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Revista Estudos Feministas

versión impresa ISSN 0104-026Xversión On-line ISSN 1806-9584

Rev. Estud. Fem. vol.31 no.2 Florianópolis  2023  Epub 30-Jul-2023

https://doi.org/10.1590/1806-9584-2023v31n292874 

Seção Temática Feminismos: atuação em rede, crise democrática e possibilidades futuras

Feminismo Negro e Interseccionalidade em Periódicos Brasileiros (1992-2020)

Black Feminism and Intersectionality in Brazilian Journals (1992-2020)

Feminismo Negro e Interseccionalidad en Revistas Brasileñas (1992-2020)

Cristiano Rodrigues1 
http://orcid.org/0000-0002-3950-0032

Viviane Gonçalves Freitas1 
http://orcid.org/0000-0002-6819-8995

1Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, MG, Brasil. 31270-901 - dcp@fafich.ufmg.br


Resumo:

Buscamos analisar a evolução da produção acadêmica brasileira sobre feminismo negro e interseccionalidade, no período de 1992 a 2020, por meio de uma análise bibliométrica e com raspagem de dados de artigos publicados em revistas das áreas de ciências sociais e humanas (A1, A2 e B1). Destacamos o impacto dos fluxos internacionais em difundir e adensar agendas de pesquisa sobre mulheres negras a partir dos anos 2000 e a importância de dossiês temáticos sobre gênero e raça em periódicos qualificados como mecanismo indutor para a ampliação da produção científica sobre as temáticas. Há um aumento contínuo de textos sobre tais questões a partir dos anos 2010, sugerindo que maior acesso de estudantes negros ao ensino superior e ampliação do debate público sobre interseccionalidade fora da academia possam estar gerando uma retroalimentação quanto ao interesse e à relevância do tema.

Palavras-chave: mulheres negras; feminismo negro; interseccionalidade; análise bibliométrica

Abstract:

In this paper we analyze the evolution of Brazilian academic production on Black feminism and intersectionality between 1992 and 2020, through a bibliometric analysis and scraping data from papers published in Journals in the areas of social sciences and humanities (A1, A2 and B1). We highlight the impact of international flows in disseminating and deepening research agendas on Black women from the 2000s onwards and the importance of thematic dossiers on gender and race in high-impact journals as an inducing mechanism for the expansion of scientific production on the themes. Our findings show that there has been a continuous increase in papers on Black feminism and intersectionality in the last decade, suggesting that greater access by Black students to higher education and the expansion of the public debate on intersectionality outside academia may be generating feedback on the interest and relevance of the topic.

Keywords: Black women; Black feminism; Intersectionality; Bibliometric analysis

Resumen:

Buscamos analizar la evolución de la producción académica brasileña sobre feminismo negro e interseccionalidad desde 1992 hasta 2020, a través de un análisis bibliométrico y raspado de datos de artículos publicados en revistas de las áreas de ciencias sociales y humanidades (A1, A2 y B1). Destacamos el impacto de los flujos internacionales en la difusión y profundización de las agendas de investigación sobre mujeres negras a partir de la década de 2000 y la importancia de los dossieres temáticos sobre género y raza en revistas calificadas como mecanismo inductor para la expansión de la producción científica sobre las temáticas. Ha habido un aumento continuo de textos sobre estos temas desde la década de 2010, lo que sugiere que un mayor acceso de los estudiantes negros a la educación superior y la expansión del debate público sobre la interseccionalidad fuera de la academia pueden estar generando retroalimentación sobre el interés y la relevancia del tema.

Palabras clave: mujeres negras; feminismo negro; interseccionalidad; análisis bibliométrico

Introdução

Estudos recentes sobre a institucionalização do feminismo na academia têm apontado para sua inerente contradição advinda, sobretudo, da tentativa constante de estabelecer conexões entre ativismo, conscientização política e produção de conhecimento validado academicamente (Cristiano RODRIGUES; Mariana ASSIS, 2017; Cecília SARDENBERG, 2007; Joan SCOTT, 2008).1 A despeito de sua crescente institucionalização, o feminismo acadêmico ainda é alvo de muitas críticas. De um lado, existem as advindas daqueles que veem o feminismo acadêmico como excessivamente politizado e pouco “científico”. De outro, há feministas que consideram a institucionalização do feminismo como um dos fatores que contribuem para o distanciamento entre acadêmicas e ativistas, bem como pelo enfraquecimento de seu potencial emancipatório, à medida que se submete ao modelo acadêmico tradicional de produção e validação de conhecimento (Ellen MESSER-DAVIDOW, 2002).

No Brasil, a institucionalização do feminismo acadêmico iniciou-se nos anos 1970, em um contexto de expansão do ensino superior e da emergência de estudos mais sistemáticos sobre a mulher (Ana Alice COSTA; SARDENBERG; 1994). Em 1978, ocorreram dois eventos que são considerados por diversas autoras (SARDENBERG; COSTA, 1994; COSTA, 1994; Miriam GROSSI, 2004) um divisor de águas para consolidação do campo de estudos sobre mulheres. O primeiro foi a realização, no Rio de Janeiro, do seminário A Mulher na Força de Trabalho na América Latina. O encontro deu origem ao Grupo de Trabalho Mulher e Força de Trabalho da Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Ciências Sociais (Anpocs) e influenciou a implementação de inúmeros outros GTs, nas mais diversas associações científicas do país. O segundo evento foi a realização do primeiro concurso de dotações de pesquisa sobre a mulher brasileira, coordenado pela Fundação Carlos Chagas e financiado pela Fundação Ford.

Entretanto, como revela Lourdes Bandeira (2000), o movimento feminista dos anos 1970, que era composto, principalmente, por mulheres brancas das camadas médias, estabeleceu uma forma única de “ser mulher” (ocidental, branca, heterossexual, classe média). A partir dessa mulher definida no singular, defendeu uma solidariedade intragênero baseada numa identidade biológica comum, esquecendo-se das diferenças e desigualdades entre mulheres de distintos lugares sociais, experiências religiosas, pertença racial, orientação sexual, entre outros marcadores. As mulheres negras no interior do feminismo insurgiram-se contra essa perspectiva limitada, afirmando que a luta pela democratização das relações sociais ia além da igualdade entre homens e mulheres, passando também por discutir as desigualdades entre as próprias mulheres (RODRIGUES; ASSIS, 2017).

Por essa razão, a relação entre feministas negras e brancas, dentro dos espaços acadêmicos e de ativismo, foi marcada, inicialmente, por um conjunto de controvérsias e disputas em torno de uma gramática política sensível às intersecções de gênero, raça e classe (RODRIGUES; ASSIS, 2017). A partir da leitura dos trabalhos de importantes feministas negras, como Lélia Gonzalez, Luiza Bairros, Matilde Ribeiro, Sueli Carneiro e Jurema Werneck, percebe-se um sentimento compartilhado de que determinadas reivindicações feministas não atingem questões relevantes para mulheres negras, além de uma insensibilidade, por parte das feministas brancas, acerca da centralidade que a experiência racial e o racismo têm na vida das mulheres negras.

