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versión impresa ISSN 0104-4060versión On-line ISSN 1984-0411

Educ. Rev. vol.36  Curitiba  2020  Epub 01-Dic-2020

https://doi.org/10.1590/0104-4060.69557 

Dossiê - Educação, democracia e diferença

Crianças viadas e o deslugar do gênero na escola: notas para um feminismo cor de ar

Gregory da Silva Balthazar* 
http://orcid.org/0000-0002-0371-1962

* Universidade Tiradentes. Programa de Pós-Graduação em Educação. Aracaju, Sergipe, Brasil. E-mail: gsbalthazar@gmail.com


RESUMO

No presente texto, problematizarei a potência do que chamarei de deslugar do gênero na escola: o gênero como matéria de uma diferença radical que pode, talvez, nos permitir vislumbrar, no campo da educação, um caminho para a construção de resistências mais plurais diante da onto-epistemologia liberal das políticas identitárias contemporâneas. Mais centralmente, e recorrendo às memórias escolares de crianças viadas, desejo mostrar a potência dos corpos abjetos para pensarmos a criação de pontos de conexão que, distante da lógica binária das identidades, nos permitem sugerir uma política interseccional pós-identitária de um feminismo cor de ar.

Palavras-chave: Gênero; Feminismos; Homossexualidade; Feminilidade; Escola

ABSTRACT

In the present paper, I will discuss the power of what I will name unplace of gender in school: gender as a matter of radical difference that may allow us to build more plural resistances in the contemporary liberal onto-epistemology of identity politics in the field of Education. Based on the school memories of queer children, I particularly want to show the power of abject bodies - far from the binary logic of identities - in an intersectional and post-identity politics of an air colored feminism.

Keywords: Gender; Feminisms; Homosexuality; Femininity; School

Introdução

“E acontece o seguinte: quando estranho uma pintura é aí que é pintura. E quando estranho a palavra aí é que ela alcança o sentido. E quando estranho a vida aí é que começa a vida”, escreveu Clarice Lispector (1998, p. 83) em Água Viva; um de seus mais belos e desconcertantes romances. Nele, Clarice nos convida a encarar o desconhecido, o estranho, a diferença que é, inelutavelmente, constituidora da vida. Mais centralmente, a tarefa de estranhar o que somos, nossa vida, nossos gestos, nosso pensamento, não é algo que se tece na solidão do eu ou como um ato voluntário de um sujeito cognoscente. Antes, e citando novamente Clarice, a arte de estranhar o já vivido só ganha corpo e vazão se “fazemo-lo juntos” (LISPECTOR, 1998, p. 9), de modo que é na relação com o outro - não qualquer outro, mas o outro que é matéria da diferença pura - que, talvez, possamos aprender a multiplicar o nosso viver; assim, afirmando com Clarice: “vivo à beira”, como ato profundo e singelo de “[nos] destruir para alcançar cerne e semente da vida” (LISPECTOR, 1998, p. 12).

Não são novos no campo da educação trabalhos que mostram como a diferença deve se tornar uma das principais (se não, a principal) matéria do trabalho pedagógico (PARAÍSO, 2018). Contudo, e em tempos da falaciosa ideia de “ideologia de gênero”, encontramo-nos à deriva, perdidos e perdidas, diante da tarefa de ensinar nossas alunas e alunos em seu porvir plural. Se afirmo isso, é lembrando, aqui, da mais recorrente pergunta que recebo em diferentes cursos de formação docente que ministro na área de gênero e sexualidade: como fazer?

Não é, por certo, uma pergunta gratuita, pois, sobretudo hoje, é uma desdobra de, ao menos, duas proposições. De um lado, como fazer uma educação que privilegia temas de gênero e sexualidade em um momento em que linhas de força buscam reavivar uma verdade sobre a escola que há muito se tem tentado abandonar: a escola como um lugar, por excelência, de normalização e de homogeneização dos corpos, das condutas, dos pensamentos, das subjetividades (BALTHAZAR, 2019; PARAÍSO, 2018). De outro lado, como fazer para ensinar sobre posições de sujeito as quais não se pertence, em um tempo em que a palavra se tornou tão perigosa diante das políticas identitárias: “as redes sociais testemunham e promovem uma verdadeira contenda entre ativistas que parecem querer se afirmar como os únicos detentores do direito de falar e agir em nome de determinada coletividade social” (DUARTE; CÉSAR, 2019, p. 34).

É um paradoxo do modo como nossas visões de mundo - e, por extensão, sobre os sentidos de educação que delas derivam - não se direcionam à multiplicidade tão cara à filosofia da diferença em educação mas, antes, estão marcadas por uma postura dogmática que, a um só tempo, estrutura os (e é estruturada pelos) discursos dos movimentos reacionários e os discursos mais progressistas sobre educação. O dogmatismo paradoxal se inscreve na lógica como, nos termos de Deleuze (2013, p. 61), “todo nosso pensamento é mais modelado pelo verbo ser, pelo É”. Com efeito, cada vez mais nos afastamos das zonas cinzas, da multiplicidade, da diferença, caminhando em direção à afirmação de que o que somos, enquanto sujeitos, resume-se sempre ao verbo ser. Assim, a herança dialética do opressor versus oprimido conforma nossas possibilidades subjetivas a um é/sou que nos parece intransponível: uma ordem discursiva binária de gênero fundante tanto dos discursos de dominação como dos de resistência.

No sentido de sugerir um outro caminho possível, procuro problematizar, distante da ordem binária das coisas, a potência do que chamarei de deslugar do gênero na escola: o gênero como matéria de uma diferença radical que pode, talvez, nos permitir vislumbrar, no campo da educação (mas, certamente, no tecido social de forma mais ampla), um caminho para a construção de formas mais plurais de resistência diante do momento político reacionário que vivemos no Brasil. Em outros termos, desejo pontuar o limite da onto-epistemologia liberal das políticas identitárias para tecermos formas de resistência outras diante da onda reacionária que vivemos. Mais centralmente, e recorrendo às memórias escolares de crianças viadas, desejo mostrar a potência dos corpos abjetos para pensarmos a criação de pontos de conexão que, distante da lógica binária, nos permitem sugerir uma política interseccional pós-identitária: “uma proposta que se baseia na experiência subjetiva e social da abjeção como meio privilegiado para a construção de uma ética coletiva” (MISKOLCI, 2011, p. 39).

