SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.28 número56A QUEM SERVE A EDUCAÇÃO?“NÃO SOMOS OBJETOS DE PESQUISA”: EM BUSCA DE UMA ANTROPOLOGIA EM COLABORAÇÃO índice de autoresíndice de assuntospesquisa de artigos
Home Pagelista alfabética de periódicos  

Serviços Personalizados

Journal

Artigo

Compartilhar


Revista da FAEEBA: Educação e Contemporaneidade

versão impressa ISSN 0104-7043versão On-line ISSN 2358-0194

Revista da FAEEBA: Educação e Contemporaneidade vol.28 no.56 Salvador set./dez 2019  Epub 14-Out-2020

https://doi.org/10.21879/faeeba2358-0194.2019.v28.n56.p33-43 

Educação e Antropologia: questões de método e epistemologia

ETNOMETODOLOGIA E PESQUISA QUALITATIVA EM SAÚDE: OBSERVAR, OUVIR, DESCREVER

ETHNOMETHODOLOGY AND QUALITATIVE HEALTH RESEARCH: OBSERVING, LISTENING, DESCRIBING

* Doutor em Sociologia da Educação pela Universidade de Paris 8. Professor visitante do Programa de Pós-Graduação em Saúde, Ambiente e Trabalho da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Bahia (PPGSAT/FAMED/UFBA). E-mail: acoulon00@gmail.com


RESUMO

Depois de lembrar a inversão teórica feita pela etnometodologia e as frequentes interpretações errôneas associadas a ela, este artigo trata de algumas das realizações práticas, que visam investigar a prática de atores sociais comuns que constantemente aplicam suas habilidades sociais através de seu “raciocínio sociológico prático”. Essa competência não é restrita a poucos, como aos sociólogos, por exemplo, mas é exercida por todos os seres humanos em suas trocas diárias. Tendo em conta esse aspecto fundador, o artigo desenvolve, em relaçao a certos conceitos da etnometodologia, três operações “elementares” que qualquer pesquisador nos campos da saúde ou da educação e, mais geralmente, das ciências sociais e humanas pode facilmente utilizar: observar, escutar e descrever.

Palavras-chave: Etnometodologia; Observar; Escutar; Descrever

ABSTRACT

After recalling the theoretical reversal made by ethnomethodology and the frequent misinterpretations associated with it, this article develops some of the features of ethnomethodology, as a sociology of practical achievements, which seeks to investigate the practice of ordinary social actors who constantly apply their social skills through their “practical sociological reasoning”. This competence is not restricted to a few, such as sociologists for example, but is practiced by all human beings in their daily exchanges. Taking into account this founding aspect, the article develops, in accordance to certain concepts of ethnomethodology, three “elementary” operations that any researcher in the fields of health or education, and more generally in the social and human sciences, can easily carry out: observation, listening, and description.

Keywords: Ethnomethodology; Observing; Listening; Describing

RESUME

Après avoir rappelé le renversement théorique opéré par l’ethnométhodologie et les contre-sens fréquents qui y sont associés, cet article développe quelques-uns des traits de l’ethnométhodologie, en tant que sociologie des accomplissements pratiques, qui cherche à enquêter sur la pratique des acteurs sociaux ordinaires qui mettent en œuvre en permanence leurs savoir-faire sociaux à travers leurs « raisonnements sociologiques pratiques ». Cette compétence n’est pas réservée à quelques-uns, comme les sociologues par exemple, mais elle est exercée par tous les êtres humains dans leurs échanges quotidiens. En prenant en compte cet aspect fondateur, l’article développe, en écho à certains concepts de l’ethnométhodologie, trois opérations « élémentaires » que tout chercheur dans les domaines de la santé ou de l’éducation, et plus généralement en sciences sociales et humaines, peut facilement mettre en œuvre : observer, écouter, et décrire.

Mots-clés: Ethnométhodologie; Observer; Écoute; Description

Introdução1

Inicialmente gostaria de agradecer pelo convite feito pelos Professores Paulo Pena e Mônica Angelim, docentes do Programa de Pós-Graduação em Saúde, Ambiente e Trabalho da Universidade Federal da Bahia (PPGSAT/ UFBA) e a Professora Ana Teixeira, da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia (UFRB), que concordou em traduzir esta conferência.2

É um grande prazer e emoção estar neste lugar histórico, berço da primeira Faculdade de Medicina do Brasil, na histórica cidade de Salvador.

Quando o Professor Paulo Pena me convidou para fazer uma palestra para os estudantes do PPGSAT, falamos sobre a etnometodologia e a pesquisa qualitativa. No domínio da saúde, considero essas temáticas essenciais. Outro motivo para que aceitasse o convite foi o fato de que, entre os diversos públicos com que lidei na minha carreira, os mais atentos e compreensivos foram, sem dúvida, os meus estudantes dos diferentes campos da saúde, especialmente as enfermeiras. Elas perceberam o que eu estava dizendo e, para um professor, isso é muito importante! Espero que hoje aconteça o mesmo!