Ademais, feministas negras têm apontado que a produção teórica feminista também promove exclusões, negligenciando ou invisibilizando a ação política e a produção intelectual de mulheres negras (Matilde RIBEIRO, 2006; Sandra AZEREDO, 1994). Ao mapear a recepção e a difusão de teorias feministas do norte global no Brasil, Azeredo (1994) afirma que os primeiros grupos e núcleos brasileiros sobre a mulher, criados na década de 1980, foram inspirados nos modelos dos programas de Women’s Studies dos Estados Unidos, porém, de maneira enviesada. Para a autora, não houve, no Brasil, a incorporação da crítica ao racismo no interior do movimento feminista tal qual ocorreu no país da América do Norte. Além disso, conforme afirmam Rodrigues e Assis (2017), a incorporação de teorias desenvolvidas por feministas negras, latinas, africanas e “de cor” tem se dado de maneira tardia e parcial no Brasil.

No início dos anos 1990, foram criadas as duas principais revistas feministas brasileiras: Revista Estudos Feministas (REF) e Cadernos Pagu. Entretanto, mesmo nessas revistas, a publicação de artigos enfatizando as intersecções de gênero, raça e etnia vem ocorrendo de forma limitada e, por vezes, dependente da proposição de dossiês temáticos como mecanismo indutor, como ressaltam os trabalhos de Luzinete Minella (2013), Janai Lopes (2020) e Rodrigues e Assis (2017).

O texto em tela visa contribuir para esse debate, ao mapear a produção acadêmica brasileira sobre mulheres negras, feminismo negro e interseccionalidade (doravante: FN), na REF, Cadernos Pagu e demais periódicos nacionais disponibilizados na plataforma Scielo, classificados como A1, A2 e B1 (de acordo com a classificação Qualis/Capes 2013-2016), das áreas de ciências sociais e humanidades, entre 1992 e 2020, tendo em vista três objetivos principais: (i) elaborar uma análise longitudinal sobre a incorporação de tais temáticas nos periódicos selecionados; (ii) observar se os periódicos feministas são mais permeáveis às temáticas analisadas neste trabalho; (iii) refletir sobre avanços e lacunas, propondo possíveis medidas para impulsionar a publicação de artigos sobre feminismo negro e interseccionalidade em periódicos qualificados.

O artigo está dividido em três seções, para além desta introdução. Na primeira, apresentamos nosso percurso metodológico e suas limitações. Na seção seguinte, apresentamos e analisamos os resultados da pesquisa. Por fim, fazemos uma discussão crítica sobre os achados da pesquisa à luz do pensamento feminista negro e trazemos as conclusões de nossa investigação.

Percursos metodológicos

A institucionalização do campo de estudos feministas e de gênero no Brasil teve início na segunda metade dos anos 1970, impulsionado pela Declaração da Década da Mulher pela Organização das Nações Unidas (ONU), em 1975. Nesse período, houve o surgimento de grupos feministas e publicações sobre desigualdades de gênero, mas ainda fortemente concentrados nas regiões Sul e Sudeste do país. Na década de 1980, foram fundados os primeiros núcleos de estudos feministas nas universidades, além dos grupos de trabalho (GTs) sobre gênero nos encontros das principais associações científicas das ciências sociais. Na década de 1990, foram criados os dois periódicos feministas mais importantes do país: Revista Estudos Feministas - REF (1992) e Cadernos Pagu (1993). Entretanto, apenas a partir da década de 2000, núcleos de pesquisa, programas de pós-graduação e periódicos passaram a incluir temáticas de gênero mais amplamente.

Embora os avanços no campo de estudos feministas e de gênero sejam inegáveis, observamos que sua intersecção com os campos de estudos sobre raça/etnicidade e a incorporação de perspectivas feministas negras sejam apenas marginais (MINELLA, 2013). Partindo desse diagnóstico, procuramos analisar a produção de artigos em periódicos qualificados sobre “mulheres negras”, “feminismo negro” e “interseccionalidade”, entre 1992 e 2020, com o objetivo de mapear o grau de marginalização dessas temáticas nos periódicos analisados e se está havendo, nos últimos anos, um incremento na produção acadêmica nessa área. Também é nossa intenção verificar se as revistas feministas são mais permeáveis à produção feminista negra no período analisado, embora a existência de uma correlação positiva entre a maior presença de mulheres negras nas universidades e o aumento de publicações sobre feminismo negro e interseccionalidade ainda demande mais investigações.

Os dados coletados e analisados em nossa pesquisa se baseiam em um conjunto de artigos publicados pelas principais revistas científicas brasileiras de seis áreas das ciências sociais e humanas - Educação, Psicologia, Sociologia, História, Antropologia, Ciência Política e Relações Internacionais -, que, de algum modo, incorporam temas relacionados a interseccionalidade, feminismo negro e mulheres negras. O corpus analisado foi constituído em três etapas, a partir de um conjunto de critérios de seleção:

  1. Definição dos periódicos: REF e Cadernos Pagu foram selecionadas e analisadas desde o período de sua fundação até 2020, pois são as revistas feministas mais importantes do país e, também, para verificarmos se, de fato, periódicos feministas são mais permeáveis às temáticas analisadas neste trabalho. Para o restante da amostra, levamos em consideração todas as revistas avaliadas pelos comitês de Educação, Psicologia, Sociologia, História, Antropologia, Ciência Política e Relações Internacionais da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), com as três notas máximas do sistema Qualis Periódicos, para o quadriênio 2013-2016: A1, A2 e B12 e disponíveis na plataforma Scielo. Utilizamos as seguintes palavras-chave na busca de artigos nos periódicos: interseccionalidade, mulheres negras, saúde da população negra, feminismo negro, consubstancialidade, mulata, esterilização forçada e esterilização em massa. Optamos por esse conjunto de palavras-chave a partir da nossa revisão inicial de literatura, na qual esses termos foram frequentemente mobilizados, de maneira substantiva ou descritiva, em artigos, teses e dissertações. Posteriormente, adicionamos outras palavras-chave a esse conjunto para verificar se retornavam mais artigos. Entretanto, os dados coletados foram redundantes e permanecemos apenas com o conjunto de palavras-chave listadas nesta seção. No total, 48 revistas atenderam a esses critérios de seleção: Afro-Ásia; Dados; Revista do Instituto de Estudos Brasileiros; Revista de História; Revista de Saúde Pública; Cadernos de Pesquisa; Cadernos CEDES; Novos Estudos CEBRAP; Estudos Econômicos; Serviço Social e Sociedade; Educação e Sociedade; História; Revista Brasileira de Estudos da População; Cadernos de Saúde Pública; Educação em Revista; Sociedade e Estado; Psicologia e Sociedade; Contexto Internacional; Saúde em Debate; Tempo Social; Estudos Históricos; Revista Brasileira de Ciência Política; Estudos Avançados; Cadernos CRH; Psicologia USP; Physis: Revista de Saúde Coletiva; Saúde e Sociedade; Revista de Sociologia e Política; Mana; Revista Brasileira de Educação; Tempo; Economia Aplicada; Ciência e Saúde; Interface; Revista Katálysis; Escola Anna Nery; Sociologias; Educação e Pesquisa; Civitas - Revista de Ciências Sociais; Revista Direito GV; Trabalho, Educação e Saúde; Galáxia; Revista de Educação Física UEM; Sexualidad, Salud y Sociedad; Revista Direito e Práxis; Almanack; Cadernos Metrópole; Sociologia & Antropologia.

