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Educar em Revista

versão impressa ISSN 0104-4060versão On-line ISSN 1984-0411

Educ. Rev. vol.38  Curitiba  2022  Epub 03-Mar-2022

https://doi.org/10.1590/0104-4060.82090 

DOSSIÊ - Educação de Jovens e Adultos: políticas e processos educativos democráticos

Políticas Públicas de/para a Educação de Jovens e Adultos: um balanço de artigos publicados no Portal de Periódicos CAPES

Gilvanice Barbosa da Silva Musial* 
http://orcid.org/0000-0002-0597-8150

Jurandir de Almeida Araújo* 
http://orcid.org/0000-0002-2688-4858

*Universidade Federal da Bahia. Salvador, Bahia, Brasil. E-mail: gilvanice.musial@ufba.br; juran-araujo@hotmail.com


RESUMO

Este artigo, parte de uma pesquisa maior, intitulada Fundamentos e autores recorrentes do campo da Educação de Jovens e Adultos no Brasil: a construção de um glossário eletrônico, tem como objetivo apresentar um balanço das publicações sobre Políticas Públicas de/para Educação de Jovens e Adultos (EJA) no Brasil, tendo como base de informação o Portal de Periódicos da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). De abordagem qualitativa de tipo bibliográfico, com inspiração nas pesquisas de Estado do Conhecimento, como definido por Romanowski e Ens (2006), do ponto de vista teórico, dialoga com o conceito de política pública a partir de Souza (2006), Teixeira (2002) e Mainardes (2018). Em linhas gerais, o estudo revelou a complexidade que envolve a análise das políticas públicas de/para a EJA, em decorrência das nuances e multiplicidades de categorias e temas associados.

Palavras-chave: Políticas Públicas; Educação de Jovens e Adultos; Políticas Públicas de Educação de Jovens e Adultos

ABSTRACT

This article, part of a larger research entitled Fundaments and recurrent authors in the field of Youth and Adult Education in Brazil: the construction of an electronic glossary, aims at presenting a review of publications on Public Policies of/for Youth and Adult Education (YAE) in Brazil, with Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior [Coordination for the Improvement of Higher Education Personnel] (CAPES) Journals Portal as information base. The research applies a qualitative, bibliographic approach and type of the State of Knowledge type as defined by Romanowski and Ens (2006), and dialogues, from theoretical point of view, with the concept of public policy by Souza (2006), Teixeira (2002) and Mainardes (2018). In broadly terms, the study revealed the complexity that involves the YAE public policies analysis, due to the nuances and categories multiplicity, further associated themes.

Keywords: Public Policies; Youth and Adult Education; Youth and Adult Education Public Policies

Introdução

A Educação de Jovens e Adultos (EJA) é uma modalidade da Educação Básica que busca atender as demandas de pessoas jovens e adultas que não tiveram acesso à escola, ou não concluíram essa etapa da escolaridade na idade correspondente. Ela é uma modalidade de ensino que tem ocupado lugar secundário nas políticas educacionais, tanto do ponto de vista do financiamento quanto da formação de professores, da produção de materiais didáticos apropriados e, sendo um campo em consolidação, é aberto para todo cultivo, como ressalta Arroyo (2006). Desde a Constituição Federal de 1988, essa modalidade de ensino se constitui como direito público subjetivo, adquirindo funções reparadora, equalizadora e qualificadora desde as Diretrizes Curriculares Nacionais, em 2000 (BRASIL, 2000). A análise dos artigos publicados nos periódicos do Portal da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) dos últimos 20 anos (2000-2019), evidencia que, embora com algumas limitações conceituais e metodológicas, houve avanços importantes no campo das políticas públicas de/para EJA, principalmente a partir dos anos 2000.

No entanto, cabe destacar que, nos últimos anos, vem ocorrendo rupturas nos avanços que vinham ocorrendo no campo das políticas públicas voltadas para EJA. Uma primeira ruptura pode ser notada com a aprovação da Emenda Constitucional nº 95/2016, que estabelece um teto dos gastos públicos por 20 anos (BRASIL, 2016), e que tem impactado fortemente o financiamento da Educação. Mais recentemente, a implementação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), que orienta a elaboração do currículo das unidades escolares da Educação Básica, pode ser considerada outra ruptura, pois não apresentava diretrizes para a educação de jovens e adultos (BRASIL, 2017). Com a eleição de Jair Messias Bolsonaro, que assumiu a presidência da República em 2019, não houve nenhuma proposta para essa modalidade de ensino, ao contrário: no seu primeiro mês de governo, a Secretaria de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão (SECADI) foi extinta, e dentre outras modalidades, ela era responsável pela EJA. Em substituição à SECADI, foram criadas a Secretaria de Alfabetização e a Secretaria de Modalidades Especializadas da Educação. Contudo, já transcorrido mais da metade do seu período de governo, e substituição de três ministros da educação, não há qualquer proposição mais consistente para o fortalecimento da educação de jovens e adultos em uma perspectiva emancipatória, democrática e como direito. Ao invés disso, foi aprovada a Resolução nº 1, de 28 de maio de 2021, que institui Diretrizes Operacionais para a Educação de Jovens e Adultos nos aspectos relativos ao seu alinhamento à Política Nacional de Alfabetização (PNA) e à Base Nacional Comum Curricular (BNCC), e Educação de Jovens e Adultos a Distância (BRASIL, 2021). A construção do referido documento recebeu críticas contundentes da comunidade acadêmica, representada pelo do GT18 - Educação de Pessoas Jovens e Adultas da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPEd), pelo modo pouco dialogado com que foi construído, bem como pela concepção de Educação de Jovens e Adultos distante da perspectiva democrática, emancipatória e inscrita no campo do direito (ANPEd, 2020; BRASIL, 2021).

