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Educar em Revista

versão impressa ISSN 0104-4060versão On-line ISSN 1984-0411

Educ. Rev. vol.38  Curitiba  2022  Epub 03-Mar-2022

https://doi.org/10.1590/0104-4060.82009 

DOSSIÊ - Educação de Jovens e Adultos: políticas e processos educativos democráticos

Políticas Públicas de Educação de Adultos em Portugal - inovações e desafios

Public Policies for Adult Education in Portugal - innovations and challenges

*Instituto de Educação da Universidade de Lisboa. Unidade de Investigação e Desenvolvimento em Educação e Formação (UIDEF). Lisboa, Portugal. E-mail: carmen@ie.ulisboa.pt


RESUMO

O reduzido nível de escolaridade da população portuguesa tem sido um problema difícil de resolver, o que se deve, em parte, ao predomínio de políticas públicas de educação de adultos limitadas, fragmentadas e intermitentes, com estatuto periférico. Todavia, nas últimas duas décadas, ocorreu um investimento neste domínio e registou-se uma elevada adesão de adultos pouco escolarizados. O artigo visa analisar os elementos de inovação e os desafios inerentes às medidas integradas em políticas de educação de adultos, em Portugal, nas últimas duas décadas. Os dados empíricos derivaram de uma investigação qualitativa, com recurso a diversas técnicas - recolha documental e entrevistas semiestruturadas, com gestores e educadores de adultos, implicados nas medidas políticas, assim como entrevistas biográficas, com adultos certificados. Os resultados da investigação revelam a inovação e a complexidade inerentes às estruturas organizacionais responsáveis pelo diagnóstico e orientação de adultos pouco escolarizados, aos cursos de educação e formação de adultos, e ao processo de reconhecimento, validação e certificação de competências. Estas medidas políticas apresentam elementos de inovação que consistem na orientação e acompanhamento dos adultos, na valorização da sua experiência e em modos de trabalho pedagógico adequados a adultos. Estes elementos de inovação, que, em grande medida, permitiram uma elevada adesão dos adultos pouco escolarizados, também têm colocado importantes desafios aos coordenadores e educadores de adultos, confirmando a importância do investimento no acompanhamento e na formação destes profissionais.

Palavras-chave: Políticas públicas; Educação de adultos; Adultos pouco escolarizados

ABSTRACT

The low level of education of the Portuguese population has been a difficult problem to solve. This is partly justified due to limited, fragmented and intermittent public adult education policies. However, in the last two decades, an investment has been made in this domain and a high number of adults with low level of education have been mobilized. The article aims to analyze the elements of innovation and the challenges of the integrated measures in adult education policies in Portugal over the last two decades. The empirical data derived from a qualitative research, using several data collection tools - legal documents, statistics, and semi-structured interviews, with managers, educators and adults, as well as biographical interviews with certified adults. The research results reveal the innovation and complexity inherent the structures responsible for diagnosing and monitoring adults, the adult education and training courses, and the process of recognition, validation, and certification of non-prior learning. These policy measures present elements of innovation that consists in the guidance and monitoring of adults, in valuing their experience and in pedagogical work methods suitable for adults. The research results showed the innovation and complexity of the adult education policies, for example, the valorisation of the adult experience in alternative to the traditional scholar model. However, these elements of innovation included important challenges for coordinators and adult educators, confirming the importance of investing in training and monitoring of these professionals.

Keywords: Public policies; Adult education; Adults with low level education

RESUMÉ

Le niveau réduit de scolarité de la population portugaise a été un problème difficile à résoudre, ce qui est dû, en partie, à la prédominance de politiques publiques d’éducation des adultes limitées, fragmentées et intermittentes, de statut périphérique. Toutefois, dans les deux dernières décennies, il y a eu un investissement dans ce domaine et on a registré une élevée adhésion des adultes peu scolarisés. L’article vise à analyser les éléments d’innovation et les défis inhérents aux mesures intégrées dans les politiques d’éducation et formation des adultes au Portugal, dans les deux dernières décennies. Les données empiriques ont dérivé d’une recherche qualitative, en utilisant diverses techniques - collecte documentaire et interviews semi-structurées avec gestionnaires et éducateurs des adultes, impliqués dans les mesures politiques, ainsi que des interviews biographiques avec des adultes certifiés. Les résultats de la recherche révèlent l’innovation et la complexité inhérentes aux structures organisationnelles chargées du diagnostic et d’orientation des adultes peu scolarisés, dans les cours d’éducation et formation des adultes, et du processus de reconnaissance, validation et certification de compétences. Ces mesures politiques présentent d’éléments d’innovation qui consistent dans l’orientation et l’accompagnement des adultes, dans la valorisation de ses expériences et dans modes de travail pédagogique adéquats aux adultes. Ces éléments d’innovation, que, dans une large mesure, ont permis une élevée adhésion des adultes peu scolarisés, ont également posé des défis importants aux coordinateurs et éducateurs des adultes, ce que confirme l’importance de l’investissement dans l’accompagnement et la formation de ces professionnelles.

