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Revista da FAEEBA: Educação e Contemporaneidade

versión impresa ISSN 0104-7043

Revista da FAEEBA: Educação e Contemporaneidade vol.27 no.52 Salvador mayo/ago 2018  Epub 02-Jul-2019

https://doi.org/10.21879/faeeba2358-0194.2018.v27.n52.p89-100 

Dossiê Temático

TURISMO COMUNITÁRIO NA BUSCA DO DESENVOLVIMENTO À ESCALA HUMANA EM ICAPUÍ, CEARÁ

COMMUNITY TOURISM IN THE SEARCH FOR DEVELOPMENT ON THE HUMAN SCALE IN ICAPUÍ, CEARÁ

TURISMO COMUNITARIO EN LA BÚSQUEDA DEL DESARROLLO A LA ESCALA HUMANA EN ICAPUÍ, CEARÁ

Luzia Neide Coriolano*  UECE

Maria Fernanda S. Pereira**  UECE

*Doutora em Geografia pela Universidade Federal de Sergipe (UFS). Professora do Mestrado em Geografia e do Mestrado em Gestão de Negócios Turísticos da Universidade Estadual do Ceará (UECE). Pesquisadora do CNPq. E-mail: luzianeidecoriolano@gmail.com

**Mestre em Gestão de Negócios Turísticos pela Universidade Estadual do Ceará (UECE). Técnica da Assembleia Legislativa do Estado do Ceará. E-mail: mariafernandasnp@yahoo.com.br


RESUMO

Esta pesquisa investiga o turismo nas comunidades de Ponta Grossa, Redonda, Requenguela e Tremembé, no município de Icapuí-CE, com histórico de participação popular e elevado nível de politização. São comunidades tradicionais que produzem artesanalmente embarcações e artefatos de pesca, utensílios que famílias utilizam no litoral, e desenvolvem turismo alternativo. Constituídas de grupos de pescadores de lagosta que enfrentam o desafio de fiscalização do litoral para evitar a pesca predatória, destacam-se pelas belezas naturais, patrimônio histórico e cultural, assim, o lugar recebe fluxos de turistas de vários lugares. Busca-se compreender transformações das comunidades de Ponta Grossa, Redonda, Requenguela e Tremembé com a chegada da atividade turística que transforma as comunidades, ao passarem a ser núcleos receptores do turismo, áreas de segundas residências, com implicações no desenvolvimento socioespacial de Icapuí. Observa-se que, apesar de as comunidades sentirem-se excluídas de ações políticas municipais, mantêm-se organizadas e produtivas.

Palavras-chave: Comunidades; Turismo; Sustentabilidade; Desenvolvimento local; Desenvolvimento humano

ABSTRACT

This research investigates tourism in Ponta Grossa, Redonda, Requenguela and Tremembé communities municipality of Icapuí / CE, which have a history of popular participation and high level of politicization. They are traditional communities who produce handmade vessels and fishing artifacts, tools that families use on the coast and develop an alternative tourism. Consisting of lobster fishermen groups that face the challenge of overseeing the coast to prevent overfishing, we highlight its natural beauty, historical and cultural heritage, as well, the place receives flows of tourists from various places. It search to understand transformations of Ponta Grossa, Redonda, Requenguela and Tremembé communities from the arrival of tourism that transforms communities to go to centers of tourism recipients, areas of second homes, with implications for the socio-spatial development Icapuí. It is observed that in spite of the communities feel excluded from municipal political action remain organized and productive.

Keywords: Communities; Tourism; Sustainability; Local development; Human development

RESUMEN

Esta pesquisa investiga el turismo en las comunidades de Ponta Grossa, Redonda, Requenguela y Tremembé, en el municipio de Icapuí-CE, con histórico de participación popular y elevado nivel de politización. Son comunidades tradicionales que producen artesanalmente embarcaciones y artefactos de pesca, utensilios que familias utilizan en la costa, y desarrollan turismo alternativo. Se compone de grupos de pescadores de langosta que enfrentan el desafío de fiscalización del litoral para evitar la pesca predatoria, se destacan por las bellezas naturales, patrimonio histórico y cultural, así, el lugar recibe flujos de turistas de varios lugares. Se busca comprender transformaciones de las comunidades de Ponta Grossa, Redonda, Requenguela y Tremembé con la llegada de la actividad turística que transforma a las comunidades, al pasar a ser núcleos receptores del turismo, áreas de segundas residencias, con implicaciones en el desarrollo socioespacial de Icapuí. Se observa que, a pesar de que las comunidades se sienten excluidas de acciones políticas municipales, se mantienen organizadas y productivas.

Palabras clave: Comunidades; Turismo; Sostenibilidad; Desarrollo local; Desarrollo humano

Introdução

O turismo, atividade econômica e socioterritorial, fomenta transformações espaciais, culturais e políticas, em municípios, comunidades ou núcleos receptores. A atividade aperfeiçoa-se no capitalismo flexível, colocando os serviços na vanguarda da reestruturação econômica para suporte e manutenção da indústria em crise. Aprimora-se no século XXI, ao reinventar trabalho e lazer, especializar a produção econômica, concentrando poder sem centralizá-lo, e assim o turismo espraia-se pelos diversos municípios cearenses, alguns turísticos por receberem fluxos intensos de visitantes, outros destacam-se pelas riquezas exploráveis, potencialmente turísticos. Turismo não é mera atividade econômica, é, sobretudo, política econômica de desenvolvimento. Em lugares onde assim é tradado, impacta positivamente nos territórios e na valorização cultural de municípios e comunidades, desenvolvendo-os. A relevância e abrangência do turismo o tornam atividade prioritária no estado do Ceará, especialmente em municípios e comunidades, com registro de crescente taxa de participação em serviço, hospedagem, alimento e bebida, sobretudo de ocupação familiar e melhora de comunidades.

