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Revista da FAEEBA: Educação e Contemporaneidade

versión impresa ISSN 0104-7043versión On-line ISSN 2358-0194

Revista da FAEEBA: Educação e Contemporaneidade vol.29 no.59 Salvador jul./sept 2020  Epub 19-Jul-2021

https://doi.org/10.21879/faeeba2358-0194.2020.v29.n59.p144-161 

DOSSIÊ TEMÁTICO

OS JORNAIS DOS ALUNOS DO LICEU MARANHENSE (1907-1930)

THE SPEECHES OF STUDENTS OF THE LICEU MARANHENSE IN THE FIRST REPUBLIC (1907-1930)

LOS DISCURSOS DE ESTUDIANTES DEL LICEU MARANHENSE EN LA PRIMERA REPÚBLICA (1907-1930)

Cesar Augusto Castro*  (UFMA)
http://orcid.org/0000-0001-7650-895X

Luciana Nathalia Morais Furtado**  (UFMA)
http://orcid.org/0000-0002-1874-9832

Samuel Luís Velásquez Castellanos***  (UFMA)
http://orcid.org/0000-0003-0849-348X

*Pós-doutorado em Educação pela Universidade de São Paulo (USP) e pela Universidade do Porto, Portugal. Doutor em Educação pela Universidade de São Paulo (USP). Professor Titular da Universidade Federal do Maranhão (UFMA). Coordenador do Grupo de Trabalho de História da Educação da ANPEd. Pesquisador Produtividade do CNPq. E-mail:ccampin@terra.com.br

**Mestre em Educação pela Universidade Federal do Maranhão (UFMA). Integrante do Núcleo de Estudos e Documentação em História da Educação e das Práticas Leitoras no Maranhão (NEDHEL/UFMA). E-mail: lucianafurtado10@gmail.com

***Pós-doutorado em Educação pelo Centre d´Histoire Culturalle des Sociétés Contemporaines da Université de Versailles, França. Doutor em Educação Escolar pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (UNESP). Professor Adjunto IV do Departamento de Educação I da Universidade Federal do Maranhão (UFMA). Bolsista Produtividade da Fundação de Amparo à Pesquisa e ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico do Maranhão (FAPEMA). E-mail: samuel.velazquez@ufma.br


RESUMO

Apresenta os discursos dos alunos liceístas nos jornais estudantis maranhenses no período de 1907 a 1930 a fim de identificar e analisar a dinâmica escolar e as representações sobre o cotidiano do ensino secundário. Para tanto, este estudo baseia-se no mapeamento e na análise dos seguintes jornais: O Progresso (1907); O Brazil (1907); O Canhoto (1912-1914); Excelsior (1914); O Estudante (1915); Lábaro (1921); Alma Nova (1929) e o Sangue Jovem (1930). O estudo da imprensa periódica educacional liceísta possibilitou compreender as ideias sobre o desenvolvimento do país, a criação de escolas e a implantação de métodos na instrução pública secundária maranhense. Contatou-se que os jornais escritos pelos alunos do Liceu se configuraram como um importante veículo de identidade e de resistência entre o ideal e o concreto vivenciado pelos estudantes desta instituição.

Palavras-chave: Imprensa estudantil; Ensino Secundário; Maranhão República

ABSTRACT

It presents the speeches of high school students in the student newspapers from Maranhão in the period from 1907 to 1930 in order to identify and analyze the school dynamics and the representations about the daily life of secondary education. To this end, this study is based on the mapping and analysis of following newspapers: O Progresso (1907); Brazil (1907); The Left-Hander (1912-1914); Excelsior (1914); The Student (1915); Labaro (1921); Alma Nova (1929) and the Young Blood (1930). The study of the periodic educational press made it possible to understand ideas about the country's development, the creation of schools and the implementation of methods in secondary public instruction in Maranhão. It was found that the newspapers written by the students of the Liceu were configured as an important vehicle of identity and resistance between the ideal and the concrete experienced by the students of that institution.

Keywords: Student press; High school; Maranhão Republic

RESUMEN

Presenta los discursos de estudiantes de secundaria en los periódicos estudiantiles de Maranhão en el período de 1907 a 1930 para identificar y analizar la dinámica escolar y las representaciones sobre la vida cotidiana de la educación secundaria. Para este fin, este estudio se basa en el mapeo y análisis de siguientes periódicos: O Progresso (1907); Brasil (1907); El zurdo (1912-1914); Excelsior (1914); El estudiante (1915); Labaro (1921); Alma Nova (1929) y The Young Blood (1930). El estudio de la prensa educativa periódica permitió comprender las ideas sobre el desarrollo del país, la creación de escuelas y la implementación de métodos en la enseñanza pública secundaria en Maranhão. Se encontró que los periódicos escritos por los estudiantes del Liceu se configuraron como un vehículo importante de identidad y resistencia entre el ideal y el concreto experimentado por los estudiantes de esa institución.