Há muito tempo que me interrogo sobre este fenômeno, me perguntando por que razão este público em particular foi tão receptivo às ideias únicas que a etnometodologia desenvolveu. Talvez vocês possam me ajudar a encontrar respostas mais precisas e fundamentadas, mas a principal explicação que encontrei é que, por necessidade profissional, esse público observa, ouve os pacientes, faz com que eles falem o que estão sentindo, sua dor, seus sintomas e se serve dessas descrições para a coconstrução do diagnóstico médico e depois para a coparticipação no cuidado.

Foi por isso que pensei em abordar estas três operações intelectuais básicas: a observação, a escuta e a descrição no âmbito da investigação em saúde ou no exercício diário das profissões vinculadas a essa área. A primeira vista, essas três operações básicas não parecem muito científicas, mas podemos tratar do essencial, do fundamental, com idéias e práticas muito simples, pois elas estão fortemente ligadas a um conjunto teórico, como é o caso da etnometodologia.

Para aqueles que não estão familiarizados com a etnometodologia, gostaria de começar por enfatizar que ela não é uma nova metodologia da etnografia, nem uma sociologia das relações étnicas, nem uma nova metodologia da sociologia.

O projeto científico da etnometodologia é analisar os métodos, ou, se preferirem, os procedimentos, as formas de fazer que os indivíduos usam para concretizar as diferentes tarefas que realizam em suas vidas cotidianas. É a análise das formas corriqueiras de fazer as coisas que os atores sociais comuns mobilizam para efetivar suas ações ordinárias. Esta metodologia profana (ou seja, não profissional) - constituída por todos os chamados etnométodos - que os membros de uma sociedade ou grupo social usam de uma forma banal, mas engenhosa, para viver juntos, constitui o corpus de pesquisa etnometodológica. No campo da saúde, por exemplo, podemos perguntar sobre os antecedentes do paciente e de sua família, seus hábitos alimentares, as práticas de higiene, os exercícios físicos que faz, a automedicação, o trabalho que realiza, os produtos utilizados no trabalho etc.

Etnometodologia é assim definida como a “ciência” dos “etnométodos”, ou seja, procedimentos que constituem o que Harold Garfinkel, o fundador e “inventor” da palavra em 1954, chama de “raciocínio sociológico prático”. Garfinkel colocou grande ênfase na análise da prática, ao ponto de sugerir, em 1968, que o termo etnometodologia deveria ser substituído por neo-praxiologia, ou seja, um projeto científico cujo objetivo seria renovar (neo) a análise da ação humana, a sua prática concreta (praxis). Na verdade, podemos dizer que é uma sociologia das realizações práticas. Se quisermos adotar uma definição simples, diria que a etnometodologia é a busca do que as pessoas sabem sobre o que fazem e as consequências das suas ações: vamos descobrir que as pessoas sabem muitas coisas se lhes perguntarmos! No campo da saúde, acredito que esse é o material primário a partir do qual os profissionais podem trabalhar.

Qualquer pessoa no mundo, quem quer que seja, tem raciocínio sociológico prático. Como disse Alfred Schütz, “somos todos sociólogos em um estado prático”. Isto significa que, para viver em sociedade, temos uma necessidade absoluta de analisar e compreender o mundo que nos rodeia, no qual todos vivemos juntos, independentemente da nossa cultura, do nosso nível de educação e da nossa classe social: o nosso raciocínio é sempre baseado em elementos sociais que dominamos e que são sempre práticos: o nosso raciocínio é sociológico e prático o tempo todo!

O verbo fazer é muito útil para lembrar o que é a etnometodologia e o que ela procura mostrar e analisar: fazer o professor, fazer o conferencista, fazer o fazendeiro, fazer o político, fazer o juiz, fazer o ouvinte, fazer o estudante, fazer o médico, fazer a enfermeira, fazer o paciente, fazer a mulher ou o homem etc. Fazer qualquer outra coisa. Não apenas personagens de teatro que desempenham3 os seus papéis no palco mundial, como disse Goffman. Nós realmente fazemos uso constante, em cada momento de nossas vidas, do conhecimento “sociológico” prático que aprendemos e acumulamos ao longo do tempo. Somos conscientes e sabemos o que fazemos, por que o fazemos e como o fazemos.

