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Revista da FAEEBA: Educação e Contemporaneidade

versión impresa ISSN 0104-7043versión On-line ISSN 2358-0194

Revista da FAEEBA: Educação e Contemporaneidade vol.28 no.56 Salvador set./dic 2019  Epub 14-Oct-2020

https://doi.org/10.21879/faeeba2358-0194.2019.v28.n56.p150-161 

Educação e Antropologia: questões de método e epistemologia

EDUCAÇÃO E RODA COLABORATIVA: ETNOGRAFIA DE PROCESSOS FORMATIVOS E EXPERIÊNCIAS DE MÃES QUE EXERCEM A PROSTITUIÇÃO

EDUCATION AND COLLABORATIVE WHEEL: ETHNOGRAPHY OF FORMATIVE PROCESSES AND EXPERIENCES OF PROSTITUTION MOTHERS

“RUEDA” DE EDUCACIÓN Y COLABORACIÓN: ETNOGRAFÍA DE PROCESOS FORMATIVOS Y EXPERIENCIAS DE MADRES EN PROSTITUCIÓN

Fernanda Priscila Alves da Silva*  UNEB
http://orcid.org/0000-0003-3795-3916

Lívia Alessandra Fialho da Costa**  UNEB
http://orcid.org/0000-0001-5769-8233

* Doutoranda em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Educação e Contemporaneidade na Universidade do Estado da Bahia (UNEB). Mestre em Educação pela Universidade do Estado da Bahia (UNEB). Integrante do Grupo de Pesquisa Educação, Desigualdades e Diversidades (UNEB). E-mail: feracatejo2@gmail.com

** Pós-Doutora em Educação pela Université Paris 13 (França). Doutora em Antropologia Social e Etnologia pela École des Hautes Études en Sciences Sociales (Paris). Professora Titular do Departamento de Educação e do Programa de Pós-Graduação em Educação e Contemporaneidade da Universidade do Estado da Bahia (UNEB) e professora e pesquisadora do Programa de Pós-Graduação em Família na Sociedade Contemporânea, da Universidade Católica do Salvador (UCSAL). Membro do Grupo de Pesquisa Educação, Desigualdades e Diversidades (UNEB). E-mail: fialho2021@gmail.com


RESUMO

Este artigo tem como perspectiva discutir a importância da etnografia em pesquisas sobre prostituição. Tem como foco as narrativas de mães, que exercem prostituição, sobre cuidado e educação dos filhos. Entendemos prostituição como uma prática social complexa que envolve uma diversidade de relações, interações e atores sociais, não sendo apenas pautada pela troca de dinheiro por serviços sexuais, mas antes, envolve uma diversidade e heterogeneidade de trocas que se dão no âmbito da rua. A educação, por sua vez, está ancorada, neste artigo, no referencial teórico da educação popular e é entendida como um ato político onde os seres humanos são convocados a se deslocar constantemente. A pesquisa foi realizada em Salvador, entre 2016 e 2019, em contextos de prostituição, com longa permanência das pesquisadoras em campo. Os diálogos e conversações com mulheres da “vida”, ou mulheres da batalha, fazem emergir a ideia da Roda colaborativa como rede educativa e de proteção aos filhos.

Palavras-chave: Educação; Prostituição; Mães; Etnografia; Filhos

ABSTRACT

This article aims to discuss the importance of ethnography in research on prostitution. It focuses on the narratives of mothers, who practice prostitution, about the care and education of their children. We understand prostitution as a complex social practice that involves a diversity of relationships, interactions and social actors, not only guided by the exchange of money for sexual services, but rather, involves a diversity and heterogeneity of exchanges that take place within the street. Education, in turn, is anchored, in this article, in the theoretical framework of popular education and is understood as a political act in which human beings are called to constantly move. The research was conducted in Salvador, between 2016 and 2019, in contexts of prostitution, with long permanence of researchers in the field. Dialogues and conversations with women of “life”, or women of battle, give rise to the idea of the collaborative wheel as an educational and child protection network.

Keywords: Education; Prostitution; Mothers; Ethnography; Children

RESUMEN

Este artículo pretende discutir la importancia de la etnografía en la investigación sobre la prostitución. Se centra en las narraciones de las madres, que ejercen la prostitución, sobre el cuidado y la educación de sus hijos. Entendemos la prostitución como una práctica social compleja que involucra una diversidad de relaciones, interacciones y actores sociales, no solo guiadas por el intercambio de dinero por servicios sexuales, sino que implica una diversidad y heterogeneidad de intercambios que tienen lugar en el ambito de la calle. La educación, a su vez, está anclada, en este artículo, en el marco teórico de la educación popular y se entiende como un acto político en el que los seres humanos están llamados a moverse constantemente. La investigación se realizó en Salvador, entre 2016 y 2019, en contextos de prostitución, con una larga permanencia de las investigadoras en el campo. Los diálogos y conversaciones con mujeres de “vida”, o mujeres de batalla, hicieron emerger la idea de rueda de colaboración como una red educativa y de protección infantil.

