SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.37Educação Clandestina: a proposição de um conceitoO estado de angústia manifestado por professores em uma formação continuada: uma análise à luz de Soren Kierkegaard índice de autoresíndice de materiabúsqueda de artículos
Home Pagelista alfabética de revistas  

Servicios Personalizados

Revista

Articulo

Compartir


Educar em Revista

versión impresa ISSN 0104-4060versión On-line ISSN 1984-0411

Educ. Rev. vol.37  Curitiba  2021  Epub 26-Oct-2021

https://doi.org/10.1590/0104-4060.76051 

Artigos

Jovens negras no Ensino Médio público e privado: leituras interseccionais sobre suas vivências e percepções do racismo

Female black students in public and private High Schools: intersectional readings about their experiences and perceptions of racism

*Universidade de Brasília. Faculdade de Educação. Programa de Pós-Graduação em Educação. Brasília, Distrito Federal, Brasil. E-mail: ellencintra.teacher@gmail.com -E-mail: wivian@unb.br


RESUMO

Com base em uma análise comparada e interseccional dos discursos de jovens negras no Ensino Médio em uma escola pública e uma escola particular no Distrito Federal, o presente artigo analisa como o racismo e a discriminação se articulam na construção das relações sociais dentro e fora da escola. A pesquisa empírica contou com a realização de grupos de discussão e a abordagem interseccional foi usada como ferramenta teórica e analítica para compreender como os eixos raça, gênero e classe moldaram as experiências de racismo e discriminação dentro e fora da escola. Concluímos que a discriminação e o racismo afetam negativamente jovens negras de classes sociais diferentes, bem como suas relações sociais. Acreditamos que a educação e a escola têm papel representativo, tanto no sentido da omissão, permitindo a reprodução destes processos, como da tomada de posição, quando aciona mecanismos para a punição e reeducação de indivíduos que mantêm atitudes ou discursos racistas e/ou quando fomenta práticas que visam o antirracismo. Ressaltamos o potencial transformador da educação e das ferramentas educativas que corroborem as práticas antirracistas no contexto escolar.

Palavras-chave: Jovens negras; Ensino Médio; Relações étnico-raciais; Interseccionalidade; Grupos de discussão

ABSTRACT

Based on a comparative and intersectional analysis of discourses of High School black females in a public school and a private school in the Federal District, this article analyses how racism and discrimination are articulated in the construction of social relations within and outside school. The empirical research relied on group discussions, and the intersectionality perspective was used as a theoretical and analytical tool to understand how the axes of race, gender, and class shaped the experiences of racism and discrimination inside and outside school. We concluded that discrimination and racism negatively affect young black females from different social classes as well as their social relations. We believe that education and school play a crucial role, both in the sense of omission, allowing the reproduction of these processes, and regarding position-taking, when it triggers mechanisms for punishment and the re-education of individuals who maintain racist attitudes or discourses and/or when it fosters practices aimed at anti-racism. Furthermore, we highlight the transforming potential of education and educational tools to substantiate anti-racist practices in the school context.

Keywords: Black youth; High School; Ethnic-racial Relations; Intersectionality; Group discussion

Introdução: olhares sobre a experiência negra brasileira

Considerado o país mais negro fora da África, o Brasil, pluriétnico, atualmente é composto por 56,10% de sua população de pessoas negras3, conforme aponta a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) Contínua do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística - IBGE (2019). Mesmo que pretos e pardos componham a maioria da população, não são contemplados equitativamente em aspectos que garantam seus direitos essenciais e condições plenas de vida, como na distribuição e geração de renda, acesso a segurança, saúde, educação, moradia ocupação de postos de trabalho, entre outros.

Quando se observam as diferenças entre a situação educacional de negros e brancos preocupa como a juventude negra segue em considerável atraso educacional, reflexo, entre outros, de um sistema educacional e social que funciona em ciclos de desvantagens cumulativas que se constroem intergeracionalmente, destacando-se, o preconceito racial dentro das escolas, a centralidade de currículos colonizados e acríticos e a outrificação desses sujeitos (KILOMBA, 2019). Tais construções resultam do silenciamento da história e da cultura negra, da anulação da estética negra, do preconceito, dos estereótipos negativos, da discriminação e das políticas de branqueamento, o que também repercute nas amarras curriculares, no conteúdo dos livros didáticos e nos itinerários de formação de professores, entre outros. Essas questões perfazem os caminhos da escolarização básica e acabam por retirar e manter as/os jovens negras/os fora da escola nas várias etapas da escolarização básica e na educação superior. Isso em diversas situações compromete a permanência na escola, que segue baseada em um modelo dominante de indivíduo, de conhecimento e de cultura (ABRAMOWICZ; GOMES, 2010; HOOKS, 2013).

O presente artigo oferece uma compreensão dos processos de discriminação a partir da perspectiva de jovens negras, reconhecendo que sua posicionalidade nos entrecruzamentos dos eixos de opressão de gênero, raça, classe (COLLINS, 2019) e idade lhes possibilita um olhar marginal (COLLINS, 2019) por romper com a supremacia branca cis-heteronormativa patriarcal e capitalista que estrutura e organiza o mundo, gerando reflexões significativas sobre como as relações sociais em contextos diversos afetam a população negra.

As conquistas advindas da atuação do Movimento Negro e o avanço nas políticas e práticas educacionais, fortemente mobilizados a partir da sanção das Leis nº 10.639/03 (BRASIL, 2003) e Lei nº 11.645/2008 (BRASIL, 2008), que alteram a Lei nº 9.394/96 (BRASIL, 1996) - Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) -, obrigando o ensino de História e Cultura afro-brasileira e indígena na educação básica, foram essenciais para o reconhecimento dessa posicionalidade. A produção acadêmica acerca das e para as relações étnico-raciais na educação brasileira apontam significativo avanço, tanto na quantidade de investigações produzidas nas últimas duas décadas, quanto nas áreas do conhecimento e temáticas abordadas. Destaca-se os trabalhos de Gomes e Jesus (2013), Wilma Coelho e Mauro Coelho (2013), Carvalho (2018), Muller (2018), Silva (2018) que empreendem esforço analítico sobre os trabalhos nessa temática nos últimos vinte anos. Ressalta-se, no entanto, a escassez de trabalhos sobre a juventude negra, a exemplo das pesquisas de Gomes e Laborne (2018)e Jesus (2018), e de investigações que analisem as questões que interseccionam as categorias de gênero e raça, entre outros mecanismos de exclusão, como nos trabalhos de Silva (2005), Eugênio e Souza (2017), Lopes (2018), Martins (2018) e Souza (2018). Fazem-se necessários novos estudos que ofereçam um panorama da realidade social contemporânea, dos processos de exclusão e de acesso a direitos, bem como da compreensão das relações étnico-raciais sob perspectivas que evidenciam como as intersecções de gênero, raça, classe e juventude possibilitam uma ampliação dos olhares sobre as relações étnico-raciais no país.