Todos nós temos um conhecimento detalhado de como funciona a sociedade em que vivemos. Ao contrário da sociologia profissional, nós não usamos, em nossas vidas diárias comuns, uma análise “científica” do mundo em que vivemos, mas somos capazes de descrevê-lo em detalhes, de mostrar nossa refinada compreensão dos mecanismos microssociais que todos usam para que possamos viver juntos. Este conhecimento é mesmo essencial, caso contrário somos considerados como “inadequados”, “desviantes”, “marginais” etc. É sobre e a partir deste conjunto (corpus) de conhecimento “comum” dos atores sociais que a etnometodologia tem o projeto de trabalhar. A etnometodologia desenvolve uma abordagem e teoria sociológica que leva em consideração e é baseada no conhecimento e na prática que os atores sociais demonstram em cada momento de suas vidas. Outra terminologia que prefiro à expressão “atores sociais” é a expressão “as pessoas”. É uma expressão mais compreensível e simples para designar todos, independentemente do sexo, idade, origem social, trabalho ou atividade em geral.

Trataremos, agora, das três operações “elementares” que são o eixo central dessa conferência, quais sejam: observar, escutar e descrever. Separo aqui essas três operações com a finalidade de melhor sistematizar o conteúdo, mas, evidentemente, elas estão inter-relacionadas no processo de pesquisa, especialmente as duas primeiras (observar e escutar).

1) Observar

Gostaria de chamar atenção para um aspecto fundamental: o mundo social está constante e plenamente disponível para todos nós. Ele se apresenta e se comenta o tempo todo perante nossos olhos, diante de nós. Não importa o que aconteça no cotidiano, o mundo social se descreve e comenta a si próprio, sem a nossa ajuda. Em inglês, essa propriedade que o mundo tem de descrever-se a si mesmo chama-se accountability, um termo que explicarei depois do exemplo que se segue.

O exemplo está relacionado à “Máquina de Comentários” de Harvey Sacks (1935-1975), um jovem colaborador de Garfinkel que fez o doutorado sob a orientação de Goffman. Sacks é o fundador de um enorme campo de conhecimento chamado análise da conversação: voltaremos a esse aspecto um pouco mais a frente.

Vamos imaginar uma máquina, diz Sacks, a “máquina de comentários”,4 que é composta por duas partes:

  • A primeira parte “age”, “move”, “faz” coisas, trata-se da “parte móvel” tal como escreveu Sacks na versão original de seu artigo;

  • A segunda parte, sincronicamente, “diz”, “comenta”, “descreve” o que a primeira parte da máquina faz.

Estamos, portanto, lidando com uma máquina muito simples, com duas partes: uma que age e outra que descreve as ações realizadas.

Vamos considerar várias situações:

  1. Uma pessoa comum vem ao encontro da máquina; ela não tem nenhum problema particular com isto; compreende imediatamente o que a máquina faz e o que diz;

  2. Por outro lado, segundo Sacks, se um sociólogo olha para a máquina, os problemas começam; ou ele acha que a primeira parte da máquina não funciona muito bem, ou ele considera que os comentários feitos pela segunda parte não são adequados, ou não são completos e precisos etc. Numa palavra, ele deve “reconciliar” as duas partes da máquina. Enquanto ele reconcilia estas duas partes, vamos dizer que ele “teoriza”, diz Sacks;

  3. Um engenheiro estrangeiro é colocado na frente da máquina. Como ele é um engenheiro especializado nesse tipo de máquinas, ele entende bem do que se trata; mas como ele é estrangeiro, não entende nenhuma palavra dos comentários que a segunda parte da máquina elabora.

Podemos então considerar que se trata de uma máquina destinada a ensinar línguas estrangeiras; conhecendo a direção da ação da máquina, ele aprenderá o significado da língua.

Essa metáfora de Sacks representa o conjunto de nossa sociedade. Passamos as nossas vidas a fazer e a dizer, a comentar as nossas ações. O “trabalho” de falar e analisar não é exclusividade dos intelectuais. Não, esse é um “trabalho” de todas as pessoas. O mundo inteiro se apresenta e se comenta. Neste exato momento há bilhões de interações no mundo: se cerca de um quarto ou um terço das pessoas estão dormindo, as outras estão interagindo, trabalhando, falando. Elas agem e, ao mesmo tempo, comentam sobre suas ações ou seus pensamentos.

O mundo se apresenta através dos dispositivos que ele mesmo coloca em prática para comentar sobre si mesmo. Em todos os lugares as pessoas estão constantemente usando esses dispositivos para interagir e viver juntos.

Essa é a accountability natural e fundamental do mundo. Account em inglês significa relatório, descrição. O que é accountable é o que é relatável, descritível. O mundo se descreve a si mesmo repetidamente, esse é o significado da accountability.

Note-se que se a fala é essencial ao Homem - somos “falaseres” como dizia Jacques Lacan, isto é, não apenas seres falantes, dotados de fala, mas é uma característica fundamental, inseparável do nosso ser, nos distingue do mundo animal e mamífero a que pertencemos -, ela não é o único meio de expressão: há também o não-verbal, que podemos observar facilmente.