Palabras clave: Educación; Prostitución; Madres; Etnografia; Hijos

Introdução

Conduzir uma pesquisa etnográfica em contexto urbano requer tempo e, de certa forma, um trabalho atento de deslocamento afetivo-emocional. Saber ver, ler o manuscrito que não é tão estranho - parafraseando Geertz -, identificar sutilezas e construir as conexões do que se observa, quando a cidade é a cidade do observador, constitui tarefa, no mínimo, exigente. A criação de um “fato etnográfico” demanda algumas qualidades do pesquisador (empatia, habilidade literária, tempo de observação, domínio teórico etc.) e, espera-se, sobretudo, que a construção do relato etnográfico seja um desenho muito aproximado das experiências dos nativos. Sabemos que tais experiências são construídas pelo pesquisador na ação, na apreensão da “realidade” dos Outros, tornando o desafio ainda maior, qual seja, o de lançar-se numa perspectiva analítica a partir da própria teoria em ação (PEIRANO, 2008).

Assim, é de um conjunto de observações que acumulamos ao longo de quatro anos de estudos sobre a rua, na rua, nas esquinas e bancos frequentados por prostitutas, nas ladeiras povoadas por crianças, nas portas dos casarões em ruína, nos bares do Centro histórico de Salvador que construímos categorias de análise para olharmos para a “batalha”1 feminina. Na descrição etnográfica - é o que queremos chamar atenção -, nossas vozes internas são muitas, construções de construções, observações tecidas à luz do dia e à noite. Do ponto de vista teórico, nossa ação entende que as categorias deste estudo trazem questões complexas e dinâmicas sendo debatidas de diferentes modos e em distintos campos (Educação e Prostituição; Cuidado e Socialização). Cada uma delas pode ser pesquisada e trabalhada a partir de um campo específico, refletindo e possibilitando a discussão de uma variedade extensa de realidades. Nesta pesquisa, ainda em curso, entretanto, se pretende compreender cada uma na sua especificidade, relacionando-as umas com as outras, buscando, no entrelaçamento de seus pontos de convergência e divergência, nos aproximar da compreensão das práticas e dinâmicas socializadoras - que entendemos como educação e cuidado - dos filhos e filhas de mulheres que exercem a prostituição. Neste artigo, trazemos uma breve reflexão, a partir de dados etnográficos que falam sobre os cuidados na rua, sobre onde estão os filhos das putas quando estas estão na batalha.

Trata-se, assim, de um estudo etnográfico, empírico, de cunho exploratório, cujo universo de participantes envolve cuidadores(as) das camadas populares no processo de cuidado, socialização e educação de crianças, filhos e filhas de mulheres que exercem a prostituição de baixa renda em Salvador, Bahia. O grupo pesquisado é composto de mulheres mães de baixa renda em exercício de prostituição, acima dos 18 anos, além de um grupo mais amplo que consiste do grupo que compõe os familiares e rede apoio e cuidado das crianças. O contexto de observação foram as ruas do Centro histórico de Salvador, Bahia, local de desempenho das atividades de prostituição das interlocutoras e/ou de moradia delas.

Prostituição, Família e Educação

Diversos estudos sobre a prostituição têm sido realizados no Brasil, principalmente nos campos da Antropologia, Sociologia e Psicologia. O conhecimento produzido a partir das diversas análises e posicionamentos tem possibilitado repensar mais contemporaneamente esta prática social. Parte desta produção está amparada em métodos que focam as narrativas, contextos e experiências dos sujeitos que integram e compõem este cenário. Neste sentido, isto favorece um conhecimento da prostituição incluindo os modos de nomear dos diversos atores presentes nesta prática.

Diante da diversidade de estudos sobre a prostituição, verifica-se uma lacuna no que tange à compreensão deste fenômeno social a partir do campo da educação. Muitas das pesquisas realizadas tomam como foco estratégias educativas voltadas para mulheres que exercem a prostituição ou a prática de instituições que desenvolvem ações voltadas para este público; outras pesquisas, ainda, olham para os saberes relacionados ao campo da saúde, associando basicamente este tema às prevenções contra DSTs, exploração sexual de crianças e adolescentes, tráfico de pessoas e violações de direitos. Dentre os trabalhos realizados, destacamos a pesquisa de Sousa (2007, 2012) envolvendo os saberes das mulheres no contexto da prostituição, saberes construídos entre mulheres e clientes neste cenário. Em nossa pesquisa (SILVA, 2017) buscamos compreender de que forma foram sendo construídos estes saberes a partir da vida na batalha, não apenas por meio da relação mulheres-clientes, mas considerando as narrativas e trajetórias de vida das mulheres, sua relação e interação no cotidiano, que as prostitutas nomeiam de batalha. A pesquisa, então, teve como resultado que os saberes na rua, na batalha, são construções que envolvem uma série de outras relações para além da relação mulher/cliente, ou seja, envolve sua interação em um contexto mais amplo onde figuram outras “mulheres-chave”, cuidadoras.