Neste sentido, este artigo visa contribuir com as discussões relativas aos estudos sobre relações raciais, gênero, educação antirracista e juventude no Brasil. A análise das relações sociais a partir da perspectiva daquelas que estão efetivamente na base da pirâmide social, como as jovens negras, permite olhar de forma ampliada para como as diversas experiências sociais são imbricadas nestas relações (COLLINS, 2019). O entrecruzamento dos eixos de opressão de raça, gênero, classe e gerações na experiência de jovens negras acaba por posicionar esse grupo como outsiders internas (outsiders within). Como explica Collins (2019), essa posição marginal peculiar das mulheres negras, construída em um contexto global de relações desiguais e excludentes, “originou uma perspectiva específica das mulheres negras em uma série de temas” (COLLINS, 2019, p. 46), produzindo diferentes olhares sobre a opressão e dinâmicas de poder que as mantêm em uma posição de exterioridade nas relações sociais. Observar as relações a partir desse lugar social permite, entre outros, pensar soluções que beneficiem a todas e todos. Em outras palavras, análises das experiências de jovens negras no Ensino Médio de diferentes classes sociais ou a partir dessa posição podem auxiliar na compreensão de como os longos séculos de expropriação colonial, escravização, racialização, ausência de políticas reparativas e um projeto de branqueamento estruturam e determinam as atuais demandas heterogêneas, históricas, políticas e culturais da população negra brasileira. Tais processos resultam em diversas dinâmicas de epistemicídio, apagamento e extermínio da população negra, também materializados na educação brasileira.

Para tanto, primeiramente o artigo discute como uma abordagem interseccional contribui para a compreensão do tema. Adiante, apresentam-se o contexto da pesquisa e os principais apontamentos dos grupos investigados. Por fim, são apontadas as principais reflexões oriundas da análise comparativa dos grupos de discussão.

Abordagem interseccional - gênero, raça e classe

A teoria da interseccionalidade vem de uma longa tradição antirracista dentro do feminismo negro e oferece uma forma ampla e fidedigna de se compreender as desigualdades sociais vivenciadas por mulheres negras. Partindo do reconhecimento de que é necessário considerar simultaneamente as categorias raça, gênero e classe para analisar as singularidades das mulheres negras, uma vez que, se comungam gênero e, em alguns casos, classe com as mulheres brancas, sentem as diferenciações de cor da pele. E se compartilham com os homens negros a raça e a classe, mesmo assim diferenciam-se pelo gênero. Dessa forma, a experiência de mulheres negras nunca pode ser considerada apenas como de “mulheres”, ou apenas como de “negras”, ou apenas como “pobres”: é preciso considerá-la em sua inteireza.

Como explica Crenshaw (1989) é necessário um olhar multidimensional, uma vez que análises atravessadas apenas por um dos eixos - raça ou gênero - distorce a experiência deste grupo. Para a autora,

[...] Haja vista a experiência interseccional ser maior que a soma do racismo e do sexismo, qualquer análise que não leve em conta a interseccionalidade não consegue tratar suficientemente a forma particular como as mulheres negras são singularizadas (CRENSHAW, 1989, p.140, tradução nossa).

Nesta mesma direção, Collins e Bilge (2016) defendem que as leituras devem considerar as categorias como ambas/e, visão que abarca, por exemplo, a possibilidade de se considerar que a experiência de uma mulher negra é, ao mesmo tempo, de gênero e de raça, sem hierarquizar ou tornar o status dessas categorias estático em diferentes contextos.

Observando as estruturas em que as relações sociais estão contidas, Collins e Bilge (2016) explicam que o paradigma interseccional, enquanto uma forma de compreender e analisar a complexidade do mundo, reforça que a opressão não pode ser reduzida a um único tipo, haja vista ela não ter sido construída apenas sob um viés. Assim, diferentes formas de opressão trabalham juntas, resultando na injustiça. Neste sentido, a autora diferencia a interseccionalidade do cenário da produção de desigualdade, nomeado como “matriz de dominação” e que se refere à forma como essas opressões interseccionadas são organizadas por domínios de poder.

Collins e Bilge (2016) entendem que, dentro de uma matriz de dominação, as relações de poder se referem às vidas das pessoas e a como elas se relacionam umas com as outras, percebendo-se que nestas interações sociais há indivíduos em vantagem ou desvantagem. Elas entendem também que a interseccionalidade pode ser usada como ferramenta analítica, contribuindo tanto para a pesquisa acadêmica quanto para resolução de problemas que as próprias pessoas ou as pessoas ao seu redor enfrentam. Essa lente de análise gira em torno de seis ideias centrais - desigualdade, relacionalidade, poder, contexto social, complexidade e justiça social -, que aparecem e reaparecem na estruturação das análises elaboradas. Dessa forma, “usar a interseccionalidade como lente analítica destaca a natureza múltipla das identidades individuais e como combinações variadas das categorias de classe, gênero, raça, sexualidade e cidadania posicionam cada indivíduo” (COLLINS; BILGE, 2016, p. 8, tradução nossa) nos eixos da divisão social. É um olhar que considera como esses eixos se influenciam e definem as experiências de vida de cada indivíduo.

Conforme discutem as autoras, seu uso como ferramenta analítica faz-se útil primeiro por mostrar como a desigualdade econômica não recai igualmente sobre todos, já que alguns grupos sociais são muito mais vulneráveis a mudanças na economia global enquanto outros são desproporcionalmente beneficiados por estas mesmas mudanças. Isto leva a pensar sobre como as discrepâncias de riqueza e de desigualdade são simultaneamente racializadas e estruturadas sobre gênero para as mulheres de cor, por exemplo. Em segundo, a interseccionalidade como ferramenta analítica demonstra a fragilidade de explicações sobre a desigualdade econômica global exclusivamente baseadas em leituras de classe, uma vez que o capital é interseccional e sempre se estrutura sobre os corpos que executam o trabalho. Por fim, a interseccionalidade como ferramenta analítica reforça o significado das instituições sociais no desenho e resolução de problemas sociais (COLLINS; BILGE, 2016).

A partir desses apontamentos, entende-se que uma perspectiva que parta apenas de um eixo de opressão encobre a experiência das mulheres negras. Demonstram-se, assim, incompletas e, por vezes, falaciosas leituras que isolem as narrativas de mulheres negras apenas a partir de sua experiência de gênero ou então simplesmente de uma percepção racial ou ainda de um olhar que parta isoladamente de sua experiência de classe (COLLINS, 1989; COLLINS; BILGE, 2016). Em outras palavras, uma perspectiva interseccional considera que há uma complexa operação das relações de poder que singularizam as experiências de alguns indivíduos dentro da estrutura social e os relega a mais de uma forma de opressão, que se apresentam imbricadamente.

Análise dos grupos de discussão com jovens negras no Ensino Médio

Considerando que “as articulações entre temáticas como juventude, raça e gênero são difíceis de construir e por vezes são pouco desenvolvidas” (WELLER, 2017, p. 132, tradução nossa), optamos pela construção de um estudo comparado que analisou as perspectivas e experiências pessoais de jovens negras do Ensino Médio público e privado. A escolha pela comparação das narrativas de jovens negras de ambientes educacionais diferentes buscou constituir um olhar contrastivo de realidades distintas, incluindo leituras das relações raciais de jovens em diferentes intersecções das relações de raça, classe social, gênero e espaço, entre outros.