Conforme a análise da Ação Educativa, associação civil sem fins lucrativos que atua nos campos da educação, da cultura e da juventude, na perspectiva dos direitos humanos, quando cumpridos, à época, os 100 primeiros dias do governo Bolsonaro, registra várias incertezas para a Educação de Jovens e Adultos. Para além da extinção da SECADI, que era responsável pelo desenvolvimento das ações para a EJA, também foi extinta a Comissão Nacional de Alfabetização e Educação de Jovens e Adultos (CNAEJA), que reunia representantes dos movimentos sociais e da sociedade civil para assessoria junto ao Ministério da Educação (MEC) (AÇÃO EDUCATIVA, 2019).

Diante do exposto, faz-se necessária uma revisão acerca da produção acadêmica sobre Políticas Pública de/para a Educação de Jovens e Adultos, de modo que possamos refletir sobre os impactos, desafios e rupturas dessas políticas. Nesta perspectiva, o presente artigo tem como objetivo apresentar um balanço das publicações sobre Políticas Públicas de/para Educação de Jovens e Adultos no Brasil1, tendo como base de informação o Portal de Periódicos CAPES.

Cabe ressaltar, no entanto, que o termo Políticas Públicas, por ser um tema de estudo que engloba diferentes áreas da ciência, como as Ciências Sociais Aplicadas, Ciência Política, Economia e Ciência da Administração Pública, e que abrange diversificados pontos de vista teórico-conceituais e análises metodológicas, configura-se como expressão que apresenta múltiplas nuances, conceitual e teórica, e em constante ressignificação (SOUZA, 2006; DIAS; MATOS, 2012). Portanto, não se restringe apenas a um conceito único. Assim, neste estudo, optamos por utilizar o conceito de Políticas Públicas apresentado por Teixeira (2002), pois, na nossa concepção, é o que melhor atende as fundamentações teórico-metodológicas das produções acadêmicas que abordam políticas públicas e educação de jovens e adultos, e políticas públicas de/para a EJA analisadas. A razão é que essas produções estão centradas em leis e decretos que as instituem, e como se desdobram em sua efetivação, por meio de projetos, programas, campanhas e outros. Segundo o referido autor,

“Políticas Públicas” são diretrizes, princípios norteadores de ação do Poder Público; regras e procedimentos para as relações entre Poder Público e sociedade, mediações entre atores da sociedade e do Estado. São, nesse caso, políticas explicitadas, sistematizadas ou formuladas em documentos (leis, programas, linhas de financiamento) que orientam ações que normalmente envolvem aplicações de recursos públicos (TEIXEIRA, 2002, p. 3).

Destacamos que, em vista do objeto e objetivo focos deste trabalho, essa definição apresenta um alcance que possibilita analisar o conjunto de trabalhos que, em seu bojo, reflete a forma polissêmica do contexto de análise das políticas públicas no cenário de estudos e pesquisas da EJA no Brasil.

Cabe destacar, também, que no Brasil, segundo Kerstenetzky (2006), o debate sobre as políticas sociais encontra-se polarizado entre dois estilos, as políticas públicas universais e as políticas públicas focalizadas. As políticas públicas universais são aquelas pensadas e implementadas contemplando todas as pessoas, na garantia de direitos preconizados nas leis vigentes no país. Em outras palavras, são políticas que garantem igualmente, a todos os cidadãos e cidadãs, independentemente de qualquer condicionante prévia (LARIÚ, 2004), direitos previstos na legislação. As políticas focalizadas, por sua vez, podem ser definidas como aquelas voltadas para a solução de demandas e/ou problemáticas específicas de determinados indivíduos que se encontram em situação de desvantagem no acesso aos direitos básicos universais. Segundo Saraiva (2004, p. 92), são políticas “[...] desenhadas apenas para amenizar a situação de determinados indivíduos ou, então, as externalidades negativas de determinada política pública”. Sob esse ponto de vista, as políticas públicas de/para EJA encaixam-se no campo conceitual das políticas focalizadas.