Na perspectiva de Piscitelli (2005), a prostituição envolve uma diversidade de trabalhos sexuais. Assim, as definições e correntes que têm buscado conceituá-la têm contribuído pouco para pensar os diversos tipos de relações e inserção que a compõem. Existe, portanto, um jogo de oferta e demanda de sexo e sensualidade que, perpassado pela mercantilização, não necessariamente assume a “forma de contrato explícito de intercâmbio entre sexo e dinheiro” (PISCITELLI, 2005, p. 8). Desse modo,

A prostituição é uma prática social complexa que está ligada à economia, ao trabalho, à sexualidade, à moral e às relações de gênero. Compreender a complexidade dessa prática implica reconhecê-la como atividade multifacetada composta por fatores sociais, econômicos, culturais e pessoais que inviabilizam a construção de uma modelo explicativo homogêneo, rígido e estático sobre a mesma. (SOUSA, 2007, p. 23).

Segundo Olivar (2010), para além do trabalho/comércio, a prostituição teria que ser compreendida como “corpo e espaço de experiência”, ou seja, espaço privilegiado de existência. Desse modo, os processos de inserção, permanência, deslocamentos, socialização e educação (construção de saberes) vivenciados pelas mulheres nesta prática as constituí como sujeitos e mulheres em toda sua integralidade. Assim, “estar na rua”, por exemplo, “produz corpos com saberes e sensibilidades diferenciais” (OLIVAR, 2010, p. 189). Neste lócus, as mulheres constroem a si mesmas, estabelecem sentidos e modos de vida, gestam relações (familiares, sociais, culturais), garantem sua sustentabilidade e de seus familiares, fazem-se e se constituem sujeitos e agentes de suas histórias.

A pesquisa de Sganzella (2011), intitulada Feita só por mãe! Sentidos de maternidade e família entre as prostitutas, analisa, a partir de uma perspectiva da antropologia, as relações afetivas e familiares de mulheres que se prostituem na cidade de Marília, São Paulo. O objetivo da pesquisa era investigar o terreno dos relacionamentos afetivos das mulheres desde o âmbito familiar, amoroso e profissional. Essa autora busca entender em que medida havia amizade entre as mulheres prostitutas além do ponto de trabalho, e se elas se visitavam fora dali, em outras situações, e em que medida existia separação entre a vida profissional e a vida afetiva. Temas como: gênero, famílias, amizade, mulher prostituta, rua/casa, território/lugar, corpo surgem na pesquisa como pontos de entrelaçamento das relações e interações que ocorrem a partir da prática da prostituição na rua e seus desdobramentos na vida cotidiana envolvendo relações profissionais, familiares e afetivas. Tal estudo nos coloca em sintonia com o trabalho de Olivar (2010, p. 27), quando afirma que a prostituição “demarca um tipo de relação, que claro, são milhares de relações”; estas relações mudam e se transformam o tempo todo. Elas envolvem clientes, parentes, filhos(as), namorados(as), uma diversidade imensa de atores que tecem a trama e a vida que é gestada na rua (em nosso caso) e/ou nos espaços de batalha.

Os processos de socialização na infância, a partir de um ponto de vista sociológico, são vastos e as crianças participam de várias modalidades de interações sociais, que variam cultural e historicamente. Nestes processos de socialização infantil, constituídos por interações, as crianças se socializam na relação, assim como os adultos, que ao interagirem entre si se socializam. Segundo Grigorowuitschs (2008, p. 43), para se compreender as especificidades dos processos de socialização na infância é necessário compreender o modo pelo qual as crianças desenvolvem seu self, suas identidades individuais e o papel do “outro” nestes processos. Na infância, ao mesmo tempo em que o self se desenvolve, desenvolve-se concomitantemente a ele a percepção do “outro generalizado”. O “outro generalizado” funciona como uma maneira de organizar as interações de todos os indivíduos envolvidos nos mesmos processos. É uma espécie de norteador das condutas individuais nos processos de socialização e da própria percepção do self (GRIGOROWUITSCHS, 2008).

Dejo (2009) se utiliza do conceito de cuidado infantil para falar da construção de “projetos de pessoa” que se expressam em práticas cotidianas. Seu trabalho se inspira em Ayres (2004), para quem o “cuidado” é entendido como a construção de projetos de felicidade que visem o bem-estar do sujeito que recebe o cuidado. Para aquela autora, no entanto, “o cuidado infantil evolve a construção de ‘projetos de pessoa’, que podem estar relacionados com múltiplos interesses - não apenas com o sucesso prático - de cuidadores ocupando distintas posições dentro do espaço social” (BUSTAMANTE, 2009, p. 17, grifo do autor).

No campo da Educação, o tema do cuidado se localiza entre as discussões de políticas e práticas da educação infantil e das séries iniciais. Entretanto, diversos autores têm defendido que ele deve ser considerado como uma dimensão inseparável da educação e que tradicionalmente tem sido mais valorizado por estar associado ao trabalho dos professores.