No contexto da pesquisa realizada (CINTRA, 2018), uma vez delimitado o tema, foram estabelecidas as etapas e os procedimentos metodológicos para pesquisa, que incluíram a opção por grupos de discussão (GDs), realizados segundo os pressupostos do Método Documentário (WELLER, 2006, 2019). A coleta de dados, seleção e contato com as escolas no ano de 2017 incluiu mapeamento das Regiões Administrativas (RAs) com maior população autodeclarada negra, levantamento das escolas de Ensino Médio dessas RAs, contato telefônico e visitas às escolas, observações de campo, elaboração de diário de campo e a construção de relações de reciprocidade e confiança entre a pesquisadora e os grupos, o que foi facilitado pela presença e mediação de outros professores na escola e gestores no contato com as/os estudantes. Após essa fase, agendamos os GDs com as jovens participantes.

Para a realização dos GDs, elaboramos um tópico-guia com 9 (nove) blocos temáticos e que traziam uma pergunta inicial e outras questões secundárias. As perguntas e discussões permitiram conhecer sobre as experiências das jovens em diversos âmbitos de suas relações sociais (escola, família, comunidade, educação, cidade etc) bem como reconhecer temáticas emergentes, como a relação com os cabelos e estratégias de resistência, entre outros. Após os GDs, fizemos as transcrições, identificamos as temáticas recorrentes, agrupamos as informações em eixos temáticos, selecionamos e nomeamos trechos das discussões conforme o tema emergente - a que chamamos passagens - e codificamos essas passagens visando à reconstrução e interpretação das informações. Após esta etapa, selecionamos nos diferentes GDs temáticas e passagens que permitiram compreender, a partir de análise comparativa e interseccional, como jovens negras de classes sociais diferentes vivenciavam de forma semelhante o racismo e a discriminação, dentro e fora da escola.

A transcrição e decodificação dos grupos foi realizada com base no Método Documentário (BOHNSACK, 2020; WELLER, 2019), observando, assim, os momentos de pausas, as risadas, as palavras pronunciadas de forma enfática ou em voz alta, entre outras marcas discursivas. Portanto, a codificação utilizada ao longo da apresentação dos grupos não segue as normas ortográficas, mas os códigos desenvolvidos no âmbito do Método Documentário, que apresenta semelhanças com os códigos utilizados na Análise da Conversação4. A equivalência dos trechos selecionados com as passagens aqui analisadas está apontada no decorrer deste artigo conforme originalmente nomeadas no trabalho de Cintra (2018). Para este artigo, selecionamos passagens referentes a experiências e percepções das jovens sobre racismo e discriminação dentro e fora da escola.

Foram realizados cinco GDs com jovens entre 15 e 18 anos no Ensino Médio público e privado. Dentre esses, selecionamos dois grupos compostos apenas por jovens adolescentes negras para a transcrição detalhada e análise comparativa das informações: um GD da escola pública localizada na região administrativa de Santa Maria (EPSM), nomeado Voos mais altos, e o GD da escola particular localizada no Plano Piloto (EPaPP), nomeado Todo mundo junto, ambas escolas localizadas no Distrito Federal.

O grupo Voos Mais Altos (escola pública), contou com a participação de duas estudantes do 3º ano do Ensino Médio, Angelou e Badu5, de 17 e 18 anos, respectivamente. Para analisarmos as experiências de discriminação nesta escola destacamos, primeiramente, algumas das narrativas sobre práticas racistas contra as/os estudantes negras/os, comuns também em outras situações cotidianas narradas pelas jovens, como na passagem Discriminação pela cor e racismo na escola analisada a seguir.

Y: Vocês já viveram; alguma coisa de discriminação; vocês falaram que já né

Af:

Y: e assim (.) vocês lembram dessa como é que foi que aconteceu -cês le:mbram de alguma coisa que aconteceu com vocês ou com outros ( ) o quê que foi que aconteceu como é: que aconteceu (1) ◦se puderem falar

Bf: Eu fo:i quando eu -tava estudando ali no ( ) e:u foi assim foi recente quando eu tinha chegado (não conhecia nada) aí eu fui conver- fui falar com a mulher (2) eh: saber informações sobre: eu não lembro muito bem o quê ela olhou pra mim (.) meia com cara de nojo, eh: pela: eu aí eu peguei não sei o que eu fui fazer no terminar da conversa fui tentar pegar na mão fui pegar na mão dela (1) alguma coisa assim relacionada aí ela não pegou só olhou pra mim assi:m (1) ela era de óculos olhou; pra mim; assim tipopor aqui assim: e: virou as costas pra mim então pra mim eu levei isso como (1) ou pela minha cor (2) porque: pra mim foi discrimi- discriminação (1) pela minha cor

Y: hum

Bf: porque tipo assim se fosse outra pessoa da cor dela ela era branca de olhos (.) de olhos azuis cabelo bom (3) e foi isso. levei isso como racismo

Y: uhum

Bf: ◦pela minha cor

Af: Acontece, né frequentemente, às vezes a pessoa não ver, que ela -tá praticando (1) só pelo fato dela olhar pra pessoa e falar o neguinho ali (2) igual tem o menino na nossa sala não vou citar o nome né mas tem um menino na nossa sala que ele é (1) bem mesmo bem, moreno mesmo negro mesmo (2) muitas pessoas (fazem racismo) com ele inclusive pessoas que são assim colegas nosso (2) en- pelo fato, dele ter vindo do Maranhão também (2) o povo além de chamar ele de neguinho fala neguinho da macumba então eu fico muito encabulada com isso

Bf: É

A partir da pergunta sobre experiências de racismo, as jovens descrevem situações de interação na escola interpretadas por elas como discriminação racial, assim percebidas a partir dos olhares, gestos e palavras das pessoas com quem interagiram. As narrativas revelam que o ambiente escolar ainda é constituído por situações de construção e reprodução de práticas racistas observadas em diferentes espaços sociais, pautadas nas noções de raça como construção social e no racismo à brasileira, revelando que o racismo no Brasil opera a partir dos mitos que relacionam as noções naturalizadas de superioridade e inferioridade que, complicados pelo mito da democracia racial, acabam por inferiorizar determinados grupos (negros) em detrimento de outros (brancos) (MUNANGA, 2010).

Tanto na narrativa de Badu quanto na de Angelou, percebe-se que a atitude racista vem calcada em categorizações positivas ou negativas dos indivíduos a partir de características físicas hereditárias comuns, nesse caso, a cor, associadas a estereótipos e juízos de valor de características psicológicas, morais, intelectuais e estéticas, construídos e veiculados sobre a população negra (MUNANGA, 2010), entre outros grupos historicamente vulnerabilizados ou racializados nas relações sociais. Em outras palavras, o racismo associa diretamente características intelectuais, psicológicas e morais de um dado grupo a suas características físicas ou biológicas. Nas narrativas, percebe-se que é a partir do primeiro contato com os jovens - no caso, com a leitura visual feita delas - que as atitudes, seja por falas ou ações, vão materializar a racialização de seus corpos negros e promover um registro sobre a estrutura em que esses processos se encaixam. Assim, a partir de uma leitura visual dispara-se a ofensa racista.

