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Educar em Revista

versão impressa ISSN 0104-4060versão On-line ISSN 1984-0411

Educ. Rev. vol.38  Curitiba  2022  Epub 19-Mar-2022

https://doi.org/10.1590/0104-4060.78237 

Artigos

Implementação de uma política educacional no contexto da pandemia de Covid-19: o REANP em Minas Gerais

The implementation of an educational policy in the context of the Covid-19 pandemic: REANP in Minas Gerais

Carla da Conceição de Lima* 
http://orcid.org/0000-0003-0929-5450

Maria Elizabete Neves Ramos* 
http://orcid.org/0000-0002-8210-4449

André Luiz Regis de Oliveira** 
http://orcid.org/0000-0002-9651-8060

*Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil. E-mail: climapuc@gmail.com; mbete.ramos@gmail.com

**Colégio de Aplicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil. E-mail: andre.regis.oliveira@gmail.com


RESUMO

O presente estudo analisa a implementação do ensino remoto no estado de Minas Gerais, no contexto da pandemia Covid-19, a partir de uma política pública educacional em caráter emergencial - o Regime Especial de Atividades Não Presenciais (REANP). O conceito de arranjo institucional de implementação é utilizado como referencial teórico e metodológico na análise dessa política educacional. A abordagem metodológica é qualitativa e constitui-se de análise documental, por meio da análise de conteúdo com base na legislação e manuais do REANP, complementada por uma exploração de dados quantitativos provenientes da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua). Os resultados evidenciam uma dificuldade na implementação da política pública REANP em função da significativa desigualdade digital no tocante ao acesso à internet, ao canal de TV aberta e à posse de equipamentos, recursos essenciais para implementação do REANP, que podem acentuar as desigualdades educacionais na rede pública estadual de Minas Gerais.

Palavras-chave: Implementação; Arranjo institucional; REANP; Ensino remoto; Covid-19

ABSTRACT

This study analyzes the implementation of remote education in the state of Minas Gerais in the context of the Covid-19 pandemic, based on an emergency public educational policy - the Regime Especial de Atividades Não Presenciais [Special Regime for Non-Attendance Activities] (REANP). The concept of institutional implementation arrangement is used as a theoretical-methodological framework in the analysis of educational policy. The methodological approach is qualitative and consists of document analysis, through content analysis, based on legislation and REANP manuals. It is also complemented by an exploration of quantitative data from the Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua [Continuous National Household Sample Survey] (Continuous PNAD). The results show a difficulty in implementing the REANP public policy due to the significant digital inequality with regard to access to the internet, open TV channel and ownership of equipment, which are essential resources for the implementation of REANP and can accentuate educational inequalities in public schools of the state of Minas Gerais.

Keywords: Implementation; Institutional Arrangement; REANP; Remote Teaching; Covid-19

Introdução

No início de março de 2020, a Organização Mundial de Saúde (OMS) elevou o estado de contaminação à pandemia de Covid-19, doença causada pelo novo coronavírus (Sars-Cov-2), não em função da gravidade da doença, mas por seu potencial de disseminação e contágio. Diante do grande risco de transmissibilidade, a maior parte dos países adotou formas distintas de isolamento social, que envolveram: suspensão da circulação de pessoas, suspensão das atividades não essenciais, lockdown e o fechamento das escolas. Esse contexto impôs a necessidade de as redes escolares implementarem programas de caráter emergencial, que reorganizaram o trabalho escolar estabelecendo a continuidade do processo educativo e da carga horária letiva, visando garantir a aprendizagem dos estudantes de forma não presencial (BRASIL, 2020).

O Conselho Nacional de Educação estabeleceu, especificamente no parecer nº 05/2020, que as atividades poderiam ser desenvolvidas por meio digital, empregando as tecnologias digitais de informação e comunicação (TDIC), como plataformas on-line que disponibilizam conteúdos, videoaulas e/ou correios eletrônicos. Permitiu também o uso de redes sociais, programas de televisão ou rádio, e material didático digital ou impresso distribuído aos alunos e aos pais/responsáveis (BRASIL, 2020) como possibilidades de aprendizagem, mas cada rede/sistema de ensino se organizou de acordo com suas especificidades. Esses recursos estão sendo utilizados para implementar o ensino remoto nas redes de educação como estratégias de mediação nas formas síncrona e assíncrona do processo de ensino-aprendizagem e para suprir a impossibilidade de os alunos e professores frequentarem a escola presencialmente.

