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Revista da FAEEBA: Educação e Contemporaneidade

versión impresa ISSN 0104-7043versión On-line ISSN 2358-0194

Revista da FAEEBA: Educação e Contemporaneidade vol.28 no.55 Salvador mayo/agosto 2019  Epub 14-Oct-2020

https://doi.org/10.21879/faeeba2358-0194.2019.v28.n55.p13-27 

Avaliação da e na Educação Superior

AVALIAÇÃO, REGULAÇÃO E AUTONOMIA DO ENSINO SUPERIOR EM ANGOLA: PERSPECTIVAS E DESAFIOS

EVALUATION, REGULATION AND AUTONOMY OF HIGHER EDUCATION IN ANGOLA: PERSPECTIVES AND CHALLENGES

EVALUACIÓN, REGULACIÓN Y AUTONOMÍA DE LA EDUCACIÓN SUPERIOR EN ANGOLA: PERSPECTIVAS Y DESAFIOS

Gionara Tauchen*  PUCRS
http://orcid.org/0000-0002-3952-0017

Daniele Simões Borges**  FURG
http://orcid.org/0000-0002-1320-6310

João Manuel Correia Filho***  ISSS
http://orcid.org/0000-0003-0868-9108

* Doutora em Educação pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS). Docente da Universidade Federal do Rio Grande (FURG). E-mail: giotauchen@gmail.com

** Doutora em Educação em Ciências pela Universidade Federal do Rio Grande (FURG). Docente da Universidade Federal do Rio Grande (FURG). E-mail: daniele.uab@gmail.com

*** Doutor em Ciências da Educação pela Universidad de la integracion de las Americas. Docente do Instituto Superior de Serviço Social, em Angola. E-mail: jmcf82@yahoo.com.br


RESUMO

A demanda pela formação de profissionais, aliada ao entendimento do Ensino Superior como fator de desenvolvimento, contribuíram com a ampliação dos sistemas de ensino na África Subsaariana, demandando ações dos Estados como organizadores, supervisores e fiscalizadores da qualidade das instituições. Situado neste contexto, o presente artigo tem por objetivo contextualizar a organização do Ensino Superior em Angola e analisar o papel regulador do Estado na avaliação e acreditação das instituições. O estudo é de natureza qualitativa, do tipo narrativa. Por meio da análise dos dados, produziu-se o eixo narrativo Autonomia: dilemas entre avaliação e regulação. Concluímos que em Angola os marcos legais reforçam princípios reguladores do Estado-avaliador, coexistindo com a ideia de autonomia como ampliação da participação política e social. Neste sentido, é necessário articular os processos de avaliação e de regulação, pois o primeiro comporta a autonomia e a diversidade das instituições e sujeitos educativos, os quais podem subsidiar e fundamentar as decisões no âmbito da regulação do Estado.

Palavras-chave: Avaliação; Ensino superior; Autonomia; Regulação

ABSTRACT

The demand for professional training together with the understanding of Higher Education as a development factor have contributed to the expansion of education systems in sub-Saharan Africa, demanding actions of the States as organizers, supervisors and inspectors of the quality of the institutions. In this context, this article aims to contextualize the Higher Education organization in Angola and analyze the regulatory role of the State in the evaluation and accreditation of the institutions. The study is qualitative, of narrative type. Through data analysis the following narrative axis was produced: Autonomy - dilemmas between evaluation and regulation. We conclude that in Angola the legal frameworks reinforce the regulatory principles of the State as an evaluator, coexisting with the notion of autonomy as a magnifier of political and social participation. In this sense, it is necessary to articulate the processes of evaluation and regulation, as the first one involves the autonomy and diversity of the institutions and educational subjects which can subsidize and support decisions within the scope of State regulation.

Keywords: Evaluation; Higher education; Autonomy; Regulation

RESUMEN

La demanda de formación profesional aliada al entendimiento de la Educación Superior como factor de desarrollo, contribuyeron con la ampliación de los sistemas de enseñanza en el África Subsahariana, exigiendo acciones por parte de los Estados, en su carácter de organizadores, supervisores y fiscalizadores de la calidad de las instituciones. En este sentido, el presente artículo tiene por objetivo contextualizar la organización de la Enseñanza Superior en Angola y analizar el papel regulador del Estado en la evaluación y acreditación de las instituciones. El estudio es de naturaleza cualitativa, del tipo narrativo. Por medio del análisis de los datos, se produjo el eje narrativo Autonomía: dilemas entre la evaluación y la regulación. Concluimos que en Angola, los marcos legales refuerzan principios reguladores del Estado como evaluador, coexistiendo con la idea de autonomía como ampliación de la participación política y social. En este sentido, es necesario articular los procesos de evaluación y de regulación, pues el primero comporta la autonomía y la diversidad de las instituciones y sujetos educativos, los cuales pueden subsidiar y fundamentar las decisiones en el ámbito de la regulación del Estado.

Palabras clave: Evaluación; Educación superior; Autonomía; Regulación

Considerações iniciais1

Na África Subsaariana, o Ensino Superior praticamente não existia até a segunda metade do século XX, apresentando a menor taxa de matrícula do mundo (BARROSO, 2017). “Antes de 1960 existiam apenas em 18 (universidades) dos 48 países” (KANDINGI, 2016, p. 8) que a integram. O Ensino Superior, embora iniciado, em alguns países, ainda no período colonial, passou por mudanças nos objetivos e na direção estratégica nos períodos subsequentes. Após o período das independências, projetava-se que as universidades nacionais africanas contribuíssem para a superação das necessidades de recursos humanos de alto nível, provendo a formação para o exercício das profissões e para o aparelho de Estado, corrigindo a escassez de profissionais decorrente da saída dos administradores coloniais. Para Makosso e outros (2009, p. 1), as universidades da independência tinham por objetivo “[...] afirmar a soberania nacional através da nacionalização ou mesmo do empoderamento do campo acadêmico”.