  2. Obtenção dos artigos: todos os periódicos supracitados disponibilizam ao menos parte de seus volumes e números no portal de divulgação científica Scielo. Com exceção da REF e Cadernos Pagu, revistas em que analisamos todos os artigos, mesmo aqueles publicados antes de sua entrada no Scielo, consideramos, para nossa análise, apenas os artigos disponibilizados pelos periódicos no portal até o ano de 2020. A partir de um algoritmo de raspagem de dados virtuais, todos os artigos disponibilizados pelo Scielo foram computados em uma base de dados e, posteriormente, analisados a partir do programa de processamento estatístico R.

  3. Seleção de artigos: esta etapa foi definida conforme a busca por palavras-chave descritas no item 1. Selecionamos aqueles artigos disponibilizados no Scielo nas 48 revistas que abordavam, em graus variados, temas relacionados às mulheres negras e ao feminismo negro (FN). Fizemos o mesmo para a REF e Cadernos Pagu.

Importante frisar que as coleções dessas revistas no Scielo variam em extensão e cronologicamente, por isso os dados aqui apresentados devem ser lidos com ressalvas. Ainda assim, é possível inferir algumas características da distribuição dos artigos sobre FN nos periódicos analisados. A REF e os Cadernos Pagu são os periódicos que, comparativamente, mais publicaram artigos sobre FN, o que confirma nossa hipótese de maior permeabilidade das revistas feministas para a incorporação de perspectivas negras. No entanto, a publicação de artigos sobre FN nestas revistas fica em torno de 3% do total e, conforme, veremos mais adiante, se concentram em dossiês temáticos. Nos demais periódicos, a publicação de artigos sobre FN é ínfima.

Foram selecionados para análise 207 artigos de um total de 2.771 textos. Esta, como qualquer outra pesquisa, tem algumas limitações metodológicas, a começar pelas palavras-chave que selecionamos para a busca. Quando decidimos por elas, tínhamos a consciência de que estávamos restringindo o corpus aos trabalhos que necessariamente estivessem alinhados às discussões teóricas em que também nos baseamos. O sistema de classificação dos periódicos impõe outra limitação, uma vez que sabemos que publicar em revistas A1, A2 e B1 não é algo sem impedimentos, além de demandar, geralmente, estar em um momento da vida acadêmica que pode não ter sido atingido ainda por várias pesquisadoras e pesquisadores que trabalham com as temáticas abordadas aqui. Muito dessas investigações encontra-se na literatura cinzenta - trabalhos de conclusão de curso (TCC), dissertações e teses - ou em revistas nos extratos B2 e inferiores, que não integram o recorte deste trabalho.

Análise dos dados: a importância dos dossiês temáticos

Nesta seção, apresentamos um levantamento dos dados coletados a partir da raspagem automática das informações das revistas, mas também trazemos algumas considerações sobre os resultados encontrados. Um aspecto significativo é quanto à publicação de dossiês temáticos, o que nos parece ser um importante indutor para que assuntos específicos ganhem mais espaço, maior divulgação e consigam ampliar seu escopo de alcance a mais pesquisadoras e pesquisadores.

O Gráfico 1 apresenta a evolução temporal do número de artigos sobre FN nos cinco periódicos que mais publicaram artigos sobre a temática no período analisado: Revista Estudos Feministas; Cadernos Pagu; Saúde e Sociedade; Psicologia e Sociedade; Revista Direito e Práxis. Conforme salientamos na seção anterior, REF e Cadernos Pagu foram considerados em nossa análise, desde sua criação, no início dos anos 1990, e os demais a partir de sua inclusão na plataforma Scielo. Optamos por fazer uma análise da REF e Cadernos Pagu desde sua criação por considerarmos a importância que exercem em liderar a publicação de artigos feministas no Brasil e para testar a hipótese de que seriam mais permeáveis à publicação de artigos sobre feminismo negro, mulheres negras e interseccionalidade.

#PraTodoMundoVer O gráfico de linhas representa a evolução temporal da publicação de artigos sobre feminismo negro em revistas qualificadas, entre os anos de 1992 e 2020. Acima, estão os dados referentes aos anos de 1992 a 2000, apenas da REF (vermelho) e Cadernos Pagu (azul), sendo que ambas as publicações apresentam o ápice nos anos de 1995 (REF) e 1996 (Pagu). Abaixo, além das duas anteriores nas mesmas cores, estão representadas as revistas Saúde e Sociedade (verde), Psicologia &Sociedade (cinza) e Direito e Práxis (lilás), no período de 2002 a 2020. A REF tem os pontos mais altos do gráfico

Gráfico 1 Evolução temporal de artigos sobre FN em periódicos qualificados (1992-2020) 

REF e Pagu são os periódicos que, no período analisado, mais publicaram artigos sobre FN, porém, a proporção de 3% se manteve estável durante todos os anos, com exceção de momentos em que houve a publicação de dossiês temáticos ou números especiais. Em 1994,3 a REF publicou um número especial sobre o Colóquio Internacional Brasil, França e Quebec, e, entre os temas debatidos no volume, estava “Relações Sociais de Gênero, Raça e Relações Interétnicas”, que contou com a publicação de quatro artigos. No ano seguinte, o periódico publicou o Dossiê Mulheres Negras, organizado por Ribeiro, que contou com artigos de Lourdes Siqueira, Ribeiro, Luiza Bairros, bell hooks, Maria Aparecida Silva Bento, Márcia Lima, Rebecca Reichmann, Edna Roland, Maria Aparecida da Silva, Ângela Gilliam, Onik’a Gilliam e Sueli Carneiro.4

Na apresentação do dossiê, Matilde Ribeiro (1995) afirma que sua proposta consistia em incentivar a divulgação de pesquisas empíricas ou postulados teóricos sobre a interconexão entre gênero, raça, racismo e participação política. Contudo, após aproximadamente um ano de contato com pesquisadoras brasileiras, a organizadora percebeu a inviabilidade desse projeto. Como resultado, convidou, então, um grupo de ativistas e pesquisadoras negras e brancas para compor o dossiê (RIBEIRO, 1995). A autora, ainda na apresentação do dossiê, aponta para a necessidade de se intensificar os estudos sobre gênero e raça e, sobretudo, quebrar o tabu que responsabiliza apenas as mulheres negras por divulgar trabalhos sobre a temática (RIBEIRO, 1995).