O turismo organiza-se em eixos: convencional, instalado de cima para baixo em diferentes territórios, com empresas de grande porte que prestam bons serviços e acumulam lucros; e alternativo, que se instala de baixo para cima, em contraponto a pequenos negócios, em espaços não usados pelo turismo hegemônico. O convencional absorve atividades produtivas modernas, megaempreendimentos, volume pesado de capital em equipamento. O eixo alternativo das comunidades atua mais com boa vontade do que com capital e não tem lucro como objetivo principal, mas complementação de renda e defesa de identidades locais. Liga-se à economia solidária e desenvolvimento na escala humana.

O alternativo absorve trabalho especializado, personalizado, lúdico, intelectual, criativo, formal e informal e oferece possibilidades a municípios e comunidades. O convencional fez surgir resistências de núcleos receptores impactados, principalmente nos municípios litorâneos, com políticas alternativas de turismo organizado pelas comunidades, turismo comunitário, desenvolvido pelas famílias pobres, com foco em ofertas turísticas modestas, pousada, hospedagem familiar, com recursos naturais e culturais, e com preocupação na defesa da natureza e preservação de identidade. O grupo não considera o lucro atividade-fim, mas forma de melhoria da renda familiar e qualidade de vida.

Os municípios têm patrimônio, manifestações culturais, identidade, vida própria, história, intencionalidades e dinâmicas sociais que, focadas no desenvolvimento humano, constituem territórios de identidade e de cidadania, substanciais a residentes e turistas. Qualidade de vida e bem-estar impõem-se como necessidade do mundo moderno que, contraditoriamente, adota modo de viver e produzir marcado pela competitividade, consumismo, degradação ambiental, poluição e ameaça à vida humana. Mudanças são necessárias e certamente não dependem somente de políticas de gestores públicos, mas do cuidado do empreendedor e da participação de famílias em comunidades, como no Município de Icapuí, no Ceará.

Este artigo tem o objeto de investigação nas comunidades de Ponta Grossa, Redonda, Requenguela e Tremembé. Analisa-se o turismo das comunidades, no município de Icapuí, no litoral leste cearense, com histórico de participação popular e elevado nível de politização.

O litoral banhado pelo Oceano Atlântico tem 578 km de costa e compreende inúmeros municípios. O litoral leste inicia em Fortaleza até limite do Estado do Rio Grande do Norte, com inúmeros atrativos turísticos, típicos de zonas costeiras, falésia, coqueiro, fontes de água doce, dunas, sol e clima tropical propício a banho e praias consideradas pela mídia como paradisíacas. Ceará e Nordeste conhecem-se nacionalmente como núcleo receptor do turismo de sol e praia.

Icapuí é um município distante 200 km de Fortaleza, antiga vila de pescadores de nome Caiçara, feita município em 1985, com grande destaque na política, por ter sido lócus da origem do Partido dos Trabalhadores no Ceará, o que lhe deu visibilidade pública nacional. Comunidade e prática da cidadania cobram da Administração Pública projetos de desenvolvimento e capacitação para a população, o que lhe dá relevância. Assemelha-se a espaços litorâneos do estado, em relação à população predominante de pescadores, artesãos e agricultores, mas difere em nível de consciência política dos habitantes.

Este estudo analisa o turismo em comunidades, realizado pelos moradores, no sentido da busca do desenvolvimento na escala humana. Busca-se compreender transformações das comunidades de Ponta Grossa, Redonda, Requenguela e Tremembé pela opção pelo desenvolvimento da atividade turística que transforma comunidades em núcleo receptor do turismo, área de segundas residências, com implicações no desenvolvimento socioespacial. Tenciona-se compreender a possibilidade de turismo sustentável e de desenvolvimento pautado no crescimento humano, no exercício digno da cidadania, da justiça social para promoção do bem-estar de residentes e turistas. Partindo de fatos e considerando a amplitude das questões que permeiam a relação do turismo voltado ao desenvolvimento humano é que se investigam políticas do turismo alternativo, relacionando com políticas municipais para entendimento da promoção do desenvolvimento da população e benefícios usufruídos com o turismo alternativo.

Comunidades de Icapuí: caminhos para sustentabilidade e desenvolvimento do turismo

A pesquisa, nas comunidades de Ponta Grossa, Redonda, Requenguela e Tremembé, sobre turismo verifica como a atividade se desenvolve e se relaciona com a concepção de desenvolvimento humano e turismo sustentável. Nesse sentido, comunidades litorâneas inserem-se em processos de transformação comunitária, na luta pela sustentabilidade territorial, ambiental e do turismo. As comunidades, em nova concepção, promovem o turismo comunitário e, consequentemente, outra forma de lidar com o processo de desenvolvimento, encontram formas de tornar o lugar história, cultura, meio natural e produto de atividades econômicas em atrativos turístico e cultural. Ainda mantida a mesma lógica econômica, amplamente rejeitada pelos teóricos que criticam o forte caráter economicista do turismo, mudam o modelo, pois tiram o foco da economia e a comunidade passa a ser a principal responsável pelo processo de transformação de atributos locais em produtos turísticos (CORIOLANO; SOUZA NETO, 2008).