No início dos anos 1970, conforme Cloete, Bunting e Maassen (2015, p. 18), “o foco havia mudado, como se refletiu na Associação Declaração das Universidades Africanas no final da Conferência de Acra, com a conclusão que todas as universidades devem ser universidades de desenvolvimento”, tendo por objetivo “supostamente contribuir para o desenvolvimento dos países em causa, cujo conteúdo é definido por líderes nacionais” (MAKOSSO et al, 2009, p. 1). Contudo, muitos governos, alimentados pelas influências das lutas políticas da Guerra Fria e orientações socioeconômicas do Banco Mundial, não conseguiram organizar um modelo coerente para o desenvolvimento do Ensino Superior.

Alves (2018, p. 3) também destaca que “no plano político, desde o fim dos anos 1980, a África testemunha a transição do monopartidarismo, das ditaduras personalistas e dos governos militares para o pluripartidarismo [...]”, sendo difundida e incorporada uma agenda de valores transnacionais considerados essenciais para as reformas do Estado e para obter investimentos ou doações dos Estados Unidos e União Europeia: “a democracia, os direitos humanos, o livre-mercado e a governança.” (ALVES, 2018, p. 5). Neste contexto, o Estado vem sendo o responsável pela expansão do Ensino Superior, conciliando as pressões do mercado, especialmente pela liberalização da circulação de serviços educacionais no quadro da Organização Mundial do Comércio (OMC), e a ampliação da oferta pública voltada para a interiorização deste nível de ensino.

Makosso e outros (2009, p. 1) analisa que nesse processo de evolução, a partir da década de 1970, observa-se a “africanização dos postos de ensino e pesquisa, a expansão e multiplicação de estabelecimentos, a introdução de novas marcos estatutários e a criação de órgãos para orientar as políticas nacionais”. No entanto, dentre outras dificuldades, a “África Subsariana enfrenta um déficit de capital humano qualificado” (KANDINGI, 2016, p. 15).

Em Angola, o Ensino Superior teve início no período colonial com a criação, em 1962, dos Estudos Gerais Universitários - Decreto-Lei nº 44.530 -, os quais evoluíram para a criação da Universidade de Luanda em 1968 - Decreto Lei nº 48.790 -, que, no processo de descolonização, deu lugar, em 1976, à Universidade de Angola - Decreto-Lei nº 60 -, que, posteriormente, em 1985, passou a ser designada Universidade Agostinho Neto - Resolução nº 1, de 1985, do Conselho de Segurança e Defesa -, a primeira universidade pública do país (BUZA et al, 2018). Após a independência do país, em 1975, iniciou-se o processo de mudança estrutural do sistema de ensino, buscando ampliar as oportunidades de acesso, mas, em virtude dos 27 anos de guerra civil que assolaram o país até 2002, com mais de 500 mil mortos, devastando a infraestrutura, a administração pública e as instituições, a afirmação e o desenvolvimento do Ensino Superior foram fragilizados.

Somente em 2009 o subsistema passou por um processo de reorganização e de interiorização em sete regiões acadêmicas (em 2014, criada a Região Acadêmica VIII, com a Universidade Cuito Canavale), contando, cada uma, com uma universidade pública decorrente do desmembramento da única universidade pública existente em Angola, a Universidade Agostinho Neto. Neste mesmo ano também foram aprovadas as Normas Gerais Reguladoras do Subsistema do Ensino Superior, Decreto Presidencial nº 90, 2009. Na sequência, aprovado o Estatuto Orgânico do Ministério do Ensino Superior e da Ciência e Tecnologia (MESCT), por meio do Decreto nº 70, de 2010, e o Estatuto Orgânico do Ministério do Ensino Superior, Decreto nº 233, de 2012. (BUZA et al, 2018; KANDINGI, 2016; ZAU, 2017)

Buza e outros (2018, p. 146) expressa que “a percentagem de docentes em tempo integral no conjunto dos docentes do ensino superior fica-se pelos 42%; a percentagem de docentes com grau de doutor é apenas de 33%; o número de estudantes matriculados por docente doutorado é de 288”, incluindo instituições públicas e privadas e, ainda, o fato de muitos docentes atuarem em mais de uma instituição.

Conforme estudos de Mendes e Silva (2017), as demandas das políticas nacionais voltadas para a regulação do subsistema de Ensino Superior em Angola resultam do processo de liberalização que acompanhou a expansão do ensino, que contava, em 2016, com 24 instituições públicas e 40 privadas, e do processo de redimensionamento da universidade pública, sendo 8 públicas e 10 privadas, 41 institutos superiores, 11 públicos e 30 privados, e 4 escolas superiores públicas, sendo que a maioria das instituições privadas concentra-se na província de Luanda.

Conforme analisa Zau (2017), a pressão permanente sobre o Ensino Superior como fator de desenvolvimento, a proliferação de instituições privadas, a falta de docentes, as dificuldades de gestão das instituições, entre outros aspectos, colocam o Estado como organizador, supervisor e fiscalizador da qualidade das instituições.

Situado nesse contexto, o presente artigo tem por objetivos: a) contextualizar a organização do Ensino Superior em Angola, um dos países da África Subsariana; b) analisar o papel regulador do Estado na avaliação e acreditação das instituições de Ensino Superior.

A organização do Ensino Superior em Angola

O Ensino Superior em Angola é considerado um meio basilar para o desenvolvimento sustentável e para a redução da pobreza e, consequentemente, a melhoria da qualidade de vida da população. Em conformidade legal das Normas Gerais Reguladoras do Ensino Superior no Decreto Lei nº 90, de 2009 (ANGOLA, 2009), em Angola as instituições de ensino superior estão estruturadas da seguinte forma:

  1. Universidades são aquelas que ministram cursos em todas as áreas do saber, sendo no mínimo em quatro áreas, conducentes à formação de especialistas e à obtenção dos graus acadêmicos de bacharelado, licenciatura, mestrado e doutoramento. Elas estruturam-se em Unidades Orgânicas, sendo: Faculdades, Institutos superiores, Escolas superiores e Centros de estudos e investigação científica.

  2. Academias pautam a sua atuação pela articulação do estudo, da docência da investigação aplicada e avançada, em uma única área do saber, conducente à formação de especialistas e à obtenção dos graus acadêmicos de mestres e doutores.