Mots clés:  Politiques publiques; Éducation des adultes; Adultes peu scolarisés

Introdução

O texto visa analisar os elementos de inovação e os desafios inerentes a medidas integradas em políticas públicas de educação de adultos, em Portugal, nas últimas duas décadas. A população portuguesa apresenta níveis de escolaridade muito baixos, por comparação com os países da União Europeia. As políticas públicas de educação de adultos, em Portugal, têm sido limitadas, fragmentadas e descontínuas, indiciando um estatuto marginal e periférico (CANÁRIO, 1999; LIMA, 2008; CAVACO, 2009, 2013; LIMA; GUIMARÃES, 2018). Contudo, o período entre 2000 e 2021, de certa forma, tem sido uma exceção a essa tendência, verificando-se, no geral, um elevado investimento nas políticas públicas de educação de adultos e uma certa continuidade das medidas adotadas (CAVACO, 2009; BARROS, 2018), com exceção do período entre 2012 e 2015. O investimento e a continuidade nas políticas públicas de educação de adultos, durante o referido período, resultaram da conjugação do interesse político a nível nacional e da influência de organismos supranacionais, principalmente da União Europeia e da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) (CAVACO, 2009).

A União Europeia e a UNESCO, através da perspectiva política da Aprendizagem ao Longo da Vida, a partir da segunda metade dos anos 1990, têm difundido a importância estratégica da educação de adultos para a promoção do desenvolvimento econômico e da paz social (CANÁRIO, 1999; CAVACO, 2009; LIMA; GUIMARÃES, 2011, 2018; GUIMARÃES; ANTUNES, 2014). As orientações políticas sobre a Aprendizagem ao Longo da Vida contribuíram para uma “Agenda Globalmente Estruturada para a Educação” (DALE, 2004), com a capacidade de influenciar as políticas públicas de educação a nível mundial. Desse modo, a perspectiva da Aprendizagem ao Longo da Vida originou um paradoxo. Por um lado, incentivou o investimento em políticas públicas de educação de adultos. Por outro, estimulou a instrumentalização da educação ao serviço do desenvolvimento econômico.

No período em análise, as políticas públicas de educação de adultos, em Portugal, foram influenciadas pela perspectiva da Aprendizagem ao Longo da Vida, o que justifica a presença do paradoxo anteriormente mencionado (CAVACO, 2009, 2013). O investimento em políticas públicas de educação de adultos tem sido entendido como estratégico para potencializar o desenvolvimento econômico do país, o que originou a adoção de medidas baseadas em lógicas instrumentalizadas e redutoras (CAVACO, 2009, 2013; LIMA; GUIMARÃES, 2018). Concomitantemente, esse investimento permitiu a implementação de medidas de educação de adultos inovadoras, originando uma grande adesão de adultos pouco escolarizados e o aumento da visibilidade social deste domínio de intervenção. Assim, as políticas públicas de educação de adultos foram permeadas por contradições, devido à presença de lógicas distintas.

Esta análise apresenta a síntese de uma investigação sobre políticas e práticas de educação de adultos em Portugal (CAVACO, 2009), baseada em recolha documental (legislação e estatísticas oficiais), em entrevistas semiestruturadas com coordenadores e educadores envolvidos nas medidas políticas e em entrevistas biográficas com adultos pouco escolarizados, certificados através dessas práticas. A análise incidiu nos elementos de inovação e nos desafios das seguintes medidas: i) criação e funcionamento de estruturas organizacionais responsáveis pelo diagnóstico e orientação de adultos pouco escolarizados; ii) organização e funcionamento de cursos de educação e formação de adultos; iii) concepção e implementação do processo de reconhecimento, validação e certificação de competências1. Surgidas nos anos 2000 e ainda vigentes, as três medidas que são objeto de análise visam aumentar a qualificação escolar e profissional de adultos pouco escolarizados.

O texto está organizado em três partes. A primeira explicita o enquadramento das políticas públicas de educação de adultos em Portugal. A segunda analisa as inovações e os desafios inerentes às estruturas organizacionais responsáveis pelo diagnóstico e orientação de adultos pouco escolarizados. A terceira destaca as inovações e os desafios do processo de reconhecimento, validação e certificação de competências. Por fim, a quarta parte foca a análise de inovações e desafios subjacentes aos cursos de educação e formação de adultos.

Qualificação de adultos pouco escolarizados

A reduzida escolaridade da população portuguesa tem se destacado como uma fragilidade do país, e está associada à interdependência de múltiplos fatores - políticos, sociais, econômicos, religiosos e culturais (REIS, 1993; RAMOS, 1998; CAVACO, 2002; MELO, 2012). O problema da baixa escolaridade da população ganhou expressão no discurso político, em grande medida, devido à preocupação com a imagem do país no exterior e às possíveis consequências no desenvolvimento econômico (NÓVOA, 1992). Além disso, desde 1970, os sucessivos governos têm sido pressionados, por organismos supranacionais, como a UNESCO e União Europeia, para implementar medidas que promovam o aumento da escolaridade da população portuguesa, nomeadamente dos adultos. Nesse contexto específico emergiram e têm sido implementadas medidas integradas em políticas públicas de educação de adultos, centradas nos adultos pouco escolarizados. Os baixos níveis de escolaridade são particularmente notórios quando se estabelece comparação com outros países da União Europeia. Nas últimas duas décadas, os níveis de escolaridade da população aumentaram, todavia os valores continuam ainda muito distantes dos registados nos países restantes, pois apenas 55% da população portuguesa possui o ensino secundário e/ou superior, sendo a média da União Europeia de 75% (EUROSTAT, 2020).