Da resistência identitária à diferença como resistência

Retomemos, para continuar, Clarice em Água Viva; diz ela: “Como vês, é-me impossível aprofundar e apossar-me da vida, ela é aérea, é o meu leve hálito. Mas sei bem o que quero aqui: quero o inconcluso” (LISPECTOR, 1998, p. 27). Aqui, segundo a leitura de Maria Lucia Homem, a busca de Clarice pelo sentido das coisas, das palavras, da vida, nunca encontra um fim, já que a narradora clariciana se depara com o (e nos coloca diante do) estranhamento sobre si na tessitura da relação com o outro: “sustentado por uma trama quase inexistente, o livro se elabora num incessante fluxo, no qual a personagem ‘eu’-feminino fala a um ‘você’, alteridade representada aqui no masculino” (HOMEM, 2011, p. 90). Na leitura da autora, a narradora de Clarice tece reflexões filosóficas sobre o amor, a alegria e a dor: “transitando entre o monólogo e esboços dialógicos, [que] dão maior ou menor consistência ao outro” (HOMEM, 2011, p. 90).

Com efeito, Maria Lucia Homem delineia, sensivelmente, como Clarice nos afronta, de modo presciente aos filósofos e filósofas da diferença, com uma intransponível e cortante questão: ser o que somos (ou melhor, este aparentemente já feito que somos) é, em verdade, um exercício constante de fazer-se na inelutável relação com o outro. Em outros termos, Água Viva nos traz uma narradora que no jogo singelo da escrita - este ato que “é o modo de quem tem a palavra como isca: a palavra pescando algo que não é palavra” (LISPECTOR, 1998, p. 21) - traça sua própria efemeridade e sua fragmentação como sujeito no diálogo com outrem: “espectro que vai do eu à alteridade mais radical” (HOMEM, 2011, p. 90, grifos meus).

Clarice nos ensina, portanto, que o sujeito não está em contraposição a um outro que assegura o eu enquanto subjetividades “já feitas”. Ou seja, e relendo Clarice nos termos de Deleuze (2013), é preciso abandonarmos a herança liberal de que a subjetividade se tece, emerge, desperta na ordem dialética do eu versus o outro inscrita no verbo ser: eu sou um, tu és outro; em que a identidade tem um lugar fundamental na definição do outro que partilha ou não este é aparentemente coeso que somos. Antes, e ainda segundo o filósofo em uma análise do cineasta Godard, é preciso afirmarmos a potência do e: “quando Godard diz que tudo se divide em dois, e que existe no dia manhã e tarde, ele não diz é um ou outro [...]”, no sentido que, distante da dialética do ou, “o e é a diversidade, a multiplicidade, a destruição da identidade” (DELEUZE, 2013, p. 62).

Assim, e se recorro a Deleuze, é para problematizar como o outro em Clarice não é o da identidade aparentemente coesa e coerente das análises estruturais. Afinal, e como o romance nos dá a ver, este outro emerge no espaço microfísico de nossos gestos e ditos, jogando-nos, em sua absoluta estranheza, em sua radical diferença, no desconhecido que absorve o nosso instante já, ou melhor, aquilo que somos agora. Longe de afirmar de forma unívoca o que somos enquanto sujeitos, faz desse aparente nós-já feito, da nossa aparente coerência identitária, nosso próprio passado; e, com isso, nos afronta: você, o eu, o nós estão em um constante devir. Nas palavras de Clarice, “se eu digo ‘eu’ é porque não ouso dizer ‘tu’, ou ‘nós’ ou ‘uma pessoa’. Sou obrigada à humildade de me personalizar me apequenando mas sou o és-tu” (LISPECTOR, 1998, p. 13, grifos meus).

Nesse sentido, e se aqui retomo constantemente à ideia clariciana de estranhamento, é assumindo o convite que Clarice nos faz com sua obra: à tarefa de estranhar, na relação com o outro, o mais hodierno da vida, o mais singelo da existência, no sentido de colocar o que somos no limite, em suspenso, em um movimento de transformação, de criação, do que somos e do que podemos vir a ser como sujeitos (de gênero, de sexualidade, de raça, etc.). É uma tarefa de desassossego com nós mesmos, de fazer, como disse certa vez Foucault (2012), difíceis os nossos gestos mais simples. Inspirado em Clarice, desejo, então, colocar as balizas do nós-já feito (isto é, das marcas identitárias que constituem nossas subjetividades) em tensionamento, sugerindo, no limiar do que nos é pensável enquanto sujeitos de múltiplas camadas do pensamento humanista, o limite desse conceito sob o qual nos constituímos e que, aparentemente, não somos capazes de abandonar.

Se digo aparentemente, é porque compreendo, como sugeriu Berenice Bento (2017, p. 255), que os nossos movimentos Lésbicos, Gays, Bissexuais, Trans e Travestis (LGBTs) e feministas promovem “uma forma de fazer resistência e de sistematizar a indignação (em termos de tática e estratégia) nos modelos herdados da esquerda que lutou contra as ditaduras [...]”. Assim, a dialética de um nós/oprimidos versus eles/opressores dá, ainda hoje, a tônica das nossas lutas políticas, em um movimento calcado na disputa por um lugar na norma da lei e da proteção do Estado democrático de direito brasileiro, marcadamente liberal. Sob a égide da ideia de essencialismo estratégico, os movimentos sociais reavivaram, durante as primeiras duas décadas do período democrático brasileiro, a herança dialética da luta de classes, fazendo das identidades oprimidas, percebidas como estruturalmente partilhadas por um certo grupo social, o grande motor de uma prática política fincada na ficção naturalizante das identidades como meio, dentro das premissas do estado liberal, de emancipação pela conquista de direitos (MISKOLCI, 2011).

Mais recentemente, e de forma bastante popularizada nas redes sociais, a necessidade de nos ater à identidade social (de gênero, de raça, de sexualidade) encontrou novo vigor no conceito de lugar de fala; que, nos termos de Djamila Ribeiro (2017, p. 66), diz das “condições sociais que permitem ou não que esses grupos [subalternizados] acessem lugares de cidadania. [...]. Não se trataria de afirmar as experiências individuais, mas de entender como o lugar social que certos grupos ocupam restringem oportunidades”. Assim, e ao dialogar com algumas correntes estruturalistas da crítica feminista, o debate sobre lugar de fala revisita noções como estrutura, opressão/oprimido e libertação, para sustentar a importância epistêmica da identidade na produção de silenciamentos das vozes de certas experiências; experiências, estas, que localizariam os sujeitos em lugares sociais distintos e desiguais (RIBEIRO, 2017).

Com efeito, e permanecendo no âmbito das discussões de gênero (mesmo que o conceito de lugar de fala tenha um forte vértice interseccional com as questões raciais, o foco, aqui, será o vértice interseccional gênero/sexualidade), as pesquisadoras que lançam mão do conceito de lugar de fala negam um essencialismo inerente ao ser mulher, defendendo a urgência de pensar o lugar de fala a partir da localização desigual dos grupos identitários nas relações estruturais de poder. Ou seja, e como coloca Djamila Ribeiro (2017, p. 63), o lugar de fala não diz do indivíduo em si, mas, antes, de como marcadores culturais (como gênero, sexualidade ou raça) são “elementos da estrutura social que emergem como dispositivos fundamentais que favorecem as desigualdades”.