Na primeira narrativa, Badu conta que “no terminar da conversa fui tentar pegar na mão fui pegar na mão dela” e a funcionária não pega na mão da jovem de volta. O contexto revela que a interação acontece em uma situação corriqueira em que a etiqueta social é quebrada por uma pessoa adulta a despeito do esforço da jovem em ser agradável, oferecendo sua mão para agradecê-la. A mulher percebe o que estava acontecendo, já que ela olha para a jovem, mas ela opta por deixar um vácuo de atitude antes de virar as costas e sair. A partir dessa situação, Badu entende ser “discriminação (1) pela minha cor”, haja vista não haver nada mais na cena que pudesse ter causado o repugno demonstrado em relação à estudante ou sua recusa em apertar-lhe a mão. No conjunto de expectativas, a imagem oposta à vivida emerge quando a jovem afirma que “se fosse outra pessoa da cor dela ela era branca de olhos (.) de olhos azuis cabelo bom” a pessoa teria agido de forma diferente e pegado na mão da jovem ao final do atendimento. Destaca-se que a mulher ocupa um lugar de poder em relação à jovem: por sua brancura, por ter olhos azuis e “cabelo bom” bem como por conhecer informações que a jovem não tinha e que lhe eram necessárias. Nessa situação, percebem-se nuances do racismo institucional manifestadas na ação que transcende o âmbito individual e revela a dimensão do poder como elemento que constitui as relações raciais e o aparato institucional (SILVA, 2019). Para além do constrangimento destacado pela jovem, percebe-se que a imposição de regras ou mesmo o padrão racista de tratamento está vinculado à ordem social que estrutura as relações entre os indivíduos.

Na narrativa seguinte, Angelou elucida como o racismo se manifesta tanto entre pessoas desconhecidas quanto entre pares. A primeira dimensão aponta que as atitudes racistas não são práticas isoladas ou eventuais - elas acontecem “frequentemente, às vezes a pessoa não vê, que ela -tá praticando”, mas elas acontecem “só pelo fato dela olhar pra pessoa e falar o neguinho ali”. Uma segunda dimensão demonstra que a prática racista nem sempre é lida como tal. A fala de Angelou explicita como opera o racismo estrutural por evidenciar que as noções naturalizadas das hierarquias sociais permeiam a estrutura da sociedade e, consequentemente as instituições e os indivíduos, denotando relações de subalternidade e visões pretensiosamente harmônicas entre os diferentes grupos raciais. Enquanto um sistema de vantagens e desvantagens sistemáticas baseadas na raça e que beneficia pessoas brancas às custas das pessoas negras, combinando diferentes mensagens culturais, práticas e políticas institucionais, crenças e ações individuais, o racismo permeia toda a sociedade (TATUM, 1997) nas interações mais ou menos formais, em diferentes espaços, como na escola.

Nesse sentido, não obstante os visíveis desdobramentos em processos de subjugação, silenciamento, estereotipação e iniquidade, a forma única como as relações raciais no Brasil se efetivam transmitem uma mensagem de que o racismo está representado apenas por atitudes que inflijam violência física ou verbal, constrangimento e/ou prejuízo à vítima quando, para além disso, compõe dimensões mais dificilmente identificadas, como nas nuances do racismo institucional e de atitudes racistas interpretadas superficialmente como bullying ou brincadeiras.

Dessa forma, o olhar “meia com cara de nojo”, o não pegar na mão, os apelidos relacionados à cor e termos generalizadamente usados, como “neguinha”, não são entendidos como atitudes racistas ou sequer associados a uma estrutura de racialização dos indivíduos. Angelou entende que o indivíduo que tem uma atitude racista pode até não perceber que está sendo racista (ou escolher não questionar a origem e resultado das atitudes que toma, nem seus privilégios), mas a fala da estudante revela que isso não impede a percepção do preconceito por parte do indivíduo discriminado, uma vez que a própria jovem consegue perceber tanto a pretensa cegueira do opressor quanto a discriminação sofrida por Badu, por ela mesma e pelos colegas negros na escola.

Para além dos muros da escola, o racismo estrutural afeta continuamente pessoas negras. Na intenção de compreender como essas situações são percebidas pelas jovens, a pesquisadora convida as estudantes a refletirem sobre experiências de racismo e discriminação em uma esfera nacional. Essa passagem foi denominada por nós de Racismo e relações sociais no Brasil6:

Y: Como vocês veem essa questão do racismo; assim no país; no Brasil como é que é

Af: É inentendível e inaceitável porque: o Brasil que é o país mais miscigenado que existe (.) pelo o que dizem né (1) e é=aonde mais ocorre o preconceito okei que o preconceito, vem das diferenças, mas a gente tem que saber respeitar, a diferença, dos outros (1) por que no fundo ninguém é igual (1) pode ser todos brancos mas ninguém vai ser igual ao outro (.) vai ter uma diferença (1) então a gente tem que saber respeitar (1) eu não aceito eu não tolero (.) de fato. eu não tolero mesmo. a pessoa por mim ela pode ser ladrão ela pode=ser=o=que= for mas racista eu não tolero , porque (1) a gente tem que respeitar o outro (2) assim, tem coisas no outro (.) tipo em questão de características não física que realmente não dá para tolerar ; (1) mas (.) questão de característica física a gente tem que tolerar porque ninguém é igual, (2) tem que aceitar (5)

TD: @(1)@

Y: E quando a gente pensa em Brasí:lia (1) tem alguma coisa que faz Brasília (1) ser por experiência (.) particular assim experiência mais específica em relação ao racismo eu não sei como é que é (.) como é que é -cês veem tipo no geral; ; no Brasil; e em Brasília (.) em nível particular, vocês veem alguma coisa específica em Brasília (.) em termos de racismo

Af: Aqui em Brasília mesmo eu acho (1) que não que é menos entendeu (2) porque assim aqui vem gente de todo o lugar vem para cá. então tem de tudo aqui (1) só que também, não quer dizer que não tem isso também acontece (1) aqui eu creio que em Brasília mesmo a discriminação é mais por questão é por questão social (.) do que racial (1) porque Brasília mesmo se a gente for pegar Brasília mesmo quem mora em Brasília tem condição (1) a gente aqui da periferia pra morar em Brasília (1) só se for por questão (.) eh: por exemplo mesmo empregada doméstica que mora; em casa de patrão; (2) então (.) eu vejo assim mais a questã:o social do que racial

Y: uhum

Bf: mas voltando aqui sobre o que você falou sobre: racismo coisas=que=a=gente=viveu (1) eu acabei de lembrar de=uma: de=uma: cena de (.) umas coisas também que eu vivi (.) que eu morava aqui (.) aqui do lado (1) eu tinha uma vizinha; do lado ela não gostava, de falar comigo pela minha cor (.) aí outra outro dia a: vizinha de baixo falou (.) quando ela chamou de neguinha; e se a neguinha tivesse, aqui ela iria pega:r as coisas lá no: (1) lá no mercado (.) pra mim aí outro dia eu -tava lá no mercado ela pediu neguinha (leva aqui pra mim) (3)

Af: Eu também não gosto disso

Bf: Eu não gostei (1) tudo bem (.) tem pessoas que me chamam, nega, (.) nossa isso aí eu gosto (1) eu gosto

Af: É um apelido carinhoso

Bf: └ )

Af:└ mas pessoas que começam, neguinha

Bf: já é bem (1) (sem graça)

Y: Parece que ( )

Bf:└ ( )

Af: └@É@ isso é verdade

Após a pergunta sobre como as jovens veem o racismo no Brasil, Angelou afirma que o racismo no Brasil “é inintendível e inaceitável porque: o Brasil que é o país mais miscigenado que existe... e é aonde mais ocorre o preconceito”. Interpretada pela jovem de maneira paradoxal, a lógica de que enquanto país miscigenado o Brasil não deveria ser racista é representativa da falácia da democracia racial. O neologismo que a jovem inventa revela: a) uma incompreensão dos motivos que mantêm uma situação racial conflituosa (num país onde a mistura entre os povos eliminou a suposta pureza de raças) e b) a incoerência que é o país com mais grupos raciais misturados, conforme entende a jovem, ainda manter uma relação de hierarquia entre tais grupos. A afirmação de Angelou denota que a miscigenação não implica uma harmonia nas relações raciais. Dessa forma, é “inaceitável” que o racismo se perpetue não só em um espaço tão racialmente diverso, mas enquanto sistema de poder em qualquer lugar do mundo.