Educação, numa perspectiva teórica e prática, é entendida, na nossa pesquisa, a partir do referencial da educação popular e consiste, portanto, na busca pela plenitude da condição humana. Neste sentido, o ser humano participa ativamente do processo como sujeito de sua própria história, buscando “ser mais” e fazendo-se continuamente. O ser humano é então um ser inacabado, a descobrir-se cotidianamente. Nas ruas e nos Movimentos organizados de Prostitutas, as interlocutoras desta pesquisa têm buscado fortalecimentos e apoios. A partir desta perspectiva, a participação, engajamento e fundação do Movimento de Prostitutas têm possibilitado esse “ser mais”, tão impulsionado por Paulo Freire. A educação aqui sendo construída entre os pares, entre as prostitutas, na solidariedade e no enfrentamento de superação de preconceitos e estigmas.

Em Pedagogia do Oprimido, Paulo Freire (2005) já apontava que a solidariedade tem como princípio: “com o povo, nunca apenas para ele ou sobre ele”, ela é uma solidariedade política, ou seja, é resultado de um processo educativo de desenvolvimento de disposições e exercício prático de participação, de diálogo com responsabilidade e com a busca por uma sociedade radicalmente democrática.

A cidadania, na perspectiva de Paulo Freire, é compreendida como apropriação da realidade para nela atuar, participando ativamente e conscientemente em favor da emancipação. Na obra de Freire, a cidadania tem três características de coletividade: ela se manifesta por meio das relações sociais, por meio do exercício da coletividade e pela força dos relacionamentos continuados em favor da vivência dos direitos e deveres dos indivíduos nos grupos sociais. Nos círculos de cultura, propostos por Paulo Freire como espaço onde os participantes conheciam seus direitos, a cidadania era construída de modo que um processo de conscientização ia sendo desvelado. No Movimento de Prostitutas, a cidadania construída de modo coletivo e pautando os processos de violações de direitos aos quais são submetidas as trabalhadoras sexuais tem sido uma vertente fundamental. Trazer à tona e evidenciar as violações, assim como fortalecer e positivar a afirmativa do trabalho sexual, tem sido uma bandeira contra todas as formas de preconceitos e estigmatizações.

A família tem sido primordialmente um dos espaços de socialização, educação e cuidado de crianças e adolescentes. Os muitos estudos sobre o tema têm mostrado que existe uma pluralidade de arranjos residenciais e de formas de se organizar o parentesco, dos quais a família conjugal, por exemplo, é apenas um dos modelos que se concretizam na prática (COSTA; JACQUET, 2004; FONSECA, 2003).

Os tipos de interações estabelecidas e as trocas efetuadas entre os membros das famílias e entre estes e a rede de parentesco mais ampla se constituem estratégias adotadas para garantir a estrutura familiar. As interações existentes entre a família ou em um grupo doméstico e as diversas formas de solidariedade e entreajuda daí então originadas são interligadas à conjuntura material e objetiva à qual pertencem. Somado a isso, deparamo-nos com a questão dos valores e dos princípios culturais, os quais se encontram em constante adaptação às transformações ocorridas no contexto social (PORTELA, 2014).

Na perspectiva de Sarti (2003), a década de 1960 é uma referência mundial no que tange à história recente da família. Entre os vários marcadores das transformações da família, encontramos o advento da pílula anticoncepcional feminina. Desde essa época, muitas mulheres começaram a se inserir no mundo público do trabalho aliando a maternidade às funções domésticas.

Nas sociedades modernas, o modelo normativo de família não abarca o conjunto de grupos familiares existentes na sociedade. Bacelar (1982) aponta a família como um fenômeno transcultural verificável em todas as sociedades. Assim, esse autor entende que a família possui elementos essenciais pertinentes a todo e qualquer agrupamento humano. Desse modo,

A família constitui a rede de unidades mínimas significativas que compõem o sistema de parentesco. Desta maneira, estabelecemos uma interdependência entre a família e o sistema de parentesco, vez que a família não pode existir sem o sistema de parentesco e vice-versa. O sistema de parentesco obviamente não terá a mesma importância em todas as sociedades. (BACELAR, 1982, p. 27).

A partir de estudo feito sobre a família da prostituta, Bacelar (1982) aponta que assim como as outras que se desviam do modelo normativo, permanece o caráter primitivo do elemento de parentesco, ou seja, a proibição do incesto, a relação de consanguinidade e de filiação, relação de aliança, com ou sem casamento. Esse autor ancora-se na perspectiva de Lévi-Strauss, para o qual o parentesco não é um fenômeno estático. Assim,

O ‘sistema de parentesco’ apresenta duas ordens diferentes de realidade. Uma, o sistema terminológico, onde alguém é entendido como mãe, pai, avô; e o outro, um sistema de atitudes, onde os indivíduos ou as classes de indivíduos que utilizam os termos se sentem, ou não ‘obrigados, uns em relação aos outros, a uma conduta determinada: respeito ou familiaridade, afeição ou hostilidade’. (BACELAR, 1982, p. 29, grifo do autor).