Muitas comunidades do litoral optam pelo desenvolvimento do turismo sustentável amparado pela forte participação popular, embasado em políticas que priorizam planejamento, organização e execução da atividade pela própria comunidade e não pelos empreendedores externos, com base no trabalho comunitário. A luta política de Icapuí, desde a primeira tentativa de emancipação em 1957, desvinculada de Aracati, produz história retratada na luta das comunidades pela melhoria de vida cotidiana, defesa e promoção de direitos. A investigação das comunidades de Ponta Grossa, Redonda, Requenguela e Tremembé remete ao turismo relacionado à defesa ambiental, valorização de identidade, turismo sustentável e desenvolvimento na escala humana.

Asseguram moradores de Icapuí, Ponta Grossa, Redonda, Requenguela e Tremembé que as praias mais visitadas abrigam famílias com alto senso de responsabilidade e compromisso com o lugar, e que lutam pela defesa da natureza e do turismo sustentável. Assim, conectam-se com polos emissores de fluxos turísticos de diversos lugares, revelando o turismo alternativo com ideias diferenciadas do convencional. Santos (1988, p. 34) esclarece que “quanto mais os lugares se mundializam, mais se tornam singulares e específicos, isto é, ‘únicos’, o que se deve à especialização dos elementos do espaço”.

Icapuí passa pelo período de relevante projeção nacional, posteriormente pela decadência com a desarticulação de políticas públicas, mas guarda a forma de ser única: pessoas conscientes e politizadas.

Ponta Grossa dista 170 km de Fortaleza-CE e 80 km de Mossoró-RN, possui 22 km e 300 habitantes. A maioria da população é evangélica, de descendência holandesa e pertence à mesma família de sobrenome Crispim. O lugar, quase todo, desde 1998 é Área de Proteção Ambiental (APA),1 onde se encontram fontes de água cristalina, entre dunas e falésias coloridas, que abastecem a comunidade com água potável de excelente qualidade. A paisagem é composta de falésias avermelhadas e duna que, além da beleza natural, serve de mirante à admiradores do pôr do sol. As formações rochosas são de variadas cores: amarelo, laranja, vermelho e vinho. Por possuidora de raras belezas naturais, Ponta Grossa também se torna destino turístico, visitada principalmente pelos turistas que vão a Canoa Quebrada2 e Aracati. Muitos que vão a Canoa Quebrada motivados pelo passeio de buggy até Icapuí, que oferece as últimas praias, no limite do Rio Grande do Norte, em razão de ter sido eleita pelos “internautas”, em março de 2014, a praia mais bela do Ceará (PONTA..., 2014).

Os moradores da comunidade de Ponta Grossa optam pelo turismo alternativo, chamado de turismo comunitário, pelo fato de ser promovido pela comunidade. Em Icapuí, desenvolve-se o turismo em que os residentes têm certo controle do desenvolvimento da comunidade, por serem responsáveis pelo planejamento das atividades e pela oferta de serviços. Sobre serviços turísticos contam-se poucos meios de hospedagem, duas pousadas e dois chalés. A gastronomia oferece pratos e petiscos típicos: peixe frito com baião, salada e farofa; moqueca de arraia com salada e pirão; peixada, bolinho de queijo e de peixe, servido em restaurante e barraca de praia. O turista desfruta de passeio pelas trilhas ecológicas, passeios de barco com pescadores artesanais de Ponta Grossa e presencia respeito à natureza, no cotidiano dos residentes, além do silêncio e da tranquilidade, diferente dos lugares urbanizados.

Redonda, no litoral icapuiense, é preferida por apresentar um conjunto de atributos naturais, culturais e paisagísticos, atrativos turísticos direcionados ao turismo alternativo. A comunidade aloca-se em enseada, agrega pescadores, é a mais povoada do município - conta com 4.000 habitantes, em média - e muitos vivem da pesca artesanal da lagosta. Nos eventos, merece destaque o Festival de Lagosta, já na 9ª edição, com apoio da Associação Grupo de Desenvolvimento do Turismo de Icapuí (GDTur). Nas últimas edições associa atrações musicais e exposição do Salão de Gastronomia, com os expositores apresentando pratos elaborados à base de lagosta. O evento tem duração de três dias e está na programação do Ministério do Turismo e da Secretaria de Turismo do Estado do Ceará. As edições se realizam em praias diferentes do município para integração e valorização das comunidades.

Os moradores de Redonda fazem o turismo alternativo, com atividades responsáveis, e atenção voltada não apenas a turistas, mas sobretudo a residentes. Destacam que empreendedores locais que foram pescadores, agora são empresários de pousada ou restaurante. As transformações socioeconômicas indicam ganhos de comunidades, com residentes participando diretamente da oferta de serviços e, consequentemente, dos benefícios da atividade.