As práticas educativas enquadradas nas políticas públicas de educação de adultos em Portugal, entre 1976 e 1999, caracterizaram-se, essencialmente, pela escolarização de adultos (CANÁRIO, 1999; LIMA, 2008; CAVACO, 2009), obedecendo a uma lógica de segunda oportunidade, numa “tentativa funcionalista de compensar os fracassos da educação formal” (ALVES et al., 2016, p. 158) de crianças e jovens. O ensino recorrente, principal medida de alfabetização e de educação de base de adultos, baseou-se numa concepção de “educação bancária” (FREIRE, 1972). Os formadores envolvidos, no geral, não tinham formação específica para trabalhar com adultos. O ensino recorrente passou a ser frequentado, progressivamente, por jovens com insucesso e/ou que abandonaram a escola precocemente. Estes problemas justificavam a reduzida adesão e a elevada evasão de adultos não escolarizados e pouco escolarizados nas práticas de alfabetização e de educação de base. Nesse período temporal, as políticas públicas de educação de adultos foram fragmentadas, porquanto consideravam apenas determinado tipo de intervenção - ora a alfabetização e a educação de base, ora a formação profissional. Durante esse período, embora os adultos apresentassem níveis de escolaridade muito reduzidos, a educação de adultos teve um “estatuto de menoridade” (MELO et al., 1998, p. 36), no âmbito das políticas públicas.

Com a emergência e a difusão da perspectiva da Aprendizagem ao Longo da Vida, em 1995, pela União Europeia, e a partir de 1997, pela UNESCO, estruturou-se uma “Agenda Global” para a educação, que tem influenciado, de modo determinante, as políticas públicas de educação de adultos em Portugal (CANÁRIO, 1999; CAVACO, 2009; LIMA; GUIMARÃES, 2011, 2018; GUIMARÃES; ANTUNES, 2014). Concomitantemente, em 1996, o estudo nacional sobre a literacia destacou os baixos níveis de literacia da população portuguesa, entre os 15 e os 64 anos (BENAVENTE et al., 1996). Nesse contexto, entre 1995 e 2002, os XIII e XIV Governos Constitucionais consideraram a educação como a principal prioridade de intervenção. Nesse enquadramento, foi elaborado um documento de estratégia para o desenvolvimento da educação de adultos (MELO et al., 1998), por especialistas do campo, defensores de políticas públicas integradas, contínuas e com potencial de mobilização dos designados “não públicos” (MELO, 2004, p. 13).

O plano estratégico para o desenvolvimento da educação de adultos definiu um conjunto de princípios de base (MELO et al., 1998). Esses princípios de base reforçam a importância de um orçamento específico, de uma estrutura central dedicada à educação de adultos, da criação e consolidação de redes territoriais com intervenção local, do envolvimento da sociedade civil, da formação dos educadores de adultos, do carácter integrado e diversificado das medidas, da comunicação e divulgação, assim como dos métodos de intervenção. O plano estratégico adotou uma visão ampla e integrada da educação de adultos, com o objetivo de salvaguardar os direitos ao acesso e ao sucesso educativo, orientados pela finalidade do desenvolvimento humano. Este plano estratégico fundou as bases para a política pública de educação de adultos em Portugal nas últimas duas décadas, nomeadamente para a emergência das três medidas objeto de análise neste texto - o diagnóstico e a orientação de adultos pouco escolarizados, os cursos de educação e formação de adultos, e o processo de reconhecimento, validação e certificação de competências.

Entre 2000 e 2020, as políticas públicas de educação de adultos focaram-se, essencialmente, no aumento da qualificação de adultos pouco escolarizados, ou seja, que não concluíram a escolaridade obrigatória2. Em 2001, os adultos pouco escolarizados representavam 63% da população residente no país (INSTITUTO NACIONAL DE ESTATÍSTICA, 2002). Os cursos de educação e formação de adultos, o processo de reconhecimento, validação e certificação de competências, e os Centros responsáveis pelo diagnóstico e orientação de adultos pouco escolarizados são medidas políticas que foram implementadas entre 2000 e 2011, num registo de continuidade. Porém, entre 2012 e 2015 ocorreu uma súbita ruptura na sequência de um ciclo governativo que destruiu deliberadamente as políticas públicas de educação de adultos. Após 2016, com um outro ciclo governativo, essas medidas foram retomadas e continuam a ser implementadas na atualidade. Este fenômeno revela a dificuldade para garantir o investimento e a continuidade das políticas públicas de educação de adultos, num país onde algumas elites têm, intencionalmente, impedido a concretização do direito à educação a todos os cidadãos e promovido o “obscurantismo programado” (MELO, 2012, p. 384). Em seguida, analisam-se as três medidas anteriormente indicadas, com o objetivo de problematizar os elementos de inovações e os desafios que comportam.

Centros de reconhecimento, validação e certificação de competências

Os Centros de Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências foram criados no ano 2000, com duas missões (AGÊNCIA NACIONAL DE EDUCAÇÃO E FORMAÇÃO DE ADULTOS, 2001). Por um lado, promover o acolhimento, o diagnóstico e a orientação de adultos, com idade igual ou superior a 18 anos, sem a escolaridade obrigatória de 12 anos. Por outro, assegurar a implementação do processo de reconhecimento, validação e certificação de competências. Estes Centros foram assumindo, ao longo do tempo, diferentes designações (Centros de Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências, Centros Novas Oportunidades, Centros para a Qualificação e o Ensino Profissional e, atualmente, Centros Qualifica), na sequência de alterações governativas, situação que evidencia a descontinuidade das políticas de educação de adultos em Portugal. Estes Centros são estruturas organizacionais constituídas por uma equipe técnico-pedagógica, composta por um coordenador, técnicos de orientação, reconhecimento e validação de competências, e formadores.