Por exemplo, é fácil ver, entre as pessoas que caminham na orla de Salvador, que elas estão envolvidas em diferentes atividades. Posso distinguir três tipos de pessoas (talvez uma observação mais atenta possa encontrar outros tipos):

  • a) algumas pessoas têm ferramentas na mão, empurram um carrinho de mão, transportam cimento, objetos, materiais etc.; são trabalhadores que reparam a orla danificada pela última tempestade;

  • b) algumas outras pessoas andam devagar, conversando umas com as outras; elas passeiam, talvez sejam amigas, talvez tenham acabado de se encontrar;

  • c) outras, as mais numerosas, andam mais depressa, vestem roupa desportiva - tênis, por exemplo - e roupas vistosas; mostram que estão “praticando uma atividade esportiva”.

Todas essas atividades são facilmente observáveis. As pessoas, sem o seu conhecimento, se podemos assim dizer, estão exibindo o que estão fazendo. Eles também podem descrever e comentar sobre o que fazem, se solicitado. Eles sabem o que estão fazendo; não são, segundo a bela fórmula de Garfinkel, “idiotas culturais”.

Rompendo com a “atitude natural”

Você deve ter notado que a observação exige que nos questionemos sobre “a evidência do mundo”, o que a fenomenologia chamou de “a atitude natural”. O que é isto? É o fato de não questionar o mundo tal como ele é apresentado. Ele nos parece óbvio, natural. Se pedir que olhe pela janela e me diga o que você vê, alguns dirão “árvores”, outros “edifícios”, “nuvens” etc. Ninguém vai pensar que este é um cenário que foi colocado do lado de fora da janela, embora seja possível.

Quando acordamos, o mundo reaparece para nós, sabemos quem somos, onde estamos, possivelmente com quem estamos: somos óbvios para nós mesmos!

O mundo se impõe a cada um de nós na sua evidência. Como disse Merleau-Ponty, “a familiaridade que me une ao mundo é um milagre que se renova todas as manhãs”.

Essa é a “atitude natural”: não questionamos o mundo. Um esforço deve ser feito para romper com esta evidência, a fim de realizar uma observação. Assim, para observar os meus personagens na orla, tenho que fazer o esforço mental e analítico de questionar e suspender a evidência que se apresenta diante dos meus olhos: o que fazem estas pessoas, e como posso reconhecer o que fazem? Que sinais elas mostram que me permitem reconhecer sua atividade atual?

O mundo se apresenta, é extraordinário: aproveitemos este fenômeno, nós que pretendemos analisá-lo. Esta observação, tanto empírica quanto teórica, tem consequências importantes para a metodologia da pesquisa de campo, aspecto que a sociologia, mas também algumas outras ciências humanas e sociais, tem neglicendiado, qual seja a importância da observação. Pelo contrário, nas ciências médicas e naturais, a observação continua a ocupar um lugar privilegiado. Não tenho dúvidas de que vem à mente muitos exemplos do mundo da saúde.

2) Ouvir

Foi a análise da conversação que me ensinou a ouvir. Aprendi muito, especialmente no seminário de Emanuel Schegloff, do qual participei em 1988 na Universidade da California (UCLA - Los Angeles), e a quem gostaria de prestar homenagem aqui. Schegloff, desde a morte de seu amigo Sacks em 1975, é considerado mundialmente como o “papa” da análise da conversação.

A análise da conversação é uma área cujo precursor é Harvey Sacks, sobre quem já comentei anteriormente.5 Não se trata estritamente de uma questão de linguística, mas de sociologia. Através do uso de nossa linguagem, exercitamos nossa competência como sociólogos, treinados de acordo com regras sociais e culturais. “Nós somos sociólogos em um estado prático”, especialmente usando nossas habilidades como membros, principalmente através de nossas interações verbais. Não podemos dizer que se trata de microssociologia porque, como diz Schegloff, em uma simples saudação, há “toda a sociedade num grão de arroz”.

Por exemplo, eu digo “olá” e você me responde “olá”; todos nós aprendemos isso quando éramos muito jovens, nos disseram que era a base de nossa interação com os outros, a base da cortesia; em todos os lugares, em todas as culturas, nos cumprimentamos uns aos outros, certo? Isto é o que se chama um par na análise da conversação: as interações verbais são sempre realizadas em pares. Quando não é esse o caso, é sinal de que surgiu um problema relacional. Se não responderem à minha saudação, é uma ofensa pessoal, mas sobretudo social: esta não-resposta é, de certa forma, um ataque à ordem social.

A análise de conversação desenvolveu um enorme campo de pesquisa no mundo médico (quase exclusivamente em inglês): Maynard,6 Heritage,7 Boden8 e, no Brasil, Ana Cristina Ostermann.9 Note-se que os campos “comunicativos” privilegiados em que a análise da conversação tem funcionado são, por exemplo, o mundo médico (consultas médicas, ou chamadas de emergência, por exemplo) ou o mundo da educação (provas de seleção, exames orais, entrevistas de orientação etc.), mas a vida quotidiana está cheia de exemplos do mesmo tipo. A análise da conversação me ensinou como ouvir melhor e, sobretudo, o que ouvir.