Para Bacelar (1982), de modo geral, as famílias que se desviam do modelo normativo vigente, como é o caso da prostituição, mantêm o modelo e o sistema de parentesco vigente na sociedade. Os processos culturais, sociais e econômicos, o sistema de atitudes não reflete automaticamente a nomenclatura, mas uma relação de interdependência. No caso da prostituição, “o caráter primordial de parentesco é exigir como condição de existência o relacionamento entre os termos que irão constituir as unidades significativas ou famílias elementares” (BACELAR, 1982, p. 29). Esse autor enfatiza ainda que a criança é indispensável neste contexto, para atestar o caráter dinâmico e teleológico do procedimento que funda o parentesco na e através da aliança.

Na rua: duas histórias na baila etnográfica

A descrição que segue é uma fotografia em dois momentos. O cenário é o mesmo bairro, a mesma extensão (o Centro histórico), “fotografado” em circunstâncias diferentes: no topo, no plano superior, uma praça central de Salvador - Praça da Sé -, lugar privilegiado e “tradicional” de antigas prostitutas e que ainda abriga a prostituição de baixa renda; mais abaixo, 500 metros, uma das ladeiras que ligam a Cidade Alta à Cidade Baixa,2 residência de famílias de baixa renda e de algumas prostitutas que frequentam a Praça.

São esses dois “lugares”, em dois momentos, que contextualizam nosso relato. Nosso argumento é que muitas práticas de cuidado, em particular voltadas para os filhos das prostitutas, envolvem uma rede de mulheres não necessariamente relacionadas à prostituição. O pertencimento a esta rede de apoio está associado ao bairro, à vizinhança, embora haja uma fronteira explícita entre as que moram no cortiço e ganhem a vida como putas e as que têm “família”. Esses cuidados são uma resposta às diversas vulnerabilidades do bairro, que luta, inclusive, para contornar o estigma de lugar de violência, prostituição e tráfico.

São muitas histórias: ouvidas, registradas, discutidas, perguntadas. O fio que tecemos com elas são muito longos, um emaranhado que nos abre a possibilidade de contar tantas outras histórias que corremos o risco de nos perdermos da exigência do foco da análise. A complexidade da vida dos Outros nos coloca no lugar de entendermos que a vida do outro não é um dado, exposto sem reflexão, sem perspectiva analítica do lado de quem fala: as narrativas são construções sobre as experiências, direcionadas para quem escuta atentamente, interessado. Desse modo, o que é compartilhado aqui é fruto de um processo de escolhas, opções, sentimentos, insights, outras coisas que muitas vezes não sabemos nomear. Importante frisar que o dito e escrito, a partir deste estudo, fazem parte da experiência construída pelas autoras juntamente com os diversos atores que contribuíram no processo deste texto. Nesta perspectiva, ficamos vigilantes na tarefa de sintonizar os desníveis entre os discursos das nativas e das pesquisadoras. Como nos adverte Viveiros de Castro (2002, p. 115),

O antropólogo tem usualmente uma vantagem epistemológica sobre o nativo. O discurso do primeiro não se acha situado no mesmo plano que o discurso do segundo: o sentido que o antropólogo estabelece depende do sentido nativo, mas é ele quem detém o sentido desse sentido – ele quem explica e interpreta, traduz e introduz, textualiza e contextualiza, justifica e significa esse sentido. A matriz relacional do discurso antropológico é hilemórfica: o sentido do antropólogo é forma; o do nativo, matéria. O discurso do nativo não detém o sentido de seu próprio sentido. De fato, como diria Geertz, somos todos nativos; mas de direito, uns sempre são mais nativos que outros.

Certamente as aproximações e as frequências sonoras sintonizadas neste artigo, transformadas em categorias, estão baseadas em convenções linguísticas. Palavras criam coisas. Assim, a etnografia não é apenas uma técnica, é um método que exige a reflexão sobre a sua ação social: é na comunicação, no encontro que criamos “coisas” com as palavras. Uma entrevista não é uma mera produção de depoimentos. É, antes de tudo, uma relação social.

Tati: a jovem avó

Já estava na Praça há algum tempo conversando com as outras mulheres sobre os mais variados assuntos. De repente chega Tati, empolgada e disposta a falar, conversar - o que não é muito comum em se tratando dela. Perguntou sobre meus bebês: João e Sofia. Aliás, tornouse algo comum, toda vez que chegava à Praça, as mulheres perguntarem pelos dois. Queriam ver fotos, vídeos e me cobravam o fato de ainda não ter levado ambos para que elas pudessem conhecê-los.