Como elemento de inovação destaca-se a possibilidade de adultos pouco escolarizados contarem com o apoio de uma estrutura vocacionada para o acolhimento, o diagnóstico e a orientação. A fragmentação, a dispersão e a falta de visibilidade da oferta de educação de adultos eram obstáculos à adesão dos adultos pouco escolarizados, por isso o trabalho realizado pelos técnicos, nestes Centros, permitiu a superação desses problemas. Os técnicos reúnem informação sobre a oferta de educação de adultos disponível no território, o que lhes permite aconselhar e orientar o adulto para a solução mais adequada, após a realização de uma entrevista sobre o percurso escolar, a experiência e o projeto de vida. Os Centros de Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências estão integrados em entidades promotoras de educação de adultos, deste modo, o diagnóstico realizado permite também o ajustamento da oferta educativa, com a criação de cursos que vão ao encontro das necessidades e interesses dos adultos. Os adultos pouco escolarizados - por meio do acolhimento, do diagnóstico e da orientação - obtêm informações sobre a oferta educativa disponível no território e a que mais se adéqua ao seu perfil. O acompanhamento assegurado pelos técnicos permite aos adultos uma tomada de decisão informada e adequada, sendo isso essencial para o seu envolvimento no processo de ensino-aprendizagem. Nesta situação, os adultos são vistos como sujeitos capazes de “atribuir sentido ao que vivem, de dizer em que ponto se encontram e o que são, e para onde desejam ir” (MAELA, 2019, p. 269, tradução nossa).

A mobilização de entidades com reconhecida experiência no campo da educação de adultos na implementação desses Centros, a criação de uma rede distribuída pelo país e a promoção da formação dos educadores de adultos envolvidos são domínios de inovação muito significativos no campo em análise. Essas opções visavam contornar algumas das fragilidades sentidas no âmbito da implementação de medidas integradas em políticas públicas de educação de adultos, nomeadamente a centralização do processo por parte do Estado, o envolvimento, quase exclusivo, das escolas, a escolarização do processo, a inadequação dos espaços físicos, a rigidez de horários, a distância entre a localização das entidades promotoras e o local de residência dos adultos, e a falta de formação dos formadores de adultos (PINTO; MATOS; ROTHES, 1998). Essas fragilidades justificavam, em grande medida, a reduzida adesão dos adultos às medidas implementadas, assim como a grande expressividade do insucesso e da evasão. No sentido inverso, a centralidade dada aos Centros de Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências no acolhimento, diagnóstico e orientação dos adultos, o envolvimento de entidades com experiência de educação de adultos - com trabalho de base territorial, de proximidade e flexibilidade -, a criação de uma rede nacional e a estimulação de trabalho em parceria, assim como o investimento na formação das equipes, são fatores que contribuíram para a elevada adesão dos adultos pouco escolarizados, à oferta educativa, no período posterior a 2000. A adequação e coerência das medidas adotadas contribuíram para captar os designados “não públicos” (MELO, 2004), ou seja, os adultos pouco escolarizados que, embora reunissem condições para o acesso, não aderiam, habitualmente, a dinâmicas de educação integradas em políticas públicas.

Entre 2000 e 2010 inscreveram-se nestes Centros 1.088.316 adultos (AGÊNCIA NACIONAL PARA A QUALIFICAÇÃO, 2010), o que representou 21% dos adultos pouco escolarizados, com idade superior ou igual a 18 anos, que não possuíam a escolaridade obrigatória de 9 anos3 (INSTITUTO NACIONAL DE ESTATÍSTICA, 2002).

QUADRO 1 NÚMERO TOTAL DE ADULTOS INSCRITOS EM OFERTAS DE EDUCAÇÃO E FORMAÇÃO, ENTRE 2000 E 2017 

Níveis de Ensino Número adultos inscritos (2000-2017)
Ensino Básico 1.197.628
Ensino Secundário 908.074
Total 2.105.702

FONTE: Direção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência (2019).

Os dados oficiais confirmam a elevada adesão dos adultos pouco escolarizados às medidas integradas nas políticas públicas de educação (Quadro 1). O valor total de inscritos, entre 2000 e 2017, representa 37% dos adultos pouco escolarizados, com idade igual ou superior a 18 anos, que não possuíam a escolaridade obrigatória de 12 anos4 (INSTITUTO NACIONAL DE ESTATÍSTICA, 2012). As ofertas contempladas no Quadro 1 abrangem os cursos de educação e formação de adultos, o processo de reconhecimento, validação e certificação de competências, o ensino recorrente, as formações modulares, e os cursos de competências básicas.

No decurso de sucessivos ciclos governativos ocorreram alterações nas medidas integradas nas políticas públicas de educação de adultos, e nessa sequência surgiram alguns problemas que afetaram a atividade dos Centros de Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências. Entre 2000 e 2005 a rede de Centros foi planejada tendo em conta o número de adultos pouco escolarizados e as especificidades de cada território, no sentido de permitir a elevada adesão dos adultos, mas também o acompanhamento e a formação dos profissionais implicados. Porém, a partir de 2005, na sequência da Iniciativa Novas Oportunidades (PORTUGAL, 2005), o foco principal passou a ser a certificação em massa, para a concretização da qualificação de um milhão de adultos pouco escolarizados, até 2010. Assim, entre 2006 e 2011, deu-se um rápido e significativo aumento da rede de Centros, sem atender à complexidade e especificidade do trabalho que desenvolviam. Com “a brutal mudança de escala” (CANÁRIO et al., 2012, p. 7), surgiram alguns constrangimentos que se repercutiram no funcionamento dos Centros. Entre esses constrangimentos destacamos a competição entre os Centros na captação de adultos, a dificuldade da Agência5 responsável pela gestão e administração da rede nacional para assegurar o acompanhamento e a formação da equipe técnico-pedagógica e a diversificação de mecanismos de regulação do trabalho realizado nos Centros. Em 2007, os Centros contavam com 5.402 profissionais na equipe técnico-pedagógica, valor que duplicou em 2008 - 10.974 profissionais (AGÊNCIA NACIONAL PARA A QUALIFICAÇÃO, 2010).