  3. Institutos superiores técnicos e politécnicos apresentam cursos em uma única área do saber e em duas ou três áreas do saber conducentes à formação de especialistas e à obtenção dos graus acadêmicos de bacharelado, licenciatura, mestrado e doutoramento.

  4. Escolas superiores são as escolas superiores técnicas e politécnicas que ministram cursos em uma única, em duas ou três áreas do saber, conducentes à formação de especialistas e à obtenção dos graus acadêmicos de bacharelado e licenciatura em modelo bietápico.

A universidade é uma instituição educativa que visa exercício permanente da crítica, que se sustenta na pesquisa, ensino e na extensão, ou seja, a universidade tem a tripla função. De acordo com a Lei nº 17, de 2016 (ANGOLA, 2016), o subsistema do ensino superior visa à formação de quadros de alto nível para os diferentes ramos de atividade econômica e social do país, assegurando-lhes uma sólida preparação cientifica, técnica, cultural e humana.

No Artigo 31° da Lei nº 17, de 2016 (ANGOLA, 2016), o ensino superior compreende o ensino universitário e o ensino politécnico. O ensino universitário visa assegurar uma sólida preparação científica e cultural e proporcionar uma formação técnica que habilite para o exercício de atividades profissionais e culturais e fomente o desenvolvimento das capacidades de concepção, de inovação e de análise crítica, ao passo que o ensino politécnico visa proporcionar uma sólida formação cultural e técnica de nível superior, desenvolver a capacidade de inovação e de análise crítica e ministrar conhecimentos científicos de índole teórica e prática e as suas aplicações com vista ao exercício de atividades profissionais.

Os níveis de formação são estruturados em dois: o nível de graduação e o de pós-graduação. A primeira subdivide-se em bacharelado e licenciatura (1º Ciclo), ao passo que a pósgraduação pode ser acadêmica ou profissional. A pós-graduação acadêmica é subdividida em Mestrado (2º Ciclo) e Doutoramento (3º Ciclo), e a pós-graduação profissional compreende a especialização. O bacharelado, segundo artigo 38º da LBSE (ANGOLA, 2016, p. 25), leva “ao estudante a aquisição de conhecimentos científicos para o exercício de uma atividade prática no domínio profissional respectivo, em área a determinar, com caráter terminal”. O seu período de formação é de três anos. A licenciatura corresponde a um ciclo de formação mais prolongado, que vai de quatro a seis anos. A licenciatura visa a “aquisição de conhecimentos, habilidades e práticas fundamentais dentro do ramo do conhecimento respectivo e a subsequente formação profissional ou acadêmica específica” (ANGOLA, 2016, p. 43).

A pós-graduação acadêmica está estruturada em mestrado acadêmico, de dois a três anos de duração, que visa essencialmente enriquecer e desenvolver competências técnico-profissionais do indivíduo licenciado; e doutoramento, com a duração de quatro a cinco anos, que visa proporcionar, segundo o artigo 33º da LBSE (ANGOLA, 2016, p. 44), a “formação cientifica, tecnológica ou humanística, ampla e profunda aos candidatos diplomados em curso de licenciatura e/ou mestrado”. A pós-graduação profissional compreende a especialização, de duração nunca superior a um ano.

Abordagem metodológica

O estudo, de natureza qualitativa, tem como paisagem educacional o contexto do Ensino Superior em Angola. A pesquisa foi organizada através de dois movimentos metodológicos seguindo os pressupostos da pesquisa narrativa (CLANDININ; CONNELLY, 2015), sendo esta uma forma de compreender a experiência da avaliação no Ensino Superior angolano, sob o ponto de vista individual e social. Desse modo, primeiramente nos propomos a uma investigação de cunho analítico, visando produzir ideias sobre o propósito político e social do Ensino Superior em Angola. Olhamos para a experiência educativa a partir da legislação e de momentos históricos de tempo e espaço refletidos e compreendidos em termos de unidades narrativas, ou seja, que produziram um significativo histórico que precisa ser narrado.

Num segundo movimento, buscou-se o aprofundamento analítico-avaliativo das percepções dos docentes que estão ou estiveram vinculados, por meio da gestão, aos processos de avaliação do Ensino Superior. Foram entrevistados sete docentes que atuam em instituições públicas de Ensino Superior situadas em Luanda. Utilizamos como recurso para produção dos dados uma entrevista com questões abertas, nas quais os sujeitos tiveram condições de expressar, por meio do diálogo, seus relatos narrativos.

As narrativas, gravadas e transcritas, foram organizadas em dois blocos: no primeiro realizou-se o trabalho de intersecção do pessoal com o social, e a partir disso retomamos nossas indagações e objetivos de pesquisa, nos colocando no entremeio das estruturas narrativamente produzidas durante todo o processo de organização desta investigação; no segundo delineamos possíveis ligações e encontros narrativos que culminaram no eixo narrativo de discussão: Autonomia: dilemas entre avaliação e regulação.

Resultados e discussões

Decorrente dos desafios de desenvolvimento e de inserção nacional e internacional, Angola aprovou, em 2016, uma nova Lei de Bases do Sistema de Educação e Ensino (ANGOLA, 2016). A Lei reafirma, como objetivo da educação e do ensino, o desenvolvimento humano com base na aprendizagem ao longo da vida, vinculado à ampliação da qualidade dos níveis de ensino e “excelência dos processos de ensino e aprendizagem” (ANGOLA, 2016, p. 1). Afirma que todas as instituições de Ensino Superior gozam de autonomia para a tomada de decisões referentes ao funcionamento e organização (Art. 77); liberdade acadêmica, vinculada à pluralidade de concepções e de métodos (Art. 78); e gestão democrática, adotando estruturas e processos participativos (Art. 79). Expressa ainda, no Art. 96, que “o mapeamento das Instituições de Ensino Superior, a orientação e o controlo das infraestruturas e da Rede de Instituições de Ensino Superior são da competência do Titular do Poder Executivo” (ANGOLA, 2016). Destaca-se, ainda, nos Art. 100 e 101, que cabe ao Titular do Poder Executivo, monitorar, controlar, fiscalizar e avaliar as instituições.