Já em 2002, a REF publicou o dossiê sobre a III Conferência Mundial das Nações Unidas contra o Racismo, a Discriminação Racial, a Xenofobia e a Intolerância, ocorrida em 2001, em Durban, na África do Sul. O dossiê foi editado por Luiza Bairros e teve, entre os trabalhos publicados, a tradução de textos de Kimberlé Crenshaw, Maylei Blackwell e Nadine Naber, lidando com diferentes aspectos do conceito de interseccionalidade. De acordo com Ana Cláudia Jaquetto Pereira (2016), a incorporação do termo interseccionalidade à literatura acadêmica brasileira foi impulsionada, entre outras razões, pela publicação desse dossiê. Daquele ponto em diante, segundo a autora, houve uma profusão de artigos de feministas brasileiras incorporando o conceito de interseccionalidade a suas análises.

Em 1996, Cadernos Pagu dedicou dois números de sua revista (6 e 7) a gênero e raça, editados por Suely Kofes. Isso explica por que, naquele ano, 93,7% dos artigos publicados na revista enfocaram algum aspecto da intersecção entre essas duas temáticas. Tal fato indica, ainda, a importância dos dossiês e números especiais como mecanismos indutores para ampliar a publicação de artigos sobre FN em periódicos qualificados.

Os demais periódicos aparecem em nossa análise a partir de 2002, ano em que a plataforma Scielo passa a contar com o apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq). Notamos que, na década de 2000, apenas a REF, entre todas as revistas selecionadas para análise, publicou sistematicamente artigos sobre FN. Entretanto, a realização de dossiês foi, mais uma vez, o mecanismo indutor para a publicação de textos sobre a temática. Em 2005, a revista dedicou parte de um número a discutir o trabalho de Glória Anzaldúa, no qual vários textos sobre mestiçagem e feminismo da diferença foram publicados.5 Em 2006, o periódico publicou o dossiê Raça, Sexualidade e Saúde,6 organizado por Laura Moutinho, Simone Monteiro, Osmundo Pinho e Sérgio Carrara.

Na década de 2010, observamos, embora de maneira tímida, uma tendência de aumento constante na publicação de artigos sobre FN na REF e Cadernos Pagu. Nos demais periódicos analisados, também houve uma maior incorporação dessa temática, em especial nas revistas Saúde e Sociedade e Psicologia & Sociedade. Todavia, como a publicação desses artigos é, na maioria dos casos, esporádica, é importante analisar de maneira mais detalhada se há a presença de contextos ou atores que ora induzem, ora limitam a publicação de tais artigos. Talvez a organização de dossiês temáticos, a presença de editoras e editores mais ou menos sensíveis e momentos no contexto geral em que o debate público sobre feminismo negro e interseccionalidade esteja mais saliente possam interferir na oscilação da produção de artigos sobre FN em periódicos qualificados.

Acreditamos também que o aumento na publicação de artigos sobre FN na década de 2010 possa estar relacionado aos processos de maior inclusão de pessoas negras, especialmente mulheres negras, nos cursos de graduação e pós-graduação nas universidades brasileiras, a partir da implementação de políticas de democratização do acesso ao ensino superior, como o Prouni, o Reuni e as cotas raciais. Entretanto, faz-se necessário produzir mais pesquisas a fim de explicar as razões de tal fenômeno. Também acreditamos que seja importante analisar se essa tendência se verifica nas políticas de tradução e na produção de teses e dissertações.

No Gráfico 2, podemos perceber que os periódicos feministas são significativamente mais permeáveis à publicação de artigos sobre FN do que os demais. Entre 2000 e 2020, os periódicos selecionados em nossa amostra publicaram ao menos um artigo sobre FN. Destes, apresentamos, no Gráfico 2, os 15 periódicos que, para o período analisado, mais publicaram artigos sobre a temática: 36,59% dos artigos sobre FN foram publicados na REF; 15,61%, na Cadernos Pagu; 5,85%, na Saúde e Sociedade; 3,41%, na Psicologia e Sociedade; 2,44%, na Revista Direito e Práxis. Os demais periódicos listados no Gráfico 2 foram responsáveis, cada um, por menos de 2% dos artigos publicados sobre FN, no período analisado.

#PraTodoMundoVer O gráfico de colunas horizontais na cor lilás apresenta a proporção de artigos sobre feminismo negro publicados pelos periódicos disponíveis no Scielo, de 2002 a 2020, nesta sequência: Revista Estudos Feministas (36,59%); Outras (20,98%); Cadernos Pagu (15,61); Saúde e Sociedade (5,85%); Psicologia & Sociedade (3,41%); Revista Direito e Práxis (2,44%); Tempo Social (1,95%); e com 1,46% as demais - Sexualidad, Salud y Sociedade; Revista Brasileira de Ciência Política; Physis: Revista de Saúde Coletiva; Novos Estudos CEBRAP; Estudos Históricos; Estudos Avançados; Cadernos de Saúde Pública e Cadernos de Pesquisa

Gráfico 2 Proporção de artigos sobre FN disponíveis na plataforma Scielo (2002 a 2020) (em %) 

O Gráfico 3 demonstra que as mulheres são as primeiras autoras na maioria dos artigos sobre FN publicados em periódicos qualificados. Para todo o período analisado, o percentual de artigos publicados por mulheres é significativamente maior do que aqueles publicados por homens. Observamos, entre 2006 e 2015, uma ampliação do percentual de artigos publicados nos quais homens aparecem como primeiros autores. Entretanto, a partir de 2016, há um decréscimo. Nossos dados não nos permitem explicar o porquê desse aumento temporário na participação masculina, porém, como se sabe, o campo de estudos de gênero, ainda que interdisciplinar, é uma das poucas áreas acadêmicas com maior representação de mulheres pesquisadoras.