O excessivo enfoque na certificação em massa originou uma grande pressão sobre as equipes dos Centros de Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências, o que se tornou evidente com a diversificação dos mecanismos de regulação relativo ao trabalho dos profissionais envolvidos. Nesta análise destacam-se duas medidas integradas nos mecanismos de regulação, estabelecidas e avaliadas pela Agência responsável pela tutela destes Centros, que passaram a condicionar o trabalho dos profissionais dos Centros: a definição de metas quantitativas e o Sistema de Informação e Gestão da Oferta Educativa e Formativa (SIGO). Assim, a Agência responsável pela tutela dos Centros passou a fazer depender a aprovação do orçamento destas estruturas da execução de metas quantitativas, como o número de adultos inscritos, o número de adultos encaminhados e o número de adultos certificados. Este organismo central, com competências de gestão e administração da rede nacional de Centros, através da imposição e da pressão, descurou a complexidade e a especificidade do trabalho realizado por estes profissionais. Deste modo, as equipes (re)organizaram-se como entenderam, de acordo com a sua experiência e o seu voluntarismo, o que comprometeu, em alguns casos, a qualidade do trabalho realizado com os adultos. Sem capacidade para realizar visitas de acompanhamento, a Agência responsável pela gestão e administração da rede de Centros investiu num Sistema de Informação e Gestão da Oferta Educativa e Formativa (SIGO), para a regulação do trabalho das equipes dos Centros, à distância e, quase, em tempo real. Deste modo, podemos considerar o sistema de informação e de gestão da oferta um mecanismo das novas formas de regulação, designadas de “pós-burocráticas” (BARROSO, 2006; MAROY, 2008; FERREIRA; ARANDA; PEREIRA, 2020). Este mecanismo de regulação provocou um excesso de trabalho administrativo e uma perda de tempo considerável para as equipes técnico-pedagógicas, diminuindo a sua disponibilidade para as funções principais - acolhimento, diagnóstico, orientação, assim como para a realização do processo de reconhecimento e validação de competências. Os constrangimentos identificados contribuíram para a progressiva falta de confiança e de credibilidade do trabalho realizado pelos profissionais destes Centros.

Processo de reconhecimento e validação de competências - a valorização da experiência

O processo de reconhecimento e validação de competências (AGÊNCIA NACIONAL DE EDUCAÇÃO E FORMAÇÃO DE ADULTOS, 2001) surgiu no ano 20006 em Portugal. O reconhecimento e a validação visam a atribuição de um certificado académico ou profissional, através da comparação entre os saberes e as capacidades adquiridas pelo adulto, por meio da experiência de vida, e os referenciais da formação escolar e profissional. O processo de reconhecimento e validação de competências é alicerçado em dois pressupostos. O primeiro pressuposto consiste na ideia de que a experiência de vida tem um potencial de aprendizagem; o segundo pressuposto reside na ideia de que as aprendizagens resultantes da experiência de vida podem ser reconhecidas e validadas, através de processos que visam a obtenção de uma certificação escolar ou profissional. Estes pressupostos estão na base da inovação do processo, mas, em simultâneo, também justificam a sua complexidade (CAVACO, 2009). Ou seja, estas “duas ideias simples inerentes ao reconhecimento de adquiridos colocam problemas complexos” (PINEAU, 1997, p. 12, tradução nossa), porquanto provocaram uma “onda de choque” (MERLE, 2005, p. 61, tradução nossa) e uma “revolução” (JOBERT, 2005, p. 9, tradução nossa) na sociedade, em geral, e, em particular, nos organismos promotores das políticas públicas de educação de adultos. Em Portugal, este processo destaca-se por introduzir alguns domínios de inovação, tais como, aumentar a qualificação escolar e profissional de adultos pouco escolarizados através da valorização dos saberes adquiridos por meio da experiência de vida, o recurso à abordagem biográfica, e o acompanhamento dos adultos. A valorização da experiência do adulto decorre de um dos pressupostos de base deste processo - o reconhecimento do potencial educativo da experiência de vida (CAVACO, 2009; DOMINICÉ, 2019). Este domínio de inovação desencadeia outros elementos inovadores e origina também os maiores desafios e dificuldades subjacentes ao processo. O processo de reconhecimento e validação de competências é complexo, porque pretende atribuir um valor acadêmico aos saberes resultantes da experiência de vida. Para tal, é necessário garantir a explicitação da experiência e dos adquiridos experienciais e, em simultâneo, estabelecer a comparação entre esses adquiridos experienciais e os elementos que constam nos referenciais de competências-chave que orientam este processo. Para tornar possível a explicitação dos adquiridos experienciais, o adulto tem de aceder a saberes que nem sempre são conscientes e passíveis de enunciação. O processo é ainda mais difícil quando o adulto desvaloriza os seus saberes, pois o heterorreconhecimento (reconhecimento realizado pelo outro) fica comprometido quando o autorreconhecimento (reconhecimento de si próprio) não ocorre (RICOEUR, 2004). Além disso, os referenciais de competências-chave remetem para conteúdos disciplinares, ou seja, saberes acadêmicos, o que torna difícil a comparação com os adquiridos experienciais. Os saberes resultantes da experiência são contextualizados, singulares e difíceis de enunciar. Ao contrário, os saberes acadêmicos são descontextualizados, generalizáveis e apresentados em forma de enunciado. Os desafios e dificuldades inerentes ao processo resultam, precisamente, da necessidade de comparar saberes com naturezas distintas e especificidades (CAVACO, 2009).