Nesse sentido, considerando a necessidade de assegurar a qualidade e conferir credibilidade às instituições, em 2018, foi aprovado o Decreto Presidencial nº 203/2018 (ANGOLA, 2018), estabelecendo o Regime Jurídico da Avaliação e Acreditação da Qualidade das Instituições de Ensino Superior. Os Art. 18, 19 e 20 disciplinam a organização e os intervenientes em três processos: autoavaliação, avaliação externa e acreditação.

Por meio do Decreto nº 203/2018 (ANGOLA, 2018), expressa-se que o Conselho Nacional de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior (CNAAES) tem caráter consultivo e atua como órgão de coordenação e supervisão. Compete a ele, segundo o artigo 20, “colaborar na definição das políticas de avaliação e acreditação do ensino superior, supervisionar o processo e proceder à avaliação e a consistência das normas, procedimentos e mecanismos inerentes ao processo [...]” (ANGOLA, 2018). Outro interveniente é o Instituto Nacional de Avaliação, Acreditação e Reconhecimento dos Estudos do Ensino Superior (INAAREES), serviço especializado do Departamento Ministerial criado por meio do Decreto Presidencial nº 252/2011 (ANGOLA, 2011), que tem por atribuição executar as políticas de avaliação e acreditação e assegurar a implementação e o desenvolvimento dos processos de avaliação externa. A autoavaliação situa-se no nível das instituições de Ensino Superior, organizada por meio de Comissões de Autoavaliação, sendo, segundo o artigo 24, “o ponto de partida do Sistema de Garantia da Qualidade do Ensino Superior” (ANGOLA, 2011).

A autoavaliação tem por princípios, definidos a partir do Art. 21 do Decreto Presidencial nº 203/18 (ANGOLA, 2018), a participação, a transparência, a regularidade e progressão, a obrigatoriedade e a divulgação. Princípios que nem sempre são experienciados pelas práticas sociais que sustentam as culturas das instituições. Neste sentido, como são percebidas as políticas de Estado e as finalidades da avaliação interna e externa? Que efeitos vêm sendo produzidos pela regulação do Estado nas culturas institucionais? Que tensões e conflitos são percebidos no âmbito da autonomia das instituições?

Conforme relatos da pesquisa, tomando como referência os movimentos políticos que incidiram sobre a Universidade Agostinho Neto e sobre a cultura do Ensino Superior no país, contextualiza-se que,

[...] no primeiro momento, o contexto do país era de um Estado-Partido, em que tudo era partidarizado por um partido único que dirigia. Nem se colocava a questão da autonomia da Universidade, porque era apenas a executora dos ideais de quem estava a governar. Depois, vai ocorrendo um distanciamento da academia como um espaço ‘político’ e traz a universidade para um lado acadêmico, culminando com o processo de eleição na Universidade. Todavia, esse processo é afetado com a destituição da então reitora que havia sido eleita. Então, será que há mesmo a autonomia das instituições ou não? Esse contexto ainda era de resquícios do Estado-Partido/ Partido-Estado. Quase no final desta fase, em que se tentava repor a autonomia, houve o que denomino de ‘sequestro da autonomia’, porque criou-se um órgão tutela para o Ensino Superior, trazendo para si muitas competências e praticamente amarrou, prendeu a ação das instituições ao ponto de serem feitas nomeações em dois mandatos consecutivos. Esse processo, obviamente, agravou mais o conceito da autonomia, pois acabaram com os órgãos colegiais. Os Conselhos Científicos e Pedagógicos tentaram caminhar, mas ficaram esvaziados na sua competência. Hoje em dia, estamos a fazer um retorno para tal autonomia. É aí que vemos que a instituição, no uso da autonomia, deverá também encontrar o espaço para a avaliação institucional, que deve ser feita a avaliação interna e estar preparada para a avaliação externa. (ENTREVISTADO A, grifo nosso).

Essa dependência das universidades em relação à tutela também é destacada por Zau (2017), ao analisar os efeitos das Normas Gerais Reguladoras do Subsistema do Ensino Superior (Decreto nº 90/09): são atribuídas à tutela competências como “[...] a abertura de novos cursos, a homologação dos regimes de avaliação interna, o estabelecimento das normas curriculares e pedagógicas, incluindo orientações metodológicas gerais” (ANGOLA, 2009, p. 43), restringindo a autonomia aos processos institucionais de natureza micro. O contexto social mais amplo atua, simultaneamente, na comunidade micro. Desse modo, a autonomia não consegue estar desconectada dos propósitos políticos. Por esta razão, precisamos levar em conta que as políticas educacionais não só produzem recomendações em âmbito legal e pressupostos de atuação, mas, também, consentem pretensões e valores.

Nessa perspectiva, Silva (2016, p. 220) também expressa que “[...] denota-se o facto de os actos de gestão dos responsáveis das IES carecem sempre, ou de prévia autorização, ou de homologação subsequente”. Neste sentido, a autonomia da universidade pública passa a ser controlada seja pela necessidade de financiamento do Estado e dos atos normativos, seja pela regulação realizada por meio da avaliação. Conforme Silva (2016, p. 221),

Basta referir que, nos Artigos 15, 16 e 17 do supracitado Decreto n. 90/09, à tutela são atribuídas 40 competências (13 no domínio académico, 20 no domínio da gestão e 7 no domínio da investigação e extensão). Às IES estão reservadas apenas 12 competências (4 no domínio científico e pedagógico, 4 no domínio administrativo e 4 no domínio financeiro). É caso para considerar que às IES resta uma autonomia implementativa, meramente instrumental, ou seja, operam num contexto de autonomia mitigada.

A autonomia, do grego autós e nomos, está presente nas diversas áreas do conhecimento e, por isso, seu conceito é polissêmico, mas essencialmente político. Contreras (2002), ao analisar a autonomia na dimensão educativa, pondera que ela enquanto atributo tem existência ilusória. O autor explica que se no contexto educacional a autonomia vincula-se exclusivamente às diretrizes técnicas e burocráticas do Estado, sua capacidade libertadora e transformativa torna-se não ingerência.