Oferecem turismo alternativo, de base comunitária, configurando como turismo de famílias de moradores, sem visão direcionada exclusivamente ao lucro, por serem preocupados com a partilha, em contraponto ao modelo de desenvolvimento hegemônico. O turismo convencional atende às necessidades dos turistas com foco na concentração de lucros, vende serviços de alta qualidade, muitos com sacrifício da natureza e trabalhadores, visando ao lucro.

Além de possuidora de atrativos e serviços turísticos, Redonda destaca-se na história de luta dos moradores quando, em 1974, inicia luta pela terra, disputada com grileiros e latifundiários de Aracati e, em 1989, impõe resistência à pesca predatória da lagosta, atividade ameaçada, conforme depoimento de residentes e lideranças comunitárias.

Praia de destaque investigada é Requenguela, comunidade e núcleo receptor de turismo de Icapuí, a 3 km da sede, com média de 100 famílias que vivem da pesca artesanal. Chama a atenção do visitante o adentramento ou recuo do mar, ficando distante da comunidade e dando a impressão de mar tranquilo. Foi motivo de matéria exibida no telejornal Bom Dia Brasil, da Rede Globo de Televisão, em 2 de fevereiro de 2010, com o título “Conheça a praia cearense onde o mar desaparece”.

O nome da praia soa “com graça” para visitantes e tem origem referente ao apelido do primeiro morador, Sr. Requenguela. Na década de 1980, passa por período acentuado de desmatamento do mangue para ampliação de salinas3 no intuito de aumentar a produção de sal, pondo em risco a sustentabilidade do ecossistema. A comunidade, preocupada com a proteção ambiental e os moradores, em 1986, cria a Associação de Moradores da Requenguela, a fim de lutar pela conservação ambiental do lugar.

Em decorrência de problemas com relação à sustentabilidade, a praia, em 2003, recebe importante contribuição da Fundação Brasil Cidadão, em parceria com a Fundação o Boticário. Desperta-se nos residentes a vontade de estudo e conhecimento do ecossistema manguezal, por meio do Projeto “Esse Mar é Meu”, com iniciativa de recuperação da área degradada do mangue. Para continuidade da cultura e preservação do lugar, em 2008, a Fundação Brasil Cidadão, patrocinada pela Programa Petrobras Ambiental, implanta o Projeto “De Olho na Água”, com a Construção da Estação Ambiental Mangue Pequeno e da Passarela no Mangue.

Poucas barracas oferecem aos turistas excelentes pratos da culinária marítima, porém não há muitos serviços, pousadas e restaurantes. Em destaque a geografia do lugar e o interesse dos visitantes em conhecer os projetos de planejamento e gestão ambiental. Dessa forma, a praia de Requenguela revela-se ao turista essencialmente promotora do turismo sustentável.

Destaque-se também Tremembé, praia de mar limpo, ondas calmas e sem formações rochosas, propícia ao banho tranquilo, o que atrai turistas. Tremembé é nome indígena relacionado aos índios da Nação Tremembé da região. Fica a 210 km de Fortaleza, 55 km de Mossoró-RN e 9 km a leste de Icapuí (MEIRELES; SANTOS, 2012). A população pequena, de pouco mais de 100 famílias, vive basicamente da pesca e do trabalho em pequenos comércios, associados à prática do turismo. A praia conta com pousadas e barracas à beira-mar que disponibilizam aos turistas passeios de barco e a cavalo pelas trilhas ecológicas.

Do ponto de vista do turismo, em 1979 chegam as primeiras unidades comerciais, com crescente número de veranistas, na maioria de Mossoró-RN. Fator relevante para a comunidade, em 1993 é construída a Pousada Tremembé, que marca a discussão do turismo comunitário sobre possibilidade de desenvolvimento responsável e sustentável. A pousada liga-se a grupo de italianos da província de Trento, na Itália, representantes da ONG Tremembé Onlus, que visitaram a comunidade para conhecimento de Icapuí, ali se instalaram e desenvolveram projetos de turismo sustentável e responsável, a exemplo do Projeto de Turismo Responsável e Luta contra a Pobreza. A pousada é administrada pela Associação Caiçara de Promoção Humana, com sede em Icapuí, e faz parte da Rede Cearense de Turismo Comunitário (TUCUM).

É questionável, apesar de a pousada fazer parte da Rede, a comunidade não se incluir na proposta do turismo comunitário. Não há o mínimo de envolvimento por parte dos residentes de Tremembé, existindo apenas a proposta da pousada, que direciona, na maioria dos casos, proposta de turismo, dito pelos gerentes de comunitário a público-alvo de turistas intelectualizados e que fazem parte de projetos sociais. A Rede TUCUM aceita como comunitária pousada sem participação de comunidade.

O turismo, em Icapuí, com o envolvimento de residentes das comunidades, fortalece as atividades socioeconômicas, culturais e ambientais do lugar, ao tempo em que o turista, harmonicamente, desfruta dos atrativos naturais, culturais, ambientais e históricos da cadeia produtiva do turismo constituída por elos interligados formando o negócio turístico. Lugar e atrativos são elos naturais e culturais. Transportes são elos responsáveis pelos fluxos, e meios de hospedagem são da ocupação; a alimentação é elo que pega pela boca; serviços de apoio aproximam turistas de residentes na utilização da infraestrutura urbana e a comercialização é elo da consolidação da mercadoria - do pacote turístico.