O recurso à abordagem biográfica é um elemento de inovação do processo de reconhecimento e de validação de competências. O adulto elabora um portfólio no qual apresenta, entre outros elementos, uma narrativa biográfica, focada nos momentos significativos da sua vida - no plano pessoal, familiar, escolar, profissional e social -, assim como nos saberes adquiridos ao longo da vida. A abordagem biográfica implica o adulto num processo de “biografização” (DELORY-MOMBERGER, 2019), caraterizado pela reflexão, rememoração, atribuição de sentido, apropriação da experiência e do processo de formação. Deste modo, a elaboração da narrativa biográfica permite aceder aos adquiridos experienciais do adulto, o que é essencial para concretizar o reconhecimento e a validação de competências, mas que, concomitantemente, desencadeia um processo de formação do adulto implicado. Esta dimensão de inovação é estruturante do processo de reconhecimento e validação de competências, porquanto permitiu transformar um processo certificação num processo de formação, com contributos significativos na vida dos adultos implicados (CAVACO, 2009). Todavia, a elaboração da narrativa biográfica é um processo delicado e difícil para os adultos, exigindo acompanhamento e adequada formação técnica, humana e ética da equipe dos Centros.

O acompanhamento é um elemento de inovação fundamental no reconhecimento e validação de competências, no sentido em que permite a superação ou a minimização das dificuldades sentidas pelo adulto. O acompanhamento realizado pelo técnico de orientação, reconhecimento e validação de competências possibilita, por um lado, o estabelecimento de uma relação de confiança, por outro lado, o esclarecimento e apoio necessários para que o adulto compreenda a lógica e os procedimentos inerentes ao processo. Este acompanhamento é personalizado e pretende promover o processo reflexivo, de explicitação e de escrita que o adulto realiza na elaboração da narrativa biográfica, focada no seu percurso de vida e no processo de formação. Além disso, o acompanhamento permite desencadear uma relação dialética entre o heterorreconhecimento e o autorreconhecimento, imprescindível num processo desta natureza realizado por adultos pouco escolarizados. Neste caso, o acompanhamento é “um dispositivo relacional” (MAELA, 2019, p. 269, tradução nossa) centrado na escuta, no diálogo e na colaboração, que pretende desenvolver a autonomia, a implicação, a reflexão e o reconhecimento do sujeito. A essência relacional do acompanhamento envolve princípios éticos determinantes na postura profissional do técnico de orientação, reconhecimento e validação de competências, o que reforça a importância da sua formação, alicerçada na promoção de uma vigilância crítica permanente (CAVACO, 2009).

QUADRO 2 NÚMERO DE ADULTOS INSCRITOS E CERTIFICADOS NO PROCESSO DE RECONHECIMENTO E VALIDAÇÃO DE COMPETÊNCIAS, ENTRE 2000 E 2017 

2000-2017 Número de adultos
Inscritos 997.535
Certificados 507.488

FONTE: Agência Nacional para a Qualificação (2010), Portugal (2018), Direção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência (2019).

O processo de reconhecimento e validação de competências captou 47% dos adultos pouco escolarizados que aderiram a medidas integradas nas políticas públicas de educação de adultos no período em análise, o que indicia uma forte adesão (Quadro 2). Nesse período, a taxa de certificação foi de 51%, ou seja, apenas metade dos adultos inscritos conseguiram terminar o processo, aumentando o seu nível de escolaridade ou de qualificação profissional. Ou seja, 49% dos adultos inscritos não obtiveram certificação, o que pode ser justificado pela inadequação do perfil do adulto ao processo, mas também pela complexidade destacada anteriormente.

Cursos de educação e formação de adultos - qualificação escolar e profissional

Os cursos de educação e formação de adultos (AGÊNCIA NACIONAL DE EDUCAÇÃO E FORMAÇÃO DE ADULTOS, 2001) visam aumentar a qualificação escolar e profissional de adultos pouco escolarizados. As entidades com experiência de trabalho no campo da educação de adultos7 assumiram a implementação deste tipo de oferta, caraterizada por “uma configuração curricular original e permitindo o acesso a uma dupla certificação” (CANÁRIO et al., 2012, p. 7). Através da análise realizada, considera-se que os elementos de inovação dos cursos de educação e formação de adultos decorrem de múltiplos fatores, tais como: a dupla qualificação, escolar e profissional; a flexibilidade curricular; o processo de reconhecimento e validação de competências; a transversalidade assegurada pelos temas de vida; e o papel do mediador pessoal e social.

Os cursos de educação e formação de adultos são estruturados numa lógica de dupla qualificação - escolar e profissional -, que permite, em simultâneo, atenuar dois problemas da população adulta portuguesa: os baixos níveis de escolaridade e de qualificação profissional. Assim, numa mesma medida uniram-se duas dimensões - a educação de base e a formação profissional -, que até ao momento eram implementadas separadamente, no decurso de “políticas fragmentadas” (LIMA, 2008; ALVES et al., 2016). Estes cursos visam assegurar o direito à educação aos adultos pouco escolarizados, através de uma formação humana integral. Nesse sentido, a dupla qualificação pode contribuir para “processos educativos que dilatem a autonomia de cada educando e os transformem em sujeitos ativos na construção de novas relações sociais” (FRIGOTTO, 2013, p. 400).