Motta (2018, p. 284) expressa que a autonomia universitária está situada em um âmbito particular: “trata-se autonomia organizativa, assim reconhecida como o poder de se organizar, mediante a edição de normas próprias”. Tomando como referência a doutrina institucionalista do Direito Público, Motta (2018, p. 285) explica que um ordenamento pode ser considerado, “[...] ao mesmo tempo, dependente e independente de outro, sendo a graduação da autonomia variável em função da distância que separa o ordenamento autônomo do ordenamento superior que lhe originou”. No caso do Ensino Superior angolano, especialmente da universidade pública, que está vinculada aos processos que marcaram a independência (1974), em que o Estado tomara a universidade soviética como inspiração (ligada ao partido, vinculando ensino e vida, voltada para a construção de uma nova sociedade etc.), registra-se que a universidade “foi objeto de orientações políticas para que pudesse funcionar como ‘instrumento da revolução socialista’” (SILVA, 2016, p. 33, grifo do autor).

Assim, a universidade angolana teve sua autonomia diretamente vinculada ao ordenamento superior que lhe originou, isto é, controlada pelo Estado e submetida às influências ideológicas do Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA). Nesse sentido, a autonomia é quase que uma retórica que passa a ser utilizada pelo Estado para aumentar o controle em relação ao que se produz enquanto conhecimento científico e o que se faz, ou seja, ao que opera nos âmbitos curriculares e de ensino.

Silva (2016, p. 35, grifo do autor) expressa que, no período de afirmação revolucionária (1976-1980),

Enfatizava-se a natureza ideológica e instrumental da universidade em relação às tarefas da revolução, fazendo daquela o foco de atenção do Partido e do Governo no sentido de a configurar como ‘agência ideológica do regime’ e como ‘fábrica de intelectuais revolucionários’ capazes de colocarem ao serviço do povo os seus conhecimentos.

No período, denominado por Silva (2016, p. 38) como ajustamento e expansão (19801991), a Universidade Agostinho Neto, por meio do Estatuto Orgânico do Ministério da Educação (Decreto nº 9/87), tem sua estrutura dependente deste, sendo considerada “[...] extensão da administração central, com tarefas relacionadas com a concepção e planeamento da política nacional para o ensino superior”. Conforme expressa um dos entrevistados, “os Reitores e os Diretores eram nomeados e não tinham nenhum compromisso com a universidade. O único compromisso era com o critério político que o nomeou, na circunstância que o nomeou” (ENTREVISTADO E). Esta prática pode ser um exemplo do controle administrativo da universidade pelo viés da implementação política na educação. A educação é percepcionada como um bem público, em que o ordenamento do Estado deve prevalecer, definindo inclusive os pressupostos ideológicos a serem desenvolvidos.

Nesse contexto, evidenciam-se conflitos entre as demandas acadêmicas e políticas: os docentes passam a reivindicar mais autonomia, revisão do plano de carreira e a se posicionar em relação às orientações ideológicas dos planos curriculares e dos processos de gestão. “Neste processo, a luta pela autonomia assumiu particular realce visando a criação de condições de estabilidade da vida universitária e de mecanismos relacionados com o poder político” (SILVA, 2016, p. 39). Contudo, essa autonomia é sempre relativa e dependente, pois “[...] não há entidade soberana que não seja o próprio Estado” (MOTTA, 2018, p. 287).

Por isso, a autonomia universitária possui caráter instrumental vinculado ao alcance dos seus objetivos e finalidades, os quais estão vinculados ao lugar que ocupa no projeto de Nação. Dessa forma, os contornos e limites da autonomia universitária podem ser observados nos Decretos e demais textos normativos do Estado. Demarchi (2012, p. 51) expressa que o Estado é “[...] uma ordem jurídica que possui a finalidade de regular e assim organizar as diferentes relações entre os indivíduos em determinado espaço geográfico, valorizando e defendendo o interesse coletivo”.

O Estado é uma unidade política (relativamente) independente que ocupa um território permanentemente habitado. Logo, é a instituição organizacional e normativa, à qual cabe coordenar e regular toda a atividade social. Decorre do Estado, portanto, a ordem jurídica ou lei organizada pela sociedade para coordenar suas próprias ações. Entretanto, sendo uma construção social, o Estado também se modifica, especialmente no contexto global de intensificação das informações e circulação das pessoas, produtos e serviços, em que a falta de controle da economia nacional, decorrente do processo de globalização, afeta diretamente os sistemas educacionais e a resolução dos seus problemas. Se concordamos com as definições de que o Estado é constituído por um território que delimita sua ação soberana e que esta soberania se constitui pelas relações de poder que unificam seu ordenamento, nos Estados democráticos vincula-se à vontade dos cidadãos. Quando deslocamos essa cidadania vinculada ao Estado para a ideia de cidadania planetária, por exemplo, o Estado parece ser insuficiente para intervir em problemas compartilhados como, por exemplo, o aquecimento global. Neste sentido, pelas vias globalizantes, produz-se a necessidade de intervenções internacionais da Organização das Nações Unidas (ONU), da Organização Mundial do Comércio (OMC), da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), do Banco Mundial, entre outros. Demarchi (2012, p. 105), expressa que

[...] a globalização no aspecto político, isto é, de nação, com base no cidadão também subverte esta ordem ao considerar os princípios e fundamentos que são gerais como, por exemplo, a segurança, o meio ambiente, direitos humanos e redução da violência em necessidades humanas globais.