Palabras clave: Prensa estudiantil; Enseñanza secundaria; República de Maranhão

INTRODUÇÃO

O estudo da imprensa periódica, em qualquer campo, constitui-se imperativo para o conhecimento da sua movimentação, suas ideias dominantes em determinados períodos, os autores mais produtivos, as temáticas reincidentes, os referenciais teóricos e metodológicos, dentre outros aspectos possíveis de investigação.

Entretanto, face à trajetória acidentada de imprensa periódica (LEMOS, 1982), é difícil detalharmos, com profundidade, os aspectos históricos da mesma, em especial no Brasil, pelas dimensões geográficas e instabilidades financeiras e políticas que afetam a produção e a circulação das informações. Os estudos existentes procuram analisar títulos isolados, dificultando, em outra instância, a construção historiográfica de um determinado campo de saber, posto que são “lacunares, parcelares e residuais” (NUNES; CARVALHO, 1985, p. 8).

Nesse sentido, Vilhena e Catani (1992, p. 1) lembram que “a própria falta de divulgação sobre a localização dos materiais [dispersão dos mesmos, divulgação deficiente e a diversidade dos círculos de origem] torna ainda mais atomizado e fragmentado o processo” de pesquisa. Tais problemáticas dificultam a precisão, no Maranhão, quanto ao número de periódicos que circularam desde 1821, quando da publicação d’O Conciliador do Maranhão.1

Raras são as exceções em que o pesquisador tem o privilégio de dispor em suas análises do ciclo de vida das publicações em sua completude, implicando significativamente na dimensão dos resultados das investigações. Este obstáculo não deve ser elemento de desmotivação da pesquisa, ao contrário. Solicita o surgimento de novas fontes que proporcionem a interpretação das lacunas e possibilitem a continuidade da construção histórica.

Assim, tornam-se relevantes os estudos em torno desse material, na medida em que propõem a organização de reportórios e guias de referência, nos quais a sistematização das informações acerca das produções elaboradas - por e para professores, bibliotecários e historiadores - seja feita de modo a prestar-se a múltiplas utilizações em trabalhos de vários pesquisadores.

No tocante às publicações criadas de cunho educacional estão as revistas pedagógicas, as revistas de ensino, as institucionais, ou seja, são várias as tipologias da Imprensa Educacional Pedagógica, que para Catani e Bastos (2002) significa afirmar que “é um corpus documental de vastas dimensões, pois constitui-se em testemunho vivo dos métodos e concepções pedagógicas de uma época e da ideologia moral, política e social de um grupo profissional”. Podemos citar autores que iniciaram os estudos desta temática, como, por exemplo, Caspard e outros (1981), em que a imprensa educacional se constituía como um conjunto de revistas destinadas a professores e objetivavam guiar a prática cotidiana do ofício docente.

Essa forma de compreender a imprensa educacional pedagógica é ampliada por Nóvoa (1993), quando a categoriza em “Imprensa de Educação e Ensino”, e subdivide todas as formas em que pode ser representada: 1) Sistema educativo e instituições escolares; 2) Professores; 3) Tipos particulares de ensino e educação; 4) Modalidades de apoio e integração socioeducativa; 5) Educação não formal; e 6) Ciências da educação. Segundo esse autor, a Imprensa de Educação e Ensino vai para além do ensino formal, abrindo caminhos para a educação não formal que representa as abordagens nos adultos, na mulher, nos movimentos da juventude, nos jornais e nas revistas infantis, entre outros (NÓVOA, 1993).

A Imprensa Pedagógica Educacional Brasileira, de igual modo, ganha destaque nas pesquisas de Catani (1996) e de Catani e Sousa (1999), quando escreveram a Imprensa Periódica Educacional Paulista (1890-1996), reunindo as revistas publicadas em São Paulo no período, objetivando organizar estas materialidades que aparecem de várias formas: 1) Periódicos de instituições de ensino superior; 2) Periódicos com números temáticos; 3) Revistas especializadas em áreas que são consideradas ciências-fontes da educação; 4) Revistas especializadas em áreas que possuem cursos de licenciatura; 5) Periódicos culturais ou literários; 6) Anuários e anais de instituições de ensino; 7) Periódicos mantidos por organizações docentes e discentes; 8) Periódicos educacionais; 9) Publicações da Secretaria da Educação; 10) Poliantéias ou edições comemorativas; e 11) Boletins bibliográficos sobre educação.

Desse modo, a compreensão que as autoras obtiveram sobre a imprensa e a educação foi adotada a partir dos autores “clássicos” que tratam da temática e, principalmente, em Nóvoa (1993, 1997), quando estas compreendem os múltiplos enfoques que podemos dar numa pesquisa com esses materiais por meio dos recortes dados pelos diferentes tipos de revistas.

Portanto, a Imprensa Pedagógica Educacional possibilita compreendermos os discursos raramente ditos em documentos oficiais, contradições de pensamentos, a relação entre a teoria e a prática observada numa mesma fonte, constituindo-se “um meio indispensável para o conhecimento do que é o sistema de ensino, o que ele representa, por exemplo, no espaço onde se desenvolve e onde se localizam todos os sistemas, teorias e práticas educacionais, de origem tanto oficial quanto privada” (CASPARD; CASPARD, 1997, p. 32-33).