A negação de um essencialismo identitário é um desdobramento de como o campo dos estudos feministas brasileiro está, sobretudo em áreas como a filosofia e a educação, cravado no coração da filosofia da diferença. Assim, é possível ouvir uma defesa ampla das pesquisadoras, aqui no Brasil, de como a identidade é uma ficção radical ou, como diria Foucault (2012), a identidade é uma verdade; e a verdade é uma criação deste mundo. No sentido de exemplificar tal proposição, recorro, novamente, a Clarice: a identidade, enquanto ficção, seria uma espécie de “arte, um artifício, por meio do qual surge uma realidade delicadíssima que passa a existir em [nós]”. Portanto, e como tão bem nos ensinou Judith Butler (2008), não temos ou somos um gênero, o gênero não é. Antes, e distante do verbo ter ou ser, nós fazemos (e, paradoxalmente, somos feitos) gênero; pensando na ideia de artifício de Clarice, é um trabalho artesanal, um trabalho estético de construir, de criar, de produzir o corpo como suporte que faz existir gênero.

Logo, e de modo bastante disseminado no Brasil, gênero não é mais tomado como uma essência do ser mulher ou homem, mas como esta arte de fazer-se mulher ou homem. Mais do que isso, essa noção de gênero estilhaçou a própria noção de mulher, em um sentido de que “o signo mulher não esgota a pluralidade de mulheres, da mesma forma que ao falarmos de gay, lésbica, travesti, transexual sabemos que há uma diversidade de experiências em cada um desses guarda-chuvas identitários” (BENTO, 2011, p. 80). Contudo, Berenice Bento (2011, p. 80) defende que encontramos, aqui, uma disjunção entre a política da identidade e o modo como as possibilidades de viver gênero e sexualidade são marcadas por uma pluralidade intransponível: “no mundo, nas relações sociais, há pluralidade. Na esfera política, tudo se passa como se a única forma eficaz de mudar uma dada conjuntura é acionando a máquina binária. Homens versus mulheres, negros versus brancos”.

Para Michel Foucault (2004), a identidade poderia ser um instrumento operacionalizado no jogo político, mas, alerta, deveria ser apenas um dispositivo efêmero para favorecer relações humanas dentro da lógica liberal de governo das condutas. Aqui, então, são inegáveis os ganhos jurídicos e políticos dos movimentos sociais no jogo identitário-liberal, como os feminismos e os movimentos LGBTs. No campo da educação, por exemplo, é indiscutível a transformação do território escolar, em que a porosidade de noções antes aparentemente fixas se tornam nova ordem do discurso em educação (SILVA; SEFFNER, 2013). Não só se discute gênero e sexualidade hoje, mas é possível ver como a vida excede às categorias com as quais usualmente trabalhamos. Cada vez mais, é possível ver uma pluralidade de modos de ser e viver gênero e sexualidade na escola. Cada vez mais, a vida na escola (mas, certamente, não só) mostra que as diferenças de gênero e sexualidade são, longe da noção de ideologia, carne viva em nós.

Ora, então, onde está a disjunção entre a política identitária e os modos de vida? Fernando Seffner (2011) nos fornece uma pista importante para pensarmos essa proposição. Para o autor, o campo de experimentação e de criação subjetiva de gênero e sexualidade “vem sendo reduzido no âmbito da população LGBT, e isso acontece ao mesmo tempo em que conquistamos mais e mais direitos [...], sem negar que ainda nos faltam muitos direitos” (SEFFNER, 2011, p. 59). Portanto, e retomando Foucault, talvez possamos dizer que esta disjunção é um desdobramento do modo como fizemos da luta política singularmente um ato de defesa contra o poder:

[...] se a identidade se torna o problema mais importante da existência sexual, se as pessoas pensam que elas devem “desvendar” sua “identidade própria” e que esta identidade deva tornar-se a lei, o princípio, o código de sua existência, se a questão que se coloca continuamente é: “Isso está de acordo com minha identidade?”, então eu penso que fizeram um retorno a uma forma de ética muito próxima à da heterossexualidade tradicional (FOUCAULT, 2004, p. 265-266).

Nesta entrevista concedida nos anos 1980, o filósofo francês nos alertava para os perigos de fazermos, diante da lógica do estado democrático de direito liberal, da prática política da identidade não um procedimento provisório, tornando-a, perigosamente, um regime de verdade hegemônico, fixo e intransponível. Portanto, e apesar de seus muitos ganhos, é inegável que as políticas identitárias se tornaram o problema mais importante dos movimentos sociais. Logo, a identidade passou a ser algo que vela nossa verdade e, ao mesmo tempo, sob a qual desvendamos nossa realidade: nós, mulheres; nós, gays; nós, lésbicas; nós, trans. É um movimento paradoxal: a identidade nos diz nossa verdade e nós, somente nós, dizemos a verdade sobre nossa identidade. Não escutamos uma das mais contundentes advertências de Foucault: não nos apaixonemos pelo poder.

No sentido de exemplificar, lembro a análise de Richard Miskolci (2011) sobre a conferência de Miguel Vale de Almeida, um expoente das militâncias LGBTs em Portugal, no Seminário Internacional Fazendo Gênero, ocorrido em 2010 na cidade de Florianópolis, BR. Nela, Almeida defendeu uma diferenciação entre a reflexão crítica (pós-identitária e acadêmica) e a ação política (identitária e militância): “sua fala terminou por apresentar o caminho liberal-identitário como inevitável, reduzindo a crítica a um papel futuro de transformação cultural mais profundo” (MISKOLCI, 2011, p. 49). Ora, e se existe mesmo essa polarização, como o lugar de fala dá conta, enquanto categoria teórico-política, de um corpo que não se enquadra na lógica binária do pensamento dialético? Como pensar em uma educação na e pela diferença diante de uma demanda identitária, aparentemente, inelutável dos movimentos sociais?

No sentido de sugerir alguns caminhos possíveis, irei analisar algumas cenas partilhadas por amigos em conversas em uma mesa de bar. Ali, naquele ambiente descontraído, a tessitura da amizade se desdobrou em uma troca das alegrias e sofrimentos da vida; mas uma questão sempre me chamava atenção: a recordação das vivências escolares, mais fortemente narradas por amigos que são gays afeminados. Metodologicamente falando, as memórias que trago aqui foram retomadas em um segundo momento através de entrevistas narrativas com alguns amigos: “por meio da entrevista narrativa, é possível reconstruir as significações que os sujeitos atribuem ao seu processo de escolarização, pois falam de si, reinventando o passado, ressignificando o presente e o vivido para narrar a si mesmos” (ANDRADE, 2012, p. 175, grifos meus).