Caminhos metodológicos percorridos

Para a realização da pesquisa, algumas opções2 foram selecionadas, quanto aos caminhos a serem percorridos. Assumimos a abordagem qualitativa por considerarmos que se constitui em “uma modalidade investigativa que se consolidou para responder ao desafio da compreensão dos aspectos formadores/formantes do humano, de suas relações e construções culturais, em suas dimensões grupais, comunitárias ou pessoais”, como ressaltam Gatti e André (2010, p. 30). Compreendemos que não existe neutralidade na pesquisa, e que ao longo do percurso de investigação, fazemos escolhas que precisam ser explicitadas no momento da apresentação dos resultados. Além disso, esta pesquisa é bibliográfica, inspirada nos trabalhos de “Estado do Conhecimento”, por se tratar de um estudo que aborda apenas um setor das publicações sobre o tema estudado: os artigos publicados e disponíveis no Portal de Periódicos CAPES (ROMANOWSKI; ENS, 2006, p. 39).

Na realização desta pesquisa, algumas questões se apresentaram: Quais são os temas mais estudados no campo das Políticas Públicas de/para a Educação de Jovens e Adultos? Quais autores(as) têm se dedicado ao referido tema? Quais autores(as) embasam os artigos localizados? Quais os principais conceitos mobilizados pelos autores? Qual a distribuição geográfica dessa produção, no território nacional?

No primeiro momento, foi realizada a leitura inicial dos resumos das publicações disponibilizadas nas bases de dados da plataforma Periódicos CAPES, levantados simultaneamente pela coordenação da pesquisa, sem delimitação de data inicial e final para a busca dos artigos na referida plataforma. Com a relação dos 70 artigos localizados na categoria Políticas Públicas, realizamos a busca dos ditos artigos e, em seguida, fizemos a leitura dos títulos, resumos e palavras-chave com o objetivo de verificar a pertinência dos referidos artigos na categoria. Para tanto, foram adotados os seguintes parâmetros: 1) Políticas Públicas e EJA; 2) Políticas Públicas de/para EJA; 3) Artigos que fossem resultado de pesquisas; e 4) Que se debruçassem sobre Políticas Públicas, Políticas Educacionais ou Programas e Projetos de/para Educação de Jovens e Adultos no Brasil.

Os critérios utilizados para a sistematização dos metadados ou metainformação foram: identificação dos periódicos, acrescidos de ano, cidade e estado da publicação; título do trabalho; autor(es); síntese do resumo; principais resultados encontrados; categorias e conceitos utilizados; palavras-chaves; metodologia; principais fundamentos e/ou referenciais teóricos. Tomando esses critérios como base, dos 70 artigos localizados, 35 foram descartados pelos seguintes motivos: 17 eram repetidos; 5 eram relatos de experiência; 4 tinham como foco a Educação Profissional; 2 diziam respeito à Formação de Professores; 2, ao Ensino Superior; 1 era estudo sobre Currículo da Educação Básica; 1 consistia em estudo sobre trajetórias; 1 focava a Educação do Campo; 1, o Custo-aluno Educação Básica; e 1 se tratava de uma resenha. Sendo assim, realizamos a leitura dos 35 artigos tentando construir agrupamento que tornasse inteligível a produção sobre Políticas Públicas, Políticas Educacionais e Programas de/para a Educação de Jovens e Adultos.

Em um segundo momento, com os descritores Políticas Públicas e Educação de Jovens e Adultos e Políticas Públicas de/para a Educação de Jovens e Adultos, fizemos uma nova busca no Portal de Periódicos CAPES, com o objetivo de localizar os artigos mais recentes, de 2018 e 2019, e algum que não tivesse sido capturado na primeira busca realizada pela equipe de coordenação geral da pesquisa. Nesse momento, outros 36 artigos foram localizados, e novamente realizamos a análise dos trabalhos adotando os mesmos critérios utilizados na etapa anterior. Fez-se necessário conhecer os detalhes das informações contidas nos Metadados ou Metainformação dessas publicações, buscando os devidos alinhamentos com os trabalhados que já haviam sido analisados anteriormente. Foi realizada a análise inicial das publicações a partir dos metadados disponibilizados e, quando necessário, dados abstrusos identificados nas produções. Esta análise resultou em nova depuração de informações (metadados ou metainformação) e na identificação de problemas em 6 trabalhos que foram descartados nesta etapa da pesquisa: 1 devido à publicação não estar acessível; e outros 5 por não estabeleceram nenhuma relação entre Políticas Públicas e EJA / Políticas Públicas de/para EJA. Ao final do segundo momento da pesquisa, contabilizamos 65 artigos (35 do primeiro momento e 30 do segundo), que constituíram o corpus bibliográfico para análise.

Assim, o processo de tratamento dos dados está diretamente associado a algumas definições de critérios e seleção de parte do conjunto de informações. Isto significa um posicionamento a partir do processo de escolha, decisão e definição de quais informações podem e/ou devem ser tabuladas. Para além do indicativo ou da menção feita no trabalho ou do registro nos metadados, buscou-se aprofundar, nas publicações, de forma investigativa, aquelas que adotaram como critério de análise, no decorrer do trabalho, leis, programas, projetos e campanhas voltadas para a EJA. Assim, a pretensão foi aproximarmo-nos do que foi proposto por Mainardes (2018, p. 192), a “[...] superação de análises descritivas em direção a níveis de abstração mais elevados”.