#PraTodoMundoVer O gráfico de linhas apresenta a proporção de primeira autoria do gênero feminino (cor vermelha, 81,46%) e masculino (cor azul, 18,54%), no período de 1992 a 2020

Gráfico 3 Gênero da primeira autoria (1992-2020) (em %) 

No Gráfico 4, analisamos também a cor/raça7 (Luiz Augusto CAMPOS; Carlos MACHADO, 2015) da primeira autoria. Notamos que, no período analisado, mulheres e homens brancos aparecem como primeiras autoras em proporção significativamente maior do que mulheres e homens negros. Nossos dados não permitem inferir as razões para tal diferença. Entretanto, Edimara Maria Ferreira, Karla Maria Damiano Teixeira e Marco Aurelio Marques Ferreira (2022) afirmam haver uma correlação entre nível de instrução e classificação racial entre os docentes do ensino superior no Brasil, sendo que 40,78% dos homens brancos e 35,39% das mulheres brancas têm mestrado, doutorado ou especialização; enquanto apenas 12,57% dos homens e 10,49% das mulheres não brancas apresentam esses níveis de instrução. No mesmo estudo, as autoras revelam que 76,67% dos docentes de instituições de ensino superior brasileiras são brancos (FERREIRA; TEIXEIRA; FERREIRA, 2022). Disso decorre que a maior presença de mulheres e homens brancos na academia, especialmente, na condição de professores e pesquisadores de pós-graduação, associada à propensão para que assinem como primeiros autores em artigos em coautoria com orientandos, pode ser alguns dos fatores que expliquem sua sobrerrepresentação em primeiras autorias em artigos sobre FN.

#PraTodoMundoVer O gráfico de linhas apresenta a proporção de primeira autoria por cor/raça e gênero, no período de 1992 a 2020. A seção superior refere-se à primeira autoria feminina. A seção inferior apresenta os dados sobre primeira autoria masculina

Gráfico 4 Cor/raça da primeira autoria (1992-2020) (em %) 

O Gráfico 5 apresenta a região de origem, no momento de publicação do artigo, da primeira autoria, e revela dois aspectos que merecem destaque. Primeiro, a grande prevalência de trabalhos do Sudeste, perfazendo 57,29% da nossa amostra, seguidos de 12,06% de trabalhos de autoras do sul do país. Segundo, a igualmente expressiva prevalência de publicações de autoras de outros países (17,59%), especialmente dos Estados Unidos. A publicação de artigos de autoras estrangeiras e/ou vivendo fora do Brasil, no momento da publicação, é maior do que de autoras das regiões norte, nordeste e centro-oeste combinadas. Compreendemos que o processo de formação e consolidação das universidades brasileiras, das revistas científicas e dos próprios núcleos de pesquisa feminista e de gênero contribui para essa discrepância na participação de autoras do Sul-Sudeste em relação a outras regiões do país. Já a prevalência de trabalhos oriundos dos Estados Unidos e de outros países deve-se a um conjunto de razões: (i) o aumento do intercâmbio acadêmico entre Brasil e Estados Unidos; (ii) a importância do feminismo negro norte-americano, que influenciou e influencia parte significativa das autoras e ativistas brasileiras e de outros países do sul global; (iii) uma política de tradução que privilegia autoras norte-americanas em detrimento a outras.

#PraTodoMundoVer O gráfico, de colunas verticais, na cor lilás, apresenta a proporção de primeira autoria por região, no momento da publicação do artigo: Norte (0,5%); Centro-oeste (6,03%); Nordeste (6,53%); Sul (12,06%); outros países (17,59%); Sudeste (57,29%)

Gráfico 5 Região de origem da primeira autoria, no momento de publicação do artigo (1992-2020) (em %) 

No Gráfico 6, podemos observar a área de atuação da primeira autoria dos artigos analisados, entre 1992 e 2020. Sociologia, Antropologia, História, Saúde Coletiva/Pública e Psicologia são as áreas de atuação mais prevalentes nos artigos selecionados. Tal constatação se coaduna a análise de outros trabalhos, os quais apontam que pesquisas mais importantes sobre mulheres negras, feminismo negro e interseccionalidade publicadas no Brasil estão, especialmente, na Sociologia, Antropologia e Psicologia (RODRIGUES; Viviane FREITAS, 2021). Tal fato também indica a necessidade de aprofundar estudos para se compreender melhor o que fez com que essas áreas, e não outras, se tornassem tão relevantes para construções de interpretações feministas negras essencialmente brasileiras.

#PraTodoMundoVer O gráfico, de colunas horizontais, na cor lilás, apresenta a proporção de primeira autoria por área de atuação, no momento da publicação do artigo: Sociologia (21,46%); Antropologia (12,68%); História (11,71%); Saúde Coletiva/Pública (9,76%); Psicologia (9,27%); Sem informação (5,85%); Educação (5,85%); Serviço Social (4,39%); Direito (4,39%); Letras (2,93%); Economia (2,93%); Ciência Política e Relações Internacionais (2,93%); Outras (2,44%); Comunicação (1,95%); Demografia (1,46%)

Gráfico 6 Área de atuação, no momento de publicação do artigo, da primeira autoria (1992-2020) (em %) 

O Gráfico 7 apresenta a instituição à qual estava vinculada a primeira autoria do artigo, no momento de sua publicação. Entretanto, como o número de instituições descritas era muito extenso, optamos por representar graficamente apenas aquelas com mais de 0,98% de menção. O Gráfico 7, em conjunto com o Gráfico 6, revela, com bastante clareza, os processos de formação e consolidação dos centros de pesquisa feminista e gênero no país. As seis instituições com o maior número de menções, com exceção da Universidade de Brasília (UnB), estão na região Sudeste e foram sede dos primeiros núcleos de pesquisa sobre gênero do país. Além disso, concentram os programas de pós-graduação que mais produzem teses e dissertações sobre gênero no Brasil.

#PraTodoMundoVer O gráfico, de colunas horizontais, na cor lilás, apresenta a proporção de primeira autoria por vínculo institucional, no momento da publicação do artigo: Outras (36,59%); Unicamp (6,83%); USP (6,34%); UnB (5,85%); UFRJ (5,37%); Não identificada (4,39%); UERJ (3,9%); Unisinos (3,41%); UFRGS (3,41%); UFMG (3,41%); UFBA (2,93%); Unesp (1,95%); UFF (1,95%); PUC-Rio (1,95%); UFSC (1,46%); UFJF (1,46%); UFSCar (0,98%); UFPE (0,98%); UFMA (0,98%); UEFS (0,98%); Sempreviva Organização Feminista (0,98%); PUC-SP (0,98%); PUC-RS (0,98%); Geledés - Instituto da Mulher Negra (0,98%); Fiocruz (0,98%)

Gráfico 7 Instituição, no momento de publicação do artigo, da primeira autoria (1992-2020) (em %) 

O Gráfico 8 analisa longitudinalmente a incorporação dos termos “mulheres negras”, “feminismo negro” e “interseccionalidade”, nos periódicos analisados, e revela aspectos interessantes sobre a produção voltada a essas temáticas, entre 1992 e 2020. Podemos inferir, de modo geral, que há uma ampliação e modificação de temas prioritários discutidos nos artigos, em cada uma das décadas analisadas em nossa pesquisa. Na década de 1990, os trabalhos, fortemente concentrados em dossiês temáticos editados pela REF e Pagu, foram escritos, em sua maioria, por ativistas do movimento de mulheres negras e/ou do movimento negro. Tinham a mulher negra como tema prioritário, discutindo assuntos relacionados à sua inserção no mercado de trabalho, trabalho doméstico remunerado, direitos sexuais, direitos reprodutivos, formas de associativismo de mulheres e negras e sua interação com os movimentos feministas e de mulheres.