Nesse sentido, no âmbito da ação política globalizada, não restam dúvidas de que os Estados precisam produzir o aparato ordenador das instituições educativas e produzir sistemas reguladores, os quais operam por meio da avaliação. A credibilidade dos sistemas e o financiamento das reformas são subordinados à incorporação de orientações ou contrapartidas educacionais que transcendem o aparelho de Estado. Por isso, mesmo em países africanos como Angola, Cabo Verde e Timor Leste, em que o ensino superior universitário público é recente, o sistema de avaliação das instituições de ensino superior já é um imperativo e decorre da política de Estado. Desse modo, Afonso (2009) tece a crítica que essa vinculação administrativa-burocrática na concepção de educação adere a ela um status de mercadoria e não apenas como bem público. Ou seja, o sistema de avaliação das instituições de ensino superior é visto como assente a responsabilização, como controle organizacional, por sua vez, esta mesma avaliação não estará preocupada em compreender a complexidade dos processos de ensino e de aprendizagem na universidade, mas, sobretudo, interessada nos resultados observáveis e quantificáveis. Um dos entrevistados da pesquisa contextualiza essa questão:

Até aqui, esta autonomia tem sido muito pouca, ou pelo menos só discursivamente. Isto porque o atual quadro jurídico que regula o funcionamento das instituições limita muito essa autonomia. Trouxe para o Ministério um conjunto de atribuições e competências que deviam estar nas instituições, condicionando inclusivamente a ação dos Reitores e Diretores Gerais, no sentido em que determinadas ações devem ser previamente autorizadas pelo Ministro, e em outros casos, os atos praticados têm que ser posteriormente homologados pelo Ministro. (ENTREVISTADO C).

A criação de sistemas de avaliação, de forma geral, decorre da ação reguladora dos Estados em um cenário de diversificação de modelos institucionais, de expansão das instituições e do acesso ao Ensino Superior, de integração e de reconhecimento internacional. Neste contexto, a expansão do Ensino Superior também vem acompanhada pela ampliação das instituições privadas, provocando, muitas vezes, um desequilíbrio do binômio qualidade-quantidade (VERHINE; FREITAS, 2015).

Nesse sentido, a avaliação vem sendo utilizada para orientar as políticas públicas e para tentar garantir a excelência das instituições diante das necessidades do desenvolvimento do sistema econômico. Logo, a avaliação torna-se um eixo estratégico das políticas e das reformas educativas. O Estado, ao admitir a lógica do mercado, baseado num modelo neoliberal e competitivo, importa para o campo da educação modelos de gestão que enfatizam a excelência e a eficácia visando criar altos padrões para se inserir, manter e enfrentar a competitividade internacional que tem como foco os resultados dos sistemas de ensino (AFONSO, 2009).

Nesse sentido, Readings (2002) expressa que a “excelência” pode funcionar como critério de avaliação de qualquer coisa, pois “não tem nenhum conteúdo”, expressando o quão relativo é este conceito. Fato é que a avaliação de cursos e instituições vem sendo o principal instrumento para a “[...] organização e implementação das reformas educacionais em um cenário em que coexistem movimentos de tensão e de retração dos Estados [...]” (TEODORO, 2013) e, também, tendências de ampliação das políticas indutoras e de controle dos Estados, orquestrando um conjunto de estratégias que caracterizam o Estado-avaliador (NEAVE, 2012; QUEIROZ, 2011), que concentra sob sua administração as estratégias de desenvolvimento, definindo e orientando a execução da política nacional de Ensino Superior, considerando a qualidade das instituições como de interesse público. Desse modo, é evidente que a “[...] mudança nas políticas governamentais pode, em determinadas conjunturas, resultar em mudanças nas práticas avaliativas” (AFONSO, 2009, p. 50).

Nessa perspectiva, como controlador, o “Estado teria a legitimidade para, de forma centralizada, estabelecer as políticas públicas de educação, os planos e a legislação complementar, no âmbito do princípio da homogeneidade legal, assumindo o controle das IES” (MENDES; SILVA, 2017, p. 6). Como supervisor, o Estado “[...] obedece ao princípio da diversidade e da aceitação do mercado como elemento para a diversificação das instituições de ensino superior, onde o Estado exerce uma supervisão mais distanciada, estabelecendo os parâmetros da qualidade” (MENDES; SILVA, 2017, p. 6), creditando “maior autonomia” às IES e os resultados da avaliação usados para a tomada de decisões.

Nessa perspectiva, um dos entrevistados aborda a ação do Estado no cenário de ampliação do subsistema do Ensino Superior em Angola:

O Decreto nº 90/09 veio para dar as normas regulatórias do sistema de Ensino Superior em Angola, travando, um pouco, aquilo de estava acontecendo: o surgimento de várias instituições de Ensino Superior sem serem reguladas. Então, o governo toma o Decreto 90, expressando que o privado que queira promover instituições de ensino superior não pode começar como universidade, tem que começar como instituto superior. A partir dai, há um problema: já havia instituições que tinham sido autorizadas pelo Governo com o nome universidade. O que acontece é que essas instituições, que são instituições de ensino superior, os institutos, as escolas politécnicas por aí, ainda que os seus processos sejam superiores, comparativamente com algumas universidades, não podem evoluir para universidade sem passar por uma avaliação. É isso que o Decreto nº 90/09 condiciona. E, veja, uma das coisas que eu chamo atenção: o INAAREES surgiu em 2013, mas não tem muito quadro para avaliar as instituições de ensino superior. Assim, toda a política avaliativa do ensino superior ficou ‘adiada’. (ENTREVISTADO F, grifo nosso).

Sobre o conceito avaliação, Verhine e Freitas (2015, p. 605) expressam que pode ser entendido “[...] como sendo o levantamento de informações sobre o processo que está sendo avaliado para subsidiar a tomada de decisão com vistas à melhoria do referido processo”. Conceber a avaliação como processo significa situá-la no âmbito das atividades desenvolvidas pelas instituições, isto é, de forma contextualizada e contínua, acompanhando de forma sistemática e permanente suas ações, conforme critérios, produzindo informações que subsidiem a compreensão com vistas ao aperfeiçoamento. “Assim, a tomada de decisões referente ao valor de algo serve como o ponto de interseção entre avaliação (que fornece as informações necessárias) e regulação governamental” (VERHINE; FREITAS, 2015, p. 605). Tem-se, assim, a utilização da avaliação como um instrumento de regulação.