Panorama das publicações nos periódicos online CAPES

Considerando que não foi estabelecido um recorte temporal, isto é, uma delimitação de período específico para o levantamento das publicações, questiona-se: por que a discussão sobre a temática em questão começa a ser divulgada nos periódicos do Portal CAPES apenas a partir do ano de 2000? Provavelmente devido ao fato de que, até então, as publicações eram impressas, e somente a partir dos anos 2000 que algumas revistas/periódicos científicos passaram a oferecer suas publicações por meio digital. Também, devido ao fato de que somente a partir dos anos de 1990, com a ampliação das políticas neoliberais3, que se visibilizaram e aprofundaram algumas discussões em torno da EJA. Em certa medida, foi no mesmo período que os governantes começaram a ser pressionados pelos movimentos sociais para assumirem uma ação mais propositiva no contexto institucional das políticas públicas de/para a EJA, de modo a cumprir com o que preconiza a Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 2020), a educação como um direito de todas as pessoas e dever do Estado e da família.

Como resultado das análises dos metadados e metainformações, foram localizados, com a pesquisa, 65 artigos publicados em periódicos disponibilizados no Portal CAPES, no período de 2000 a 2019, que tratam sobre políticas públicas de/para EJA. Do Gráfico 1, podemos inferir algumas características importantes atinentes a este contexto das publicações. O primeiro é perceber que, mesmo diante da grande variação, nesse período de quase 20 anos, houve um aumento crescente no número de publicações sobre a temática. Uma segunda característica que nos chama atenção é sobre os anos de 2009 (6 artigos), 2010 (8 artigos) e 2019 (10 artigos), como os anos de maior concentração das publicações.

FONTE: Metadados sistematizados pelos autores (2020).

GRÁFICO 1 ANO DE PUBLICAÇÃO DOS ARTIGOS  

Não por acaso, aferimos que o contexto político-econômico-social contribuiu significativamente para a elevação do número de publicações nos anos de 2009 e 2010. Vale ressaltar que, nesse período, muitos acontecimentos possibilitaram a ampliação do debate nacional sobre a educação pública, e no bojo dessa discussão, a temática da EJA também foi favorecida pelo contexto. Entretanto, é principalmente a partir de 2004, com os governos de Luiz Inácio Lula da Silva, que foram realizadas mudanças importantes no MEC, com a criação da Secretaria de Educação Continuada Alfabetização e Diversidade (Secad) e da Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica (Setec), como destaca Machado (2018, p. 22). Também foi durante esse governo que houve a criação, no ano de 2006, do Programa Nacional de Integração da Educação Profissional com a Educação Básica na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos (Proeja), a partir do Decreto nº 5.840 de 2006 (BRASIL, 2006a). Ainda nesse período, com a criação do Grupo de Trabalho Interministerial sobre a Juventude, foi formulada uma Política Nacional de Juventude, destinada ao público de 15 a 29 anos. Em fevereiro de 2005 foi lançado o Programa Nacional de Inclusão de Jovens (Projovem), um programa emergencial que propõe articular Ensino Fundamental, qualificação profissional e Ação Comunitária, em um projeto Pedagógico Integrado, como ressaltam Rummert, Bilio e Gaspar (2017, p. 51). Destacamos, ainda, a criação do Fundo de Desenvolvimento da Educação Básica (FUNDEB), pela Lei nº 11.494/07 (BRASIL, 2007), que inclui as matrículas da EJA no cômputo do financiamento da Educação Básica, além de outros programas fortalecidos em diversas esferas da gestão pública, como o Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (PRONERA), mudanças na legislação e financiamento da educação básica, ampliação da oferta de educação profissional, e outros.

O Gráfico 1 mostra que, anteriormente ao ano de 2007, o número de publicações foi bastante reduzido, e ainda registrando a completa ausência de publicações nos anos de 2002 e 2003. A partir de 2007 observa-se um aumento gradativo nas publicações, e isso ocorre provavelmente em decorrência dos avanços no campo das políticas públicas voltadas para a EJA, como já ressaltado, com destaque para a criação do Proeja, com o Edital Proeja Capes/Setec nº 03/2006 (BRASIL, 2006b), com financiamentos público à pesquisa e à constituição de redes de pesquisadores que incluíssem a pauta da Educação Profissional Integrada à EJA. Além disso, há os Editais do Programa Observatório da Educação - OBEDUC/CAPES, que acolheram projetos de pesquisa no campo da EJA, entre outras temáticas. Os resultados das pesquisas realizadas no interior desses editais começam a aparecer nas reuniões da ANPEd a partir de 2007, nos GTs 09 - Trabalho e Educação e 18 - Educação de Pessoas Jovens e Adultas, como ressalta Machado (2018). Contudo, o crescimento expressivo no número de publicações em 2019 também sinaliza um esforço analítico dos pesquisadores em compreender os efeitos, para o campo Educação de Jovens e Adultos, dos retrocessos na área da educação a partir de 2016, com a extinção da SECADI, redução do investimento público em pesquisa e os cortes orçamentários nas universidades públicas, só para ficar em alguns exemplos.