As comunidades de Ponta Grossa, Redonda, Tremembé e Requenguela são núcleos receptores de turismo e lutam pela promoção do desenvolvimento sustentável, no turismo. Petrocchi (1998) considera o envolvimento de comunidades no núcleo turístico, ao afirmar que a participação das pessoas do local é imprescindível ao desenvolvimento do turismo, pois significa consciência da população da importância da atividade. Sem participação e firme engajamento da comunidade, não há como pensar em crescimento de turismo sustentável. (PETROCCHI, 1998). Daí a importância da participação da comunidade e interação com turistas para que todos possam ter contato com a cultura e valorização de diferenças que os unem.

Turismo e desenvolvimento na escala humana

O turismo é relevante por gerar oportunidade de trabalho, intercâmbio de pessoas e culturas e proporcionar crescimento de destinos receptores, por meio dos serviços prestados ao turista. Consolidado, torna-se meio ao desenvolvimento nacional, regional e local, ao contribuir com o Produto Interno Bruto (PIB) de estados. Fenômeno social, planejado para o desenvolvimento, ajuda na diminuição de desigualdades sociais, fortalecimento econômico, inclusão social e melhoria de qualidade de vida da população. Quando concentrado no capital, faz de modo especial, visto ser parte do rol dos serviços planejados para reestruturação do capitalismo fabril.

Na perspectiva do desenvolvimento, apresenta-se o turismo como possibilidade de trabalho, de geração de emprego e renda e entrada de divisas. Na perspectiva social, torna-se forma de contato entre turistas e autóctones, como sujeitos sociais. “Os saberes, formas de pensar e sentir, modos de fazer que, durante séculos de dominação ocidental, foram desconsiderados e desprezados, sinônimos de atraso sociocultural e econômico, ficam revalorizados no novo modo de fazer e pensar o turismo” (BRASILEIRO, 2012, p. 95). Desta forma, a educação torna-se relevante para o turismo direcionar-se ao desenvolvimento humano, com inserção de residentes nas transformações sociais.

Paradigma de planejamento do turismo é a base local, em que se priorizam comunidades. Nos estudos sobre comunidade na sociedade contemporânea, conceitua-se comunidade como: grupo social residente em pequeno espaço geográfico, onde ocorre integração de pessoas entre si e delas com o lugar. É um grupo pequeno de pessoas com modo próprio de viver tradições religiosas, artísticas, culturais, históricas, sociais e que desenvolvem atividades produtivas, necessidades e aspirações, tendo, sobretudo, consciência da vida em comum (CORIOLANO et al, 2009).

Solidariedade, princípio essencial da comunidade, é o que difere a sociedade moderna, que evita conhecer e se envolver com problema dos outros. Ao discorrer sobre comunidade, Bauman (2003, p. 7) afirma que o significado de comunidade

[...] sugere uma coisa boa: o que quer que comunidade signifique, é bom ter uma comunidade, estar numa comunidade. Se alguém se afasta do caminho certo, frequentemente explicamos sua conduta reprovável dizendo que anda em má companhia. Se alguém se sente miserável, sofre muito e se vê persistentemente privado de uma vida digna, logo acusamos a sociedade - o modo como está organizada e como funciona. As companhias ou a sociedade podem ser más; mas não a comunidade. Comunidade, sentimos, é sempre uma coisa boa.

Bauman (2003) tem a comunidade como lugar aconchegante, confortável e seguro, de pertencimento ímpar, diferente de aglomerado social, que remete ao paradoxo de resistir à segurança coletiva com vistas à segurança harmoniosa e individual. Contudo admite-se que há dificuldades de vida em comunidade, pelos avanços da sociedade moderna, embora seja o caminho a ser reencontrado. Ao estabelecer a relação entre turismo e comunidade receptora de turismo, recorre-se a Krippendorf (1989, p. 191), que destaca:

Um dos elementos essenciais na busca do desenvolvimento harmonioso reside na reivindicação segundo a qual uma comunidade turística deve conservar o poder sobre o solo e, portanto, a decisão soberana sobre a utilização do mesmo. Em nenhuma hipótese deve despojar-se de seu principal instrumento de orientação.

Na compreensão de Krippendorf (1989), a instalação de equipamentos turísticos é oportuna onde empregos sejam assumidos pela população residente, para que, dessa forma, os residentes tenham benefícios sociais. A atividade turística na comunidade é para mitigar impactos sobre ecossistemas, em respeito à conservação ambiental. Reflexões sobre comunidade turística retratadas por Bauman (2003) e Krippendorf (1989) sugerem que o turismo leve ao desenvolvimento e fortaleça o lugar e as pessoas, entendido o desenvolvimento como:

Aquele realizado em pequenos lugares de forma participativa, levando a mudanças socioestruturais, com caráter endógeno. Nele, os habitantes possuem relativa autonomia, para explorar o potencial do território que beneficie a maioria deles, e decidir como cada um pode contribuir com inovações. São os residentes os agentes principais do desenrolar de todo o processo de desenvolvimento e zelam pela qualidade dos relacionamentos interpessoais, interinstitucionais, aproveitam as sinergias em benefício da coletividade. (CORIOLANO; LIMA, 2012, p. 109).

