medo frente a um “outro” que ameaça a ordem social consolidada e naturalizada, seja ele o ativista social, a mulher feminista, ou a pessoa homossexual e trans, dentre outros grupos subalternizados (Vladimir SAFATLE, 2017).

Além disso, a busca de retorno a um passado mítico ou da tradição tem por objetivo criar um clima de irrealidade no país, como na afirmação de que a ditadura militar não existiu ou que ela foi mera “resistência” à ditadura do comunismo. Há também um aprofundamento das afrontas ao estado social, que começou no governo de Michel Temer2 e seguiu com a aprovação da reforma da previdência e com a já anunciada proposta de reforma administrativa, a ser encaminhada ao Congresso Nacional (Antonio TEMÓTEO; Ricardo MARCHESAN, 2019). Essa orientação chegou também à política externa do governo brasileiro, pois em visita aos Estados Unidos durante a Era Trump, o presidente Bolsonaro afirmou: “EUA e Brasil são irmanados na fé em Deus, no combate à ‘ideologia de gênero’, ao politicamente correto e às fake news” (Marina DIAS, 2019).

Dentre as estratégias identificadas por Stanley (2018), destacamos a do retorno ao passado mítico de uma família patriarcal idílica e a da ansiedade sexual que, articuladas, dão origem à uma reação violenta ao gênero, por meio da “ideologia de gênero familista” (CAMPOS; BERNARDES, 2019). Para Stanley (2018), as políticas da ansiedade sexual e de retorno ao passado mítico são formas poderosas de apresentar a liberdade e a igualdade como ameaças, sem rejeitá-las explicitamente; de invocar esses conceitos como fundamento para justamente erodi-los. Ainda conforme o autor, “uma marcante política de ansiedade sexual talvez seja o sinal mais evidente da erosão da democracia liberal” (STANLEY, 2018, p. 137).

O passado mítico envolve papéis de gênero tradicionais e patriarcais aonde “a família patriarcal reina soberana” e sustenta-se em uma ideologia autoritária e hierárquica (STANLEY, 2018, p. 19). Nesse sentido, “a família patriarcal é um ideal que os políticos fascistas tendem a criar na sociedade -ou recuperar”, na medida em que o líder da nação é apresentado como análogo ao pai da família tradicional (STANLEY, 2018, p. 21), enquanto o lugar reservado às mulheres é a maternidade. Ser mãe é identificada como a maior vocação para as mulheres.

Na família patriarcal o homem é o provedor e a igualdade de gênero representa uma ameaça ao lugar masculino. O controle sobre o corpo e sobre o tempo das mulheres são características desse tipo de sociedade. Disso decorre real aversão a discussões sobre justiça reprodutiva, divisão sexual do trabalho e paridade entre gêneros tanto no mercado de trabalho quanto no trabalho doméstico. Em períodos de crises econômicas, o político demagogo mobiliza a ansiedade masculina, acentuada em virtude da dificuldade econômica, contra aqueles que rejeitam a estrutura patriarcal, especialmente contra as minorias sexuais. Assim, transgêneros e homossexuais são fonte de agressão sexual mobilizada pela política fascista da ansiedade sexual: “transgêneros e homossexuais são usados para aumentar a ansiedade e o pânico sobre a ameaça aos papéis masculinos tradicionais” (STANLEY, 2018, p. 127).

Essas políticas que apresentam as mulheres trans como “uma ameaça à masculinidade da nação são uma forma de colocar a ideia da masculinidade no centro da atenção política” e introduzem, de modo gradual, “ideias fascistas de hierarquia e dominação pelo poder físico na esfera pública” (STANLEY, 2018, p. 136) que, de outro modo, poderiam não ser acolhidas. Assim, todo e qualquer desvio da família tradicional é uma ameaça à família patriarcal e ao “pai da nação” (STANLEY, 2018, p. 127).

A articulação da ansiedade sexual e do retorno ao passado patriarcal mítico, a reação aos avanços dos feminismos e aos estudos queer em torno da categoria “gênero” estão presentes na ideologia de gênero de caráter familista. Ainda que a formulação da expressão “ideologia de gênero” remonte ao início dos anos 2000, a sua institucionalização como política pública é sem precedentes no governo Bolsonaro.

Gênero, reação violenta ao gênero e ideologia de gênero familista

O termo “gênero”, fundamental aos estudos feministas e queer, geralmente é utilizado em oposição ao termo “sexo”. O último usualmente refere-se à realidade biológica dos corpos masculinos e femininos, enquanto o primeiro comunica a construção social sobre o que seria apropriado para homens e mulheres fazerem, pensarem e sentirem. Esta disjunção entre natureza e cultura possibilita diferentes interpretações do corpo feminino e rompe com a rigidez das identidades femininas (e masculinas). Tal distinção permite, ainda, compreender que o status subordinado da mulher nas sociedades patriarcais não é um dado natural, mas uma construção social (Judith BUTLER, 1986, p. 35). Tornou-se possível desmascarar operações semânticas que procuravam apresentar como descritivos (lugar de mulher é na cozinha) juízos que são, na verdade, normativos, segundo uma lógica sexista de subordinação feminina (lugar de mulher deve ser na cozinha) (Nicola LACEY, 1998).