Tati estava bem animada. Perguntei então sobre sua guia3 e ela disse que estava parada. Já fazia um tempo não estava mais indo à Praça, pois tinha outras preocupações. Perguntei quais eram essas preocupações e ela me contou que era avó. Sua filha de 17 anos tinha tido um filho e ela estava agora se dedicando aos cuidados do neto. Enquanto me interrogava sobre como eu estava cuidando de meus dois filhos, Tati falava de como ela, enquanto avó, estava buscando recursos e meios para cuidar de seu neto. O fato de ter deixado de ir à Praça era um motivo, pois teme deixar o neto com a filha. Segundo Tati, sua filha faz “uso de coisas” e isso pode prejudicar o bebê. Por isso, permite que o neto fique em sua casa e fica de olho na filha e no genro. Em determinado momento, Tati disse que ia embora, descer para Barroquinha. Perguntei se podia acompanhá-la e ela disse que sim. Saímos então da Praça da Sé, passamos pela Cruz caída, pois ela precisava falar com um “chegado”4 sobre sua guia. Segundo Tati, o verão estava chegando e talvez colocasse sua guia novamente neste período. Após uma conversa acalorada, Tati deixou o “chegado” falando sozinho e saiu falando em voz alta, enquanto descíamos em direção ao Elevador Lacerda e em seguida à Barroquinha. Segundo Tati, o preço cobrado pelo “chegado” era muito alto e ela não o deixaria passa-la pra traz.

Passado o acaloramento, e certamente minha vergonha, por estar andando ao lado de Tati, que falava alto, enquanto as outras pessoas nos olhavam, Tati volta a falar do neto: “Sabe o que eu gosto? Colocar uma roupa bem bonita nele e sair. Levo ele pro parque e todo mundo diz que ele parece ser meu filho. Fico tão feliz.5 Ir ao parque com o neto e colocar roupa bem bonita é motivo de orgulho para Tati. De outro lado, enquanto descíamos, ela dizia que sua prioridade agora é a criança, pois ainda está pequeno e precisa dela, depois as coisas se ajeitavam.

Tati é uma avó jovem. Também se tornou mãe muito jovem. Segundo seu relato, foi sua mãe quem cuidou de sua filha e da maioria de seus outros filhos. Agora, sua filha se torna mãe e ela assume para si a responsabilidade, refazendo o gesto de sua mãe. A forma como fala do neto e o assume a coloca em um lugar que poderíamos denominar de mãe. Contudo, se compreendemos este lugar de cuidado, de forma mais ampla, como o lugar de quem exerce essa função e assume esse papel, podemos repensar tais concepções. Por outro lado, ainda que as pessoas pensem que ele “se pareça com seu filho”, Tati guarda com muita precisão o lugar de sua filha na história. As histórias se encontram e se entrecruzam. O movimento de colaboração, no cuidado de quem ainda está “bem pequeno”, é um processo que acontece de forma positiva. Em determinado momento, sua mãe assumiu este lugar, pois ela, Tati, ainda não estava tão preparada, e agora ela assume, pois a sua filha é quem não está tão preparada. Este movimento circular coloca estas mulheres em uma roda de colaboração.

Carol: de olho nas crianças do bairro

Num final de tarde de sexta-feira, mês de maio de 2019, na Ladeira da Montanha, muitas mulheres estão sentadas no batente de suas moradias, antigos casarões degradados pelo tempo e decadentes pela ausência de intervenção do poder público, que vira as costas ao patrimônio imobiliário do Centro histórico. Crianças pequenas descem e sobem nas calçadas; outras crianças, com fardamento escolar, retornam às casas e ali logo se juntam a outras crianças da vizinhança, iniciando qualquer brincadeira de rua: gritam, riem, jogam uma pedra para afastar os cachorros, fazem piadas; outros ainda se lançam na denúncia, às mães ou mulheres que ali estão, do comportamento achado impróprio de colegas, vizinhos, na escola: “A professora botou ele pra fora da sala hoje! Cê vai ver, vão chamar a mãe dele!”6 - denuncia um menino apontando para o colega que passa com ar desconfiado do outro lado da calçada. Enquanto ouço e observo, uma das mulheres se refere a mim: “Aquele dali já tá é na perdição. Outro dia disseram que ele já tá no mau costume, roubando. Ele tem 12 anos, devia era estudar pra não ter destino do pai, nas drogas”.7 Eu, surpresa, insisti no tema do comportamento do menino, que já era meu conhecido de um projeto social envolvendo música no bairro. A mulher então dispara sua preocupação:

Aqui todo mundo tem de se ajudar. Quando falta água a gente se ajuda, carrega até lata pesada pros outros. Quando tem perigo de desabamento, durante as chuvas, a gente procura a Associação de bairro, vai junto na prefeitura, faz arrecadação, porque não quer ver a desgraça dos outros [...] E as crianças a gente tem de olhar. Não é porque o pai é do crack que a gente vai ver o menino errando e não vai falar, orientar. Tudo o que eu fiz, no meu passado (porque agora já tou mais velha, cansada), não me arrependo. Tive foi de fazer vida pra sustentar a mim e aos filhos. Tenho uma filha que estudou e saiu daqui, mas não se envergonha da mãe [...]. Temos de buscar melhorar. Eu olho muito pra mim e hoje eu sei o que pode ajudar essas crianças: brigar, chamar atenção. Mesmo que a mãe despreze, mas o fato de você falar com os meninos já dá assim pra eles um norte. Do tipo, alguém está preocupado comigo, eu não vou fazer assim que fulana tá ali, vai saber que eu fiz errado... Eu fico de olho nas crianças do bairro [...]. Eu criei meus filhos, minha filha sobretudo, com a ajuda de muita gente que não era da minha família. As amigas iam se juntando, ajudando, uma vizinha aqui, outra ali e eu fui aprendendo. Hoje eu faço até melhor do que o que fizeram por mim.8