Nessa linha de pensamento, o desenvolvimento mostra-se com dimensões variadas quanto ao espaço, ambiente natural, ação humana e, consequentemente, inserção da atividade que se associa às demais atividades econômicas. Desenvolvimento que remete somente ao aumento de indicadores econômicos, mas considera a dimensão dos valores culturais, ambientais da região, incentivando a criatividade dos residentes, tornando-os protagonistas para ação de novas perspectivas sociais que beneficiem o crescimento da comunidade. Daí dizer Santos (2002, p. 93) que:

Propor desenvolvimento de base local tem por significado contrariar a racionalidade econômica hegemônica e fortalecer o que designa de contrafinalidades, que são localmente geradas, ou seja, pensar no teatro de um cotidiano conforme, mas não obrigatoriamente conformista [...], o impõe uma dinâmica da sociedade em constante movimento.

A dinâmica da sociedade globalizada concentradora acaba por promover exclusão social, aumentar a violência urbana, colocar em risco o meio ambiente, o que leva comunidades a buscarem alternativas para superar as dificuldades e desigualdades com práticas de desenvolvimento em escala humana, social e ambiental. Nessa perspectiva, compreende-se desenvolvimento como:

Um conceito mais exigente que o conceito de crescimento econômico. Para que o desenvolvimento se concretize, não basta crescer a economia, a produção de riqueza ou o PIB (Produto Interno Bruto), faz-se necessário, sobretudo, que essa riqueza circule elevando o poder aquisitivo e a qualidade de vida de todos os segmentos da sociedade dentro dos princípios de direitos humanos. Quando cresce a economia e ela não é redistribuída, ocorre apenas o crescimento econômico concentrado. O desenvolvimento só se dá quando o crescimento econômico beneficia a todas as pessoas, ou seja, atinge a escala humana. Assim, todo desenvolvimento é crescimento econômico, mas nem todo crescimento econômico é desenvolvimento. O Brasil cresceu economicamente, mas não se desenvolveu, uma prova disso é a grande exclusão social com a negação dos direitos humanos. (CORIOLANO, 2000, p. 38).

Grupo como o de Icapuí, que luta para assegurar direitos à vida digna com serviços de saúde, educação, alimentação, bem-estar, habitação, vestuário, segurança e lazer, deseja melhorar o desenvolvimento para atingir a escala humana. Na perspectiva ampla de desenvolvimento, Furtado (2000) diz que o desenvolvimento não pode assumir apenas o caráter econômico do aumento da eficácia do sistema de produção, mas dimensão substantiva relativa à satisfação das necessidades humanas. O que se coaduna com a Teoria de Max-Neef (2012) sobre o desenvolvimento à escala humana.

Os postulados de Max-Neef (2012, p. 28), na obra Desenvolvimento à Escala Humana, mostram que “o desenvolvimento se refere às pessoas e não a objetos”. O pensador chileno discute aspectos relativos ao desenvolvimento, entendendo-o como processo capaz de satisfazer as necessidades humanas, não somente como metas a serem atingidas, mas também como razão para a existência do processo. Afirma Max-Neef (2012, p. 27) que se trata de:

Um desenvolvimento em escala humana, orientado para a satisfação das necessidades humanas, exige uma nova maneira de interpretar a realidade. Ele nos impele a perceber e avaliar o mundo, isto é, as pessoas e seus processos, de uma forma muito diferente da convencional. De modo semelhante, uma teoria das necessidades humanas visando o desenvolvimento precisa ser compreendida, precisamente naqueles termos, como uma teoria para o desenvolvimento.

Defende esse autor que a economia convencional incorre em erro fundamental de que as necessidades humanas são crescentes e ilimitadas, o que não é concebível. Demonstra que as necessidades humanas são poucas, delimitadas e classificáveis e, portanto, as mesmas em qualquer época histórica e cultural. O que difere é a maneira como se satisfazem as necessidades, isso varia de cultura para cultura. Para explicar o postulado, o autor utiliza a palavra satisfatores4 para definir a forma dominante que cultura ou sociedade imprime às necessidades. “Os satisfatores não são bens econômicos disponíveis. Estão relacionados a tudo aquilo que representa formas de: Ser, Ter, Fazer e Estar, contribui para a realização das necessidades humanas” (MAX-NEEF, 2012, p. 35).

Max-Neef (2012) afirma que o equilíbrio entre as formas de ter, ser, fazer e estar reduz a possibilidade de frustração e faz a defesa da subjetividade ao defender a maneira pela qual se vivencia a necessidade de cultura ou sociedade com a qualidade de vida. Ou seja, as formas de expressão passam necessariamente pelo subjetivo, visto que estão ligadas em situação histórica e forma de viver das pessoas que contemplam referências sociais, estratégias de vida, condições econômicas, relações com o meio ambiente, o que faz “satisfatores” imprimirem nas necessidades o caráter histórico e cultural e os bens econômicos em manifestação material.