Se, aqui, falo em reinvenção e ressignificação pela narrativa mnemônica, é porque compreendo, conforme sugere Gustavo Passos (2019), que a entrevista narrativa não diz de uma verdade fundante do sujeito mas, antes, de versões de verdades que constituem nossas subjetividades. Assim, e longe da pretensão de alcançar a verdade do vivido pelos meus amigos, compreendo que a entrevista nos possibilita abrir enunciados das narrativas das memórias escolares que, em algumas camadas, podem sugerir como a linguagem não representa a realidade; mas, antes, lhe dá vida, lhe dá sentido, lhe dá materialidade. Mais centralmente, falo em como as narrativas são, em muitos níveis, sintomáticas dos modos como o gênero opera de forma performativa: “a performatividade deve ser compreendida não como um ato singular ou deliberativo, mas, em vez disso, como prática reiterativa e citacional pela qual o discurso produz os efeitos que nomeia” (BUTLER, 2010, 154). Em outros termos, as narrativas não são percebidas como uma recuperação fato vivido em si, mas como uma sobrevivência, uma reminiscência, dos discursos escolares que se fizeram corpo, gesto e pensamento.

Assim dito, foram entrevistados oito amigos para compor uma rede de memórias que poderiam, talvez, sugerir como a citacionalidade da performatividade é reiterada e recolocada em movimento no ato mesmo de produção de fala, de produção de memória, de produção de narrativa. Contudo, e pensando no limite do presente texto, trouxe à análise excertos de duas entrevistas que, me arriscaria dizer com Foucault (2012, p. 199), causaram-me certa comoção; de modo que as memórias, aqui trazidas, “não seguiram outra regra mais importante do que meu próprio gosto, meu prazer, uma emoção, o riso, a surpresa, um certo assombro ou qualquer outro sentimento, do qual teria dificuldade, talvez, em justificar a intensidade”. Diante das lembranças narradas, de uma “dramaturgia do real”, como diria Foucault (2012, p. 204), objetivo abrir alguns enunciados que nos possibilitem vislumbrar a intensidade da vida de uma criança viada na escola; vidas ínfimas que, como nós, sem grandes feitos, estão “destinadas a passar por baixo de qualquer discurso e a desaparecer sem nunca terem sido faladas”.

Criança viada ou o ínfimo gesto de viver a abjeção

Antes de adentrar as cenas escolares e para dar conta das questões mencionadas anteriormente, é importante falar um pouco mais sobre como essa disjunção entre a militância e a vida sustenta a necessidade política identitária; o que se desdobra, materialmente, nas formas como o Estado brasileiro tem operado - ou, pelo menos, tinha operado até o golpe contra a presidenta Dilma Rousseff (e que, de forma cambaleante, ainda tenta) - uma espécie de governamentalização dos movimentos sociais e, com isso, produzido efeitos problemáticos às políticas públicas implicadas, no caso da educação, com a filosofia da diferença (PARAÍSO, 2018). Assim, e já no sentido de traçar uma análise, recorro, como metodologicamente sugerido por Giancarlo Cornejo (2011), à minha própria experiência de pertencimento e exclusão como homem, gay, cis e pesquisador de questões sobre as possibilidades ético-estéticas de um êthos implicado à crítica de um feminismo pós-identitário (BALTHAZAR, 2018).

Ao longo de uma carreira pesquisando mulheres e feminismos, sempre fui questionado: “por que tu não trabalhas com as viadas? Por que mulheres? Por que feminismos?”. À época, eram questões que eu mesmo não sabia responder; mas que, hoje, com a escrita deste texto, vejo como questões insidiosas. Afinal, sou, poderia dizer, parte da rapa do tacho da terceira onda dos feminismos, marcada pela consolidação e expansão dos estudos feministas. Digo isso, porque fui formado por feministas que deram corpo, voz e cara à terceira onda no Brasil; a exemplo de Ana Paula Martins, Dagmar Meyer, Guacira Lopes Louro e tantas outras professoras de quem fui aluno. Assim, foram essas pesquisadoras que, no Brasil, uniram militância feminista com produção de conhecimento, bem como gestaram, desde os anos 1990, a virada epistêmica daquilo que chamamos de “estudos de mulheres” para uma noção pós-estruturalista do gênero.

No campo educacional, por exemplo, Guacira Lopes Louro (1997, p. 118) demonstrou como um importante ganho da matriz pedagógica feminista estruturalista foi estimular e dar a ver o lugar de fala daquelas que se veem silenciadas por uma estrutura androcêntrica da educação como observatório do social: “sem dúvida essas formulações permitem que se inscrevam as pedagogias feministas na perspectiva das pedagogias emancipatórias, que pretendem a ‘conscientização’, a ‘libertação’ ou a ‘emancipação’ dos sujeitos e da sociedade”. Ademais, e apesar da importância política de tais pedagogias, Guacira Lopes Louro (1997, p. 123) sugeriu, em uma leitura feminista pós-estruturalista, como algumas práticas pedagógicas feministas estruturalistas acabam ratificando uma lógica binária do gênero: “a ação de professoras e estudantes dentro de um modelo marcadamente dualista - e essa lógica dicotômica acaba por marcar tanto a descrição das relações profissionais e das relações interpessoais quanto as estratégias de sua superação”.

Nessa mesma linha, Dagmar Meyer (2003) demonstrou como uma perspectiva feminista pós-estruturalista em educação mobilizaria uma prática pedagógica e curricular que problematiza e desfaz uma compreensão binária do gênero como sinônimo dos matizes de masculino e feminino (nossas identidades de gênero). Assim, e mais centralmente, essas pesquisadoras em educação defenderam, no final dos anos 1990 e início dos anos 2000, a importância de compreender o gênero não como “processos educativos pelas quais os seres humanos se constituem e são constituídos como homens e mulheres”, mas, de forma mais ampla, pontuam “a necessidade de examinar os diferentes modos como o gênero opera estruturando o próprio social” (MEYER, 2003, p. 18). Em outros termos, e pensando na implicação do presente texto à filosofia da diferença, compreender o gênero como organizador do social, como uma matriz de inteligibilidade, permitiu a proposição de uma pedagogia e um currículo:

[...] a favor da “confusão de fronteiras”, todas as fronteiras, especialmente as fronteiras de gênero que, desde muito cedo (ainda no útero), trabalha-se para demarcar. [...]. [Essa pedagogia e currículo trabalham] pela subversão, pela confusão e hibridização de gênero, de sexo, de corpos, de desejos. Mas ao lutar contra as fronteiras de gênero que dividem, separam e hierarquizam, não significa que ele não escute o “falar da fronteira”. [...]. É bom escutar o falar da fronteira quando esse diz as fronteiras são uma zona de contato onde convergem diferenças fluidas, onde o poder circula de formas complexas e multidirecionais, onde a capacidade de ação existe de ambos os lados desse fosso permanentemente mutável e permeável (PARAÍSO, 2016, p. 234-235).