A posição de Angelou é firme em relação ao trato dos racistas: “eu não aceito eu não tolero”, pois para a jovem a pessoa “pode ser ladrão ela pode=ser=o=que= for mas racista eu não tolero, porque (1) a gente tem que respeitar o outro”. Ela entende que as pessoas não são iguais em relação às características não físicas, como temperamento e caráter, por exemplo. No entanto, em relação à “característica física a gente tem que tolerar porque ninguém é igual, (2) tem que aceitar (5)”, o que revela tanto uma compreensão de igualdade entre os indivíduos por sua condição humana quanto a percepção de que o racismo opera a partir da racialização fenotípica. Embasada pelas concepções de respeito e tolerância, Angelou coloca o racismo acima outras formas de violência que vilipendiem os cidadãos de toda sorte.

Depois de Angelou falar um pouco sobre a percepção de que, em Brasília, a discriminação estaria mais ligada às diferenças entre classes sociais, Badu narra um outro episódio de racismo, em que “eu tinha uma vizinha; do lado ela não gostava, de falar comigo pela minha cor”. Interessa como as jovens refletem sobre as ações da vizinha como racista se pautando ambos na linguagem empregada para reduzir (“neguinha”), por exemplo, a partir do uso do diminutivo, e na execução de favores braçais. A diferenciação da racialização é evidenciada quando as jovens contrapõem o uso de palavras associadas como “negra” e “nega”, sendo este último percebido como “um apelido carinhoso”. Em conjunto com o uso de um vocábulo que contrapõe superioridade e inferioridade está a atitude da vizinha, que verbaliza não somente para outras pessoas que “se a neguinha tivesse, aqui ela iria pega:r as coisas lá no: (1) lá no mercado (.) pra mim”, mas também para a jovem quando “outro dia eu -tava lá no mercado ela pediu neguinha (leva aqui pra mim) (3)” materializando a assunção de que a jovem cumpriria as tarefas para ela. Durante a realização do GD, observou-se a indignação das jovens com a atitude da vizinha e atitudes semelhantes enquanto narravam as cenas, aspecto evidenciado pelo destaque em negrito na passagem.

No grupo Todo mundo junto, realizado em uma escola particular no Plano Piloto (EPaPP), contamos com cinco estudantes do Ensino Médio: Clementina, Dandara, Jill, Lélia e Nwanda7, de 17, 15, 16, 16 e 17 anos, respectivamente.

O segmento abaixo traz algumas das reflexões acerca das experiências de discriminação na escola e que foram relatadas pelas jovens durante o GD (passagem Cabelo e racialização8:

Y:Eu vou fazer uma pergunta mais direta sobre racismo (1) e: pra a gente poder né assim começando. a. fechar. porque já são três e cinquenta e dois já (2) eh: ultimamente a gente tem discutido assim muito a questão do preconceito tanto que vocês falaram ah daí veio uma onda de vamos aceitar os cabelos cacheados entre outras coisas né que =tem=muito=por=aí eh:: vocês já tiveram ou sofreram alguma situação de discriminação

Df: Não

Lf: └ Não

Y: └diretamente com vocês

Lf: └ Não=não

Nf: └ Não

Y:└ por questões raciais

Jf:

Y:

Jf: @(.)@

TD: @(1)@

Y: └ Você se importaria de falar (sobre isso)

Df: └ Eu nunca

Jf: Não importo não (1) eh:: mas foi be:m assim bem rápido, e minha mãe sempre falou se mexer com você vai na diretora imediatamente (.) não espera nem cinco minutos //uhum// e foi, o que eu fiz eu -tava com meu amigo eh: a gente -tava sentado na (.) do lado da sala da =diretora e um ami- (.) um menino mesmo da minha antiga escola (.) antiga bem antiga bem antes ((estalar de dedos)) @(.)@ meio que assim eh passou e aí urubu torrado (1) e aí eu peguei na mesma hora entrei na sala da minha diretora e meu amigo ficou como prova porque ele viu ? //uhum// e: no final de tudo o menino foi suspenso @(.)@ ele ficou com muita raiva? e eu falei mano (1) @ninguém mandou@ //uhum// você poderia ter ficado calado (.) se poderia ter ficado com esse preconceito na sua cabeça mas ninguém mandou (.) eu era pequena ainda eu tinha u : ns doze anos (.) é. (.) eu era pequena (.) então eh: tipo assim na mesma hora eu peguei e agi e fui na diretora (1) eh: então minha mãe (.) minha mãe já sofreu muito bullying né (.) que igual ela fala antigamente não se falava, disso então ela sofria muito bullying (1) então, ela tinha esse medo com a gente (.) de a gente sofrer e a gente ficar preocupado com isso então tipo ela sempre. falava. aconteceu °vai imediatamente na diretora° (1) imediatamente

Questionadas pela entrevistadora sobre já terem sofrido alguma situação de discriminação, Jill responde afirmativamente e conta sobre o episódio em que foi agredida verbalmente com uma expressão racista por um jovem em uma outra escola particular onde estudou anteriormente.

Jill abre a cena já com a afirmação de que sua mãe “tinha esse medo com a gente, de a gente sofrer e a gente ficar preocupado com isso”, demonstrando a preocupação com o bem estar dos filhos. Esse medo pode ser compreendido no contexto do GD tanto na esfera do sofrimento psicológico quanto do sofrimento físico e vem embasado nas experiências e expectativas vivenciadas pelos pais.

A narrativa demonstra a preocupação em relatar o ocorrido imediatamente, atitude que a garota toma exatamente como demandado pela mãe, pois “foi, o que eu fiz”. A repetição do vocábulo “imediatamente” no trecho reforça a importância de não deixar a atitude de reportar a violência para depois e “na mesma hora entrei na sala da minha diretora”, como orientado pela mãe. Em um primeiro plano está a necessidade de se tratar o ocorrido “imediatamente não espera nem 5 minutos”, que reflete que tanto a possibilidade de constatação do ocorrido, solução do problema ou punição têm maiores probabilidades de acontecerem quanto antes seja reportada a agressão. A jovem ainda reforça que seu amigo “ficou de prova, porque ele viu”, enfatizando que sua história ainda poderia ser confirmada por um terceiro, revelando também uma dimensão de justiça, direito e proteção, que circundam as relações de agressão.