Quanto à metodologia adotada pelos autores/pesquisadores no desenvolvimento de suas pesquisas, em primeiro lugar está a pesquisa documental, com 19 artigos; em segundo, a pesquisa qualitativa, com 13; e em terceiro, a revisão histórica, com 13 artigos.

FONTE: Metadados sistematizados pelos autores (2020).

GRÁFICO 2 ABORDAGEM METODOLÓGICA  

A metodologia não ficou clara ou não foi devidamente explicitada em um número expressivo dos artigos. Alguns a apresentam de forma superficial; outros sequer apontam a abordagem utilizada. Assim, a partir do objetivo e das categorias de análises e das informações mobilizadas, buscamos enquadrá-los em uma metodologia e/ou abordagem metodológica.

Em relação à distribuição das publicações por regiões e estados da federação, como se pode perceber, no Gráfico 3, a região Sudeste, com 32 artigos, e a região Sul, com 17, são aquelas que apresentam o maior número de publicações, seguidas da região Nordeste, com 9 artigos. A região Norte, com 5, e a Centro-Oeste, com apenas 1 artigo, são as que menos publicaram.

FONTE: Metadados sistematizados pelos autores (2020).

GRÁFICO 3 DISTRIBUIÇÃO DAS PUBLICAÇÕES POR REGIÕES 

O fato de o Sudeste e o Sul apresentarem o maior número de publicações talvez se explique pelo número de Programas de Pós-graduação em Educação nessas regiões. O Nordeste, por sua vez, que historicamente tem uma tradição de experiências e pesquisas no campo da Educação de Jovens e Adultos, aparece em terceiro lugar. Ainda há uma revista localizada na cidade de Córdoba, na Argentina. A publicação consta na lista de periódicos avaliados pela CAPES, e o artigo tratava da temática foco da pesquisa: políticas de/para a Educação de Jovens e Adultos no Brasil.

Em relação à distribuição das publicações por estados da federação (exceto um internacional, e portanto, sem vinculação), como podemos ver, no Gráfico 4, a seguir, São Paulo, com 17 artigos; e Rio de Janeiro, com 10 artigos, destacam-se. Cabe ressaltar os estados da Bahia e Santa Catarina, com 6 publicações cada; e Minas Gerais, Paraná e Rio Grande do Sul, com 5 publicações entre os anos de 2013 e 2019. No Estado da Arte realizado por Haddad et al. (2000), Rio de Janeiro e São Paulo aparecem como estados com destaque na produção de pesquisas no campo da Educação de Jovens e Adultos. Naquele momento, Haddad et al. (2000) ressaltava que esses dois estados correspondiam a 59% da produção nacional.

FONTE: Metadados sistematizados pelos autores (2020).

GRÁFICO 4 DISTRIBUIÇÃO DAS PUBLICAÇÕES POR ESTADOS  

Dois periódicos destacam-se pelo número de publicações sobre políticas públicas e EJA e políticas públicas de/para a EJA: a Revista Brasileira de Educação (RBE), publicada pela Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPEd), com endereço no Rio de Janeiro-RJ, com 6 publicações; e a Revista Educação & Sociedade, publicada pelo Centro de Estudos Educação e Sociedade (CEDES), Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Campinas-SP, com 3 publicações.

No conjunto dos artigos publicados, 7 autores/pesquisadores destacam-se pelo número de publicações: Maria Clara Di Pierro, com 8 artigos; Sérgio Haddad, com 5; Jaqueline Pereira Ventura, com 3; Sonia Maria Rummert, com 3; Andreza Maria Batista do Nascimento Tavares, com 2; Márcio Adriano Azevedo, com 2; e Patrícia Lessa Santos Costas, com 2 artigos. Juntos, esses autores representam 39,5% das publicações analisadas. Como revela o Quadro 1, abordam, em seus estudos, as políticas públicas de/para a EJA em diferentes perspectivas.

QUADRO 1 AUTOR/PESQUISADOR COMO MAIS PUBLICAÇÕES E TEMAS ABORDADOS 

Autor/Pesquisador Freq. (%) Temas abordados
Maria Clara Di Pierro 12,3% Descentralização (gestão e financiamento); Direito à educação ao longo da vida; Alfabetização; Políticas educacionais; Paradigma compensatório; e Trajetória da EJA.
Sérgio Haddad 7,7% Alfabetização; Supletivo; Educação escolar; Política, Educação e ONG; Programas, gestão e violência; e VI CONFINTEA1.
Jaqueline Pereira Ventura 4,6% Educação ao longo da vida como visão produtivista de educação; Emancipação humana; Pedagogia do oprimido; Políticas e práticas; e Programa Fazendo Escola2.
Sonia Maria Rummert 4,6% Brasil Alfabetizado; Educação Profissional; Fazendo Escola; Políticas Educacionais; e Privatização do conhecimento.
Andreza Maria Batista do Nascimento Tavares 3,1% Educação e diversidade; Educação profissional; Indicadores sociais; Programas e projetos; e Qualidade social.
Márcio Adriano Azevedo 3,1% Educação e diversidade; Educação profissional; Indicadores sociais; Programas e projetos; e Qualidade social.
Patrícia Lessa Santos Costa 3,1% Ação comunicativa; Educação Integrada; Emancipação; Gestão educacional; Participação social; e Proeja3.