A distinção entre sexo e gênero possibilita a desconstrução de certos comportamentos, emoções e pensamentos como “naturalmente” femininos ou masculinos e, ao fazê-lo, pensar-se em modos distintos de experimentar os corpos. Longe de “impor” que qualquer pessoa possa, em algum momento da vida, “escolher mudar” o seu gênero, o que esta distinção faz é despatologizar corpos não alinhados ao que patriarcalmente se considera “normal” para eles. Abre-se espaço para liberdade, diversidade e tolerância e impede-se a homofobia, lesbofobia e transfobia.

As lentes de gênero permitem enxergar processos históricos, sociais e políticos desde uma perspectiva não-hegemônica (e contestadora). Auxiliam ainda contar a história daquelas que foram invisibilizadas e a reconhecer um panorama mais amplo da cena de disputa política por recursos simbólicos e materiais. Segundo Joan Scott (1995, p. 73-74), gênero é uma categoria útil de “continuidades e descontinuidades e dar conta de desigualdades persistentes como experiências sociais radicalmente diferentes”.

A partir da categoria gênero articulada com as categorias raça e sexualidade, pode-se compreender melhor fenômenos sociais de violência e processos sociais de representação social e política. Como “categoria útil de análise” (SCOTT, 1995), gênero permite reconhecer e nomear a existência de formas de violências que acometem especialmente às mulheres e aos corpos não alinhados, como a violência doméstica e o feminicídio, e a perceber como formas generificadas, masculinistas, de organização social produzem uma ordem que exalta a violência, inclusive de estado, como meio de pacificação social.

Devido ao seu caráter contestador do status quo, a categoria gênero tem sofrido uma forte reação, que se dá por meio da afirmação da existência de uma suposta ideologia de gênero. No início dos anos 2000, a expressão aparece explicitamente em documentos religiosos e é definida como a defesa da escolha da orientação sexual independentemente da biologia, o que enfraqueceria o casamento e a família tradicional (Richard MISKOLCI; Maximiliano CAMPANA 2017, p. 727). Assim, a luta contra os feminismos, movimentos LGBTIQ+ e a categoria gênero tem como base uma concepção religiosa que pretende manter a família tradicional e, nela, o papel subalterno das mulheres. Essa forte reação aos avanços conquistados por movimentos sociais é reforçada por Jorge Scala (2011, p. 11), que inicia a introdução do livro afirmando que:

A assim chamada “teoria (‘enfoque’, ‘olhar’) de gênero” é, na realidade, uma ideologia. Provavelmente a ideologia mais radical da história, já que, se fosse imposta, destruiria o ser humano em seu núcleo mais último e simultaneamente acabaria com a sociedade.

A ideologia de gênero, segundo o autor, origina-se na terceira onda feminista - “feminismo de gênero” - e pretende fazer uma “reengenharia social planetária” (SCALA, 2015, p. 46). Assim, a “ideologia de gênero” é um instrumento político-discursivo que objetiva alterar as pautas morais e destruir a sociedade. As consequências sociais da ideologia de gênero são a eliminação do casamento, porque toda a união sexual teria o mesmo valor, mesmo aquela entre pessoas do mesmo sexo (SCALA, 2015, p. 67-67), enfraquecendo o vínculo matrimonial, causando confusão mental nas novas gerações, diminuindo o número de “verdadeiras uniões estáveis” e aumentando o número de casamentos sucedâneos (SCALA, 2015, p. 83).

Além disso, inovações como a “família democrática” e sua derivação, a “parentalidade”, seriam uma “engenharia social” para substituir a paternidade e a maternidade (SCALA, 2015), e junto com a guarda compartilhada, são uma ameaça à autoridade na família, pois “todos os membros opinam e decidem igualmente” (SCALA, 2015, p. 79). Da mesma forma, o oferecimento de educação sexual nas escolas, a capacitação de professores e a transversalidade de gênero eliminam totalmente o pátrio poder em matéria sexual (SCALA, 2015).

A família constituída pelo casamento heterossexual e indissolúvel não seria uma invenção humana, mas uma instituição exigida pela própria natureza, e funcionaria como a célula básica de toda a sociedade. Na medida em que esta família estaria ameaçada pelos feminismos e estudos de gênero, toda a sociedade humana estaria ameaçada (SCALA, 2015).