Na década de 2000, com o aumento da internacionalização do feminismo negro brasileiro e maior intercâmbio com ativistas e intelectuais norte-americanas, debates sobre o pensamento feminista negro tornaram-se mais salientes. Pesquisas sobre as origens do feminismo negro brasileiro, os processos de autonomização e consolidação do movimento e das ONGs de mulheres negras ganham centralidade. Também foram publicados os primeiros trabalhos tentando recuperar e difundir o legado de importantes intelectuais negras, como Lélia Gonzalez e Beatriz Nascimento. Na década de 2010, ocorreu uma “virada interseccional”, em que esse conceito, difundido no Brasil a partir do dossiê sobre a Conferência de Durban, publicado na REF, se tornou bastante popular e ultrapassou as fronteiras da academia. O processo de democratização das universidades públicas, iniciado na década anterior, começou a dar resultados a partir de 2010, com maior participação de mulheres negras em programas de pós-graduação e estudantes exigindo a descolonização dos currículos. Nesse período, a interseccionalidade, seja como palavra de ordem, seja como tema de pesquisa, ganhou centralidade. No entanto, é necessário que mais pesquisas se dediquem a verificar se há uma correlação positiva entre o aumento de publicações sobre o feminismo negro e temáticas vinculadas a ele e o ingresso de mais discentes negras na universidade, especialmente em cursos de pós-graduação. Faz-se necessário, ainda, investir em pesquisas que analisem a produção sobre FN em periódicos menos qualificados, nos quais estudantes de pós-graduação tendem a publicar, e na área cinzenta (TCCs, dissertações e teses). Em conjunto, essas análises poderão fornecer um diagnóstico mais amplo e acurado sobre a expansão da produção sobre FN em anos recentes.

#PraTodoMundoVer O gráfico de linhas apresenta a evolução de como o feminismo negro e temas correlatos foram abordados pelas revistas analisadas, no período de 1992 a 2020. As “mulheres negras” (linha azul) aparecem desde 1996, com picos em 2006 e 2008, terminando em ascendência em 2020. Já “interseccionalidade” (linha vermelha) é sinalizada com as primeiras publicações, em 2005, com auge entre 2013 e 2014 e posterior decréscimo entre 2014 e 2016, quando volta a apresentar crescimento que se mantém até 2020. Por último, “feminismo negro” (linha verde) tem as primeiras publicações em 2012, com pico em 2016 e em 2019-2020 apresenta novo crescimento

Gráfico 8 Evolução temática (1992-2020) 

A Tabela 1 traz as autoras mais citadas nos artigos analisados, nas décadas de 1990 a 2010, e complementa os dados apresentados no Gráfico 8. Ao observarmos as variações nos padrões de citação ao longo do período analisado, conseguimos perceber: (i) as mudanças na agenda de pesquisas sobre FN; (ii) a importância das políticas de tradução em dar visibilidade a autoras estrangeiras do sul e norte globais e difundir temas de pesquisa sobejamente negligenciados na academia brasileira; (iii) o papel do intercâmbio entre intelectuais e ativistas negras brasileiras com o objetivo de ampliar o debate sobre feminismo negro para além da academia. Assim, nos anos 1990, o debate acadêmico se concentrou sobre as definições do sujeito político “mulher negra”, suas estratégias de mobilização política e sua posição autônoma, porém colaborativa, com a agenda política dos movimentos negros e feministas. Naquele período, a participação das mulheres negras na academia era ínfima e pouco se pesquisava sobre FN. Não por acaso, a maioria das autoras dos artigos dos anos 1990 aqui analisados era de ativistas do movimento de mulheres negras. Entre as autoras mais citadas do período, a presença de ativistas negras é também marcante. Fátima Oliveira, fundadora da Rede Nacional Feminista de Saúde e Direitos Sexuais Reprodutivos, ativista na luta pelos direitos reprodutivos e saúde da mulher negra, é uma das autoras brasileiras mais citadas na década de 1990. A filósofa Sueli Carneiro, uma das fundadoras do Geledés - Instituto da Mulher Negra, também foi uma das autoras mais citadas no período, fato que se repetiu nas décadas seguintes. Vale notar, ainda, como a citação de autoras como Fúlvia Rosemberg, pesquisadora sobre a segregação educacional e racismo na infância, e Elza Berquó, demógrafa com importantes trabalhos sobre o preterimento de mulheres negras no mercado amoroso, demonstra como a agenda de pesquisa sobre FN já apontava para temas que se tornariam centrais no debate público e acadêmico nas décadas subsequentes.

Nos anos 2000, houve, conforme mencionamos anteriormente, o aumento do intercâmbio entre feministas negras brasileiras e norte-americanas. O crescimento de citações aos trabalhos de bell hooks, Patricia Hill Collins, Gloria Anzaldúa e o aparecimento da palavra interseccionalidade em artigos brasileiros revelam como o pensamento feminista negro norte-americano começou a se tornar influente no Brasil. Nancy Fraser e Judith Butler, cujos trabalhos mais influentes foram traduzidos para o português no início dos anos 2000, também aparecem como algumas das autoras mais citadas no período.

Nos anos 2010, houve a expansão do intercâmbio entre feministas negras brasileiras e latino-americanas. Nesse contexto, trabalhos críticos ao conceito de interseccionalidade e/ou sua articulação com perspectivas decoloniais vieram a lume, o que pode ser observado pela presença de citações aos trabalhos de Ochy Curiel e Maria Lugones. Nesse período, houve, também, a reabilitação de importantes intelectuais negras brasileiras, como Lélia Gonzalez, Virgínia Bicudo e a ampliação do reconhecimento acadêmico de Sueli Carneiro. Flavia Rios e Regimeire Maciel (2018) creditam essa retomada ao movimento de se questionar o caráter colonizado dos currículos universitários por parte de estudantes negros. A tradução, ainda que tardia, mas contínua e sistemática dos trabalhos de importantes intelectuais negras norte-americanas, como Angela Davis, Kimberlé Crenshaw, Patricia Hill Collins e bell hooks, contribuiu para o aumento da influência do feminismo negro proveniente dos Estados Unidos entre nós, como também para a ampliação do uso do paradigma interseccional em pesquisas de natureza diversa.