FONTE: Metadados sistematizados pelos autores (2020).

Notas:

1 Conferência Internacional de Educação de Adultos.

2 Fazendo Escola - Programa de Apoio aos Sistemas de Ensino para Atendimento à Educação de Jovens e Adultos.

3 Programa Nacional de Integração da Educação Profissional com a Educação Básica na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos.

Buscando aprofundar nossas análises investigativas, com base nos objetivos apresentados para este trabalho, mais uma vez recorrendo a Mainardes (2018) no intuito de qualificar nossas reflexões, seguindo a orientação de que

[...] é essencial que as pesquisas ultrapassem o nível descritivo e que os pesquisadores explicitem os seus referenciais teóricos de análise, ou seja, a perspectiva epistemológica, o posicionamento epistemológico e indicações de que, de modo efetivo o emprego da epistemetodologia (MAINARDES, 2018, p. 191).

A partir dessa compreensão, e considerando a necessidade do aprofundamento quanto aos referenciais teóricos utilizados pelos pesquisadores e que dão sustentação para as publicações por nós analisadas, identificamos 3 grupos de referenciais. O primeiro grupo, composto por 4 autores, contribui para definições de concepções teóricas no campo da educação, ainda que muitas vezes os citados como referenciais não tenham suas concepções devidamente aprofundadas ou relacionados no tratamento dos objetos em estudo. São eles: Antônio Gramsci, e a importância da educação para o processo de transformação histórica; Michel Foucault, filósofo-ativista que ganhou destaque por desenvolver reflexões sobre a verdade, a transgressão e o poder; Pierre Bourdieu, que a partir da sociologia crítica elaborou um importante referencial acerca dos mecanismos de reprodução das desigualdades sociais; e Theodor Adorno, que entre os destaques da chamada Escola de Frankfurt, fundamentou no Brasil as discussões sobre educação e autonomia.

O segundo grupo, formando por outros referenciais, é extenso e bastante frequente no campo da EJA. Entre eles encontramos: Celso de Rui Beisiegel, teórico-militante e pioneiro na defesa pela educação popular; Dermeval Saviani, reconhecido como um filósofo da educação e que está diretamente inserido no contexto da chamada pedagogia dialética, com contribuições para os estudos sobre a pedagogia histórico-crítica amplamente conhecidas, reconhecidas e estudadas; Gaudêncio Frigotto, importante intelectual brasileiro, reconhecido por adotar posturas reflexivas e críticas e um dos maiores referenciais nas discussões sobre trabalho e educação, assim como educação profissional emancipadora; Miguel González Arroyo, importante no campo da educação integral, não somente voltada para o tempo de permanência na escola, mas na integralidade da formação para a vida, e na discussão acerca da necessidade de as esferas públicas contemplarem um processo escolar e formativo que enfrente as vulnerabilidades sociais e promova a garantia de direitos por meio da educação; Moacir Gadotti, que dentre os temas com os quais dialoga, destaca-se a formação crítica do educador, teorias e pensamento pedagógico da educação brasileira, história das ideias pedagógicas e a diversidade cultural e educação para todos; Paulo Freire, que além de educador, filósofo e patrono da educação brasileira, é reconhecido mundialmente como um dos pensadores de maior destaque na história da pedagogia, a quem é atribuída importante contribuição para o chamado movimento da pedagogia crítica.

Ainda neste segundo grupo de pesquisadores e pesquisadoras que dão sustentação às publicações por nós analisadas, estão dois nomes extremamente importantes, principalmente pela identificação mais aderente ao campo da EJA, Maria Clara Di Pierro e Sérgio Haddad, bastante citados pelos outros autores/pesquisadores dos artigos analisados. Como visto no Quadro 1, esses autores transitam de forma fluída por uma variedade de temas, contribuindo significativamente para os estudos, análises e reflexões mais focalizadas sobre Políticas Públicas de/para a Educação de Jovens e Adultos. Por isso, podemos seguramente afirmar que, juntamente com Paulo Freire, compõem o grupo de autores-referência no estudo desse campo.

No terceiro grupo identificamos uma variedade muito grande de autores, entre os quais destacamos: Leôncio José Soares, Jane Paiva, Sonia Maria Rummert, Inês Barbosa de Oliveira, Maria Ciavatta, Marise Nogueira Ramos, e Osmar Fávero. É importante ressaltar que esses agrupamentos não qualificam, no sentido de priorizar esse ou aquele autor, mas busca, de forma metodológica, objetivando o cumprimento traçado para este trabalho, categorizar esses referenciais que dão sustentação aos trabalhos aqui identificados.

Dentre as categorias de análise utilizadas pelos autores em suas investigações sobre as políticas públicas de/para EJA, as mais recorrentes são: alfabetização, educação, formação de professores, gestão, participação, programas/projetos/campanhas, política(s) e trabalho. Como revela o Quadro 2, abaixo, desdobram-se em outros temas associados.