Mas a noção de ideologia do autor pode ser utilizada contra a sua própria concepção de “ideologia de gênero”. Segundo Scala (2015, p. 32-33):

uma ideologia é um corpo doutrinario fechado, com pretensões de oferecer uma explicação de toda a realidade e, por isso, oferecer pautas universais de comportamento. Parte de uma premissa não demonstrada e indemonstrável -porque é falsa- e, a partir dela, as consequências são deduzidas mediante raciocínios rigorosamente lógicos. Por isso, quem aceita a premissa acriticamente e assim se introduz no sistema de pensamento ideológico não pode sair dele. Pelo contrário, nele se introduz cada vez mais profundamente, podendo chegar até ao mais irracional fanatismo.

Ora, é exatamente com um corpo fechado de ideias sobre família, casamento e poder familiar que o autor trabalha, cujo único arranjo familiar possível é a família heterossexual com o respeito ao poder familiar (paterno). A ruptura desse modelo corresponde à ruptura social. Portanto, é um modelo que pretende oferecer um padrão universal de comportamento, marginalizando e tratando como desviantes todos os outros arranjos familiares existentes na sociedade brasileira, pois o único modelo aceitável é o autoritária e ideologicamente definido e validado pelo autor. Desse modo, o autor enrosca-se no irracionalismo fanático que contraditoriamente afirma combater.

Por esta razão, a terminologia “ideologia de gênero” reflete ela própria uma ideologia de gênero de natureza familista (CAMPOS; BERNARDES, 2019) sustentada em um passado mítico, patriarcal e no desejo de retorno a um lugar onde as mulheres desempenhem papéis sociais subordinados e no qual o homem ocupe o papel central na família. Concebe o gênero sob bases falsas, pois afirma que o conceito de gênero está ligado ao de sexualidade e que, por meio dele, feministas e teóricos queer querem acabar com a diferença entre os sexos. Sob esta compreensão, qualquer crítica às regras normalizadoras do comportamento feminino e masculino, e consequente afirmação de formas divergentes de sermos homens e mulheres, é caracterizada como ameaça à identidade heterossexual e cis-gênera de crianças (CAMPOS; BERNARDES, 2019).

Nesta matriz heterossexual, o discurso forja subjetividades - o homem normal e a mulher normal - atribuindo a cada um determinado comportamento social, identidade de gênero e comportamento sexual específico. As similaridades existentes entre corpos de sexo oposto e as diferenças entre os corpos do mesmo sexo são tidas como irrelevantes (Adriana OLIVEIRA, 2015). Por um lado, corpos masculinos são associados à uma identidade masculina determinando comportamento viril e desejo sexual pelo sexo oposto. Por outro, o corpo feminino é correlacionado a uma identidade passiva e também desejo sexual pelo outro sexo. Aqueles que desviarem da regra normalizada serão punidos com violência (Marcia BERNARDES; Mariana ALBUQUERQUE, 2019).

Nesse sentido, a Ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos ao afirmar que meninas vestem rosa e meninos vestem azul ou meninas devem ser tratadas como princesas (Fernanda PONTES, 2019) mobiliza forte conteúdo de gênero porque tradicionalmente a cor rosa está ligada à delicadeza (atributo identificado como feminino), portanto à princesa, e o azul à virilidade/masculinidade, ao príncipe. Da mesma forma, sua compreensão de que o problema da violência é a falta de romantismo (meninos devem tratar as meninas como princesas e dar-lhes flores) entende a violência contra mulheres como um problema individual, isto é, de quem não se comporta conforme esse modelo. Com isso, desloca o problema para a pessoa, isentando a sociedade que cria e reproduz relações desiguais de gênero (CAMPOS; BERNARDES, 2019).

Nesta medida, esse discurso é uma reação violenta ao gênero, mas contraditoriamente, é ele próprio de uma “ideologia de gênero familista”, um sistema de ideias que mascara relações de opressão, naturalizando-as. A “ideologia de gênero familista” necessita negar o conceito de violência baseada no gênero, de caráter sistemático e enraizado nas relações desiguais de poder entre homens e mulheres. A aceitação social da subordinação feminina e o uso da violência para o controle dos corpos femininos vincula a presunção de que meninas são propriedade dos meninos e sem autonomia, pois seus corpos pertencem aos meninos (CAMPOS; BERNARDES, 2019). Ora, se a causa da violência vai mais além da mera intenção individual de um menino “desviante” e “mal formado”, o que, nos processos ideológicos, Marilena Chauí (1980) chama de inversão causa/efeito, a “ideologia de gênero familista” necessita esconder que a família é um lugar de violência.

Argumentamos que o locus de difusão dessa política baseada no retorno à família patriarcal é o MMFDH, que trabalha para a divisão entre as mulheres (“nós” x “elas”, as feministas) e para o fortalecimento da perspectiva da família tradicional. Adota uma postura anti-intelectual de negação ou distorção dos estudos feministas e queer sobre as questões das mulheres e das minorias sexuais. Promove, com base nestas manipulações, um clima de pânico moral que tem por objetivo conter os avanços democraticamente conquistados pelas mulheres e minorias sexuais, colocando-as em risco.

O Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos como locus de difusão da ideologia de gênero familista

A reação violenta ao gênero fez parte do discurso do então candidato à Presidência Jair Bolsonaro, e ingressa formalmente como política do seu governo com a criação do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos.

Uma das primeiras manifestações da Ministra titular da pasta, a pastora Damares Alves, em seu discurso de posse, foi afirmar que “ninguém irá impedir de chamar meninas de princesas” e meninos de príncipes”. E logo após, nos bastidores do Ministério ela afirma que “é uma nova era no Brasil: meninos vestem azul e meninas vestem rosa” (O GLOBO, 2019).

Essas manifestações geraram inúmeras reações. Ao ser questionada, a Ministra disse que fez uma metáfora, já que existe o Outubro Rosa e Novembro Azul, referindo-se às campanhas de prevenção ao câncer de mama e de próstata, respectivamente. Afirmou ainda que irão “respeitar a identidade biológica das crianças”. Segundo a Ministra,

O Presidente Jair Bolsonaro prometeu na campanha o combate ao abuso da doutrinação ideológica. Eles dizem que a criança não é menina nem menino, que é um ser neutro que vai crescendo e depois escolhe o que quer ser e estão dando 70 opções de identidade de gênero no Brasil e isso está confundindo as crianças (JORNAL HOJE, 2019).

O discurso da Ministra revela uma manipulação do conceito de gênero com o propósito de confundir a opinião pública e criar um clima de pânico moral. O pânico moral, resultante da “reação violenta ao gênero”, é uma estratégia utilizada em conjunto com a ansiedade sexual e “emerge a partir do medo social com relação às mudanças, especialmente as percebidas como repentinas e talvez, por isso mesmo, ameaçadoras” (Richard MISKOLCI, 2007, p. 103). Nesse sentido, o conceito de gênero e a união de pessoas de mesmo sexo são utilizados como ameaças à identidade de crianças e adolescentes e ao casamento tradicional, devendo, portanto, serem combatidos.

Como já mencionado, o conceito de gênero tensiona a heteronormatividade como único comportamento aceitável no campo da sexualidade. Gays, lésbicas e trans ameaçam a identidade fixa de gênero, a ideia de casamento, da reprodução e da família como fundamento da estrutura patriarcal. Afirma Miskolci (2007, p. 107) que a

“inversão sexual” constituía uma ameaça múltipla: à reprodução biológica, à divisão tradicional de poder entre o homem e a mulher na família e na sociedade e, sobretudo, à manutenção dos valores e da moralidade responsáveis por toda uma ordem e visão de mundo.

Os “desviantes” da sexualidade hegemônica perturbam os valores tradicionais da família patriarcal e são, portanto, uma ameaça às políticas fascistas que se sustentam nesse modelo (STANLEY, 2018). Por isso, a necessidade de criar pânico moral em torno do gênero e do que ele supostamente representa. Como temor à sociedade, o gênero se torna um inimigo e todas suas defensoras e seus defensores ou aquelas e aqueles que expressam concretamente essas “identidades invertidas” devem ser eliminados (MISKOLCI, 2007, p. 110).

Essa “ideologia de gênero familista” não é apenas difundida por discursos de parlamentares e gestores. Ela vem sendo elaborada como uma política pública do MMFDH, cuja estrutura e programas foram moldados para executá-la. Como veremos, o Ministério criou diversos programas, e renomeou outros, usando o termo família, sem conceitua-la oficialmente. Da mesma forma, alterou algumas estruturas já estabelecidas para o enfrentamento à violência doméstica. Argumentamos que, para percebermos a forma como as pautas relativas a gênero foram instrumentalizadas em benefício da família patriarcal, por meio de definições ou omissões nas políticas existentes e de novidades já instituídas pelo MMFDH, precisamos analisá-las em articulação com a retórica geral de pânico moral de todo o governo atual, em especial do próprio MMFDH.

3.1 O MMFDH

O MMFDH é um “super-ministério” em termos de estrutura, possuindo oito secretarias nacionais e onze órgãos colegiados (Conselhos Nacionais), dentre eles, o Conselho Nacional dos Direitos da Mulher (BRASIL, 2019a). Esse Ministério reúne as antigas Secretaria de Políticas para as Mulheres, a Secretaria da Promoção da Igualdade Racial e o Ministério dos Direitos Humanos. A essa estrutura foram incluídas outras secretarias: a Secretaria Nacional de Proteção Global; a Secretaria Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência; a Secretaria Nacional de Promoção e Defesa dos Direitos da Pessoa Idosa; a Secretaria Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente; a Secretaria Nacional da Família e a Secretaria Nacional da Juventude.