Nesse sentido, são importantes as contribuições de Neave (2012), que nos ajuda a compreender as forças históricas subjacentes ao fenômeno do Estado-avaliador, delineado e consolidado no contexto do Estado-nação. Embora os estudos de Neave (2012) façam referência ao contexto da Europa Ocidental, suas considerações são fundamentais para a compreensão do fenômeno da avaliação que se manifesta, de diferentes formas, em todos os continentes. Para Neave (2012, p. 676), “o Estado-avaliador tem como objetivo essencial assegurar a mobilização contínua do sistema de ensino superior por meio da avaliação periódica de sua produtividade, seu desempenho e sua utilização de recursos públicos”. E, para compreendê-lo, precisamos mapear e acompanhar o conjunto de medidas que configuram sua dinâmica.

Assim, Neave (2012) situa as origens do Estado-avaliador nas três crises mutuamente constitutivas que emergiram na Europa Ocidental na segunda metade do século XX: 1) “o ressurgimento de demandas sociais por ensino superior” (NEAVE, 2012, p. 676); 2) o financiamento desta demanda massiva; e 3) a eficiência operacional, sendo ela a propulsora das mudanças administrativas nos sistemas, reconfigurando, também, sua epistemologia. Em outras palavras, transformou-se as compreensões sobre eficiência operacional em virtude da distribuição e da otimização dos recursos, introduzindo outras dimensões à supervisão administrativa e pública, diversificando e ampliando os procedimentos e as formas de verificação e de avaliação.

Sendo assim, o desenvolvimento dos indicadores de desempenho institucional foi inicialmente concebido “[...] em termos de atualização e aumento de eficiência da relação existente - uma eficiência operacionalizada primariamente em termos de compressão orçamentária, com novos parâmetros para a utilização de recursos acadêmicos” (NEAVE, 2012, p. 680). Os indicadores de desempenho são meios de gerenciamento que possibilitam comparar resultados verificáveis e “desvios” com vistas a um fim. Por isso, os indicadores integram os sistemas de medição de desempenho (eficiência e eficácia) e vinculam-se à gestão estratégica da qualidade. Esse modelo de gestão não é neutro e tem um viés positivista, aderindo para o contexto da educação aspectos da área da racionalidade econômica (AFONSO, 2009). Aos sistemas de ensino, nesse sentido, produz-se a necessidade da criação de indicadores mensuráveis como meios possíveis para promover a separação, hierarquia e imposição; em outras palavras, indicadores globais são estratégias de legitimação do Estado-avaliador.

Neave (2012) também expressa que o conceito de homogeneidade legal será o principal constructo a regular as relações. Por meio de leis, decretos e portarias homogeneíza-se o status jurídico de todas as instituições de ensino superior, especialmente público, e introduzem-se mudanças de maneira uniforme. Paralelamente, são estabelecidos mecanismos de “[...] revisão e avaliação com o objetivo de fortalecer a capacidade institucional de inovação e iniciativa autodeterminadas” (NEAVE, 2012, p. 683), suavizando a homogeneidade legal e encorajando as iniciativas das instituições. Neste sentido, as autonomias e as identidades institucionais são acompanhadas pelas perversidades das políticas homogeneizadoras, invisibilizando realidades, mazelas e potencialidades do ensino superior. Neave (2012, p. 684) explica que “a homogeneidade legal migrou para o domínio operacional e evoluiu para uma homogeneidade de avaliação, sustentada de forma explícita e deliberada por rigorosos procedimentos formais de auditoria [...]”, vinculadas às metas de desempenho e de produtividade (número de estudantes, de docentes doutores, de publicações etc.), possibilitando verificações e análises com impactos no financiamento das instituições. Neste sentido, o Estado-avaliador “é um agente para verificação de eficiência [...]” (NEAVE, 2012, 185) e “é poderoso exatamente porque sua função é verificar que as políticas tenham sido adotadas” (NEAVE, 2012, p. 186). O conjunto de informações possibilita a comparação entre as instituições, a sustentação das políticas, a verificação das mudanças institucionais, a percepção da eficiência econômica, a transformação do “tempo acadêmico” em “tempo produtivo”, os quais afetam, diversificam e complexificam as finalidades das instituições.

Muñoz e Marum-Espinosa (2012, p. 153), discutindo as relações entre autonomia e responsabilidade social da universidade, expressam que:

La autonomía universitaria se encuentra también en una encrucijada, pues actualmente se há visto limitada e irrumpida por la avaluación y el financiamiento gubernamental articulado a ella, y su mayor responsabilidad social como un pilar fundamental del desarrollo y de la sustentabilidad de éste [...].

Dessa forma, a autonomia universitária precisa ser compreendida como interação social historicamente construída, com limites e possibilidades configurados pelas práticas sociais decorrentes das concepções e formas de interação. A autonomia não é um fim, pois depende dos diversos níveis de interação e dos atores sociais. Pode ser considerada um princípio, mas condicionada pelos meios e pelas práticas sociais orientadas por outros princípios coexistentes como a participação, por exemplo. “Como relação e prática social, portanto, a autonomia será sempre o produto de uma conjuntura histórica e nunca a resposta definitiva para contradições e conflitos sociais, insondáveis e imprevisíveis” (MARTINS, 2002a, p. 200).

Essa conjuntura histórica é destacada por um dos participantes da pesquisa:

Portanto, as instituições ficaram muito limitadas na sua ação e muito condicionadas, de tal forma que hoje praticamente não arriscam exercer a autonomia. Agora, estamos a preparar um regime jurídico para as instituições, em que esta autonomia é devolvida às instituições. Para a avaliação, precisam deter autonomia para definir os cronogramas, os objetivos, os planos e os indicadores. (ENTREVISTADO C).

Se há a intenção de mudar a cultura das instituições, não seria necessário mudar antes sua auto-organização? Por que se percebe que as instituições foram “condicionadas” em seu papel social? Parece-nos que as configurações políticas e ideológicas dos movimentos da independência do país culminaram com excessivo controle por parte do Estado, pois suas lutas não foram travadas nos espaços intra-institucionais. Pelo contrário, estes serviam aos ideais do Estado. Assim, a avaliação do Ensino Superior em Angola quer enquanto produto mais que resultados educacionais, e sim utilizá-la como mecanismo a favorecer a expansão do Estado.