QUADRO 2 CATEGORIAS E TEMAS ASSOCIADOS 

CATEGORIAS TEMAS ASSOCIADOS
Alfabetização Campanhas Nacionais; Cidadania; Direitos Humanos; Escolarização; Formação Integral; História Social; e Solidariedade.
Educação Ação Comunitária; Classe Trabalhadora; Direito Social; Educação de Base; Educação Social; Emancipação; Exclusão; Inclusão; Liberdade; Educação Não Formal; Educação Popular; Educação profissional; Projetos Sociais; Qualidade; Relações Étnico-Raciais; e Transdisciplinaridade.
Formação de Professores Aprendizagem; Formação Inicial; Formação Continuada; Formação Integrada; Educação Social; Experiência; Memória; Políticas Cognitivas; Profissionais da EJA; e Trabalho.
Gestão Administração Gerencial; Burocracia; Descentralização; Direito à Educação; Financiamento; Gerenciamento da Escola; Liderança; Parcerias; e Programas Federais.
Participação Atores Sociais; Autonomia Cidadã; Exclusão Social; Movimentos Sociais; ONG; Opressão; Panorama Social; Participação Popular; Resistência; Serviço Público não Estatal; e Sociedade Civil.
Programas/Projetos/Campanhas Educação em Prisões; Educação Profissional e Tecnológica; Mobral1; Proeja2; Programa Brasil Alfabetizado; Programa Fazendo Escola; Programa Nacional de Inclusão; Projeto Político Pedagógico; Projetos de Alfabetização; Projetos de Letramentos; e Projovem3.
Política(s) Ação de Governo; Políticas Compensatórias; Políticas de Currículo; Política de Estado; Políticas de Governo; Políticas de Integração; e Políticas Neoliberais.
Trabalho Capitalismo; Cenário Mundial; Compensatória(s); Empoderamento; Emprego; Escolarização; Inclusão; Princípios Educativos; Produtividade; Proletariado; Qualificação; Sociedades de Classes; Subalternidade; Tecnologias; e Terceirização.

FONTE: Metadados sistematizados pelos autores (2020).

Notas:

1 Movimento Brasileiro de Alfabetização.

2 Programa Nacional de Integração da Educação Profissional com a Educação Básica na Modalidade de Educação de Jovens e Adultos.

3 Programa Nacional de Inclusão de Jovens. Programa emergencial que propõe articulação entre o Ensino Fundamental, a formação profissional e, às vezes, a EJA.

Ao analisar o Quadro 2, percebe-se a complexidade que envolve a análise das políticas públicas de/para a EJA. Também se revela que os autores buscam apreender as categorias de análise da problemática investigada de forma multidimensional e/ou interseccional, e que os temas associados são apresentados de forma transversal, e isso, a nosso ver, amplia a compressão do leitor acerca da temática em discussão. O Quadro 2 também demonstra que há uma preocupação dos autores em não limitar a análise da(s) política(s) pública(s) de/para EJA a apenas uma única perspectiva dimensional - a escolarização, mas de forma dialógica, com aspectos sociológicos imbricados na questão figuram aspectos políticos, étnico-raciais, geracionais, econômicos, culturais, regionais/territoriais, entre outros.

O Quadro 2 nos leva, ainda, a inferir que a teorização da(s) política(s) pública(s) de/para EJA está referenciada na perspectiva da educação para e ao longo da vida, Educação Popular, Educação para o trabalho e Educação do trabalhador, e ancora-se na tríade: formação cidadã, trabalho e tecnologia. Também concebe os sujeitos em suas diferenças, diversidades e subjetividades, de modo que possam se desenvolver intelectualmente, além de se tornarem agentes ativos nas transformações e relações estabelecidas no meio social onde estão inseridos.

Algumas considerações

Embora as primeiras políticas públicas de/para EJA comecem a ser implementadas a partir da década de 1950, é a partir da Constituição Federal de 1988 (BRASIL, 2020) que a Educação passou a ser considerada um direito público subjetivo, inclusive para aqueles que não tiveram acesso à escola na infância e adolescência. Na década de 1990, no bojo das políticas neoliberais, as políticas focalizadas tiveram prioridade, principalmente aquelas voltadas para o público de 7 a 14 anos, a exemplo do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (FUNDEF). No campo da Educação de Jovens e Adultos, essa década ficou marcada, por um lado, por políticas compensatórias, voltadas para a diminuição do índice de analfabetismo no país, baseadas no voluntarismo e na solidariedade; e por outro, pelo entendimento da EJA como direito público subjetivo, pela luta social para inclusão dessa modalidade no financiamento público, bem como pela ampliação da sua oferta nos diferentes níveis e etapas da escolarização e em diferentes sistemas e redes de educação.