O ensino remoto, mesmo não sendo definido pela legislação educacional como uma modalidade de ensino para a educação básica, popularizou-se por indicar as ações pedagógicas implementadas em tempos de pandemia de Covid-19 - em caráter temporário e emergencial para minimizar os efeitos da suspensão das aulas presenciais através do uso das TDIC como a solução para a educação no período pandêmico. No entanto, algumas pesquisas (SANTOS, 2014; MACEDO, 2021) têm apontado que o ensino remoto produz, no processo de ensino-aprendizagem, significativa redução do currículo, da interação e diálogo entre professores e alunos, o enaltecimento do consumo de conteúdo e da mera realização de atividades, além da reprodução de metodologias tradicionais contestadas mesmo antes da pandemia. Desconsidera-se, assim, a diversidade de realidades educacionais, sociais, econômicas, tornando o ensino remoto distante do cotidiano das escolas e dos alunos ao consagrar, conforme já apontado na literatura (FERREIRA et al., 2020; RIBEIRO et al., 2013), a TDIC como instrumento de democratização do acesso à informação, ao conhecimento e das condições de maior participação social no contexto educativo. Ao condicionar o acesso ao ensino remoto, majoritariamente pelas TDIC, uma parcela significativa de crianças e jovens que não está conectada, ou possui acesso limitado à internet, tem sua trajetória educacional afetada por outro tipo de desigualdade: a digital.

A desigualdade digital, muitas vezes compreendida como exclusão digital, refere-se à diferença observada nas chances individuais de posse de equipamentos, acesso à internet e conhecimento para utilizar as TDIC entre grupos que ocupam distintas posições na sociedade (HELSPER, 2019; RIBEIRO et al., 2013). Por apontar os efeitos excludentes das TDIC, a desigualdade digital reflete as desigualdades sociais e econômicas, já reiteradamente observadas como lócus de estratificação no Brasil, além de apresentar acentuada correlação com a cultura, renda e com marcadores sociais como idade, raça, gênero, nível socioeconômico e escolaridade (RIBEIRO et al., 2013; MACEDO, 2021).

Além disso, o reflexo da desigualdade entre os grupos sociais tem, frequentemente, apontado que as escolas são planejadas e desenhadas para um grupo que possui privilégios sociais, econômicos, políticos e culturais. Dessa forma, a estrutura e funcionamento da escola, bem como as metodologias de ensino e o currículo, têm auxiliado a assegurar a perpetuação da desigualdade social e econômica. Essas desigualdades, portanto, são um dos fatores que desencadeiam a desigualdade digital, ao mesmo tempo que esta, ao dificultar o acesso ao conhecimento, aprofunda aquelas, ou seja, amplia a distância entre grupos sociais. Na prática, as condições de acesso aos recursos não são as mesmas para os diferentes grupos sociais, reverberando em novas dimensões da exclusão.

O objetivo deste artigo é analisar o potencial de reprodução e intensificação de desigualdades digitais que podem estar presentes nesse tipo de política, ainda que ela tenha sido inicialmente formulada com o propósito de reduzi-las. Para o estudo em tela, o foco é o ensino remoto em Minas Gerais, intitulado de Regime Especial de Atividades Não Presenciais (REANP). Promulgado por meio da resolução nº 4.310/2020 da Secretaria de Estado de Educação (SEE), tem o propósito de assegurar a continuidade do processo de ensino e aprendizagem dos estudantes da rede estadual do estado durante o período em que as atividades escolares presenciais estiverem suspensas (MINAS GERAIS, 2020d).

Nas próximas seções, apresentamos o REANP e, em seguida, o conceito de arranjo institucional de implementação, utilizado como referencial teórico para a análise do ensino remoto nas escolas de Minas Gerais. Na quarta seção apresentamos a metodologia, e na quinta seção analisamos as condições de acesso a computadores, internet e ao canal de TV Rede Minas, no estado de Minas Gerais, e discutimos os resultados, buscando interpretá-los à luz dos referenciais teóricos. Por fim, na seção seis, tecemos algumas considerações finais.

REANP em Minas Gerais

Nas últimas duas décadas, o estado de Minas Gerais apresentou diversas propostas educacionais com objetivo de melhorar a qualidade da educação, com foco no trabalho realizado dentro da escola. Entre os programas destacam-se: o Plano de Intervenção Pedagógica (PIP), implementado entre 2007 e 2017, e os Itinerários Avaliativos, criados em 2017 e em vigência atualmente, instituídos devido ao baixo desempenho e rendimento dos discentes e à necessidade de traçar um processo formativo com orientações para a construção colaborativa a partir do diagnóstico da escola. Os programas ofereciam, respectivamente, suporte metodológico e didático aos agentes escolares e uma tecnologia de gestão e monitoramento que valorizava a tomada de decisões baseada em evidências, buscando promover mudanças substantivas no cotidiano escolar em prol da qualidade e da equidade da educação (MINAS GERAIS, 2013, 2019).

O governo do Partido Novo1, atuante desde 2019, embora seja alvo de críticas contundentes sobre a forma hierárquica e prescritiva com que instituiu o REANP, em maio de 2020, visava cumprir as horas legalmente estabelecidas (pelo menos 800h), garantir a aprendizagem discente e a execução das propostas pedagógicas nos níveis e modalidades de ensino ofertados pelas escolas da rede estadual. Para tanto, o ensino remoto foi estruturado a partir de três ferramentas que utilizam suportes distintos: (i) Plano de Estudos Tutorados (PET); (ii) Programa de TV “Se Liga na Educação”; (iii) aplicativo Conexão Escola (MINAS GERAIS, 2020d).