Nesse sentido, Martins (2002a, p. 231) corrobora com a ampliação dos entendimentos da pesquisa ao expressar que no campo da educação “o conceito de autonomia encontrase reduzido à redefinição de procedimentos administrativos e financeiros”.

Considerações finais

Em Angola, muitos processos de reorganização do Ensino Superior vêm ocorrendo a partir da última década, dentre os quais destacamos o Decreto Presidencial nº 203/2018 (ANGOLA, 2018), que estabelece o regime jurídico de avaliação e acreditação da qualidade das instituições de Ensino Superior, demandando mudanças que incidem sobre a autonomia das instituições e nas suas relações com o Estado, conforme destacado pelos entrevistados. O Decreto disciplina que a avaliação e a acreditação serão pautados pelos seguintes princípios gerais: pedagógico, inclusivo, globalidade, participativo, contínuo, isenção, legitimidade, equidade, caráter público, contextualização nacional, adequações aos padrões internacionais e autoridade técnica.

Então, nesse cenário, que lugar ocupa a autonomia das instituições? Quando contrastamos os princípios da avaliação e acreditação com a Lei nº 17/16 (ANGOLA, 2016), que estabelece os princípios e bases gerais do sistema de educação e ensino, nomeadamente legalidade, integralidade, laicidade, universalidade, democraticidade, gratuidade, obrigatoriedade, intervenção do Estado, qualidade de serviços, promoção dos valores morais, cívicos e patrióticos, encontramos a autonomia ligada à ideia de participação social. Os princípios pedagógico e inclusivo expressam que a qualidade e a avaliação integram os esforços de mudança cultural desenvolvidos no âmbito das instituições, os quais são garantidos mediante a participação. O princípio da isenção, por sua vez, expressa a preocupação com a preservação da identidade e dos valores institucionais. Já na Lei nº 17/16, o princípio da democraticidade reforça a necessidade de participação social, pois entende que todos são agentes da educação.

A ideia de ampliação da participação política e social vincula-se à descentralização do poder, mas no caso de Angola, os referidos marcos legais reforçam princípios reguladores centrados no Estado: o da legitimidade, da equidade, do caráter público, da contextualização e da autoridade técnica (ANGOLA,2018). Então, trata-se de processos de descentralização ou de desconcentração? Martins (2002b) e Parro (2012) expressam que a desconcentração refere-se aos processos nos quais as responsabilidades são transferidas aos entes ou unidades do sistema, mas o poder de decisão permanece no aparato centralizador do Estado. Na descentralização as decisões e as ações são configuradas no âmbito das unidades. Então, em que medida as instituições participam dos processos decisórios das políticas de Estado? Como ocorre o processo de representação institucional? Quem são os atores sociais e quais os seus entendimentos e interesses sobre os processos de avaliação?

Nesse contexto, a autonomia está ligada e condicionada ao desenvolvimento dos processos democráticos, os quais são recentes na cultura angolana. A participação social e política vem acompanhada por uma complexidade cultural que envolve a distribuição do poder e as formas de representação. Neste sentido, no âmbito do Ensino Superior, a representação política funde-se à representação acadêmica e se, nas culturas institucionais, “[...] a participação é delegada por normas, vigora a ausência do desejo como motor fundante da ação. Neste caso, dificilmente o ator imprimirá o mesmo sentido a ações sociais, a projetos coletivos, a empreendimentos de mudança institucional” (MARTINS, 2002a p. 210).

Foi recorrente, nos relatos da pesquisa, a expectativa das instituições com os atos reguladores do Estado, decorrentes do Decreto nº 203/18 (ANGOLA, 2018), pois “os procedimentos, dispositivos, instrumentos e demais processos inerentes à Autoavaliação são estabelecidos em Regulamento próprio, aprovados pelo Titular do Departamento Ministerial [...]”. Ao mesmo tempo em que é reconhecida a necessidade dos processos de avaliação, há uma grande preocupação em relação aos critérios e às demandas que serão estabelecidas, bem como em relação à capacitação das pessoas no seu desenvolvimento, seja junto ao órgão de tutela, seja nas instituições.

Dias Sobrinho (2003) expressa que dentre os dilemas envolvidos na avaliação está a pluralidade de finalidades, as quais vinculam-se aos diferentes atores sociais e níveis do sistema educacional. A avaliação com finalidade de regulação, realizada pelo Estado, de forma geral, vincula-se aos aspectos mais quantitativos, aos resultados, aos critérios objetivos de comparação. A avaliação educacional, geralmente realizada no âmbito institucional, com fins de tomada de decisão, ocorre de forma processual, formativa e participativa. Por isso, os processos e procedimentos metodológicos para a produção dos dados podem ser complementares, mas diferentes no âmbito do sistema e das instituições. Avaliação significa levantamento de informações ou dados, por meio de instrumentos que ampliem nossa percepção, para a produção de um julgamento de valor visando à tomada de decisão ou aperfeiçoamento que, em muitos casos, podem estar distantes e ser divergentes das decisões e interesses de âmbito governamental e institucional. Ou, por outro lado, restringir a avaliação ao processo de regulação significa simplificá-la e reduzi-la a um conjunto de regras e normas heterônomas, isto é, definidas, estabelecidas e controladas pelo Estado.

É necessário articular os processos de avaliação e de regulação, pois só a avaliação comporta a autonomia e a diversidade das instituições e sujeitos educativos, os quais podem subsidiar e fundamentar as decisões no âmbito da regulação. Assim, a esta problemática sugere-se um novo ponto de partida: há necessidade da valorização de uma avaliação que preserve elementos reflexivos e críticos, mais que um viés normativo e estandartizado. A avaliação precisa comportar a dimensão formativa que, por meio da solidariedade social e institucional, crie pontos que recursivamente organizem e reorganizem a regulação, a autonomia e a articulação do Estado com a sociedade.

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1Agradecemos o financiamento do CNPq, FAPERGS e CAPES.

Recebido: 18 de Março de 2019; Aceito: 20 de Junho de 2019

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