Entre os elementos de inovação dos cursos, destaca-se a estrutura curricular flexível, estruturada em módulos de curta duração, para facilitar a adaptação ao perfil de cada adulto e possibilitar a realização de percursos diferenciados. A flexibilidade curricular associa-se também a uma lógica de transversalidade, assegurada por meio do tema de vida, definido de forma coletiva entre os adultos e os formadores. A estruturação do ensino-aprendizagem a partir do tema de vida permite o desenvolvimento de processos educativos significativos para os adultos, baseados nos seus interesses e focados na atribuição de sentido. A organização do processo de ensino-aprendizagem em torno do tema de vida possibilita a superação do modelo escolar tradicional, baseado na revelação, na exterioridade e na cumulatividade (CANÁRIO, 2005). Assim, podem emergir práticas educativas promotoras da apropriação e da construção de saber, da continuidade entre a experiência dos adultos e os conteúdos curriculares, e da contextualização que permita valorizar a singularidade de cada sujeito, assim como as dinâmicas coletivas (CAVACO, 2009). Esta abordagem pedagógica baseada na transversalidade requer um trabalho articulado entre os elementos da equipe pedagógica - coordenador, mediador e formadores - que exige disponibilidade e implicação no trabalho coletivo, o que nem sempre é garantido. A inovação estimula nos formadores as capacidades de “esquecer” e “desaprender” (JOSSO, 2008), necessárias ao estabelecimento de rupturas e ao ensaio de novos modos de trabalho pedagógico, centrados na experiência, na resolução de problemas, no trabalho coletivo e na aprendizagem dos formandos.

A integração de um processo de reconhecimento e validação de competências do adulto nestes cursos é um domínio de inovação desde logo muito relevante, porque tem subjacente a permissa de que o adulto em formação é portador de uma história de vida, de experiências, de saberes e de capacidades, passíveis de serem valorizadas na formação. Este processo, realizado no início do curso, é baseado no portfólio reflexivo de aprendizagem, que integra uma narrativa biográfica elaborada pelo adulto, com a explicitação do seu percurso de vida e do processo de formação. Deste modo, a equipe técnico-pedagógica responsável pelo curso consegue identificar os saberes que o adulto adquiriu, ao longo da vida, e definir um processo de formação ajustado ao seu perfil. Esta inovação bastante pertinente do ponto de vista dos princípios da educação de adultos, fundamentada na valorização da experiência e dos saberes dos adultos (CAVACO, 2009; DOMINICÉ, 2019), introduziu complexidade nos cursos de educação e formação de adultos, de tal modo que não permitiu a definição de processos de formação à medida de cada adulto, como era sua finalidade. A rigidez nas regras de financiamento das entidades promotoras e da bolsa de formação atribuída aos formandos foram os principais obstáculos à materialização deste elemento de inovação, uma vez que, em ambos os casos, os valores financeiros são atribuídos em função do número de formandos e das horas de formação frequentada.

Por fim, outro elemento de inovação reside na figura do mediador, que desempenha um conjunto diversificado de funções - participa no processo de recrutamento e seleção dos formandos, coordena a equipe pedagógica, promove a articulação entre a equipe pedagógica e os formandos, garante o acompanhamento e orientação dos formandos, promove o módulo Aprender com Autonomia e o portfólio reflexivo de aprendizagem. Neste caso, os mediadores promovem um processo de “acompanhamento” (JOSSO, 2008, p. 119) dos adultos, contribuindo para a sua implicação no processo de aprendizagem e para (re)configurar a relação dos adultos com o saber (LAFFIN, 2007), assumindo-se como educadores de adultos. Para o exercício das funções nestes cursos, os mediadores precisam de adequada formação nos domínios “técnico, pessoal e relacional” (SILVA; MUNUERA, 2020, p. 3), caso contrário as inovações associadas à sua intervenção ficam comprometidas.

Os dados quantitativos comprovam a importância dos cursos de educação e formação de adultos, integrados nas políticas públicas em Portugal, pois esta medida captou 27,6% do total de adultos pouco escolarizados, inscritos em ofertas de educação e formação no período em análise (Quadro 3). A taxa de certificação é de 32%, ou seja, apenas um terço dos inscritos conseguiu terminar o curso e aumentar o seu nível de escolaridade e/ou de qualificação profissional. Este valor é baixo, indicando problemas de insucesso e de evasão, que nos fazem refletir sobre a (in)capacidade de concretização dos elementos de inovação dos cursos de educação e formação de adultos.

QUADRO 3 NÚMERO DE ADULTOS INSCRITOS NOS CURSOS DE EDUCAÇÃO E FORMAÇÃO DE ADULTOS (CURSOS EFA) 

Cursos de Educação e Formação de Adultos (2000-2017) Número de adultos
Inscritos 582.066
Certificados 186.730

FONTE: Direção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência (2019).

A emergência de inovações nos processos de ensino-aprendizagem, embora possa ser impulsionada, não ocorre por via de orientações políticas e de imposições normativas. As inovações são processos complexos, dependentes de fatores políticos, organizacionais, financeiros e humanos. Nos cursos de educação e formação de adultos, os domínios de inovação nem sempre foram passíveis de concretização devido à rigidez e à inadequação das regras de financiamento dos cursos e de atribuição de bolsas aos formandos, mas também devido a problemas de formação e de acompanhamento das equipes técnico-pedagógicas. No geral, os elementos de inovação dos cursos de educação e formação de adultos visavam superar a escolarização do processo educativo de adultos, através da valorização da sua experiência, de modos de trabalho pedagógico alternativos ao transmissivo, da flexibilidade e transversalidade curricular, e do acompanhamento pelo mediador. Apesar dos desafios e das dificuldades, as equipes técnico-pedagógicas e os adultos fazem um balanço muito positivo destes cursos, porquanto permitem a valorização da experiência de vida e dos saberes dos adultos, mas também desencadeiam “novos saberes e heranças culturais no sentido de promover maior compreensão sobre o mundo em que se vive” (LAFFIN, 2007, p. 105).