Os PETs - apostilas publicadas mensalmente, conforme objetivos de aprendizagem e modalidade de cada ano de escolaridade, vinculadas à proposta curricular do estado - objetivam a “manutenção do processo ensino e aprendizagem e da rotina de estudo dos estudantes, buscando minimizar as desigualdades educacionais e o distanciamento com o saber escolar” (MINAS GERAIS, 2020d). A distribuição dos PETs é realizada, prioritariamente, pelo site Estude em Casa2 (MINAS GERAIS, [2020e]), por meio do download da apostila ou, se o aluno não tiver acesso à internet, a escola, em parceria com a Secretaria Municipal de Educação3, deve utilizar o serviço postal ou solicitar aos segmentos representativos da comunidade4 a entrega dos PETs. Posteriormente, o aluno/pai/responsável deve entregar o PET na escola ou usar a mesma estratégia utilizada, por ocasião do recebimento do material pelo aluno, na hora da devolução.

O programa “Se Liga na Educação” é transmitido pelo canal de televisão Rede Minas, de segunda à sexta-feira, no período da manhã5, por antena parabólica que capta o sinal via satélite ou por duas empresas de canais a cabo. As aulas também estão disponíveis no YouTube, através do canal Rede Minas (REDE MINAS, [2020]), no site e aplicativo da Rede Minas e no aplicativo Conexão Escola. Apresentado por docentes da rede pública estadual e da Escola de Formação de Minas Gerais, o programa privilegia conteúdos em que, historicamente, os alunos apresentam mais dificuldades. As aulas são organizadas por ano de escolaridade e áreas de conhecimento6 (MINAS GERAIS, 2020d), com duração de 20 minutos cada.

O aplicativo Conexão Escola, disponível para Android e iOS, com acesso exclusivo para alunos e professores da rede estadual através de login e senha, é composto por quatro menus: (i) Vídeo - com as aulas do “Se Liga na Educação”; (ii) PET/Conteúdo - que apresenta o conteúdo por assunto de cada componente curricular; (iii) Chat - para interação entre professor e alunos conforme a disciplina e o horário da aula; (iv) Seus Estudos - com a avaliação diagnóstica7 e o plano de estudo com orientações para os estudantes. É possível acessar o aplicativo sem utilizar os dados móveis do celular do aluno, já que o acesso é custeado pelo governo de Minas Gerais, mas é necessário que o celular do estudante tenha conexão com a internet para que possa ser realizada a configuração necessária para acesso ao aplicativo (MINAS GERAIS, 2020d).

As orientações da SEE estabeleceram que a unidade escolar seria responsável, juntamente com as Superintendências Regionais de Educação (SREs), por garantir a entrega, a realização e a devolução dos PETs pelo estudante, bem como o registro do acompanhamento das atividades escolares realizadas por ele.

Nota-se no REANP uma significativa aposta na tecnologia como forma de assegurar o direito à educação, implementar novas práticas pedagógicas e possibilitar novos modos de comunicação e acesso à informação em qualquer espaço-tempo. Considera-se o avanço das TDICs para difusão e acesso à informação, aliado ao valor cada vez mais acessível dos dispositivos tecnológicos, como igualitário, equitativo e democrático (RIBEIRO et al., 2013). Todavia, conforme observado por Selwyn (2011), trata-se de uma visão utópica polarizada, e até romantizada, baseada no princípio de que as TDICs e, consequentemente, o ensino remoto promovem a igualdade e o acesso de todos às informações e ao ensino. Ademais, os instrumentos utilizados no REANP têm a capacidade de “orientar e tornar previsível o comportamento dos atores” (LASCOUMÉS; LE GALÈS, 2012, p. 38). Esses instrumentos são formulados como forma de induzir o comportamento dos atores e, assim, os mecanismos de monitoramento, avaliação e comunicação previstos nessa política educacional visam a garantia de que seus objetivos sejam alcançados.

Arranjos institucionais de implementação

A análise de implementação de políticas públicas busca compreender como e de que forma os objetivos pontuados como intenção pelas esferas governamentais efetivamente se transformam em ação. Muitas vezes, a implementação é compreendida como sendo o momento da materialização propriamente dita de uma política, ou seja, como a execução do que foi formulado. No entanto, os estudos mais recentes no campo das ciências políticas não contrapõem formulação e implementação como momentos distintos e estanques, pois “a separação real não é entre quem formula (e decide) e quem implementa (e executa), mas sobre quem decide sobre o quê” (LOTTA, 2019, p. 18). Essa distinção supõe que, na realidade, existem vários níveis no processo decisório, que são contínuos e perpassam diferentes atores na cadeia decisória.

Entre os estudos de implementação, a abordagem dos arranjos institucionais tem contribuído para o entendimento da configuração da política, e corresponde aos objetivos, atores envolvidos e instrumentos utilizados para se alcançar determinado resultado. O conceito de arranjo institucional de implementação corresponde ao “conjunto de regras, mecanismos e processos que definem a forma particular como se coordenam atores e interesses na implementação de uma política pública específica” (GOMIDE; PIRES, 2014, p. 19), conforme se pode observar na figura a seguir.