É, pois, dentro dessa perspectiva, que se tornou uma marca decisiva (e, talvez, diria, amplamente partilhada) pelas pesquisadoras do campo dos estudos de gênero e sexualidade no Brasil (RIBEIRO; XAVIER FILHA, 2014), que fui formado como professor-pesquisador. Contudo, e com o reavivamento hoje de uma militância feminista que retoma premissas estruturalistas (e isso já à época do meu doutorado), passei a ver colegas me questionarem, não tão mais polidamente, como e com que direito como homem estudava e falava sobre feminismos? As perguntas se radicalizavam em ofensas (ora veladas, ora nem tanto) e pude ver que colegas, tão comprometidas com as proposições da filosofia da diferença, defendiam em seus discursos, em seus trabalhos, em suas aulas, o caráter transitório, múltiplo, contingente do gênero e da sexualidade; mas, estas mesmas colegas, endureciam o tom ao dizer em uníssono que homens não tinham voz nos feminismos. É um paradoxo que demonstra, justamente, a provisoriedade, a pluralidade e, por que não dizer, a tensão que marca como cada uma de nós ocupa, a um só tempo, posições de sujeito que ora se aproximam, ora divergem. No caso, aqui, como a postura de professora/pesquisadora feminista implicada à filosofia da diferença pode, paradoxalmente, coabitar com uma postura de sujeito militante mais implicada à crítica dos feminismos estruturalistas.

Postura paradoxal que se encontra também no conceito lugar de fala: “absolutamente não tem a ver com a visão essencialista de que somente o negro pode falar de racismo” (RIBEIRO, 2017, p. 66), mas, mesmo negando o essencialismo, reafirma-o em outros termos: “por mais que pessoas pertencentes a grupos privilegiados sejam conscientes e combatam arduamente as opressões, elas não deixarão de ser beneficiadas, estruturalmente falando, pelas opressões que infligem a outros grupos” (RIBEIRO, 2017, p. 70). Paradoxalmente, a desnaturalização do gênero, tão cara ao pensamento feminista desde Simone de Beauvoir e radicalizada por Judith Butler, se fez nas falas de minhas colegas areia que escorre entre os dedos, pois se chocou com os limites da política identitária e, mais centralmente, da ideia tão forte de lugar de fala (BENTO, 2011).

Assim, e por mais que o essencialismo seja negado e que afirmem que todos devem falar sobre opressões, há, aqui presente, uma noção de que sujeitos - dentro de uma tônica estruturalista que universaliza a ideia do que é ser branco, homem e heterossexual - estão localizados no lugar do poder (ou, no limite, o poder como algo que um grupo privilegiado detém), localizando, com efeito, outros sujeitos - os subalternizados, as minorias sociais - em lugares de falas de quem é objeto das opressões desse poder.

Dessa forma, minhas colegas (e o novo vulto que dão aos movimentos sociais, sobretudo sob a égide do conceito de lugar de fala) resvalam no essencialismo identitário que buscam negar, no momento em que, como já há tanto tempo mostrou Judith Butler (2008), operam dentro da lógica binária do pensamento liberal que desejam desconstruir: homens ou mulheres; gays ou heteros, etc. Fazendo da identidade, do lugar de fala do subalterno, uma nova incontestável lei. Mais do que isso, perdem de vista, como nos ensinou Foucault (2012), que o poder não tem origem nem é algo que alguém detém, mas sim um jogo de relações de forças que todos os sujeitos, em maior ou menor grau, exercem. Nesse contexto, ouvindo as memórias de muitos amigos passei a conceber uma resposta às tantas questões que, por tanto tempo, me interpelavam: por que os feminismos me são tão caros e por que o faço deles foco de interesse das minhas pesquisas?

Fui uma subjetividade subalternizada na escola por um viver gay (por mais que não o soubesse), mas o que, sobretudo, marcava meu lugar (ou, melhor, me colocava em um deslugar) era por um estar abjeto; um estar criança viada. Quando falo em subalternizado, certamente, falo de um lugar de fala coerentemente localizado nos jogos de poder (a homossexualidade). Mas, e como tentarei mostrar, a abjeção excede e, por isso, maximiza a ideia mesmo de subalternização: ser um homem que performatiza o feminino - ou, como irei usar no texto, uma feminilidade sem mulher, uma releitura do conceito de masculinidade sem homem de Berenice Bento (2017) - me jogava (e, infelizmente, ainda joga tantas outras subjetividades) nas fronteiras da ideia mesma de lugar de fala; isto é, como homem não partilhei de um lugar de poder ou de privilégios de uma cultura masculina, pois performatizava uma feminilidade sem mulher. Em outros termos, a ideia de uma feminilidade sem mulher é um radical entre-lugar; por isso falo de um deslugar de fala na ordem do discurso de gênero.

Vejamos, para melhor exemplificar, algumas cenas narradas pelos meus amigos, uma vez que, por meio de suas memórias escolares, vividas nos anos 1990, podemos pensar como a identidade acaba por não dar conta da abjeção e, mais do que isso, acaba por ratificar a exclusão dos corpos incompreensível à lógica estrutural do lugar de fala.

A história de Lucas: ao narrar suas vivências escolares em uma escola de freiras em um bairro de classe média da cidade de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, Lucas começa da seguinte maneira:

Aí, guria, tu sabe que desde quando tu pediu, assim, pra falar sobre essas memórias da escola, eu fiquei tipo... [ele pensou para continuar, um certo engasgo na voz e com a voz embargada continuou] eu tive que custar um pouco pra cavocar elas. Talvez, porque eu ressignifiquei já essas memórias. Hoje, elas são indícios do Lucas de hoje; eu lido muito melhor do que eu lidava na época (Lucas).

A dificuldade de falar sobre a vivência escolar é uma constante entre todos os meus amigos entrevistados; mas, paradoxalmente, todos se tornaram professores - pode ser que a dificuldade da vida escolar tenha motivado todos nós a ocuparmos um papel na docência, na tentativa, talvez, de transformar a educação... mas essa é uma outra história. Na sequência, ele imediatamente relembra uma cena vivida quando estava na sexta série (hoje, sétimo ano do ensino fundamental). Diz ele:

Eu era afeminado, né; era criança viada, sempre fui. De desenhar vestido em casa, enfim, tinha voz fina... [e, novamente, a pausa na voz, talvez, como ele próprio disse anteriormente, tentando “cavocar” algo há muito enterrado na memória] não sei quantificar o que sofri. Uma época, e não sei mesurar quanto tempo durou, tinha um guri que, óbvio, batia em mim. Ele me segurava e ninguém fazia nada; afinal, ele tava batendo no viadinho. Tipo, ele batia em mim todo o intervalo ou em vários intervalos, sei lá eu. Eu lembro que falei pra ele que se ele continuasse me batendo meu irmão ia cagar ele a pau, alguma coisa do gênero, né. E, por coincidência, meu irmão foi me buscar e o guri viu, e nunca mais me dirigiu a palavra (Lucas).