Os dispositivos de categorização dos membros

Ouvir as categorias. Outra noção teórica importante, derivada da etnometodologia, é “o dispositivo de categorização dos membros”, cujo autor é Harvey Sacks. Ele trabalhou por vários anos com Harold Garfinkel e Edward Rose, outro sociólogo americano que pode ser considerado coinventor da etnometodologia. Através da análise muito detalhada das interações comuns e banais entre as pessoas, Sacks destacou o conhecimento sutil que cada indivíduo tem do mundo social em que vive. Ao contrário da maioria dos linguistas, Sacks sempre trabalhou a partir de amostras reais tiradas do cotidiano dos atores, e foi assim que ele fundou esta nova disciplina das ciências humanas chamada análise da conversação, ou análise conversacional.

Sacks definiu o que se entendia por “dispositivo de categorização dos membros”. Uma menina brinca sozinha com as bonecas e, como todas as crianças do mundo, fala com um terceiro imaginário. A certa altura, ela disse: « The baby cried the mommy picked it up » (“o bebê estava chorando, a mãe o pegou em seus braços”) Duas ações são descritas aqui, em ordem cronológica: o bebê chorou (ação A); a mamãe o pegou (ação B). É importante que a análise mantenha os detalhes da ação descrita pela menina. Por exemplo, alguns alunos por vezes me sugeriram que talvez o bebê estivesse chorando porque tinha sido levado pela mãe. Claro que não! Esta menina já sabe, com os seus três anos de idade, a cronologia das ações e por isso as descreve na sua ordem sequencial! Se você não respeita a exatidão e precisão dos seus dados, então você corre o risco de se envolver em falsas interpretações, dignas da “psicologia” que às vezes pode ser encontrada em revistas populares.

Ao ouvir ou ler essa frase, compreende-se, imediatamente, que se trata da mãe do bebê - e não de qualquer mãe que passa por acaso, o que seria possível empiricamente, dependendo do contexto da ação (por exemplo, em creches) -, embora na frase não exista uma ligação gramatical entre as duas ações, A e B, que envolvem, respectivamente, o bebê e a mãe. Por quê? (Testei esta frase em mais de 30 línguas diferentes e sempre o mesmo fenômeno se manifestou.).

Segundo Sacks, bebê e mamãe são categorias não apenas linguísticas, mas também sociais, ambas pertencentes à mesma coleção - aqui se trata da coleção de categorias utilizadas para designar relações de parentesco. Esta coleção também varia, por vezes, de forma significativa, em razão da cultura e da língua. Se estabelecermos imediatamente a ligação entre o bebê e a mamãe, apesar de não ser fornecida qualquer informação gramatical, é porque:

  • a) as categorias já estão ligadas entre si antes da sua utilização;

  • b) as regras de pertencimento os reúnem na mesma coleção;

  • c) e porque são utilizadas no mesmo contexto.

Assim, a nossa aprendizagem progressiva das categorias adequadas para descrever e relatar o mundo se faria por conjuntos, por lista, por coleção de categorias; uma criança muito nova não aprende a lista elementar de cores sendo apresentada ao vermelho em janeiro, amarelo em fevereiro e azul em março! As cores são ensinadas simultaneamente, para que ela identifique e reconheça os diferentes estímulos e possa, por sua vez, designá-los de forma “competente”, escolhendo a categoria apropriada da lista.

Se seguirmos o raciocínio de Sacks, o mesmo se aplica a todo o processo de aprendizagem e uso da língua. À medida que construímos as nossas trocas, escolhemos as categorias adequadas para dar sentido às mesmas, e os nossos interlocutores, se tiverem o mesmo conjunto de categorias (o que é geralmente o caso dos membros da mesma cultura), nos compreendem perfeitamente, apesar da improvisação essencial de cada interação verbal.

Como aprendemos nossa língua materna?

Como aprendemos nossa língua materna? Através de interações verbais entre a mãe e o seu bebê, interações essas que são incessantes, descritivas, “didáticas” e que começam a partir dos primeiros minutos após o nascimento, ao longo das quais o bebê, e depois a criança, vai, gradualmente, reconhecer, construir e reproduzir os dispositivos de categorização que, uma vez dominados, farão com que ela seja reconhecida, pelos outros, como um membro competente da sociedade.