FONTE: Pires e Gomide (2018, p. 30).

FIGURA 1 ABORDAGEM DOS ARRANJOS INSTITUCIONAIS DE IMPLEMENTAÇÃO 

A Figura 1 mostra uma seta de entrada, indicando os objetivos da política, e uma seta de saída, indicando os resultados e como a consecução dos resultados de uma política é decorrente da configuração estabelecida para a sua implementação. Essa configuração depende essencialmente da interação entre os atores envolvidos, que podem ser das burocracias governamentais, da sociedade civil, entre outros, com suas capacidades técnicas e políticas, e cuja atuação será muitas vezes informada pelos instrumentos previstos no arranjo de implementação de cada política.

A política educacional analisada - cujo objetivo é assegurar a continuidade do processo de ensino e aprendizagem dos estudantes de Minas Gerais durante o período em que as atividades escolares presenciais estiveram suspensas - envolveu atores da esfera executiva, além dos professores, alunos, gestores das unidades escolares, da SEE e das SREs, entre outros. Os instrumentos de política pública são a forma pela qual o governo estabelece como alcançar os resultados esperados. Ou seja, os instrumentos organizam as interações entre os atores e direcionam comportamentos. Para Lascoumés e Le Galès (2012) os instrumentos dão estrutura aos arranjos institucionais e influenciam diretamente no seu funcionamento, determinando as posições e os recursos disponíveis aos atores, assim como os resultados que o arranjo será capaz ou não de produzir.

Entretanto, há o risco de se (re)produzir desigualdade pelo uso de instrumentos inadequados que obstaculizam o alcance dos objetivos da política pública e influenciam na qualidade dos resultados. De acordo com Spínola e Ollaik (2019, p. 333-334), “instrumentos não são neutros, mas definem/fixam papéis, distribuem recursos e possibilidades de influência, e podem ter efeitos no sentido de reforçar ou mitigar padrões de desigualdade existentes”. Embora seja um meio escolhido para entregar bens e serviços públicos e traduzir a relação entre estado e sociedade ao dar concretude as ações, os arranjos de implementação podem desconsiderar a situação e os direitos da população afetada, contribuindo para a vulnerabilidade e a manutenção das múltiplas formas de desigualdade.

No que concerne ao risco de reprodução de desigualdades no processo de implementação de políticas públicas, Pires (2019) analisa dois mecanismos que dizem respeito, especificamente, aos seus arranjos e instrumentos, e que correspondem à “distribuição desigual de poder, recursos e capacidades de conectividade” (PIRES, 2019, p. 27) de cada ator de interferir em decisões, e a adoção de “instrumentação seletiva e dispositivos de fixação de sentidos” (PIRES, 2019, p. 31). A configuração do arranjo de uma política pública remete não apenas ao seu “aspecto operacional e institucional”, mas a “uma questão de acesso a direitos e ao apoio público”, de tal forma que “a falha em conectar serviços, equipamentos e instituições pode incorrer em riscos de perpetuação de vulnerabilidades por parte de grupos sociais que já se encontram em trajetórias de dificuldade de acesso ao Estado.” (PIRES, 2019, p. 29).

Estudos sobre arranjos de implementação e as desigualdades são escassos na literatura de referência (PIRES; LOTTA, 2019; SPÍNOLA; OLLAIK, 2019) e tratam a desigualdade social como uma consequência da implementação, isto é, “um entre os muitos resultados e impactos associados à tomada de decisão discricionária e ao decorrente tratamento desigual dos cidadãos” (PIRES; LOTTA, 2019, p. 128). Apesar da desigualdade social fazer parte das interações que permeiam as políticas públicas, ainda existe um potencial pouco explorado de análises que conectam a atuação dos atores e dos instrumentos das políticas públicas à (re)produção de outras desigualdades, como a desigualdade digital. Nesse sentido, a desigualdade digital intersecta processos de implementação de políticas públicas como um fenômeno que pode se originar antes, durante ou após o processo de implementação, já que pode estar inscrita em âmbito cultural, social ou econômico, sendo reproduzida por ações de implementação ou pelo uso de determinados instrumentos.

Soma-se a isso o fato de que as pesquisas sobre desigualdades digitais nas políticas públicas enfatizam as relações entre acesso, posse de equipamentos e habilidades e usos das tecnologias, além de constatar que indivíduos socioeconomicamente desfavorecidos apresentam menores chances de acesso e uso dos recursos tecnológicos (ARRETCHE, 2019; RIBEIRO et al., 2013). As conclusões desses estudos recaem sobre as características dos domicílios, dos indivíduos ou recursos materiais associados a eles, como as que têm maior efeito na desigualdade digital (RIBEIRO et al., 2013). Estudos mais recentes, entretanto, buscam obter um entendimento mais contextualizado envolvendo, inclusive, a localização geográfica das desigualdades (HELSPER, 2019).