Assim, definir parâmetros de desenvolvimento à escala humana remete à qualidade de vida de países ou comunidades, o que contribui para a construção de novo paradigma para o desenvolvimento, baseado no protagonismo das pessoas, na definição do modo de vida que a comunidade ou país escolhem para se desenvolver. Baseia-se, sobretudo, na autonomia das pessoas, das comunidades e países como sujeitos do processo de desenvolvimento. Entende-se o novo paradigma de desenvolvimento como resgate do valor humano voltado com atenção ao cuidado com a natureza, valorização da ética e do desenvolvimento social, econômico e cultural.

O turismo que queremos

As comunidades de Ponta Grossa, Redonda, Requenguela e Tremembé, destinos turísticos de Icapuí, concentram a maior parte dos serviços turísticos do município. Desenvolvem-se de forma diferenciada, ou seja, cada comunidade oferece distintamente serviços turísticos, o que revela formas de organização sociocultural e realidade geoambiental.

Comunidades pesqueiras tradicionais se assumem como núcleo receptor de turismo comunitário, posto que participativo. Assim, organizam-se em associações e oferecem turismo como oportunidade de trabalho e de realização humana a residentes, voltando-se ao respeito ao meio ambiente. Fazem do turismo forma de promoção do desenvolvimento pela venda de produtos turísticos, instalação de barracas de praia, restaurante à beira-mar, artesanato e oferta da culinária marítima com pratos típicos de frutos do mar. Dessa forma, as comunidades asseguram o ordenamento do território com a criação de associações, cooperativas e sindicatos, tendo em vista ações tomadas em conjunto que atendam as necessidades e o fortalecimento comunitário. Bourdin (2001) compreende que o local se desenvolve pela ideia do “viver junto” associado à defesa dos interesses coletivos. Para o autor:

A sociedade local se define primeiro como um grupo de indivíduos (ou de famílias) que partilham dos mesmos valores e vivem juntos num território em que se desenvolve o conjunto da atividade coletiva e individual, depois como a partilha de um mesmo território por diversos grupos comunitários (religiosos, étnicos entre outros). (BOURDIN, 2001, p. 199).

Comunidades de pequenas cidades assumem a lógica da coletividade, interferem na realidade e adquirem protagonismo na vida política, econômica, cultural e social. Ao se organizarem em associações e formarem movimentos sociopolíticos, buscam soluções dos problemas referentes à falta de trabalho, residência, escola, defesa do meio ambiente e da cultura, não de forma individualista. É o caso da Associação de Turismo, Cultura e Meio Ambiente de Ponta Grossa (ASTUMAC) e da Associação Tremembé Onlus, representadas que atuam nas comunidades na busca do desenvolvimento comunitário sustentável.

Para desenvolvimento do turismo comunitário, são relevantes organizações associativas, fundações e entidades engajadas no processo de planejamento e crescimento ordenado da atividade turística de Icapuí. A análise de Castelli (2001) da atuação de organizações não governamentais atenta para o fato de elas, bem como as intergovernamentais e as associadas, ainda que indiretamente ao turismo, trabalharem para atingir, por meio da atividade turística, o desenvolvimento social, econômico, cultural e educacional, com base no entendimento e compreensão internacionais, valorizando a harmonia entre os povos. Explicam Rabinovici e Lavini (2005, p. 3) que as Organizações Não Governamentais (ONGs):

Fazem parte do chamado terceiro setor, formado por entidades de caráter privado e sem fins lucrativos, as quais se orientam por valores e não pelo lucro, ou seja, possuem fins públicos e não econômicos. Contam com a capacidade de gerar projetos, assumir responsabilidades, empreender iniciativas e mobilizar recursos necessários ao desenvolvimento social do país, além de promoverem iniciativas na esfera pública, não realizadas pelo Estado ou complementares a ele, destinadas ao interesse comum. Possuem estrutura formal, são autônomas e exercem uma função política na sociedade. O objetivo maior é o benefício social para a comunidade ou públicos específicos, o qual atinge através de parcerias ou alianças estratégicas.

Nas comunidades de Ponta Grossa, Requenguela e Tremembé, o turismo apresenta-se como possibilidade de uso sustentável dos recursos naturais, com apoio das ONGs ambientalistas que se articulam com a comunidade e o governo para o desenvolvimento de programas e projetos de turismo sustentável, com vistas à compreensão da dimensão local e resolução de conflitos socioambientais. Projetos sociais de ONGs se preocupam com ecossistemas aquáticos, a exemplo da Associação de Pesquisa e Preservação de Ecossistemas Aquáticos (Aquasis), com missão de desenvolver ações e pesquisas para preservação da biodiversidade e uso responsável de recursos naturais no Nordeste do Brasil, estimulando mudanças de atitude para construção de sociedade sustentável (AQUASIS, 2018). O Instituto Terramar, ONG que atua em comunidades, sem fins lucrativos, no campo popular democrático, na proteção da Zona Costeira do Ceará, para o desenvolvimento humano com justiça socioambiental, cidadania, participação política, autonomia dos grupos organizados e fortalecimento da identidade cultural dos Povos do Mar do Ceará (INSTITUTO TERRAMAR, 2018). A Fundação Brasil Cidadão para a Educação, Cultura, Tecnologia e Meio Ambiente (FBC), ONG ou organização civil sem fins lucrativos, prioriza iniciativas por meio de projetos que permitem ao público-alvo alcançar progresso baseado na autossustentabilidade e melhoria da qualidade de vida das comunidades (FUNDAÇÃO BRASIL CIDADÃO, 2018).