Tabela 1 Autoras mais citadas por década (1990-2010) 

Década Autoras/es mais citadas/os Número de citações por autora
CARNEIRO 11
ROSEMBERG 9
OLIVEIRA 8
SILVA 4
1990 HASENBALG 4
BUTLER 3
RUBIN 3
GIACOMINI 2
HARAWAY 2
BERQUÓ 2
CARNEIRO 8
hooks 7
WELLER 7
CARVALHO 6
2000 ANZALDÚA 5
GUIMARÃES 5
FOUCAULT 4
GONZALEZ 3
FRASER 3
COLLINS 2
hooks 42
CRENSHAW 36
COLLINS 32
CARNEIRO 29
2010 GONZALEZ 17
BUTLER 16
FRASER 9
ALVAREZ 8
CURIEL 6
LUGONES 5

#PraTodoMundoVer A Tabela 1 apresenta as autoras mais citadas, por décadas (1990-2010), de acordo com o número de citações encontradas nas referências bibliográficas dos artigos analisados. A primeira coluna traz os anos iniciais (1990; 2000; 2010). Na coluna do meio, são listados os sobrenomes das autoras mais citadas. Na terceira e última coluna, são apresentados o número de citações de cada autora, por década. Assim, temos: (i) década de 1990 - Carneiro (11); Rosemberg (9); Oliveira (8); Silva (4); Hasenbalg (4); Butler (3); Rubin (3); Giacomini (2); Haraway (2); Berquó (2); década de 2000 - Carneiro (8); hooks (7); Weller (7); Carvalho (6); Anzaldúa (5); Guimarães (5); Foucault (4); Gonzalez (3); Fraser (3); Collins (2); década de 2010 - hooks (42); Crenshaw (36); Collins (32); Carneiro (29); Gonzalez (17); Butler (16); Fraser (9); Alvarez (8); Curiel (6); Lugones (5).

Notas (in)conclusivas: epistemologias alternativas, conhecimentos legitimados e silenciamento

Os achados deste artigo complementam o que várias das intelectuais negras já abordaram em seus estudos. Para bell hooks (1995, p. 465), a decisão de mulheres e homens negros de trilhar, conscientemente, um caminho intelectual foi sempre uma “opção excepcional e difícil”. Tal constatação, de acordo com Gonzalez (2020) ocorre, principalmente, porque há uma naturalização social de que a elas e a eles não caberia nada além do que a objetificação e um lugar à margem, pelo silenciamento e violência impelida a seus corpos.

A primeira coisa que a gente percebe nesse papo de racismo é que todo mundo acha que é natural. Que negro tem mais é que viver na miséria. Por quê? Ora, porque ele tem umas qualidades que não estão com nada: irresponsabilidade, incapacidade intelectual, criancice etc. e tal. Daí é natural que seja perseguido pela polícia, pois não gosta de trabalho, sabe? Se não trabalha é malandro, e se é malandro é ladrão. Logo, tem que ser preso, naturalmente. Menor negro só pode ser pivete ou trombadinha, pois filho de peixe, peixinho é. Mulher negra, naturalmente, é cozinheira, faxineira, servente, trocadora de ônibus ou prostituta. Basta ler o jornal, ouvir rádio e ver televisão. Eles não querem nada. Portanto têm mais é que ser favelados (GONZALEZ, 2020, p. 78).

Assim, hooks (1995) ressalta que o trabalho intelectual não está, de modo algum, divorciado da política do cotidiano, uma vez que o tornar-se intelectual permite entender a realidade na qual se está inserida, encarando o concreto das relações corriqueiras. Aprofundando um pouco mais essa reflexão, o pensamento feminista negro, como teoria social crítica, refletiria interesses e pontos de vista daquelas que o elaboram, apontando como temas centrais o trabalho, a família, a política sexual, a maternidade e o ativismo político, baseando-se em paradigmas que enfatizam a relevância das opressões interseccionais na estrutura social (Patricia COLLINS, 2019). Esse apontamento pode ser complementado pela observação de Luciana de Oliveira Dias (2022, p. 155), que chama a atenção para o movimento que vem se consolidando nos cursos de graduação e nos programas de pós-graduação,8 quanto à adoção de “posturas inclusivas, indicadoras de um antirracismo, em seus planos de ensino, com a inserção de temáticas e bibliografias não clássicas ou canonizadas, mas potentes na mobilização do campo”, no sentido de se buscar ciências sociais e humanas plurais.

Filiamo-nos aqui ao entendimento de “epistemologia” adotado por Collins (2019), que engloba a pesquisa de padrões utilizados para avaliar o conhecimento ou a razão pela qual acreditamos que algo é verdade. Dessa forma, “as escolhas epistemológicas referentes a em quem se deve confiar, em que acreditar e por que algo é verdadeiro não são questões acadêmicas inocentes. Essas preocupações, ao contrário, dizem respeito a uma questão fundamental: a das versões da verdade que acabam por prevalecer” (COLLINS, 2019, p. 403-404). Para a autora, a epistemologia feminista negra pode ser compreendida a partir de quatro dimensões: (i) a experiência vivida como critério de significado; (ii) o uso do diálogo na avaliação de reivindicações de conhecimento; (iii) a ética do cuidar (no sentido de valorizar a expressividade pessoal, as emoções e a empatia); e (iv) a ética da responsabilidade pessoal (referindo-se a que as argumentações carregam em si o caráter, os valores e a ética de cada indivíduo).

Gonzalez, ainda nas décadas de 1970 e 1980, já dizia que era necessário romper com a hierarquia dos saberes, e se utilizava da linguagem pretuguês para questionar o que era considerado “não-saber”, uma vez que entendia essa hierarquização como “produto da classificação racial da população”, como nos lembra Djamila Ribeiro (2017). Débora Sirno Santos e Dias (2019) destacam o impacto da inclusão de disciplinas sobre a temática racial atrelada ao gênero, nas grades de cursos de graduação e de pós-graduação, como citado acima. Tal observação refere-se não apenas à inserção de autoras e autores que abalam o direcionamento “hegemônico e clássico” ao construirem um pensamento crítico e da margem ao centro, mas também pela importância na construção da identidade do corpo discente.

Aquele lugar de lutas foi também de ressignificação e positivação de pertencimentos e afirmação de locais de fala (RIBEIRO, 2017) e de identidades que fortaleceram coletivamente. Muito desse processo foi ativado pelo fato de a professora da disciplina ser uma mulher negra e ponderar sobre o seu local de fala e de sua representatividade, o que implica entendê-la como um referencial que espelha e inspira sonhos, desejos e projetos (SANTOS; DIAS, 2019, p. 16).

Collins (2016; 2019) destaca que os processos de validação do conhecimento são influenciados por dois critérios políticos: (i) as reivindicações de conhecimento serem avaliadas por um grupo de especialistas composto por integrantes da parcela privilegiada pelas opressões interseccionais; e (ii) cada comunidade de especialistas seria responsável por atribuir credibilidade a seus pares, de acordo com critérios advindos dos conhecimentos básicos, “no pensar como de costume”. Dessa maneira, a autora frisa que, “quando homens brancos de elite ou qualquer outro grupo excessivamente homogêneo domina os processos de validação do conhecimento, esses dois critérios políticos podem servir para suprimir o pensamento feminista negro” (COLLINS, 2019, p. 405).