As políticas públicas baseadas na utilização das TDICs como prestação de apoio a pessoas em situação de vulnerabilidade deveriam garantir o acesso às tecnologias, sob o risco de agravar o problema que deu origem à ação pública. Nesse sentido, é importante avaliar os riscos de reprodução de desigualdades que os próprios arranjos de implementação podem acarretar.

Metodologia

O estudo aqui apresentado encontra-se no âmbito das pesquisas qualitativas em educação e configurou-se como um estudo de toda a rede estadual de Minas Gerais, com o propósito de analisar a implementação do ensino remoto no contexto da pandemia Covid-19 a partir do REANP. A questão que mobilizou esta investigação foi: “qual o potencial que o REANP tem de reproduzir ou intensificar as desigualdades educacionais, ainda que esta política educacional tenha sido inicialmente formulada com o propósito de reduzi-las?”. Para esta pesquisa buscamos identificar os atores, processos e instrumentos envolvidos na implementação do ensino remoto em Minas Gerais no contexto da pandemia.

O trabalho foi desenvolvido a partir de uma metodologia qualitativa, utilizando a análise documental. Optamos pela análise de conteúdo, que se define por um “conjunto de técnicas de análise das comunicações” (BARDIN, 1995 apudROCHA; DEUSDARÁ, 2005, p. 308). Integraram o corpus de análise documental: (i) a Resolução SEE nº 4.310, de 17 de abril de 2020 (MINAS GERAIS, 2020d); (ii) memorandos (MINAS GERAIS, 2020a; MINAS GERAIS, 2020b) e (iii) manuais do REANP8 publicados no período entre março e novembro de 2020 através da legislação listada no site9 da Secretaria de Educação. O propósito desta etapa foi compreender os princípios e pressupostos no REANP, e os instrumentos utilizados em seu arranjo institucional de implementação.

Com a finalidade de analisar o contexto de implementação, selecionamos alguns dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua), pesquisa realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) a cada trimestre, que tem por finalidade traçar um panorama sobre questões de trabalho e temas específicos que permitam a compreensão da realidade brasileira. Para esta pesquisa utilizamos, de maneira complementar, os dados quantitativos com as informações do 4º trimestre de 2018 da PNAD Contínua (IBGE, 2021)10, últimas informações disponíveis sobre TDIC e que também poderiam ter sido utilizadas pelos formuladores da política do REANP como um indicador de cobertura digital. Selecionamos indicadores de acesso às tecnologias no estado de Minas Gerais, com a finalidade de mapear a realidade do estado. Como se trata de uma pesquisa realizada de forma amostral, os dados não estão disponíveis por município, e a menor unidade de análise é a unidade de federação, mas, ainda que seja um fato limitador, permite-nos ter uma dimensão da posse de equipamentos e acesso à internet nos domicílios mineiros. Além da análise descritiva de dados da PNAD Contínua sobre a cobertura digital, também foi possível mapear os municípios que captam o sinal do canal de televisão Rede Minas e os domicílios que possuem acesso à internet e posse das TDIC.

Os dados coletados na análise documental permitiram a identificação dos atores e dos instrumentos de implementação da política. Além disso, a análise descritiva da PNAD Contínua, que forneceu informações dos principais instrumentos de acesso e uso das TDIC, especialmente a internet, permitiu-nos traçar um panorama de cobertura dos meios necessários para que a política analisada fosse, de fato, acessível a todos os estudantes mineiros.

A organização, a seleção, a categorização e a análise dos dados da pesquisa documental e da PNAD Contínua ocorreram com o propósito de estratificar os resultados com base no modelo proposto por Pires e Gomide (2018), que identifica os atores e os principais instrumentos previstos nos documentos oficiais, e que imprime a maneira de regular as atividades e controlar a forma de execução nos diferentes níveis da hierarquia estadual. Cabe ressaltar que devido ao contexto pandêmico não foi possível investigar a situação dos estudantes e das famílias.

Análise dos resultados

Organizamos os resultados a partir do referencial teórico de arranjo institucional de implementação (GOMIDE; PIRES, 2014), conforme as categorias de atores e instrumentos frente ao contexto de implementação, que, no caso do REANP, constitui-se basicamente no ensino remoto, em que alunos e professores dependem de suas condições de acesso às tecnologias digitais.

Atores e instrumentos do REANP

Através da Resolução 4.310/2020, a Secretaria de Educação regulamentou a oferta de Regime Especial de Atividades Não Presenciais durante o período de emergência causada pelo agente coronavírus (Covid- 19), para cumprimento da carga horária mínima exigida. (art. 1º).

O Regime Especial de Atividades Não Presenciais, estabelecido por esta Resolução, constitui-se de procedimentos específicos, meios e formas de organização das atividades escolares obrigatórias destinadas ao cumprimento das horas letivas legalmente estabelecidas, à garantia das aprendizagens dos estudantes e ao cumprimento das Propostas Pedagógicas, nos níveis e modalidades de Ensino ofertados pelas escolas estaduais. (MINAS GERAIS, 2020d).