Entre as sutilezas da situação narrada é possível novamente desdobrar como algumas expressões e vocabulário se constroem como agressões. A ofensa racista embutida na expressão “urubu torrado” tanto demonstra a tentativa do garoto de associar Jill a um animal tipicamente visto de forma inferior quanto enfatizar o tom mais escuro de sua pele com a palavra “torrado”. A expressão demonstra uma tentativa de relocar Jill a um lugar inferiorizado associado à população negra e onde, por consequência, Jill deveria estar também.

Finalmente, quando a jovem verbaliza que o garoto “poderia ter ficado calado, cê poderia ter ficado com esse preconceito na sua cabeça” a lógica do silêncio e da não verbalização da ofensa ilustra compreensões sobre tolerância e justiça. Em outras palavras, a jovem diz que o garoto não precisa gostar dela, de sua cor ou de qualquer outra coisa sobre ela, mas que ele não tem o direito de a ofender e sair impune disso, pois “no final de tudo o menino foi suspenso, ele ficou com muita raiva”. Essa reflexão revela como a não ofensa, advinda do direito de ser, não necessariamente dialoga com a compreensão de quem é o outro, já compreendendo que a noção de “outro” reflete que as pessoas não se veem como iguais. A frase da jovem revela como a lógica da democracia racial dita a noção de tolerância e não nivela a noção de respeito com a noção de conhecer o outro e, assim, respeitá-lo por sua essência.

Em outro trecho, motivadas pela pergunta da entrevistadora, as jovens trazem algumas discussões acerca de suas percepções e experiências de discriminação racial em relações fora do ambiente escolar e Jill conta novamente para o grupo uma de suas experiências na passagem O uniforme não me protegeu9:

Jf: Eu já sofri ao contrário, eu com o uniforme do EPaPP (.) no metrô (.) e o=meus=ami- eu e o meu amigo desceu e aí a gente foi brincar com a nossa amiga falei vamo deixá ela pa trás e vamo=dá uma=corridinha (.) e aí tinha um cara na nossa frente, e aí o cara saiu correndo (.) : depois ele parou, e olhou pra nossa=cara e falou, (.) eu achei que vocês iam me assaltar e a gente -tava com o uniforme do EPaPP (.)

Y: uhum

Jf: e aí a gente ficô tipo, (2) que que cê -tá fazendo, cara e aí a gente pegô, esperô a nossa ami:ga, e depois a gente se=seguiu o caminho; isso com o uniforme sabe , o povo fala=que ah só=ali quando olha a gente de uniforme de escola pública já fica assim, mas isso aconteceu, com escola, com uma pessoa com: um= um uniforme de escola particular //uhum// entendeu, que é bem vista; então até nisso a soc- é as pessoas já encrencam assim, olhou a cor já : já tão olhando de outro jeito, não tão nem aí mais importando com o uniforme e essas coisas sabe , (2)

Y: └uhum (2) o uniforme, não te protegeu,

Jf: É não me protegeu, (1) o uniforme não me protegeu

?f └@(.)@

Jf: o uniforme não me protegeu

A entrevistadora interpela as jovens acerca de situações em que entendam terem sido discriminadas. O momento da brincadeira entre Jill e seu amigo exemplifica como opera a interseccionalidade de raça, gênero e classe na experiência coletiva de jovens negras de classe média e alta e o papel distinto de símbolos sociais, como um uniforme. A despeito de estarem usando um uniforme de uma escola de prestígio, a justificativa dada (“eu achei que vocês iam me assaltar”) é sintomática da epidermização do racismo (FANON, 2008).

O relato apresentado faz sobressaltar algumas reflexões sobre a narrativa: 1) determinadas atitudes são diretamente associadas a determinadas intenções, como o ato de correr sem que houvesse um motivo aparente para isso; 2) o uniforme de uma escola pública e de uma escola particular é lido de formas valorativamente diferentes e 3) o marcador simbólico de uma classe social elevada, no caso, o uniforme de uma escola de prestígio, não muda a valoração negativa socialmente naturalizada contra a jovem negra.

O tom confuso e contestador da voz da jovem ao afirmar que “o povo fala que ah só ali quando olha a gente de uniforme de escola pública já fica assim” e enfatizar que “a gente tava com o uniforme do Colégio EPaPP” revela que há uma valoração diferenciada dos grupos sociais que pode ser relacionada aos uniformes das escolas que frequentam. Ela elucida que jovens de escola pública são vistos de forma desconfiada, pois quem está ao redor “já fica assim”, o que explica a reação do homem no metrô. No entanto, o tom adversativo nas afirmações da jovem, por estarem com o uniforme da escola particular, e a frase “mas isso aconteceu com escola com uma pessoa com um uniforme de escola particular” revela que, no âmbito das relações sociais, tal desconfiança ou desconforto não acompanha pessoas que usam uniformes de uma escola particular de prestígio, uma escola “que é bem-vista”, mas é uma desconfiança naturalizada em relação a pessoas de escola pública. Em outras palavras, percebe-se uma imagem positiva de jovens brancos, de classes econômicas mais altas - população que mais veste tais uniformes - em contraponto a uma leitura negativa feita acerca de jovens de escola pública, normalmente de extratos sociais menos favorecidos e majoritariamente negras/os.

Assim, o uso da expressão “o uniforme não me protegeu”, ratificada pela jovem após ter sido inserida pela entrevistadora, ilustra como a classe social não protege da racialização, revelando dimensões mais profundas da experiência interseccional de jovens negras. Mesmo que pertençam a classes sociais elevadas e usem símbolos, como um uniforme, que as vinculem a um estrato social não marginalizado, a partir do momento em que “olhou a cor já tão olhando de outro jeito” e então diferentes dispositivos serão operacionalizados simultaneamente resultando na opressão uma vez que “não tão nem aí mais importando com o uniforme e essas coisas, sabe”.

Considerações finais: um olhar interseccional das vivências e percepções do racismo

Quando se é negro, é evidente que não se pode ser outra coisa, só excepcionalmente não se será o pobre (...) não será humilhado, porque a questão central é a humilhação cotidiana. Ninguém escapa, não importa que fique rico. E daí o medo, que também tenho, de circular. Acredito que tenham medo (...). Todos têm. Milton Santos (1998).

Essa é a primeira e maior das conclusões deste trabalho: a história de subjugação e de violência extrema sofrida pelo negro no Brasil é uma história cíclica, que se repete, se reinventa, e extermina cada dia mais o povo preto, com toques rebuscados de crueldade direcionados às mulheres negras. E nada disso parece fora de ordem. Nada.

As construções ímpares resultantes das interações entre eixos como raça, gênero e classe social, que se unem para atenuar ou intensificar as percepções individuais dentro de um eixo mais amplo de discriminação, elucidam sobre dinâmicas de opressão que operam na sociedade. Em todas as situações analisadas neste trabalho fica demarcada a presença das/dos jovens negros como aquelas/es que se tornaram ambos a/o “outro” - aquelas/aqueles compreendidos como diferentes em relação aos quais as pessoas brancas são medidas - e a “Outridade” - que representa “a personificação de aspectos repressores do “eu” do sujeito branco”, ou seja, “a representação mental daquilo com que o sujeito branco não quer se parecer” (KILOMBA, 2019, p. 38).