Carol é uma das entrevistadas cuja narrativa reconta as várias dificuldades das mulheres pobres, com filhos e no exercício da prostituição. As que estão em outras atividades (faxineiras, vendedoras ambulantes, empregadas domésticas) enfrentam as mesmas dificuldades na criação dos filhos. Assim, o cenário da cidade que exclui os pobres e marginaliza e estigmatiza populações está presente em muitas experiências femininas de prostitutas e não -prostitutas. Acompanhando o cotidiano de muitas mulheres, caminhando junto com elas, podemos melhor observar suas dificuldades e desafios, que vão desde o próprio deslocamento (subir e descer a ladeira), buscar filhos pequenos na escola, ausência de creches para os menores, ausência de rede de apoio. A decisão de acompanhar os “indivíduos” em seus trajetos habituais, permite revelar o mapa de deslocamentos deles. Esse modo de operar é denominado por Magnani (2012) pela perspectiva “de perto e de dentro”, ou seja, acompanhar tais indivíduos significa “apreender os padrões de comportamento não de indivíduos atomizados, mas de múltiplos, variados e heterogêneos conjuntos de atores sociais, cuja vida cotidiana transcorre na paisagem da cidade e depende de seus equipamentos” (MAGNANI, 2012, p. 267).

Considerações

As histórias são tecidas e construídas a partir dos vários encontros que temos realizado com as interlocutoras na Praça da Sé, na rua, em suas casas, nas ladeiras do Centro. Os saberes provenientes desses encontros com o Outro, com a alteridade, nos levam para além da pesquisa a um processo de encontro consigo mesmas. Este encontro nos coloca em sintonia com o significado de pesquisar a partir da perspectiva da etnografia: o encontro nas ruas e a partir das ruas nos movimenta e nos conduz a estabelecer novas e distintas “leituras de mundo”. É um trabalho de parceria, envolvimento e conexão.

O objetivo deste artigo foi trazer alguns dados etnográficos, a partir de conversas e observações que tomam como foco o tema dos processos e dinâmicas socializadoras de crianças, filhos e filhas de mulheres pobres que exercem a prostituição em Salvador, Bahia. Para tanto, buscou olhar para as estratégias de cuidado elaboradas e experienciadas pelas mulheres e seus familiares diante da necessidade de cuidar, educar e socializar seus filhos(as). A pesquisa, ainda em fase de coleta de dados, compreende a importância de pensarmos os atores na rua e no bairro, afinal as redes de cuidado pressupõem estratégias espaciais que favorecem a circulação. As agentes da pesquisa estabelecem interlocuções a partir do seu cotidiano e seu estar no mundo, assim, são por meio destas interlocuções que as identidades são construídas e (re)construídas.

A etnografia tem sido a chave para entendermos o que as imagens podem informar. O movimento de crianças circulando, mulheres sentadas nos bancos - uma em sua guia, outra esperando cliente, uma terceira segurando sua filha bebê, a outra se ocupando do neto - nos faz pensar em como as relações neste espaço são diversas. Em determinado momento, ao sinal de um cliente, uma das mulheres levantou-se e foi atendê-lo. As crianças, por sua vez, continuavam brincando no espaço, em alguns momentos correndo, em outros subindo nas árvores. Chamava atenção, no entanto, que as mulheres, não somente a mãe, ao verem as crianças se distanciarem um pouco mais, ou a fazer algo “errado”, chamavam a atenção destas. Chamar a atenção é chamar para si a responsabilidade. Cada mulher, ali naquele espaço, chama para si o cuidado de qualquer criança que esteja naquele espaço. A criança, portanto, não é somente filho ou filha de, mas alguém que está sob os cuidados e responsabilidades de todos os presentes.

O caminho etnográfico nos leva a um “estar junto”: estando junto na rua, observando o cotidiano, e para além desta observação, participando da trama que envolve estar na rua junto às trabalhadoras sexuais é, em grande medida, estar junto com o movimento, tecendo estratégias e enfrentamentos, e, assim, aprendendo no campo e com o campo como pesquisar.

Nesta pesquisa optamos pelo método etnográfico por nos permitir, no processo de pesquisa de campo e construção dos dados, a interação com o Outro e a possibilidade de participar das tramas e dramas vivenciados pelos atores sociais deste contexto. Em nosso caso, os atores sociais são, majoritariamente, as mulheres da batalha e seus filhos e filhas. Além das mulheres iremos considerar os diversos atores sociais que compõem o cenário da prostituição e os contextos onde as mulheres educam e cuidam seus filhos e filhas. A opção é por fazer um trajeto de pesquisa com esses atores, pautado do conhecimento e reconhecimento do lugar e território onde já iniciamos anteriormente uma pesquisa.