Os materiais pedagógicos disponibilizados para o REANP foram confeccionados por meio de uma parceria que envolveu diversos atores da própria SEE, da União dos Dirigentes Municipais de Educação (Undime-MG)11 e professores da rede pública estadual, para acesso dos estudantes e docentes. Essa parceria garantiu a participação social e de atores da esfera executiva para atender à rede estadual de educação. As redes municipais poderiam utilizar os PETs disponibilizados e adequá-los à sua realidade, caso necessário.

A formulação do REANP desenvolvida pela SEE para ser implementada nas unidades escolares passa pela intermediação das SREs - que são 48 ao todo, nas distintas regiões do estado mineiro. A condução da implementação do REANP pelos gestores escolares é monitorada pelos gestores das SREs, que acabam por imprimir pequenas diferenças na coordenação dessa política educacional. Por isso, Lotta (2019) afirma que nos estudos sobre implementação de políticas públicas existem vários níveis no processo decisório, que são contínuos e perpassam diferentes atores que em suas decisões acabam promovendo mudanças na formulação da política.

Entre os instrumentos de regulação e controle, em cumprimento às exigências previstas na regulamentação do REANP, os docentes da rede estadual de ensino de Minas Gerais estão sujeitos ao preenchimento de formulários de controle das atividades dos alunos, os quais são fiscalizados pelo gestor da unidade escolar, que, por sua vez, presta contas junto às SREs.

Art. 6º - Cabe ao Gestor Escolar, de acordo com os meios:

§2º É responsabilidade da unidade escolar, de acordo com suas especificidades e em conjunto com a Superintendência Regional de Ensino, garantir a entrega, a realização e a devolução dos Planos de Estudos Tutorados pelo estudante, bem como o registro do acompanhamento das atividades escolares realizadas pelo estudante, no formulário constante do ANEXO I (MINAS GERAIS, 2020d).

Nessa política educacional, os instrumentos de regulação presentes são: o controle por acesso, pela entrega do material e pelo formulário preenchido pelo professor; o registro da carga horária e do cumprimento do currículo via preenchimento do Diário Escolar Digital (DED) pelo docente; e o pagamento docente condicionado ao cumprimento das regras e frequência das atividades. Conforme afirmam Lascoumés e Le Galès (2012), os instrumentos normativos e legais, com suas regras ou princípios gerais da política, ajustam e conduzem o comportamento social.

Nesse sentido, os memorandos do REANP instituem o regime de teletrabalho em que o “servidor público executa parte ou a totalidade de suas atribuições fora das dependências físicas das unidades do respectivo órgão ou entidade de lotação, por meio da utilização de tecnologias de informação e comunicação” (MINAS GERAIS, 2020c), bem como a continuidade dos serviços executados. Nota-se, assim como nos manuais, especialmente nos que concernem ao aplicativo Conexão Escola, uma centralização das tarefas em torno do uso das TDIC e, consequentemente, a sua não neutralidade ao serem utilizadas como instrumentos de padronização da atuação dos agentes e dos serviços prestados.

Contexto de implementação do REANP

As condições de implementação dessa política educacional estão relacionadas às possibilidades de acesso dos alunos e professores a cada um dos instrumentos disponíveis, de tal forma que essas análises acerca das condições de acesso às ferramentas do REANP nos permitiram identificar os matizes da desigualdade digital reverberada por essa política, conforme detalharemos a seguir. Ao constatarmos que nem todos os municípios mineiros têm acesso aos canais Rede Minas e Assembleia na TV aberta (Figura 2), o programa de TV “Se Liga na Educação”, por exemplo, que era disponibilizado pela TV para democratizar o acesso, não atingiu esse objetivo.

FONTE: Elaboração própria com base nos dados da Rede Minas TV, 2020 (REDE MINAS, c2017).

FIGURA 2: DISPONIBILIDADE DE ACESSO À TV NO ESTADO DE MINAS GERAIS. 

Apenas 183 municípios são atendidos pela Rede Minas, enquanto outros 79 municípios pela TV Assembleia, totalizando somente 262 dos 853 municípios mineiros em cobertura de sinal, ou seja, 69,28% dos municípios não têm acesso ao programa por TV aberta. Além disso, o mapa da Figura 2 apresenta uma distribuição desigual também em termos de SREs, pois 32 das 48 SREs possuem menos de 50% dos municípios com acesso ao canal de TV. Com relação ao acesso, o programa “Se Liga na Educação” pode ser visto por canal aberto, mas, como já apresentado, 69,28% dos municípios não têm cobertura e apenas três12 têm acesso ao canal Rede Minas via TV a cabo.

Como o canal Rede Minas não é distribuído de maneira uniforme em todo o estado, há uma estratificação da desigualdade digital. Nesse sentido, a localização geográfica do domicílio - fator já apresentado na literatura de referência sobre desigualdade digital (HELSPER, 2019; RIBEIRO et al., 2013) - torna-se condição para que o estudante tenha acesso ou não ao programa criado pelo REANP. Ademais, ao desconsiderar as especificidades sociais, econômicas e tecnológicas dos domicílios, amplamente discutidas nos estudos sobre desigualdade digital (ARRETCHE, 2019; MACEDO, 2021) e fatores de suma importância para se implementar o ensino remoto, restringe-se o acesso ao conhecimento e à aprendizagem a uma parcela de estudantes, relegando os demais a um lugar periférico como beneficiário da política pública.