A reconstrução e análise das narrativas revelou que a escola segue silenciadora e reprodutora das estruturas de exclusão a que pertence. Além disso, em ambos os contextos analisados, nesses e em outros trechos dos GDs, foram relatadas pelas estudantes poucas ações que evidenciem o combate ao racismo e às diferentes formas de discriminação nas situações cotidianas, dentro ou fora de sala, informando que não há um ambiente que acolha a fala e as percepções dos jovens como um todo. Pairaram dimensões contraditoriamente acolhedoras e silenciadoras alimentadas por escarças práticas que coadunavam uma educação e ambiente antirracistas. Ambas as escolas reproduzem uma lógica do “poderia ter ficado calado” e da cordialidade presente na inerte e falaciosa democracia racial, que reforçam a naturalização do racismo e a vulnerabilidade de mulheres negras nas esferas sociais.

Emerge da comparação das experiências de discriminação e percepções do racismo que a experiência e relações sociais entre negros e não-negros não são harmônicas. As narrativas destacadas revelam que as situações de racismo sofridas pelas jovens e seus colegas negros seguem atuais e recorrentes e não são invisibilizadas pela condição socioeconômica. O poder aparece como chave na construção das relações entre os diferentes personagens que aparecem nas histórias narradas - seja no olhar com “nojo” antes de se ignorar, seja no apelido racista, seja na leitura do corpo negro coberto por um uniforme de prestígio que não protege - como ações que materializam o racismo estrutural. Todas essas referências racistas, mais ou menos sutis, revelam como os domínios do poder se articulam na construção da humilhação, do silenciamento, do apagamento e da geografia dos corpos, cuja subalternidade e inferioridade foi inscrita em sua cor. Interessa que a observação e vivências dessas cenas por jovens negras fala sobre os estereótipos e intersecções que lhes regulam a imagem e também sobre a posição silenciada, subalterna ou violenta a que foram relegadas na hierarquia social e nas relações descritas nas histórias. Convidamos a uma reflexão comparativa considerando experiências de diferentes grupos sociais e perguntamos como poderiam ter sido as narrativas ou a posição de agressor ou vítima, caso os eixos combinados na identidade dos sujeitos fossem diferentes: se fossem jovens brancas ou brancos, pobres ou ricos, com ou sem uniforme, dentro ou fora da escola, ou, ainda, jovens negros? Que tratamento teria sido dado ou esperado ou, ainda, que expectativas sociais circundariam a identidade desses sujeitos?

Entendemos que este trabalho pode contribuir com uma leitura crítica da realidade por dar voz a “informantes nativos” (HOOKS, 2013, p. 62) como Angelou, Badu, Clementina, Dandara, Jill, Lélia e Nwanda, marcadas tanto por sua conexão geracional quanto por sua experiência interseccional. Ao narrar suas experiências como educadora, Hooks (2013) reflete sobre como todos os participantes do processo educativo experimentam novos “modos de conhecer” e “hábitos de ser”, trazidos por esta integração da teoria com a práxis e afirma que “praticamos não só o questionamento das ideias como também o dos hábitos de ser. Por meio desse processo, construímos uma comunidade” (HOOKS, 2013, p. 61).

A escola é o lugar que entendemos ser ideal para o diálogo com as propostas trazidas pelas leis nº 10.639/2003 (BRASIL, 2003) e a lei nº 11.645/2008 (BRASIL, 2008): ela pode e deve propiciar espaços para o desenvolvimento de uma comunidade crítica, empática e equânime em que, entre outros, a prática docente, o currículo e as políticas educacionais contribuam para o potencial transformador das/dos estudantes enquanto outsiders within no processo educativo, reverberando em ações positivas para além dos muros da escola. Este lugar pressupõe uma abertura dos contextos educativos para a conversa e reflexão sobre seus lugares e a compreensão de sua centralidade na renovação dos conhecimentos e das relações como ora se apresentam.

REFERÊNCIAS

ABRAMOWICZ, Anete; GOMES, Nilma Lino (org.) Educação e raça: perspectivas políticas, pedagógicas e estéticas. Belo Horizonte: Autêntica, 2010. [ Links ]

BOHNSACK, Ralf. Pesquisa social reconstrutiva: introdução aos métodos qualitativos. Petrópolis: Vozes, 2020. [ Links ]

BRASIL. Presidência da República. Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Brasília, DF: Presidência da República, 20 dez. 1996. Disponível em:Disponível em:http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9394.htm . Acesso em 18 jun. 2021. [ Links ]

BRASIL. Presidência da República. Lei no10.639, de 9 de janeiro de 2003. Altera a Lei no9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a obrigatoriedade da temática "História e Cultura Afro-Brasileira", e dá outras providências. Brasília, DF: Presidência da República , 9 jan. 2003. Disponível em: Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2003/l10.639.htm . Acesso em:18 jun. 2021. [ Links ]

BRASIL. Presidência da República. Lei nº 11.645, de 10 março de 2008. Altera a Lei nº9.394, de 20 de dezembro de 1996, modificada pela Lei no10.639, de 9 de janeiro de 2003, que estabelece as diretrizes e bases da educação nacional, para incluir no currículo oficial da rede de ensino a obrigatoriedade da temática “História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena”. Brasília, DF: Presidência da República , 10 mar. 2008. Disponível em: Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2007-2010/2008/lei/l11645.htm . Acesso em: 18 jun. 2021. [ Links ]

CARVALHO, Marcelo Pagliosa. História da Educação da população negra: O estado da arte sobre educação das relações étnico-raciais (2003-2014). Educar em Revista, Curitiba, v. 34, n. 69, p. 211-230, maio/jun. 2018. Disponível em:https://www.scielo.br/j/er/a/PSKSnRyjwfyTxmbYnHyJLXd/?lang=pt&format=pdf. Acesso em: 03 set. 2021. [ Links ]

CINTRA, Éllen Daiane. Jovens negras no ensino médio público e privado no DF: um estudo comparado e interseccional sobre suas vivências e percepções do racismo. 2018. Dissertação (Mestrado em Educação) — Universidade de Brasília, Brasília, 2018. [ Links ]

COELHO, Wilma Nazaré Baía; COELHO, Mauro Cezar. Os conteúdos étnico-raciais na educação brasileira: práticas em curso. Educar em Revista, Curitiba, v. 29, n. 47, p. 67-84, jan./mar.2013. [ Links ]

COLLINS, Patricia Hill. Pensamento feminista negro. Tradução de Jamille P. Dias. São Paulo: Boitempo, 2019. [ Links ]

COLLINS, Patricia Hill; BILGE, Sirma. Intersectionality. Cambridge, UK; Maden, MA: Polity Press, 2016. [ Links ]

CRENSHAW, Kimberle. Demarginalizing the Intersection of Race and Sex: A Black Feminist Critique of Antidiscrimination Doctrine, Feminist Theory and Antiracist Politics. University of Chicago Legal Forum, issue 1, Article 8, p. 139-167, 1989. [ Links ]

EUGÊNIO, Benedito; SOUZA, Thiana E. S. Estado do conhecimento sobre juventude negra: análise do VI Simpósio Internacional sobre Juventude Brasileira (JUBRA). Educação Por Escrito, Porto Alegre, v. 8, n. 1, p. 49-66, jan.-jun.2017. [ Links ]