A Secretaria Nacional de Políticas para as Mulheres (SNPM) é formada pelo Departamento de políticas de enfrentamento à violência contra as mulheres, a coordenadoria-geral de acesso à justiça e fortalecimento da rede de atendimento à violência contra a mulher; a coordenação-geral do programa Mulher, Viver sem Violência (recentemente renomeado); a coordenação-geral de articulação nacional de combate à violência contra as mulheres, o departamento de promoção da dignidade da mulher e mais quatro outras coordenações gerais (BRASIL, 2021a). Tem como atribuição a defesa da dignidade de todas as mulheres, a formulação, coordenação e articulação de políticas para mulheres, incluídas atividades antidiscriminatórias e o combate a todas as formas de violência contra mulheres. Consta na página eletrônica que a promoção dos direitos das mulheres deve considerar a perspectiva da família, o fortalecimento de vínculos familiares e a solidariedade intergeracional (BRASIL, 2021b).

No que se refere às políticas de enfrentamento à violência contra mulheres, o MMFDH manteve, dos programas anteriores, apenas o Ligue 180 (Central de Atendimento à Mulher) e o Disque 100, agora unificados na Ouvidoria. O Programa “Mulher, Viver sem Violência”, ao qual está vinculada a Casa da Mulher Brasileira (CMB) foi substituído pelo Programa “Mulher Segura e Protegida” e suas atribuições, diretrizes e ações alteradas, o que repercute também nas atribuições da Casa. A CMB (BRASIL, 2019b)3 estava vinculada ao “Programa Mulher, Viver sem Violência”, sendo criada no governo Dilma como um espaço que concentra os principais serviços de atendimento a mulheres em situação de violência, atendendo principalmente a vítimas de violência doméstica. A primeira Casa da Mulher Brasileira foi inaugurada em Campo Grande, em 2015 (Yara AQUINO, 2015).

Nos governos anteriores, a CMB funcionava como um espaço para acolhimento e atendimento jurídico e psicossocial de mulheres em situação de violência doméstica. O atual Programa “Mulher Protegida e Segura” 4 pretende ampliar o atendimento para casos de tráfico de mulheres e situações de vulnerabilidade por fluxo migratório em fronteiras, sem uma real avaliação do impacto dessa reestruturação (BRASIL, 2019c). O antigo programa previa que mulheres em situação de tráfico e migrantes, especialmente nas regiões de fronteira, fossem atendidas pelos centros de atendimento a mulheres especializados nesses temas. Agora a CMB passa a acolher situações de outra complexidade e especificidades. Em geral, o tráfico de pessoas está associado à criminalidade internacional e a outros crimes conexos, o que pode fragilizar a segurança e o atendimento a mulheres em situação de violência doméstica e familiar. Além disso, as equipes multidisciplinares deverão ter capacitação específica para cada uma dessas modalidades de crime ou violências. No entanto, o MMFDH não tem mais a obrigatoriedade de apoiar técnica e financeiramente a manutenção das Casas5.

O Programa “Mulher Segura e Protegida” substituiu também a “transversalidade de gênero” prevista no programa “Mulher, Viver sem Violência” pela “transversalidade dos direitos das mulheres nas políticas públicas” 6. Dentre as ações previstas no art. 3º do Decreto instituidor do Programa estava a ampliação da Central de Atendimento à Mulher (Ligue 180), já não mais assegurada. Ademais, a capacitação não mais incluirá temas referentes às relações sociais de gênero, abrindo espaço para o reforço da família tradicional.

Mencionamos que a Secretaria Nacional de Políticas para as Mulheres (SNPM) é responsável por elaborar e gerir as políticas de enfrentamento à violência contra mulheres. As políticas elaboradas são divulgadas na página eletrônica do MMFDH e esse é o único canal por meio do qual se pode obter informações. Foi então na página oficial do Ministério que encontramos informações sobre o que parece ser, até o momento, a sua única política de enfrentamento à violência contra mulheres, o projeto #SalveumaMulher7:

Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos (MMFDH), por meio da Secretaria Nacional de Políticas para Mulheres (SNPM), realizou nesta quarta-feira (26) um encontro com aproximadamente 50 representantes da área da beleza. Na pauta, a adesão ao projeto #SalveUmaMulher.

(...) a coordenadora-geral do Trabalho e Projeção Econômica da Mulher, da SNPM/MMFDH, Roberta Monzini, destacou que a proposta é capacitar profissionais para identificar, acolher e apoiar as mulheres em situação de violência.