A falta do programa televisivo “Se Liga na Educação” em alguns municípios constitui-se como uma forma de exclusão dos estudantes que não deriva de uma escolha individual, mas de uma desigual distribuição territorial. Estabelecem-se barreiras espaciais para a promoção do ensino, pois o lugar onde se vive afeta o acesso às oportunidades educacionais promovidas pelo REANP, reverberando em privações para a aprendizagem discente. Para além das divisões entre áreas urbanas e rurais, já observadas pela literatura (ARRETCHE, 2019; HELSPER, 2019), a estratificação entre os municípios pode expressar também a segregação social e econômica, uma vez que as desigualdades territoriais são preditoras de outras desigualdades.

Diante do exposto, uma possibilidade seria acessar as aulas do “Se Liga na Educação” através do YouTube ou do próprio aplicativo Conexão Escola, ou seja, dependendo do acesso à internet. Com os dados provenientes da PNAD Contínua do 4º trimestre de 2018, podemos observar a distribuição com relação ao acesso à internet, na Tabela 1:

TABELA 1 INFORMAÇÕES SOBRE ACESSO ÀS TECNOLOGIAS NO ESTADO DE MINAS GERAIS, POR DOMICÍLIOS, SEGUNDO DADOS DA PNAD CONTÍNUA 2018. 

Itens selecionados %
Existência de utilização da internet 79,3
Existência de microcomputador ou tablet 46,3
Existência de telefone móvel celular 93,7
Utilização de microcomputador ou tablet para acessar a internet 51,8
Utilização de tablet para acessar a internet 13,6
Utilização de telefone móvel celular para acessar a internet 99,2
Utilização de televisão para acessar a internet 23,2

FONTE: Elaboração própria a partir dos dados do IBGE (2018).

Observa-se que 79,3% dos domicílios do estado de Minas Gerais possuem acesso à internet, o que implica dizer que 20,7% das residências não utilizam internet, ou seja, existe uma dificuldade de acesso a algumas das funcionalidades do REANP, sobretudo se conjugarmos com dados já apresentados anteriormente em relação à disponibilidade dos canais de TV em que são apresentadas as aulas. Um total de 46,3% dos domicílios possui microcomputador ou tablet e 93,7% dos domicílios têm telefone móvel celular, mas não necessariamente todos possuem acesso à internet, e, neste caso, ainda teríamos 6,3% dos domicílios que não contam com aparelho de celular. Essas informações são essenciais ao pensar uma política que é pautada em aplicativo, download de PETs e de vídeos que são disponibilizados pela internet. Esses dados mostram que, embora a política tenha três instrumentos de efetivação, para alguns estudantes apenas o PET impresso poderá ser de fato implementado.

As quatro últimas linhas da Tabela 1 estão relacionadas aos domicílios que possuem internet, ou seja, àqueles 79,3% apresentados inicialmente. Por exemplo, entre os domicílios que possuem internet, 51,8% utilizam microcomputador ou tablet para acessar a internet; e 13,6% o tablet; mas o meio mais utilizado para acessar a internet, entre os domicílios que possuem acesso, é o telefone móvel: 99,2%. Com o advento das tecnologias, outra possibilidade para que os estudantes tivessem acesso às aulas gravadas e disponibilizadas no YouTube seria a disponibilidade das smart TVs (com acesso à internet embarcado). Contudo, conforme está indicado na última linha da Tabela 1, em apenas em 23,2% das residências a televisão é utilizada para acessar a internet, o que se torna mais um limitador para o acesso às programações dos conteúdos escolares.

No processo de implementação de uma política como o REANP, que pressupõe acesso à internet, informações como essas são importantes para refletir sobre o seu alcance. Há, portanto, uma estratificação entre os domicílios, que reverbera em indivíduos conectados e não conectados, que vai além do acesso à internet e da posse das TDICs, bem como no aspecto econômico, social e formas de uso da tecnologia, como já observado por Arretche (2019), que torna mais significativa a lacuna entre os dois grupos de indivíduos e até entre os conectados. De acordo com Ribeiro et al. (2013, p. 294), os “setores já dominantes da sociedade são justamente aqueles que tiram maior proveito dessas oportunidades, empurrando para a ‘infoexclusão’ parte dos setores populares”. Assim, o acesso à internet oferecido de forma gratuita pelo governo de Minas Gerais para a implementação do REANP pouco tem efeito nesse contexto tão estratificado.

Dessa forma, o acesso à internet e a posse de TDICs funcionam como um mecanismo reprodutor das desigualdades, especialmente as educacionais, pois os alunos que não têm acesso a esses recursos possivelmente são aqueles que têm um desempenho aquém do esperado no contexto educacional, mesmo antes da pandemia. Nesse sentido, o REANP, enquanto política que pretende garantir o acesso à educação através das tecnologias digitais, oferece o risco de levar ao agravamento das desigualdades educacionais e sociais prevalentes no país. Portanto, a implementação do REANP “se torna não apenas um local para a visualização das desigualdades existentes, mas também um ambiente em que as desigualdades sociais podem ser reproduzidas, apesar de as intenções originais da política pública serem o contrário” (PIRES; LOTTA, 2019, p. 145), bem como a desigualdade digital pode ser vislumbrado a partir de diferentes nuances.