FANON, Frantz. Pele negra, máscaras brancas. Salvador: EDUFBA, 2008. [ Links ]

GOMES, Nilma Lino; LABORNE, Ana Amélia de Paula. Pedagogia da crueldade: racismo e extermínio da juventude negra. Educação em Revista, Belo Horizonte, v. 34, e197406, 2018. [ Links ]

GOMES, Nilma Lino; JESUS, Rodrigo Ednilson de. As práticas pedagógicas de trabalho com relações étnico-raciais na escola na perspectiva de Lei 10.639/2003: desafios para a política educacional e indagações para a pesquisa. Educar em Revista, Curitiba, n. 47, p. 19-33, jan./mar.2013. [ Links ]

HOOKS, Bell. Ensinando a transgredir: a educação como prática da liberdade. São Paulo: WMF Martins Fontes, 2013. [ Links ]

IBGE. Desigualdades Sociais por Cor ou Raça no Brasil. Estudos e Pesquisas - Informação Demográfica e Socioeconômica, n. 41, 2019. [ Links ]

JESUS, Rodrigo Ednilson de. Mecanismos eficientes na produção do fracasso escolar de jovens negros: estereótipos, silenciamento e invisibilização. Educação em Revista, Belo Horizonte, v. 34, e167901, 2018. [ Links ]

KILOMBA, Grada. Memórias da plantação: episódios de racismo cotidiano. Rio de Janeiro: Cobogó, 2019. [ Links ]

LOPES, Saskya Miranda. Interseccionalidade de raça e gênero nas escolas brasileiras e os projetos de lei silenciadores. Motricidades, São Carlos, v. 2, n. 2, p. 149-162, maio/ago. 2018. [ Links ]

MARTINS, Ícaro Amorim. “Se eu não sou negra, eu sou o quê?” Da importância de discutirmos discriminação racial, interseccionalidade e empoderamento em sala de aula. 2018. Dissertação (Mestrado em Ensino de História) - Mestrado Profissional em Ensino de História. Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2018. [ Links ]

MULLER, Tânia Mara Pedroso. Livro didático, Educação e Relações Étnico-raciais: o estado da arte. Educar em Revista, Curitiba, v. 34, n. 69, p. 77-98, maio/jun. 2018. Disponível em:Disponível em:https://www.scielo.br/j/er/a/q8Fc6KBmPsnWp6h9kh5mhtG/?lang=pt . Acesso em: 03 set. 2021. [ Links ]

MUNANGA, Kabengele. Teoria Social e Relações Raciais no Brasil Contemporâneo, Cadernos PENESB, Niterói, n. 12, p. 169-203, 2010. [ Links ]

SANTOS, Milton. Entrevista explosiva: Mestre Milton. [Entrevista cedida a] Marina Amaral, Sério Pinto de Almeida, Leo Gilson Ribeiro, Georges Bourdoukan, Roberto Freire, João Noro, Sérgio de Souza. Revista Caros Amigos, São Paulo, n. 17, ago. 1998. Disponível em: https://www.geledes.org.br/entrevista-explosiva-com-milton-santos/. Acesso em: 03 set. 2021. [ Links ]

SILVA, Maria Aparecida. Mulheres negras adolescentes no Ensino Médio: Discriminação e desafio. 2005. Dissertação (Mestrado em Sociologia) - Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Faculdade de Ciências e Letras da Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho, Araraquara, 2005. [ Links ]

SILVA, Petronilha Beatriz Gonçalves e. Educação das Relações Étnico-Raciais nas instituições escolares. Educar em Revista, Curitiba, v. 34, n. 69, p. 123-150, maio/jun. 2018. Disponível em: Disponível em: https://www.scielo.br/j/er/a/xggQmhckhC9mPwSYPJWFbND/?format=pdf&lang=pt . Acesso em: 03 set. 2021. [ Links ]

SOUSA, Mariana Alves de. Jovens negras e a sala de aula: caminhos para promover o reconhecimento da negritude feminina por meio do ensino de sociologia. 2018. Dissertação (Mestrado em Sociologia) - Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, Marília, 2018. [ Links ]

TATUM, Beverly Daniel. "Why are all the black kids sitting together in the cafeteria?" and other conversations about race. New York: Basic Books, 1997. [ Links ]

WELLER, Wivian. Grupos de discussão na pesquisa com adolescentes e jovens: aportes teórico-metodológicos e análise de uma experiência com o método. Educação e Pesquisa. São Paulo, v. 32, n. 2, p. 241-260, maio/ago. 2006. [ Links ]

WELLER, Wivian. Investigaciones sobre juventud en Brasil: género y diversidad. Ciudadanías, Buenos Aires, n.1, p. 119- 138, 2017. [ Links ]

WELLER, Wivian. Group Discussion and Documentary Method in EducationResearch. Oxford Research Encyclopedia of Education. Oxford, p. 1-23, 2019. DOI: 10.1093/acrefore/9780190264093.013.358. Disponível em: Disponível em: https://oxfordre.com/education/view/10.1093/acrefore/9780190264093.001.0001/acrefore 9780190264093-e-358. Acesso em: 29 abr. 2020. [ Links ]

3Conforme a autoclassificação proposta pelo IBGE, as cinco alternativas de denominação são branca, preta, parda, indígena e amarela. A denominação “negras/os” refere-se ao subgrupo composto pelo somatório das pessoas que se autodeclaram pretas e pardas.

4A nomeação das passagens/temas dos grupos de discussão e os códigos de transcrição adotados, seguem nomenclatura dada por Cintra (2018). Principais códigos utilizados: (.) pausa curta; (2) pausa e tempo de duração; └ falas iniciadas antes da conclusão da fala de outro jovem; (ponto e vírgula = leve diminuição do tom da voz); (ponto = forte diminuição do tom da voz); (vírgula = leve aumento do tom da voz); ? (interrogação = forte aumento do tom da voz); ex em- (submissão de parte da palavra); assim=assim (pronúncia de forma emendada); exemplo ou exemplo (pronúncia de forma enfática); exemplo ou EXEMPLO (pronúncia em tom de voz elevado); exemplo (pronúncia em voz baixa); (exemplo) = palavra ou frase entre parêntesis que não foram totalmente compreendidas); @exemplo@ (pronúncia entre risos).

5As abreviações Af e Bf foram utilizadas para nos referirmos às jovens participantes deste GD. Os apelidos utilizados são nomes fictícios, atribuídos pela pesquisadora, em referência a Maya Angelou e Erykah Badu.

6Ver também Cintra (2018).

7As abreviações Cf, Df, Jf e Lf serão utilizadas para nos referirmos às jovens participantes deste GD. Os apelidos utilizados são nomes fictícios, atribuídos pela pesquisadora, em referência e homenagem a Clementina de Jesus, Dandara, Jill Scott e Lélia Gonzalez, mulheres negras brasileiras e americanas que se destacam na história, na luta antirracista e em suas áreas de atuação. O apelido Nwanda foi atribuído a si mesma pela própria jovem.

8Ver também Cintra (2018).

9Ver também, Cintra (2018).

Recebido: 25 de Agosto de 2020; Aceito: 21 de Junho de 2021

Creative Commons License Este é um artigo publicado em acesso aberto sob uma licença Creative Commons