A mãe é como a máquina de comentar de Sacks: ela age, ela relata suas ações, ela as descreve e as comenta: “vamos tomar banho”, ou “eu vou te lavar”, “vamos dormir”; depois, quando o bebê crescer: “vamos jogar bola”, “vamos passear no parque”, “olha o pato no lago”, “vamos andar na patinete”, “olha o avião no céu” etc... É assim que aprendemos a nossa língua materna: através das descrições feitas pela mãe, bem como, mais geralmente, pelas ações que ocorrem no mundo ao nosso redor e que conhecemos tão bem. Desta forma, é assim que nos tornamos gradualmente um membro, no sentido etnometodológico, ou seja, alguém que compartilha a linguagem comum do grupo em que vive.

É assim que devemos entender a expressão “categorização”, a força motriz da aprendizagem, que é tão social quanto lexical, em nossa vida em sociedade: um membro competente categoriza o mundo da mesma forma que seus pares.

Esta operação de categorização, que é uma operação natural do ser falante e interpretante, é incessante e essencial na nossa vida diária. A categorização do mundo acontece simultaneamente, insisto:

  • a) por um lado, de acordo com a definição da situação por cada indivíduo, que é altamente variável, certamente, mas facilmente identificável por outros;

  • b) por outro lado, dependendo do contexto em que está localizado;

  • c) finalmente, dependendo da atividade social em curso.

A compreensão e a interiorização por todos dos sistemas de categorização nos permite desenvolver uma compreensão comum do mundo social, graças à qual somos capazes de viver juntos e coproduzir o mundo em que vivemos. Gostaria de apresentar outro exemplo.

“We were in an automobile discussion” (“Estávamos numa discussão sobre automóveis”)

A certa altura da sua pesquisa, Sacks quis trabalhar em situações em que acolhemos alguém, um terceiro, numa interação verbal já em curso. Em particular, ele queria saber se era possível detectar formas de fazer as coisas (e, portanto, de dizer), aceitar o outro ou rejeitá-lo. A este respeito, cita o exemplo de um homem que, em sua casa, conversa com outros amigos do sexo masculino enquanto bebe com eles.

Sua esposa chega, cumprimentos recíprocos são feitos, e o marido vai dizer à esposa o que eles estão fazendo (há muitas maneiras potenciais de dizer isso): “We were in an automobile discussion” (“Estávamos numa discussão sobre automóveis”), diz ele.

O que vôces acham que aconteceu? Na sua opinião, isto é um convite para participar da discussão, ou é uma rejeição? Você teria razão se considerasse que se trata de uma rejeição:

  • a) Inicialmente, o tempo verbal: em inglês, o uso do pretérito (were) significa que uma ação foi interrompida, a mulher literalmente os interrompeu em sua discussão;

  • b) Dois elementos “lexicais” que são categorias significativas: automóvel (estamos na Califórnia nos anos 1970, onde as mulheres ainda dirigem pouco, e são os homens que falam uns com os outros sobre a sua paixão); e discussão, que indica que é uma discussão viva, “séria”, “entre homens” de certa forma.

No caso real da interação relatada por Sacks, a mulher imediatamente entendeu e saiu da sala!

Em conclusão, se como pesquisador, ou simplesmente como trabalhador, especialmente como profissional da saúde, você quiser “ouvir” os pacientes, ouça as “categorias” que eles usam. Faça um inventário progressivo delas, faça um “mapa de utilização” das categorias.

Outro exemplo: no passado, nos Estados Unidos, a palavra Negro foi usada para designar os negros e depois tornou-se pejorativa. Em seguida a palavra Black passou a ser usada e, por sua vez, foi considerada uma expressão estigmatizante. Atualmente a expressão usada é Afro-American, o que ainda é, provavelmente, tão problemático quanto o uso das expressões anteriores! Isso é o que chamamos de “politicamente correto”, mas também é uma realidade sociológica que se expressa na linguagem, no uso permanente que fazemos das categorias. Lembre-se de Sacks: nós construímos o sentido daquilo que queremos dizer na medida em que escolhemos nossas “categorias”, e o outro ouve e entende essas categorias se for membro, isto é, se tiver o mesmo conjunto de categorias que o orador, se tiver o mesmo idioma e cultura que o orador, se tiver a mesma “definição da situação” que o orador, apesar das possíveis nuances em sua interpretação. É possível perceber que esta perspectiva amplia a questão de todos os tipos de aprendizagem que devemos realizar, não só durante o tempo escolar, mas em nossa vida diária e ao longo de toda nossa vida, onde devemos nos adaptar constantemente a novas situações através de novos microaprendizados. Tratei dessa questão, por exemplo, quando analisei a situação dos novos estudantes que entram na universidade; voltaremos a esta questão mais tarde.

Por isso, ouça atentamente essas descrições categóricas, porque temos à nossa disposição uma fonte de informação inesgotável, sempre disponível para análise!

3) Descrever

Gostaria agora de tratar deste ultimo aspecto.

Voce entendeu que o mundo inteiro está sendo constantemente descrito. Todos nós passamos as nossas vidas a fazer e a dizer. E o que se passa com aqueles que pretendem ser pesquisadores? Pois se nós também “descrevemos” as descrições dos atores do mundo, ainda estamos no processo científico?