Como se nota, a primeira reunião sobre o projeto foi com profissionais de beleza. Posteriormente, o projeto foi lançado no dia 03/10/2019, já com uma perspectiva mais ampla, prevendo ações de sensibilização, campanhas e capacitação de voluntários, por meio oficinas para agentes públicos e privados, que deverão atuar como multiplicadores da informação e da capacitação. Além disso, propõe a criação de grupos de apoio. As instituições parceiras do projeto serão contempladas com o selo “Essa instituição se dedica a salvar mulheres”. Conforme estimativas, serão sensibilizados 40 mil agentes de saúde, 106 mil funcionários dos correios, 30 mil conselheiros tutelares e 1.722 profissionais da Defensoria Pública da União (DPU) (BRASIL, 2019d). No entanto, não há informações sobre o conteúdo das capacitações, quem serão as/os capacitadores/as, e nem como o projeto irá, de fato, ser realizado.

No vídeo de lançamento do projeto, a Ministra disse que pretende transformar homens e mulheres em “heróis e heroínas” (BRASIL, 2019e), e que precisamos criar um “exército”. Tal manifestação corresponde à ideia de que a luta contra a violência contra mulheres não é de enfrentamento a um problema estrutural, culturalmente enraizado, mas um ato de coragem de algumas pessoas capacitadas para salvar mulheres. Por sua vez, o termo “exército” não parece ter surgido espontaneamente, tampouco sua utilização por religiosos (Kiko NOGUEIRA, 2019) 8. Ele transmite a ideia de “guerra”, da qual precisamos “salvar as mulheres” da violência. Os que assim agirem serão “heróis” da pátria. Aqui vê-se como as ideias de heroísmo, militarismo e machismo se articulam no discurso da ministra.

Em relação à lei Maria da Penha, principal instrumento de proteção às mulheres, não foram encontrados projetos destinados ao seu fortalecimento e ampliação da rede nela prevista. Apenas em notícia a Ministra menciona a expansão do Projeto intitulado “Maria da Penha vai à Escola” (BRASIL, 2021c) para todo o país. O projeto pretende educar futuras gerações para serem agentes de proteção dos direitos da mulher. No entanto, a SNPM não disponibiliza informações sobre esse projeto, como e por quem será executado. Mais recentemente, em discurso, a Ministra afirmou que irá fortalecer as Rondas e Patrulhas Maria da Penha (BRASIL, 2019f), mas não se sabe como.

A ausência de projetos específicos de fortalecimento da lei Maria da Penha pode ser explicada em virtude da lei definir a violência doméstica e familiar como violência baseada no “gênero”, que ocorre na “família” e não apenas na casa, o que, a partir da perspectiva da “ideologia de gênero familista” (CAMPOS; BERNARDES, 2019), tornaria a lei Maria da Penha indefensável.

De fato, segundo o ideólogo familista Scala (2011, p. 88-89), a violência baseada no gênero irá aumentar exponencialmente a violência social, pois sua erradicação é utilizada como uma das estratégias para impor os direitos sexuais e reprodutivos, incluído o aborto, já que a violência contra a mulher restringe o exercício pleno dos direitos sexuais e reprodutivos, conforme organismos internacionais. Assim, a expressão violência de gênero ocultaria a violência contra o homem, contra os filhos e, em última instância, contra a família. Por isso,

todas as campanhas de conscientização contra a violência “doméstica” ou “de gênero” se baseiam em incentivar as mulheres a denunciarem seus esposos ou concubinos. Além disso, em toda pesquisa sobre “violência doméstica”, perguntam apenas à mulher adulta se ela é vítima de violência. (...) Os ministérios e secretarias da mulher têm este mesmo viés ideológico, ao mesmo tempo em que não existem os organismos de promoção da família (SCALA, 2015, p. 89).

Além disso, o autor é contrário à expressão violência familiar, pois para ele a violência predomina onde não existem famílias [heterossexuais]. Assim, é melhor a expressão “violência doméstica” que marca o lugar em que ocorre a violência, ou seja, a casa. Portanto, a violência não ocorre na família enquanto instituição (SCALA, 2015). Com efeito, a defesa da família pela Ministra também é constante:

(...) vamos criar ações efetivas de valorização e fortalecimento da família. Esse é o caminho. Precisamos de vínculos fortes. Nossa sociedade avança assim. Família unida e harmoniosa protege as suas crianças. Aguardem novidades9.

3.2 O Observatório da Família

A crítica de Scala aos órgãos que não defendem a família parece ter sido a inspiração para a criação da Secretaria Nacional da Família (SNF), do MMFDH. A SNF possui uma diretoria de formação, fortalecimento e promoção da família; uma coordenação-geral de apoio à formação e desenvolvimento da família; uma coordenação-geral de fortalecimento dos vínculos familiares e solidariedade intergeracional; uma diretoria de equilíbrio trabalho-família; uma coordenação-geral de conciliação trabalho-família e projeção econômica; uma coordenação-geral de estudos, pesquisa e avaliação; uma diretoria de desafios sociais no âmbito familiar; uma coordenação-geral de enfrentamento à violência nas famílias, abandono, pedofilia e pornografia; uma coordenação-geral de enfrentamento a vícios e impactos negativos do uso imoderado de novas tecnologias.