Há muitos indícios para explorarmos, mas foquemos em dois: a ideia de “criança viada”; já que, aqui, Lucas faz claramente uma alusão à obra da artista Bia Leite que causou a revolta do Movimento Brasil Livre na exposição Queermuseu de 2017, no Santander Cultural; entendo que seja uma forma de positivar, pela memoração, esse lugar marcado pela abjeção: uma feminilidade sem mulher, ou seja, um gay afeminado. Com a censura da exposição e a midiatização sobretudo da obra de Bia Leite, o termo criança viada passou a compor, no meu círculo de amigos, uma positivação de uma experiência afeminada; ou, como diria a drag queen Lorelay Fox, ser “afeminado, bixa, bixona, bixérrima é revolucionário” (GAYS AFEMINADOS, 2015).

Com efeito, é interessante pensar como assumir a ideia de criança viada pode ser uma reverberação, à brasileira, do processo de afirmação política do termo queer - um “insulto que tem a força de uma invocação sempre repetida, um insulto que ecoa e reitera os gritos de muitos grupos homofóbicos [...]”, mas que “é assumido por uma vertente dos movimentos homossexuais precisamente para caracterizar sua perspectiva de oposição e de contestação. Para esse grupo, queer significa colocar-se contra a normalização - venha ela de onde vier” (LOURO, 2008, p. 38). Dizer-se criança viada é, talvez, afirmar a fronteira, afirmar a dissidência, que caracteriza o deslugar de uma feminilidade sem mulher, como possibilidade de vida. Aqui, então, reside minha escolha de usar, ao longo do texto, o termo criança viada ao invés de gay afeminado, bixa ou transviado.

Porém, e na sequência da ideia de criança viada, a memória vem com o termo “viadinho”: “um guri que óbvio batia em mim, ele me segurava e ninguém fazia nada; afinal, ele tava batendo no viadinho”. Paradoxo, da criança viada afirmada ao viadinho, um diminutivo que marca a força da violência como currículo, como pedagogia, que visa normalizar os corpos dissidentes na escola. Não é novo nos estudos de gênero o caráter pedagógico da violência: “a escola costuma ser, geralmente, um espaço social bastante perverso para as crianças que performatizam em seus corpos dissidências de gênero e sexualidade” (SILVA, 2018, p. 267), de modo que as normas de gênero funcionam de forma coercitiva (e, por extensão, pedagógica) sobre todos os corpos que escapam e destoam das normas (LOURO, 2008). Se, como disse Lucas, ninguém fazia nada, porque ele estava batendo no viadinho, é porque a violência, aqui, é currículo, ela educa, disciplina, corrige. Ela é parte organizadora da escola. Ora, então, o movimento gay dá conta de explicar essa violência sofrida por Lucas? Afinal, os gays partilham de um lugar de fala dentro de uma estrutura da homofobia que sustenta o ato de violência ao viadinho da escola.

Novamente, deparamo-nos com a disjunção entre os termos operados pelos movimentos sociais e a vida; sobretudo, a vida que atravessa, rompe, embaralha as fronteiras binárias da ordem do discurso de gênero e sexual. Explico: a ideia de homofobia é insuficiente, politicamente, para analisar a experiência de Lucas, uma vez que se restringe à violência e à injúria contra homens gays, deixando de fora toda uma gama de vivências de gênero e sexualidade: lésbicas, travestis, transexuais, viados.

Ao invés de transformar a experiência da discriminação em força política de resistência e questionamento da heteronormatividade, parece mais forte, no contexto brasileiro, a manutenção de uma perspectiva que busca conciliar a armadilha identitária da qual o movimento parece não saber sair. Daí a estratégia que subdivide a homofobia nas chamadas transfobia, homofobia, lesbofobia, apelando para a proteção e a tolerância de identidades ao invés de problematizar as normas sexuais e, sobretudo, as de gênero (MISKOLCI, 2011, p. 48).

Nesse sentido, o autor sugere o termo efeminofobia como potente para problematizarmos, em nossas pesquisas, em nossas escolas, como há um ponto comum entre as muitas divisões identitárias: “os traços antigênero feminino e misóginos presentes nessas formas de discriminação” (MISKOLCI, 2011, p. 48). Importa, portanto, lembrar que nem todo gay partilha do mesmo “lugar de fala”, pois ocupam lugares distintos na ordem do discurso de gênero. Portanto, a criança viada, o gay afeminado, a feminilidade sem mulher, não é tão bem recebida nessa falaciosa ideia de comunidade gay: “gays costumam ser tão ou mais efeminofóbicos do que héteros, o que é perceptível pela forma preponderante como dizem ‘não ser’ ou ‘odiar’ efeminados” (MISKOLCI, 2011, p. 49).

Sob esse prisma analítico, e retomando a cena narrada por Lucas, não se tecia, ali, uma violência da ordem da sexualidade, mesmo que ela esteja no pano de fundo da possibilidade da violência como currículo: a heterossexualidade que a escola, enquanto uma instituição disciplinar por excelência, precisa garantir. No cenário central da violência vivida por Lucas, está o gênero. O viadinho não é sinônimo de uma sexualidade homossexual já constituída. Antes, é sinônimo de um corpo com pênis que vive, que se expressa, que existe no feminino. Não é uma biomulher (ou seja, um corpo engendrado e nomeado como mulher desde o nascimento), mas também não é uma mulher trans - subjetividades que buscam, em certo sentido, a coerência identitária de mulher. O corpo de Lucas é algo inconcebível na ordem binárias das coisas: é um corpo masculino que tem trejeitos femininos e não deseja ser mulher; é uma feminilidade sem mulher.

A averiguação é visível em como ele rememora (de forma muito semelhante aos outros entrevistados) que “no ensino fundamental, guria, eu andava com as gurias; então, eu ficava com elas no recreio, ficava fazendo coisas que eram as brincadeiras de gurias. E não ia pro futebol, porque não gostava de nada que os boys gostavam. Eu ficava com elas o tempo todo”. Apesar de marcar o gênero como um terreno fixo (por exemplo, fixar que existia brincadeira de gurias), Lucas habitava o território do feminino: longe de ser algo intransponível, o corpo da criança viada, de um menino que só brinca com coisas de gurias e com gurias, nos dá a ver como as fronteiras de gênero são porosas, como elas são atravessáveis, como ele ocupa um deslugar na ordem do discurso. Assim, e como analisa João Paulo Silva (2018, p. 269), a criança viada bagunça a matriz de gênero que organiza a escola “pois cresce como uma gama no entre, no meio, rompendo com as formas masculino-e-feminino, fazendo o sistema de gênero fugir, vazar como se fura um cano”.