Ramón Grosfoguel (2016, p. 27) reforça tal ponto ao frisar que há uma dinâmica de inferiorização de epistemologias e de conhecimentos outros, por parte de “universidades ocidentalizadas”, uma vez que “superior” seria o conhecimento produzido “por uns poucos homens ocidentalizados dos cinco países, [que] conformam o cânone do pensamento nas humanidades e nas ciências sociais”. Dessa forma, as discussões sobre feminismo negro e interseccionalidade se enquadrariam no que Reiland Rabaka (apudGROSFOGUEL, 2016) resume como “apartheid epistêmico”, pelo seu viés hierárquico, racista e sexista de silenciamento, inferiorização, exclusão e dominação de outras cosmologias e visões de mundo distintas da considerada “padrão”.

No entanto, as epistemologias alternativas - como Collins (2019) denomina -, advindas do pensamento feminista negro, vêm, aos poucos, quebrando barreiras e ocupando espaços. Ainda estamos longe de percentuais tão expressivos quanto aos dos debates hegemônicos, mas, como se buscou apresentar no trabalho em tela, homens e mulheres intelectuais brasileiras estão produzindo pesquisas que auxiliam xxx nessa mudança de paradigmas, no sentido da ampliação dos referenciais interpretativos, como a interseccionalidade, além da ruptura da falsa dicotomia academia/militância.

Apesar do avanço observado na última década (2010-2020), os dados discutidos aqui revelam que a proporção de artigos sobre FN ainda é muito baixa, não passando de 3% em periódicos feministas e alcançando, no máximo, 1% nos demais. Por isso, é tão importante estudar de maneira mais detida onde estão os entraves para a diversificação de publicações sobre FN. Nesse sentido, deixamos algumas questões que ainda precisam de outros esforços de pesquisas para serem respondidas: (i) não há submissões suficientes para esses periódicos?; (ii) os pareceres para artigos sobre FN são substancialmente diferentes do que para artigos de outra natureza?; (iii) a maior parte das publicações sobre FN ainda se encontra na literatura cinzenta?; ou (iv) artigos sobre FN estão sendo publicados em revistas menos qualificadas? Ao analisar esses diferentes cenários, poderemos pensar mecanismos indutores, para além de dossiês temáticos, que propiciem um aumento na publicação de artigos sobre FN em periódicos qualificados.

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1Os dados empíricos e reflexões apresentados neste artigo foram coletados no âmbito do Projeto “Mulheres Negras em Movimento(s): trajetórias, intersecções e novos cenários para a teoria e práxis feminista negra no Brasil”, financiado pelo CNPq (Processo 432980/2016-4).

2Até 2020, os periódicos eram avaliados em oito classes: A1, A2, B1, B2, B3, B4, B5 e C. Entretanto, apenas periódicos classificados nas três primeiras classes compõem o rol de excelência acadêmica, segundo a Capes.

3Número especial/2º sem./1994 - Colóquio Internacional Brasil, França e Quebec.

4Dossiê Mulheres Negras. Revista Estudos Feministas, v. 3, n. 2, 1995, p. 434-552.

5Revista Estudos Feministas, Volume: 13, Número: 3, Publicado: 2005.

6Revista Estudos Feministas, Volume: 14, Número: 1, Publicado: 2006.

7A análise da cor/raça da primeira autoria foi feita apenas com autoras e autores brasileiros e/ou que trabalham no Brasil. Na classificação oficial do IBGE, a população brasileira é subdividida em brancos, amarelos, pretos, pardos e indígenas. Porém, desde os estudos sociológicos conduzidos por Carlos Hasenbalg e Nelson do Valle Silva, a partir de final dos anos 1970, tornou-se tradição agregar os autodeclarados pretos e pardos à categoria sociológica “negro”. Por essa razão, utilizamos a categoria negro em nossa análise. Importante ressaltar que, embora o CNPq colete informações sobre cor/raça dos pesquisadores com currículos cadastrados na plataforma Lattes, seu preenchimento não é obrigatório, tampouco disponibilizado publicamente ou via lei de acesso à informação. Isso representou um desafio metodológico e, para contorná-lo, nos valemos do método de heteroclassificação racial, tal qual utilizado por Campos e Machado (2015). Assim, adotamos o seguinte procedimento: (i) selecionamos fotos das primeiras autorias disponíveis no Currículo Lattes e/ou em redes sociais; submetemos as fotos a três diferentes codificadores, e, em todas as situações nas quais houve concordância de pelo menos dois dos codificadores em relação à cor da autora, fizemos a classificação racial. Casos discordantes e aqueles em que não conseguimos encontrar fotografias foram classificados como “sem informação”.

8A autora faz referência especificamente, em seu texto, à área da Antropologia, mas quisemos trazer esse destaque de modo a contemplar também as outras ciências sociais e humanas, visto que refletem o contexto que buscamos apresentar no trabalho em tela.

Como citar esse artigo de acordo com as normas da revista: RODRIGUES, Cristiano; FREITAS, Viviane Gonçalves. “Feminismo Negro e Interseccionalidade em Periódicos Brasileiros (1992-2020)”. Revista Estudos Feministas, Florianópolis, v. 31, n.2, e92874, 2023

Financiamento: Os dados empíricos apresentados neste artigo foram coletados no âmbito do Projeto “Mulheres Negras em Movimento(s): trajetórias, intersecções e novos cenários para a teoria e práxis feminista negra no Brasil”, financiado pelo CNPq (Processo 432980/2016-4)

Consentimento de uso de imagem: Não se aplica

Aprovação de comitê de ética em pesquisa: Não se aplica

Recebido: 10 de Fevereiro de 2023; Revisado: 29 de Abril de 2023; Aceito: 25 de Julho de 2023

csrodrigues@ufmg.br

vivianegf@ufmg.br; vivianegoncalvesfreitas@gmail.com

Cristiano Rodrigues (csrodrigues@ufmg.br) é professor do Departamento de Ciência Política e do Programa de Pós-Graduação em Ciência Política da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)

Viviane Gonçalves Freitas (vivianegf@ufmg.br; vivianegoncalvesfreitas@gmail.com) é professora substituta no Departamento de Ciência Política da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Doutora em Ciência Política pela Universidade de Brasília (UnB). Pesquisadora associada à Rede de Pesquisas em Feminismos e Política e ao Margem - Grupo de Pesquisa em Democracia e Justiça (UFMG). Coordenadora do GT Mídia, Gênero e Raça (Compolítica) e da AT Raça, Etnicidade e Política (ABCP)

Contribuição de autoria: O autor e a autora contribuíram igualmente.

Conflito de interesses: Não se aplica

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