A SNF possui ainda um Observatório Nacional da Família (ONF) que parece ser o principal projeto do Ministério:

O Observatório Nacional da Família (ONF) é unidade de pesquisa integrante da estrutura da Secretaria Nacional da Família do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos que visa incentivar o desenvolvimento de estudos e pesquisas relacionados à temática da família, tornando-se referência para elaboração de políticas públicas voltadas à família. Busca igualmente contribuir para subsidiar políticas familiares bem como o intercâmbio e a difusão do conhecimento científico sobre a família no Brasil e no mundo (BRASIL, 2020a).

Dentre os objetivos principais do ONF, destacamos:

Produzir conhecimento científico sobre família, sendo pólo dinamizador de uma rede de investigadores nacionais e internacionais que se dedicam à investigação científica neste domínio, nas suas mais diversas vertentes temáticas.

(...)

Intervir nos grandes debates públicos sobre questões relativas à família.

(…)

Monitorar políticas públicas, programas e ações promovidos pela sociedade civil no domínio da família, através de estudos, relatórios e pareceres de experts ou que resultem de solicitações realizadas por agentes e instituições políticas, bem como por organizações cívicas e não governamentais (BRASIL, 2020a).

O ONF possui nove eixos temáticos, dentre os quais salientamos os eixos 4 - A família no contexto da educação; 5 - Desenvolvimento e fortalecimento de vínculos familiares e parentalidade contemporânea; 6 - Casamento e conjugalidade (BRASIL, 2020b). Infelizmente, não há informação sobre o que cada eixo busca desenvolver. Observa-se que um eixo temático estabelece o fortalecimento da “parentalidade” contemporânea, embora não defina esse termo.

Dentre as ações da SNF comentamos o lançamento do “Selo Empresa Amiga da Família” SEAF) cujo objetivo é

fomentar a adoção voluntária de práticas organizacionais familiarmente responsáveis pelas empresas brasileiras por meio do reconhecimento daquelas que se mostram comprometidas com o equilíbrio trabalho-família, o florescimento pessoal e profissional, e o desenvolvimento sustentável da sociedade (BRASIL, 2019g).

Novamente, não é possível saber o que significa “prática organizacional familiarmente responsável com o equilíbrio trabalho-família”. Pode-se perguntar que empresas merecerão o selo. Empresas que ampliarem a licença-paternidade para que mãe/pai possam passar mais tempo com os filhos, participarem de sua criação e dividirem as tarefas de cuidados? Ou ainda, empresas que criem creches para que as mães e pais possam deixar seus filhos enquanto trabalham terão o reconhecimento de uma boa prática? Ou empresas que não discriminem casais de mesmo sexo e garantam a eles os mesmos direitos em relação aos filhos que possuem casais heterossexuais serão empresas amigas da família? A concessão e os critérios pelos quais o selo será distribuído indicará o entendimento governamental de boas práticas no equilíbrio trabalho-família.

O SEAF é uma instituição importante, pois há previsão de uma estrutura de governança (art. 8o) composta por um Conselho Deliberativo (inciso I) e uma Secretaria Executiva (inciso II). O Conselho Deliberativo formado por onze integrantes (art. 9o) é a instância responsável por decidir sobre a aprovação das empresas para concessão do SEAF, a partir do relatório submetido pela Secretaria-Executiva (art.10, I). Dentre as atribuições da Secretaria-Executiva do SEAF, chama a atenção a que dispõe sobre seu poder para classificar o grau de sigilo dos documentos apresentados pela empresa em cumprimento às regras de participação estabelecidas para o SEAF (inciso III do art. 13), nos termos da Lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011 (BRASIL, 2011). É estranha essa atribuição porque documentos de uma empresa que concorre a um selo dado pelo estado devem ser públicos. Teria o sigilo a finalidade de ocultar os critérios pelos quais é concedido o selo?

Considerações finais

Sustentamos que o Ministério da Mulher está configurado para ser o difusor da “ideologia de gênero familista” do governo Bolsonaro, combatendo o uso da categoria gênero, os feminismos e estudos queer. Vale-se da estratégia fascista de gerar pânico moral na população, deturpando argumentos feministas e queers, reagindo violentamente ao gênero e a tudo que seja associado aos movimentos e suas conquistas em termos de igualdade e de liberdade para mulheres e minorias sexuais. Nesse sentido, a eliminação do termo gênero de todas as políticas existentes, assim como a desarticulação de programas de proteção à mulher e de atenção às vítimas de violência de gênero têm por objetivo a defesa da família que possui proteção ministerial. O Observatório da Família conduz-se para ser o braço ideológico do MMFDH, pois tem por objetivo propagar a “ideologia de gênero familista” do governo, embasando com estudos e pesquisas as políticas públicas e difundir o conhecimento por meio de uma rede de investigadores nacionais e internacionais que trocarão informações e subsidiarão os embates ideológicos do governo com os movimentos sociais, particularmente feministas e queers.