Magnani (2009) afirma que a etnografia é uma forma de operar onde o/a pesquisador(a) entra em contato com o universo dos(as) pesquisados(as) e compartilha de seu horizonte, em um processo de relação de troca. Nesta relação, compara suas próprias teorias com as dos(as) pesquisados(as) e assim busca sair com um novo entendimento da realidade, ou pelo menos um novo olhar não previsto anteriormente. Na perspectiva de Magnani (2009) há que distinguir entre “prática etnográfica” de “experiência etnográfica”, assim, enquanto a prática é programada e contínua, a experiência é descontínua e imprevista.

Nesta pesquisa, nosso foco tem sido a etnografia de rua, pelo fato de as mulheres da batalha estarem situadas na rua/praça, enquanto exercem sua profissão e agenciam seu cotidiano em suas mais variadas facetas: cuidado com os/as filhos(as), relação com clientes e/ou companheiros(as), resolução de questões como saúde, alimentação, educação, participação de outros espaços e contextos. Para Rocha e Eckert (2013, p. 12), a etnografia de rua “é uma adesão à antropologia em seu método clássico, mas, mais do que esta filiação, é um diálogo com novos tempos interpretativos da antropologia em seus paradigmas críticos”.

A rua, nos exercícios etnográficos, se coloca para nós como um arranjo espaço-temporal onde a vida social se desenrola nas suas mais diversas formas. São múltiplas facetas da rua que o etnógrafo conhece em sua inserção na ‘pesquisa de campo’ que são narradas pelas imagens etnográficas da escrita, da foto, do vídeo, do som e que aqui são interpretadas como poética das ruas acomodadas nos ritmos temporais da vida citadina. (ROCHA; ECKERT, 2013, p. 13, grifo do autor).

A rua é o lugar para onde convergem múltiplos sentidos e se constroem diversas significações sobre a realidade e o contexto. Na rua, as pessoas constroem redes de relações e interações, vivenciam dramas, encontros, desencontros, compõem o cenário e o corporificam dando gostos, sabores, cheiros, ruídos, imagens, cores e som. A rua é, portanto, o espaço vivido, “onde o corpo coletivo pode narrar a cidade” (ROCHA; ECKERT, 2013, p. 13).

A etnografia de rua está relacionada aos estudos pioneiros da Antropologia Urbana, sendo a referência, no Brasil, Gilberto Velho (1978, 1980). Em Gilberto Velho, verificamos que o/a pesquisador(a) pertence à cidade e a constrói, portanto ele(a) faz parte da sociedade que está sendo pesquisada, por isso será necessário construir o lugar marcado pelo estranhamento em relação aos fenômenos que compõem a vida urbana. É necessário: “estranhar o familiar”, nas palavras de Gilberto Velho (1973).

A partir da rua e dos encontros possíveis neste espaço, nossa busca tem sido a de nos aproximarmos das mulheres da batalha, em relação e interação, observando de que modo elas constroem formas de organização no que tange ao cuidado, educação e socialização de seus filhos e filhas.

REFERÊNCIAS

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1Batalha é uma categoria que emerge do campo e do processo de pesquisa e estudo sobre as mobilidades, socialização e construção de saberes construídos por mulheres pobres inseridas em contexto de prostituição no Centro Histórico de Salvador. Ela explícita de modo amplo a complexidade da prostituição, prática social atravessada e perpassada por diversas relações e categorias sociais, que nos informa no campo de estudo e investigação do tema o modo como essas mulheres, especificamente, significam e dão sentidos à sua prática. A batalha, portanto, expressa muito mais que mera troca de dinheiro por serviços sexuais, é uma metáfora que expressa um modo próprio de garantir a subsistência de necessidades básicas, o agenciamento e protagonismo de mulheres excluídas do mundo social e dos espaços políticos, que buscam a cidadania plena e lutam por garantia de direitos (SILVA, 2017).

2Em razão de sua geografia, a cidade de Salvador se formou em dois níveis, chamados Cidade Alta e Cidade Baixa. Além do Elevador Lacerda, algumas ladeiras ligam os dois planos da cidade; dentre elas, a da Montanha é uma das principais. No começo do século passado, a Ladeira da Montanha ficou conhecida por possuir os principais cabarés e prostíbulos da cidade, os ditos “castelos”. A Ladeira abrigava bares e locais de diversão para, sobretudo, marinheiros que aportavam na capital baiana. Outras ladeiras ainda hoje permitem a ligação dos dois planos da cidade, são as ladeiras da Preguiça, Conceição, Misericórdia e Taboão.

3Ponto de venda.

4Um “chegado” é uma expressão para se referir a uma pessoa próxima, um amigo com quem se tem intimidade.

5Anotações do caderno de campo, março de 2019.

6Anotações do caderno de campo, maio de 2019.

7Anotações do caderno de campo, maio de 2019.

8Anotações do caderno de campo, maio de 2019.

Recebido: 11 de Maio de 2019; Aceito: 03 de Novembro de 2019

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