Conclusão

A reduzida escolaridade da população portuguesa, embora considerada problemática, não deu lugar a um forte investimento em políticas públicas de educação de adultos durante o século XX. Porém, a análise das medidas integradas em políticas públicas de educação de adultos em Portugal, nas últimas duas décadas, permite-nos afirmar que este período temporal foi caraterizado por uma certa continuidade de orientações políticas, com consequências positivas na centralidade e visibilidade do campo da educação de adultos e no envolvimento de um número significativo de adultos pouco escolarizados. A continuidade e o investimento nas políticas públicas de educação de adultos, no período em análise, justificam-se, essencialmente, pela influência da perspectiva da Aprendizagem ao Longo da Vida emanada pela União Europeia e pela UNESCO. Além disso, também se justificam com a existência do documento de estratégia para o desenvolvimento da educação de adultos em Portugal, que definiu um rumo para este campo - norteado pela defesa de políticas públicas integradas, diversificadas, contínuas, inovadoras, mobilizadoras da sociedade civil e dos adultos pouco escolarizados. A influência da “Agenda Globalmente Estruturada para a Educação” (DALE, 2004) justifica também a presença de um paradoxo, que marca a implementação das políticas públicas de educação de adultos no período em análise. Por um lado, emergiram medidas inovadoras, capazes de mobilizar os adultos pouco escolarizados. Por outro, foram norteadas para finalidades demasiado redutoras, que instrumentalizaram a educação de adultos ao serviço do desenvolvimento econômico. Esta situação justifica as contradições e o aumento da complexidade verificados na implementação das medidas.

Os Centros de orientação, reconhecimento e validação de competências, os cursos de educação e formação de adultos e o processo de reconhecimento e validação de competências são medidas integradas em políticas públicas de educação de adultos caraterizadas por inovações, o que justifica, em grande medida, a elevada adesão de adultos pouco escolarizados, acontecimento inédito na história do país. Os domínios de inovação contribuíram para a captação dos designados “não públicos” (MELO, 2004), através da orientação para as ofertas mais adequadas em função do seu perfil, do desenvolvimento de práticas pedagógicas valorizadoras da experiência e adequadas aos adultos - numa lógica de transversalidade de áreas do saber, conjugando qualificação escolar e profissional - e do acompanhamento de educadores de adultos. Além disso, o investimento em redes territoriais para assegurar a proximidade do local de residência dos adultos e o envolvimento de entidades promotoras com experiência na educação de adultos também justifica a elevada adesão de adultos pouco escolarizados.

Os elementos de inovação também estão na origem da complexidade e da dificuldade de implementação de tais medidas, o que reforça a importância da formação e do acompanhamento dos profissionais comprometidos na sua implementação. Estas medidas, integradas numa estratégia de “aposta educativa na participação de todos” (MELO et al., 1998, p. 3), afirmaram-se nas últimas duas décadas com um potencial gerador de igualdade de oportunidades no acesso e no sucesso educativo. Assim, devido ao seu caráter inovador, apesar de enquadradas e influenciadas pela perspectiva da Aprendizagem ao Longo da Vida, estas medidas têm sido importantes para a “qualidade da educação que interessa à classe trabalhadora” (FRIGOTTO, 2013, p. 389). Isso tem se configurado decisivo, porquanto o direito à educação lhes foi negado durante a infância e juventude. Deste modo, as medidas integradas em políticas de educação de adultos têm sido determinantes para a justiça social, como tal necessárias para a construção de uma sociedade democrática, mais justa e equitativa.

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1No texto, optamos por manter a designação do processo como surge nos documentos oficiais, todavia, consideramos mais adequado o uso da designação “reconhecimento, validação e certificação de adquiridos experienciais”, porque o processo, para além da análise de competências, também incide na análise de saberes, de saberes-fazer e de saberes-ser, resultantes da experiência de vida. Os adquiridos experienciais são o conjunto de saberes e de capacidades desenvolvidas ao longo da vida, através da experiência.

2Até 2007 a escolaridade obrigatória era o ensino fundamental (9º ano), e a partir de então passou a ser o ensino médio (12º ano).

3Os Censos 2001 registaram 5.236.821 adultos pouco escolarizados (INSTITUTO NACIONAL DE ESTATÍSTICA, 2002).

4Os Censos 2011 registaram 5.692.238 adultos pouco escolarizados (INSTITUTO NACIONAL DE ESTATÍSTICA, 2012).

5O organismo público responsável pela tutela dos Centros de Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências teve diversas designações entre o ano 2000 e a atualidade - Agência Nacional de Educação e Formação de Adultos, Direção-Geral de Formação Vocacional, Agência Nacional para a Qualificação, Agência Nacional para a Qualificação e o Ensino Profissional.

6Este processo tem sido implementado na rede de Centros de Reconhecimento, Validação e Certificação de Competências, atualmente designados Centros Qualifica, por meio de uma equipe composta por um coordenador, por técnicos de orientação, reconhecimento e validação de competências e por formadores.

7Associações de desenvolvimento local, centros de formação e escolas.

Recebido: 19 de Julho de 2021; Aceito: 26 de Setembro de 2021

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Traduit par Bethânia Negreiros Barroso. E-mail: bethania.negreiros@ufsc.br

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