Redonda é uma comunidade histórica, com forte participação de luta política no município, que foi reduto do Partido dos Trabalhadores. Possui Associação de Moradores que faz reuniões sistemáticas a fim de trabalhar o nível de consciência dos residentes. A Associação de Pescadores luta contra a pesca predatória da lagosta. Famílias desenvolvem o turismo, oferecendo pousadas e pequenos restaurantes. Alguns pescadores de lagosta são atualmente proprietários de empreendimentos turísticos no lugar, comprovando crescimento socioeconômico do grupo.

Admitem moradores que o grupo perdeu o elã pela vida comunitária. É, portanto, um retrocesso, considerando a história da politização de Icapuí e da comunidade que recebia como principal turista o ex-presidente Lula. Redonda destaca-se das comunidades por apresentar melhor estrutura de hospedagem. O turista é informado pelos donos de pousadas, bares e restaurantes quanto ao respeito às regras de convivência e de respeito ao lugar.

Icapuí conta com a Associação Grupo de Desenvolvimento do Turismo (GDTur), formada por 23 associados, empresários donos de pousadas, bares e restaurantes que trabalham com comunidades na promoção de eventos, campanha de limpeza de parais e reciclagem de lixo e em parceira com instituições como o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (SEBRAE) e o Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (SENAC), para capacitação de garçons e aperfeiçoamento da culinária, e com o governo do estado na promoção de eventos no município.

Considerações Finais

Conclui-se que, além de fenômeno político, social, econômico e cultural, o turismo envolve a forma como as comunidades litorâneas se organizam para receber a atividade, sobretudo por serem reconhecidas como “paraísos tropicais”. O turismo no município de Icapuí afirma-se como complemento de renda de famílias e empenha-se na melhoria da qualidade de vida e preservação do ambiente natural do lugar.

Nas comunidades, o turismo é prática social, cultural, ambiental e econômica transformadora de espaços, de ocupações e mentalidades. Nesse processo, o turismo na comunidade consolida-se como meio de enfrentamento de problemas sociais, econômicos e ambientais da população, em busca do desenvolvimento baseado na sustentabilidade e no fechamento das “portas” do lugar ao turismo convencional. É turismo de resistência, não há empreendimentos convencionais. O desenvolvimento pautado na responsabilidade socioambiental faz enfrentamento às desigualdades sociais, contribui para o ordenamento territorial e para a redução das desigualdades sociais, visto que a comunidade não quer e nem permite degradar o ambiente natural e tem o turismo como oportunidade de pequenos negócios para todos.

O turismo não é a única opção econômica do lugar, apenas mais uma para se somar às tradicionais e às preexistentes ao turismo. A pesca artesanal, embora seja uma atividade sem suporte do poder público para se desenvolver a contento, garante o sustento de famílias. O turismo se insere nas comunidades como mais um meio de desenvolvimento econômico, social, estímulo à preservação ambiental e valorização da cultura.

A proposta de desenvolvimento em escala humana de Max-Neef (2012) contribui para a discussão do desenvolvimento humano pautado no serviço às pessoas, com base no conhecimento das necessidades e com “satisfatores” para residentes, ou seja, todos diferenciam necessidades básicas - das induzidas pelo capitalismo às formas de satisfação das necessidades -, a exemplo das comunidades pesquisadas, que se tornaram sujeitos no processo de desenvolvimento, com participação direta na busca de soluções criativas e adequadas às necessidades.

O trabalho no turismo é altamente gratificante e não está exclusivamente voltado ao capital, mas à realização humana, podendo-se afirmar que, na prática, vivencia a afirmação de Max-Neef (2012), em que a economia está para servir as pessoas e não as pessoas para servir a economia. E, assim, o turismo tem contribuído para o desenvolvimento em escala humana. Apesar de o poder público não implantar ações específicas para regular a atividade turística, comunidades receptoras assumem a política do turismo comunitário. Organizam-se, enfrentam e se reúnem para decidir propostas de turismo, de desenvolvimento. Para as comunidades, o turismo tem sido importante para dinamizar a vida social, além de contribuir para a melhoria de ganhos econômicos com a venda dos produtos turísticos, o que tem ajudado a valorizá-las.

O turismo alternativo se diferencia do convencional por voltar-se a valores humanos, ao cultivo da amizade com visitantes, à colaboração e solidariedade entre produtores dos serviços turísticos. Para esse eixo do turismo, a prioridade é preservar o patrimônio, a cultura, além da conservação do meio ambiente e fortalecimento da consciência cidadã.

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1Área de Proteção Ambiental, por meio da Lei Municipal nº 262/98, em uma área de 555,6762 ha, situada no município de Icapuí.

2 Um dos principais destinos turísticos do estado do Ceará e Núcleo Indutor de Turismo, segundo a Secretaria de Turismo do Estado do Ceará (2016).

3Em 1925, surge na comunidade a Salina Nazareth, e em 1950, a Salina São Vicente (CARBOGIM, 2013).

4Satisfator, por ser a que melhor corresponde a “satisfactor” do original em espanhol, e a “satisfier” da tradução para o inglês (MAX-NEEF, 2012).

Recebido: 05 de Abril de 2018; Aceito: 09 de Agosto de 2018

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