Wittgenstein (filósofo austríaco, naturalizado inglês, que ensinou em Cambridge) parece reverter tanto a ordem cronológica que acreditamos conhecer entre descrição e explicação, quanto a primazia de uma sobre a outra: “em algum momento, devemos passar da explicação para a simples descrição”. Com efeito, segundo Wittgenstein, “a explicação é demasiado incerta, é apenas uma hipótese”; é marcada pelo conhecimento prévio do pesquisador, enquanto “a descrição permite mostrar a ordenação interna das coisas”.

Se somos professores, a descrição é também uma poderosa ferramenta de aprendizagem. Isto é particularmente verdade na escola primária, onde aprendemos a língua e as categorias. Então, um pouco mais tarde, quando estamos no ensino médio, nossos professores às vezes nos culpam por sermos “muito descritivos”, ou seja, não suficientemente analíticos. Recordemos aqui que isto não é verdade: a descrição é em si mesma analítica. Aqueles que atuam no campo médico e paramédico sabem bem disso, é tão óbvio e natural que muitas vezes nem sequer se apercebem disso.

No que diz respeito ao ingresso de novos estudantes na universidade, mostrei que descrever a própria passagem é uma forma do estudante se afiliar, de se tornar membro de um grupo, de transformar a estranheza primária em familiaridade e conhecimento. Tenho mostrado que os novos estudantes devem primeiro aprender o seu “ofício de estudante”, caso contrário eles serão eliminados ou autoeliminados.10 Eles devem, gradualmente, se tornar afiliados com seu novo mundo, que, no início, parece estranho para eles, com novas regras de existência e, acima de tudo, novas regras para a aprendizagem de conhecimentos e habilidades. Uma poderosa ferramenta de autoanálise e afiliação é a escrita de um diário no qual o estudante descreve as diferentes interações que experimenta durante os primeiros três ou quatro meses na universidade. Ao realizar esse registro escrito ele se torna, assim, o etnógrafo e, sem se dar conta, torna-se o analista de sua própria passagem para a educação superior.

O taxista não é um cartógrafo

No que diz respeito à pesquisa sociológica em si, a maior atenção dada ao ator como sujeito que objetiva e descreve o mundo ao seu redor não implica, segundo a etnometodologia, o abandono da atitude científica, que é, ao contrário, claramente reivindicada por H. Garfinkel em sua tese, desde 1952.11 Para o pesquisador, levar em conta a subjetividade das pessoas observadas não gera confusão entre o ator real e o ator construído, nem entre a descrição do objeto pelo sociólogo e a descrição do mesmo objeto por qualquer ator social:

As pessoas empíricas do sociólogo - seus policiais, seus pais, seus filhos, seus compatriotas irlandeses, seus Trobrianders - são objetos sociológicos e não objetos da vida cotidiana. Para um cartógrafo, a cidade de Boston é descrita por um mapa de Boston, [...] o objeto Boston é construído usando procedimentos cartográficos e não a partir do consenso entre as concepções de taxistas de Boston. [...] Um retrato científico do mapa de Boston não é criado pela consulta aos taxistas. (GARFINKEL, 1952, p. 223-224).

A posição de H. Garfinkel é, portanto, clara, e o programa científico da etnometodologia não consiste de forma alguma em um “relatório dos relatórios dos atores”, ao contrário do que Bourdieu12 indica, por exemplo. A questão é saber como os atores produzem seus mundos, que regras os regem e governam seus julgamentos. É importante destacar que o sociólogo deve, necessariamente, realizar um trabalho de objetificação, a fim de transformar seus objetos empíricos (pacientes, estudantes, trabalhadores, por exemplo) em objetos sociológicos (as mesmas pessoas, mas tipificadas em uma perspectiva de pesquisa); certamente, o ator social comum também faz um trabalho semelhante, a fim de interpretar o mundo ao seu redor e, assim, realizar suas ações, mas ele não pretende realizar um trabalho tal como aquele desenvolvido pelo sociólogo profissional.

Isto é o que se deve procurar quando se faz trabalho de campo: como é que alguém sobre quem você quer fazer uma pesquisa, objetiva e compreende o seu ambiente de vida ou de trabalho, incluindo, naturalmente, no campo da saúde.

Para concluir, gostaria de me referir aos conselhos que Heródoto - o “pai” da história moderna e da etnografia - deu aos seus contemporâneos que, como ele, viajaram para o Egito, como todos os gregos alfabetizados do seu tempo. Quando ele voltou disse o seguinte: “Relate o que você viu, o que você ouviu, relate o ponto de vista do mundo e acrescente algo a partir de sua própria observação.” Nossa tarefa como analistas é ouvir, ver o mundo como ele é. O mundo se apresenta. Ele tem a extraordinária capacidade de se apresentar a si mesmo.