Como já constatado por Ferreira et al. (2020) e Pischetola (2016), o acesso à internet e às TDIC, por si só, não elimina as barreiras geográficas e, quando utilizado com o propósito de apenas suprir uma lacuna educacional que privilegia a eficiência e eficácia no contexto escolar, torna-se um instrumento que aprofunda a desigualdade digital e educacional. Dessa forma, o ensino remoto instituído em caráter emergencial e temporário está gerando exclusões com a prerrogativa de assegurar a educação de qualidade e equidade para todos, mas que apenas disfarça e perpetua as desigualdades educacionais.

Considerações finais

Com esta pesquisa buscamos investigar o alcance, os limites e as orientações adotadas pelos sistemas educacionais durante o período de fechamento das escolas, no contexto da pandemia Covid-19.

O REANP foi pensado para atender à rede estadual de Minas Gerais, considerando as especificidades e organizações curriculares da rede, e poderia ou não ser adotado pelas redes municipais. No entanto, sendo uma política que supõe o uso de tecnologias e da internet como solução para a impossibilidade das aulas presenciais, não foram levadas em consideração as condições socioeconômicas das redes de ensino e de seus alunos, pois, segundo informações da PNAD Contínua (IBGE, 2018), apenas 79,3% da população mineira têm acesso à internet.

A formulação de uma política pública requer o conhecimento aprofundado das condições de infraestrutura tecnológica domiciliar que, no caso da política analisada no presente trabalho, seria o acesso a recursos tecnológicos. A não democratização do acesso à internet e posse das TDICs, no caso do REANP mineiro, está funcionando como um mecanismo reprodutor de desigualdades educacionais e econômicas ao não ser distribuído uniformemente pelas distintas camadas sociais (ARRETCHE, 2019; HELSPER, 2019; RIBEIRO et al., 2013).

A implementação dessa política traz em si várias nuances, que podem se desdobrar na análise dos diferentes atores e instrumentos, como discutido ao longo do artigo, e na necessidade de uma avaliação de sua efetividade. Ao considerar como e quais êxitos essa política alcançou, inevitavelmente teremos grupos com diferentes situações no tocante à política: aqueles que tiveram acesso apenas ao PET, aqueles que tiveram acesso ao PET e às aulas na televisão ou internet, aqueles que tiveram acesso ao PET e ao aplicativo Conexão Escola, e aqueles que tiveram acesso a todas as tecnologias disponibilizadas pelo REANP. Esse tipo de análise, articulada a sistemas de avaliação, poderia oferecer aos diferentes níveis de atuação (sala de aula, escola e rede) indicadores dos aspectos que deveriam ser trabalhados com a finalidade de reduzir as desigualdades e promover a equidade.

REFERÊNCIAS

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1Em 2019, foi Romeu Zema (Novo) que assumiu o cargo com previsão de término em 2022.

2Além do PET, o site também apresenta informações sobre como fazer o download do aplicativo Conexão Escola, acesso às teleaulas do “Se Liga na Educação”, guias práticos e perguntas e respostas sobre as ferramentas e o REANP.

3O diálogo entre a escola estadual e as secretarias municipais de educação deve ser para que os trabalhadores que se deslocam dentro dos municípios, assim como os segmentos representativos das comunidades, possam levar os PETs aos alunos.

4Como as associações de bairros.

5As aulas ocorriam entre 7h e 12h30min, sendo que no período das 11h15min às 12h30min os discentes podem interagir com os professores das disciplinas daquele dia e sanar suas dúvidas.

6As áreas de conhecimento são: Linguagens - Língua Portuguesa, Literatura, Inglês, Arte e Educação Física; Ciências Humanas - História, Geografia, Sociologia e Filosofia; Matemática; Ciências da Natureza - Biologia, Física e Química; e conteúdos abordados no Exame Nacional do Ensino Médio.

7Cadernos de testes que o aluno deve responder, contendo questões das diversas áreas de conhecimento.

8Como por exemplo o manual do Aplicativo Conexão Escola, sobre o Se Liga na Educação e materiais elaborados pelas SREs.

9Site do Regime de Estudos não Presencial (MINAS GERAIS, [2020e]).

10Nas PNADs Contínuas são realizadas Pesquisas Suplementares Anuais, e nos anos de 2016 a 2019 um dos temas e tópicos suplementares abordados foram as Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC).

11Associação civil sem fins lucrativos, que representa os dirigentes municipais de educação.

12Cataguases, Leopoldina e Juiz de Fora pertencem à Zona da Mata mineira, sendo que os dois últimos são sedes de SRE.

Recebido: 04 de Dezembro de 2020; Aceito: 18 de Janeiro de 2022

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