Ali, no chão da sala de aula, o corpo de Lucas excede as normas de gênero, mas também excede às normas identitárias dos movimentos sociais. Se Lucas não é, como prima a ideia de lugar de fala, um homem que detém um lugar de poder/privilégios de uma cultura androcêntrica, mas também não é ou deseja ser uma mulher - este sujeito de lugar de fala sulbalternizado, a partir da qual os feminismos buscam a coerência do seu sujeito político - pergunto: qual, então, é o lugar de fala de uma feminilidade sem mulher? Quem dá conta desse corpo: os feminismos que lutam contra o machismo estrutural ou o movimento gay que luta contra uma homofobia estrutural? Nenhum e, ao mesmo tempo, os dois: “nesse momento, a dialética (binária) do senhor e escravo tem que acertar suas contas com um terceiro termo: o abjeto” (BENTO, 2017, p. 248).

Portanto, a demanda por uma política inclusiva que privilegia a diversidade cultural na escola encontra no corpo abjeto de Lucas, na subjetividade dissidente de Lucas, seu limite. Como demonstra Berenice Bento (2011, p. 102), a demanda por parte dos movimentos sociais de uma agenda unificadora, significa silenciar vozes e excluir subjetividades em nome de uma suposta identidade coletiva, em uma dicotomia enganosa que perde do horizonte como: “as mulheres fazem parte de um campo construído como inferior [...]. Esse lugar é parcialmente ocupado pelas mulheres cromossomas XX. A violência contra os seres abjetos, frágeis, identificados como femininos, não se limita à mulher”. A criança viada embaralha a noção de lugar de fala, pois não se enquadra na lógica opressor/oprimido das análises dialéticas: masculino (homens que partilham de privilégios de uma estrutura masculina) versus feminino (mulheres oprimidas por uma estrutura masculina). Antes, a feminilidade sem mulher performatizada por e materializada no corpo de Lucas é um e outro; é masculino e feminino; é fronteira; é entre-lugar; é, enfim, um não-lugar por excelência.

A história de Eduardo:

Então, falar da minha trajetória, da minha vida escolar, é um episódio que é sempre traumático. E ele traz alguns elementos que eu acabo, ao rememorar, revivendo, de certa forma, alguns pontos de sofrimento. Eu ingressei novo nessa instituição. Então, com seis anos, eu entrei no pré-escola. E eu sempre fui uma criança muito fechada. Eu não gostava de brincar muito com os outros; até porque eu não gostava das brincadeiras tidas como masculinas. Então, nas brincadeiras de criança isso sempre causava um constrangimento, né; desde ficar de fora das brincadeiras até, desde muito cedo, ser taxado de viadinho (Eduardo).

Nas primeiras palavras de Eduardo o sofrimento é, como na fala de Lucas, o primeiro sentimento que emerge sobre a memória escolar. Conforme Giancarlo Cornejo, a injúria é a primeira marca que inscreve uma criança, uma criança viada, dentro do que concebemos como identidade homossexual. Nas palavras do autor, “a injúria viado me interpelou antes de me dar conta de que eu era um [viado]” (CORNEJO, 2011, p. 82). Assim, e como momento inaugural de uma identidade homossexual, é interessante pesar como a rememoração da injúria tem como disparador uma lembrança de brincadeiras ainda na pré-escola (hoje, educação infantil), com crianças de 5 e 6 anos de idade: “o simples ato de brincar com determinados brinquedos ou brincadeiras para crianças viadas, muitas vezes, se configura em atos de denúncia contra elas mesmas” (DIAS et al., 2019).

Aqui, então, algumas perguntas se fazem necessárias: o que aquelas crianças de 5 e 6 anos sabem sobre sexualidade? O que sabem elas sobre homossexualidade? Se trago aqui estas questões, é como elas nos dirigem à seguinte proposição: a homofobia não é, aqui, uma questão, mas, antes, o machismo, que encontra nela vazão. O que isso quer dizer? As crianças, em sua primeira infância, não sabem o que é viado ou homossexual, mas sabem que isso é ruim, que pode ofender, que pode machucar. Portanto, ser taxado de viadinho, ser alijado de poder brincar na pré-escola, não é uma marca de uma identidade sexual já definida, já compreendida, já formada, mas, antes, uma forma de nomear uma diferença incompreensível para aquelas crianças: um corpo infantil masculino que habita a fronteira do gênero, pois um corpo marcado por uma feminilidade sem mulher.

Como currículo normalizador, as coerções de gênero não são exercidas somente nas violências entre colegas, mas também naquelas impetradas, de forma insidiosa, pelos professores (PARAÍSO, 2018). E isso é uma marca na memória de Eduardo: “os meus trejeitos [femininos] causavam um desconforto nos colegas e nos professores. Eu tinha um professora que ficava me corrigindo por colocar o cabelo para trás da orelha, ela dizia que eu não podia fazer isso porque era coisa de menina”. A interdição no discurso da professora se inscreve, como no das crianças, na impossibilidade de um corpo destinado a ser homem habitar o terreno do feminino. E é essa interdição à performatividade feminina, da incoerência de um corpo masculino viver o feminino, que borra a ideia mesmo de que tais corpos possam ter uma identidade homossexual coerente e, portanto, um lugar de fala claramente partilhado por outras subjetividades homossexuais.

Estamos, portanto, diante da radicalidade de como o machismo é organizador das violências escolares; mais, efetivamente, de uma violência efeminofóbica: “‘Não seja mulherzinha! Se comporte como homem’ são as primeiras verdades que irão organizar as subjetividades, fazendo com que o feminino já nasça maculado pela misoginia conferindo-lhe anterioridade à homofobia” (BENTO, 2011, p. 102). Em outros termos, o perigo a ser corrigido ou a ser disciplinado é, antes de tudo, uma feminilidade sem mulher, este corpo que habita um gênero que não lhe cabe. Dimensão, essa, que se agrava na própria relação subjetiva que Eduardo construiu com a violência que sofria:

Eu tinha um agravante, eu era uma criança gordinha; eu era a gorda viada. [...]. Eu comecei nesse processo de escolarização a apanhar muito [a voz embarga com choro], eu sempre apanhava; e eu chegava em casa sempre com muito hematomas, nos braços, enfim, tenho foto que mostra muito isso. Mas a minha família entendia que isso deveria ser culpa minha e que como bom macho deveria me defender. Só que esse processo foi se intensificando e se tornando muito forte na medida em que eu chegava próximo à adolescência. [...] eu conheci um menino que, assim como eu, tinha trejeitos e era magro. Eu projetava muito ser como aquele menino, porque para mim ser taxado de viado era um problema e ser taxado de gordo também. E eu comecei a pensar [o choro emerge forte] “viado eu não vou deixar de ser, mas gordo eu posso, né”. E aí, perto dos 11/12 anos eu comecei em um processo de parar de comer gradativamente; no início minha família não reparou, né. [...] até que eu comecei a cortar algumas refeições e, em um processo de seis meses, eu perdi aproximadamente 20 kg. Então, com mais ou menos 12 anos eu fui diagnosticado com depressão, bulimia e anorexia; e dentro desse processo eu comecei a ter crises suicidas, né. Esse processo durou cerca de um ano, e ele culminou em algumas feridas que não são só emocionais, eu tenho no braço marcas dessas tentativas de suicídio. Eu acabei internado em uma ala psiquiátrica, uma ala infantil. Meu pai ficou comigo nesses 21 dias. Na época eu tinha 12 anos e hoje tenho 26, então, fazem 14 anos. Há 14 anos atrás a anorexia era muito discutida entre as meninas, entre as mulheres, a quem essa doença deveria atingir. E o psiquiatra chamou meu pai para conversar e disse que eu tinha vários sintomas de homossexualidade e a anorexia era um desses sintomas e que eu, em algum momento, iria me assumir gay (Eduardo).