Sabemos que alguns animais também se apresentam, em rituais de acasalamento, por exemplo, para se mostrarem.

Contudo, como diz Edward Rose (1993, grifo nosso):

O que distingue a atividade humana é que o mundo inteiro faz uma apresentação de si mesmo, dá sentido às suas atividades... Cada ser humano quer partilhar com os outros a sua compreensão do que é o mundo. Temos um nome para tudo o que é apresentado. É o mundo. Os leões não sabem que vivem em Leonie. Todos os seres humanos sabem que vivem no mundo... Você deve ouvir o mundo dizer o que ele sabe... Procure o pensamento humano no mundo.13

Agradeço pela atenção de vocês.

REFERÊNCIAS

BODEN, Deirdre. The business of talk: organizations in action. Cambridge: Polity Press, 1994. [ Links ]

BOURDIEU, Pierre. Choses dites. Paris: Éditions de Minuit, 1987. [ Links ]

COULON, Alain. Le métier d’étudiant. Paris: Econômica, 2008. [ Links ]

COULON, Alain. Etnometodologia, Petrópolis, RJ: Vozes, 1995. [ Links ]

COULON, Alain. Etnometodologia e educação. São Paulo: Cortez, 2017. [ Links ]

GARFINKEL, Harold. The perception of the other: a study in social order. 1952. Dissertation (Ph. D. Social Psychology) - Harvard University, Cambridge, 1952. [ Links ]

GARFINKEL, Harold. Estudos de Etnometodologia. Petrópolis, RJ: Vozes, 2018. [ Links ]

HERITAGE, John; MAYNARD, Douglas W. (ed.). Communication in medical care: interaction between primary care physicians and patients. Cambridge: Cambridge University Press, 2006. [ Links ]

MAYNARD, Douglas W.; HERITAGE, John. Conversation analysis, doctor-patient interaction and medical communication. Medical Education, n. 39, p. 428-435, 2005. [ Links ]

OSTERMANN, Ana C. et al. Perspectivas otimistas na comunicação de notícias difíceis sobre a formação fetal. Cadernos de Saúde Pública, Rio de Janeiro, v. 33, n. 8, 2017. [ Links ]

ROSE, Edward. The Werald. Colorado: The Waiting Room Press, 1992. [ Links ]

ROSE, Edward. Conversation avec Harvey Sacks: analyse avec modifications et corrections. Cahiers de Recherche Ethnométhodologique, n. 1, p. 25-40, 1993. [ Links ]

SACKS, Harvey. Sociological description. Berkeley Journal of Sociology, v. VIII, n. 1, p. 1-16, 1963. [ Links ]

SACKS, Harvey. Lectures on conversation. Cambridge: Blackwell, 1995. [ Links ]

SCHÜTZ, A. Sobre fenomenologia e relações sociais. Petrópolis, RJ: Vozes, 2012. [ Links ]

SOUZA, Joseane de; OSTERMANN, Ana C. “Tudo bem”, “tudo em paz” e “uma tremenda sorte”: avaliações positivas no gerenciamento da incerteza na comunicação entre oncologistas e pacientes com câncer de mama. Revista de Estudos da Linguagem, v. 25, p. 609-640, 2017. [ Links ]

WITTGENSTEIN, L. Recherches philosophiques. Paris: Gallimard, 1953. [ Links ]

1Artigo traduzido pela Profa. Dra. Ana Teixeira (UFRB/ CECULT).

2Conferência realizada no dia 16 de setembro de 2016, na Faculdade de Medicina da UFBA, a convite do Programa de Pós-Graduação de Saúde, Meio Ambiente e Trabalho (PPGSAT).

3A este respeito, consultar a extraordinária análise de Garfinkel sobre o “caso Agnes” (GARFINKEL, 2018).

4Ver Sacks (1963). Tradução para o francês: Cahiers de recherche ethnométhodologique, n°1, 1993, Laboratoire de recherche ethnométhodologique, Université de Paris VIII.

5Ver Sacks (1995).

6Para uma introdução ao uso da análise de conversação no mundo médico, ver Maynard e Heritage (2005).

7Ver Heritage e Maynard (2006).

8Ver Boden (1994).

9Ver Souza e Ostermann (2017) e Ostermann e outros (2017).

10Ver Coulon (2008) e Coulon (2017).

11Ver Garfinkel (1952).

12Ver Bourdieu (1987).

13Este artigo é o texto da comunicação oral, editada pelo autor, que Edward Rose fez durante a conferência "Etnometodologia e Análise da Conversação", realizada em Amsterdã, de 15 a 20 de julho de 1991. Este artigo também estáa em Rose (1992).

Recebido: 13 de Agosto de 2019; Aceito: 10 de Novembro de 2019

Creative Commons License Este é um artigo publicado em acesso aberto sob uma licença Creative Commons