A partir da segunda metade da década de 1990, há uma nova reconfiguração do público atendido pela EJA. De acordo com os estudos de Haddad e Di Pierro (2000, p. 126),

O desafio da expansão do atendimento na educação de jovens e adultos já não reside apenas na população que jamais foi à escola, mas se estende àquela que frequentou os bancos escolares mas neles não obteve aprendizagens suficientes para participar plenamente da vida econômica, política e cultural do país e seguir aprendendo ao longo da vida.

A distorção idade/série constitui-se como um dos principais fatores para a expansão da EJA para um público cada vez mais jovem. Sobre isso, Di Pierro, Joia e Ribeiro (2001, p. 71) observam que “cada vez que se amplia a escolaridade mínima obrigatória, um novo contingente de jovens e adultos fica com uma escolaridade inferior àquela a que todo cidadão tem direito”. Eis a busca por maiores níveis de escolarização.

Para Di Pierro (2005, p. 1122),

Dentre as motivações para a busca de maiores níveis de escolarização após a infância e adolescência, destacam-se as múltiplas necessidades de conhecimento ligadas ao acesso aos meios de informação e comunicação, à afirmação de identidades singulares em sociedades complexas e multiculturais, assim como às crescentes exigências de qualificação de um mundo do trabalho cada vez mais competitivo e excludente.

Esse cenário descrito pela autora está em curso no Brasil, e as demandas, incluídas as da EJA, fazem parte de um cenário ainda pouco conhecido. A partir das mudanças implementadas na legislação educacional brasileira, através da Emenda Constitucional nº 59/2009 (BRASIL, 2009), que assevera a universalização da “educação básica obrigatória e gratuita dos 4 (quatro) aos 17 (dezessete) anos de idade”, assim como “assegurar a manutenção e desenvolvimento do ensino em seus diversos níveis, etapas e modalidades”, certamente trarão à realidade a ampliação de demandas, problemas e questões envolvendo todo o contexto da educação pública brasileira, e com isso, envolvendo também o contexto da EJA.

Considerando a ampla discussão no campo das políticas públicas em todas as dimensões sociais, é consenso entre os pesquisadores a necessidade de uma ampla discussão em torno de um novo pacto federativo. Um dos temas nesse debate atual, em torno desta repactuação, diz respeito ao reconhecimento de que as políticas socias, contemplando neste caso a educação, saúde, assistência aos vulneráveis, na prática, ocorrem no âmbito dos municípios. Entretanto, na contramão desta realidade, a maior fatia dos recursos arrecadados continua concentrada sob a administração do Governo Federal. Correlacionado a isso, podemos afirmar que, por extensão, a oferta da EJA, na maior parte do tempo marginalizada entre as ofertas da Educação Básica, também sofre os reflexos da invisibilização social identificada no decorrer desta pesquisa.

As análises das políticas educacionais da EJA relacionadas à gestão municipal ainda é tema pouco recorrente. Dos 65 artigos localizados sobre Políticas de/para a Educação de Jovens e Adultos, 7 deles abordavam a discussão a partir dos municípios; a grande parte dos outros trabalhos não aborda o tema ou o faz de forma indireta.

Em meio às arenas de disputas que se estabeleceram no contexto de retrocesso e obscurantismo da educação pública, e no caso da EJA com agravos irreparáveis, os estudos sobre as políticas públicas demonstram uma estratégia de reafirmação dos direitos. Como observam Moura e Ventura (2018, p. 348), podemos constatar, no contexto político e social atual, que as políticas públicas e as práticas pedagógicas voltadas para a educação de pessoas jovens e adultas trabalhadoras “estão em permanente disputa, que se constroem cotidianamente, nas relações sociais, políticas econômicas e culturais, e expressam diferentes projetos e concepções de homem e de sociedade”.

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1E é parte dos resultados de uma pesquisa maior, intitulada Fundamentos e autores recorrentes do campo da Educação de Jovens e Adultos no Brasil: a construção de um glossário eletrônico, coordenado por pela Profa. Dra. Maria Hermínia Lage Laffin - Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) - e contou com auxílio à pesquisa do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) Chamada Universal (2016), pesquisa de 2017-2021. Tem como pergunta norteadora: Quais os principais fundamentos teórico-metodológicos presentes nas produções resultantes das pesquisas no campo da Educação de Jovens e Adultos no Brasil? No caso deste artigo, o foco está nas Políticas Públicas de/para a Educação de Jovens e Adultos.

2Agradecemos especialmente a Gilson Alves Lima, que também integra a equipe da pesquisa em questão e que muito contribuiu para o refinamento das análises presentes neste artigo.

3Um novo modelo de gestão de políticas públicas e sociais foi inaugurado no Brasil na década de 1990. A reforma do Estado, promovida pelo presidente Fernando Henrique Cardoso (FHC - 1995-2003), teve como antecedente histórico o Plano Real, implementado a partir de 1º de julho de 1994, mas desenvolvido cerca de um ano antes, quando o mesmo FHC ocupava a função como Ministro da Fazenda do Governo Itamar Franco (OLIVEIRA, 2009).

Recebido: 23 de Julho de 2021; Aceito: 26 de Setembro de 2021

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Translated by Elita de Medeiros. E-mail: elita.med@gmail.com

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