Essa é uma narrativa que nos atinge como um soco no estomago. Se o sofrimento aparece como primeira luz da lembrança, é porque a escola é um espaço de sofrimento a todas as formas de dissidência de gênero e sexualidade. Porém, e apesar das muitas possibilidades de análise dessa fala, gostaria de levantar a seguinte proposição: o psiquiatra determina que a homossexualidade é um resultado patológico inelutável. Mas o diagnóstico, a patologização do sofrimento, a patologização da violência, só toma forma no ato dissonante do deslugar do corpo de um menino de 12 anos que possui doenças que não cabem, que não pertencem, ao seu sexo: a bulimia e a anorexia.

Da violência escolar à patologização psicológica, a feminilidade sem mulher não ocupa um lugar na lógica identitária do pensamento psiquiátrico de 14 anos atrás - ou mesmo hoje, como bem demostra Berenice Bento (2017) sobre a ideia da transexualidade ser caracterizada como uma disforia de gênero no DSM 5. Nesta lógica da patologização, o diagnóstico emerge por meio da ordem da lógica binária estrutural, em que esferas opostas dão forma a lugares específicos de ser sujeito na cultura. Afinal, “como identificar uma criança com ‘disforia de gênero’? Por definições culturais do que é adequado a cada sexo. Não há exame clínico para encontrar a ‘disforia de gênero’” (BENTO, 2017, p. 43). Assim, o determinante para um corpo ser violentado no espaço escolar e ser diagnosticado como patológico por um psiquiatra é, claramente, seu não lugar na ordem das coisas: sua abjeção - um corpo masculino performatizando o feminino.

Dessa forma - e aqui reside o argumento mais central do texto -, nem todo corpo, nem toda forma de viver o gênero, pode ser explicada ou pode ser incluída na lógica binária que estrutura as resistências que se voltam, quase que singularmente, quase que unicamente, às políticas identitárias como único caminho possível. Se, como tenho tentado argumentar, a dissidência é o limite do lugar de fala e das políticas identitárias, é porque a ideia mesmo de estrutura de gênero e sexualidade se sustenta como “algo objetivo, que antecede ao sujeito”, perdendo de vista como a estrutura é o estado terminal de microrrelações de força que se tecem “nas interações cotidianas, nas práticas estruturadas e estruturantes de sujeitos que atualizam e alteram as regras e recursos das estruturas de gênero e sexuais em seus cotidianos” (BENTO, 2011, p. 86).

Se, como coloquei no início do texto, os homens não têm voz, não tem lugar em algumas correntes dos feminismos, é porque tomamos, muitas vezes, feminismos como sinônimo de um movimento de biomulheres para biomulheres; é um feminismo uterino (BALTHAZAR; MARCELLO, 2018; BENTO, 2011; BUTLER, 2008). Com efeito, e se a biologia é ponto inelutável de explicação, de coalizão de luta, então, e apesar dos seus muitos ganhos (do mercado de trabalho, do mundo da política, dos direitos reprodutivos das mulheres), os feminismos falharam em um de seus objetivos mais centrais: a radical luta contra os binarismos e pela desnaturalização das identidades. Afinal, e se o movimento é uterino, a grande máxima de Simone de Beauvoir (2000) de que “não se nasce mulher, mas torna-se” cai por terra em um movimento que, paradoxalmente, faz da biologia, da ficção da identidade, um novo e inelutável destino.

Considerações finais

Para finalizar, gostaria de dizer que, hoje, tenho uma resposta às minhas colegas: trabalho com os feminismos porque foi por meio da teoria feminista, com minhas professoras feministas, que passei a compreender que as dores que sofri - como, conforme analisei, muitos dos meus amigos também sofreram - não têm um lugar definido na ordem binária do jogo da identidade; mas são fruto do nosso atrevimento (e, por que não dizer, da nossa coragem, da nossa insistência) em habitar o deslugar de gênero na escola. As crianças viadas, os gays afeminados, as bixas ou as transviadas não têm um lugar de fala, pois não partilhamos somente as dores de outros homossexuais (muitos gays, com passibilidade heterossexual, não sofrem com machismo) e não partilhamos somente as dores das mulheres (de um lado, há terrenos da violência de gênero que nunca conheceremos; de outro, há o terreno onde a violência de gênero encontra a homofobia que as mulheres cis heterossexuais nunca conhecerão).

Não estou dizendo que é preciso mensurar quem sofre mais ou menos violência. De modo algum. Antes, e distante da lógica identitária ou de um lugar de fala partilhado coerentemente, é preciso olhar onde nossas dores se encontram, onde elas nos aproximam em nossas diferenças radicais. É como aquele momento no recreio em que nós, crianças viadas, escolhemos andar e brincar com as gurias. Longe da ideia de sororidade, porque não somos mulheres e sim homens cis, é um ato outro de resistência, um ato revolucionário, de recusa de uma identidade que nos foi destinada (não partilhamos das benéficies de uma sociedade androcêntrica ou mesmo plenamente do terreno da feminilidade), mas caminhamos, cambaleantes, no limiar do gênero, no deslugar do gênero, e fazemos do feminino o nosso modo de existência. E, ali, junto com a gurias no recreio, damos forma a um feminismo pós-identitário, um feminismo que gostaria de qualificar, a partir da fala de Clarice Lispector sobre o ato da escrita, da seguinte forma: o feminismo pós-identitário, um feminismo que não prima por um lugar de fala destinado a um sujeito político coerente, é um feminismo que “não é de ninguém. E essa liberdade de ninguém é muito perigosa. É como o infinito que tem cor de ar”. O que, então, aprendemos com as crianças viadas brincando com as gurias? Aprendemos a possibilidade de construirmos juntos, em nossas diferenças, em nossas dores em comum, um feminismo infinito, um feminismo cor de ar.

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Recebido: 05 de Julho de 2020; Aceito: 16 de Setembro de 2020

Translated by Stefane Colman. E-mail: stefanecolman@gmail.com and Juliana Fleig. E-mail: julifleig@yahoo.com.br - Translation review by Hailey Kass. E-mail: hailey.kaas@gmail.com

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