Assim, essas iniciativas somam-se a outras existentes em várias partes do mundo que reagem violentamente ao gênero e buscam impor estados totalitários, racistas, homofóbicos e patriarcais. Felizmente, ventos vindos de países latino-americanos e europeus informam que as populações que mais sofrem com essas políticas autoritárias estão resistindo e impondo derrotas a tais governos. Um alento e inspiração para as lutas e resistências que construímos dia a dia no Brasil

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1Foi o slogan da campanha de Jair Bolsonaro e permanece no seu governo.

2O governo de Michel Temer (2016-2018) iniciou após o golpe institucional (juridicamente nomeado como impeachment) contra a então Presidenta Dilma Rousseff.

3Notícia publicada em 08/11/2019 anunciava a inauguração da Casa da Mulher Brasileira em São Paulo, no dia 11/11/2019 (BRASIL, 2019b).

4Art. 3º O Programa Mulher Segura e Protegida foi criado pelo Decreto no 10.112, de 2019.

5Art. 4º Compete à Secretaria Nacional de Políticas para as Mulheres do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos: (Redação dada pelo Decreto nº 10.112, de 2019). VII - prestar apoio técnico e financeiro, não compulsório, aos entes federativos na manutenção das unidades da Casa da Mulher Brasileira; (Redação dada pelo Decreto nº 10.112, de 2019)

6Art. 2º São diretrizes do Programa Mulher Segura e Protegida: (Redação dada pelo Decreto nº 10.112, de 2019) II - transversalidade dos direitos das mulheres nas políticas públicas (Redação dada pelo Decreto nº 10.112, de 2019)

7O projeto foi inicialmente noticiado em junho de 2019, mas a página não se encontra mais disponível. Há notícia sobre a Campanha Abrace o Marajó, contra a exploração sexual, mas não está vinculada à SNPM.

8Curiosamente, a 1ª Igreja Evangélica Luz do Mundo, empresa do pastor Albertino Alves de Sá e sua mulher pastora Uelida Borges, sediada em Lages, Santa Catarina, mandou os fiéis orarem “pelas autoridades que governam o país, numa demonstração plena de amor à pátria. Uelida ainda ordenou que as seguidoras vestissem trajes militares para as apresentações.

9Postagem no Twitter da @DamaresAlves, em 27/05/2019.

Como citar esse artigo de acordo com as normas da revista: CAMPOS, Carmen H. de.; BERNARDES, Márcia N. “Ideologia de gênero e o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos”. Revista Estudos Feministas, Florianópolis, v. 30, n. 3, e73882, 2022

Financiamento: Pesquisa financiada pelo CNPq. Pesquisa financiada pela UniRitter

Consentimento de uso de imagem: Não se aplica

Aprovação de comitê de ética em pesquisa: Não se aplica

Recebido: 13 de Maio de 2020; Revisado: 16 de Novembro de 2021; Aceito: 10 de Dezembro de 2021

charmcampos@gmail.com

marcianb@puc-rio.br

Carmen Hein de Campos (charmcampos@gmail.com) é doutora em Ciências Criminais pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC/RS). Mestre em Direito (Universidade Federal de Santa Catarina e Universidade de Toronto). Professora do Mestrado e do Curso de Direito do Centro Universitário Ritter dos Reis, UniRitter. Líder do Grupo de Estudos e Pesquisa Gênero, Democracia e Direitos Humanos. Integrante da Rede Latinoamericana de acadêmicas feministas (Red ALAS)

Márcia Nina Bernardes (marcianb@puc-rio.br) é professora de Direito (Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro - PUC-Rio), doutora em Direito (NYU Law School), mestre em Direito (PUC-Rio e NYU Law School). Coordenadora do Núcleo de Direitos Humanos do Departamento de Direito da PUC-Rio. Lider do Grupo de Pesquisa Gênero, Democracia e Direito. Pesquisadora de produtividade do CNPq. Integrante da Rede Latinoamericana de acadêmicas feministas (Red ALAS)

Contribuição de autoria: Carmen Hein de Campos contribuiu na discussão sobre a concepção do artigo, o debete internacional sobre fascismo, o conceito de ideologia de gênero, sobre a análise das políticas públicas e ainda na redação do artigo. Márcia Nina Bernardes contribuiu com a pesquisa sobre a discussão sobre fascismo no Brasil e sobre o conceito de gênero nas diversas teorias feministas. Contribuiu também para redação do artigo e na revisão de dados coletados

Conflito de interesses: Não se aplica

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