Esse argumento é defendido por Nóvoa (1993, p. 6) quando afirma que a imprensa de Educação e Ensino revela “as múltiplas facetas dos processos educativos, numa perspectiva interna (cursos, programas, currículos), como também o papel desempenhado pelas famílias e pelas diversas instâncias de socialização de crianças e jovens”.

Portanto, são unânimes os autores em destacar a importância dessas fontes que propiciam o alargamento da análise sobre as práticas escolares e os efeitos dela sobre professores, alunos e diretores; estes diversos atores contribuem para a propagação de ideais quando escrevem suas próprias folhas, jornais ou revistas.

Desse modo, a importância de estudar essas fontes nos leva a compreender as práticas desempenhadas naquele presente-ausente e os anseios de um futuro, descortinando realidades diferentes a partir das diversas vozes na imprensa, “uma vez que é através deste media que se manifestam a maior parte das vozes, dos projetos, dos anseios e das realidades dos diversos autores” (NÓVOA, 1997, p. 11). Sob a análise destas materialidades são denunciadas situações próximas do acontecimento, levando-nos a compreender de que formas se realizaram o cotidiano escola

A partir desses estudos, proliferam-se investigações que tomam os jornais e as revistas como material para análise do campo da história da educação brasileira, a exemplo da obra organizada por Schelbauer e Araújo (2007). Trabalhos apresentados em eventos científicos, como o Congresso Brasileiro de História da Educação e o Luso-Brasileiro de História da Educação, são exemplos de como essas materialidades têm ocupado lugar privilegiado nas análises do cotidiano, nas práticas e no movimento do campo em tempo e espaços diversos.

Todavia, é preciso considerar que a imprensa é como o lugar de uma permanente regulação coletiva. Nesse sentido, lembra Nóvoa (1993, p. xxxiii) que:

[...] o futuro de um periódico agrega-se sempre a detalhes e discussões, a polêmicas e conflitos; mesmo quando é fruto de uma vontade individual. A controvérsia não deixa de estar presente no diálogo com os leitores, nas reivindicações junto aos poderes públicos ou nos editoriais de abertura.

Concebemos, desse modo, os materiais da imprensa periódica como veículos de comunicação de um dado campo de saber, ou seja, como um mecanismo de divulgação de suas atividades. Isso possibilita ao pesquisador compreender a sua trajetória, suas ideias dominantes em determinado período, suas principais lideranças, dentre outros aspectos possíveis face às riquezas de contribuições discursivas advindas deste tipo de material. Nesse sentido, Nóvoa (1993) afirma que a imprensa é, talvez, o melhor meio para compreendermos as dificuldades de articulação entre a teoria e a prática: o senso comum, que perpassa as páginas dos jornais e das revistas, ilustra uma das qualidades de um discurso educacional que se constrói a partir dos diversos autores em presença.

Em se tratando de educação, a imprensa maranhense constitui-se um campo fértil de investigação, ainda pouco explorado pelos pesquisadores locais. Ou seja, são fontes privilegiadas para mapearmos o movimento da educação no Estado, onde brotam:

[...] ‘vozes’ que têm dificuldade em se fazerem ouvir noutros espaços sociais, tais como a academia ou o livro impresso. Basta ver, por exemplo, o papel extremamente activo desempenhado pelos professores do ensino primário na dinamização de jornais locais ou regionais, a importância crescente da imprensa de iniciativa dos estudantes. (NOVOA, 1997, p. 17, grifo do autor).

Todavia, é preciso entendermos que a imprensa periódica como veículo de comunicação não é destituída de ideologias - políticas, culturais, sociais, religiosas e outras - dos seus redatores e colaboradores. No Maranhão, observamos uma tendência marcante das disputas pelo poder político, liderado pelos grupos oligárquicos, que fundam e usam os jornais para divulgarem seus interesses partidários e/ou rebaterem os dos seus opositores.

Sendo assim, classificamos a imprensa periódica maranhense em dois grupos. O primeiro destinava-se a discutir notícias de âmbito geral, inserindo a educação nesse contexto. Esses jornais destinavam-se a uma parcela leitora geral, dentre os quais havia as mulheres, negros, comerciantes e políticos (CASTELLANOS, 2007). O segundo grupo constitui-se em jornais que tratavam de assuntos específicos como a literatura, a religião e a educação - caracterizavam-se por um ciclo de vida curto, sendo que alguns não ultrapassavam duas ou três edições, além de terem periodicidade irregular.

Ao refletir sobre a imprensa periódica maranhense, César Augusto Marques, em 1878, afirma que:

[...] a imprensa, quando bem encaminhada, é farol que alumia e dirige com acerto, e não facho incendiário que destrói e tudo arrasa, e que a discussão livre, porém calma e judiciosa, esclarece o pensamento, espalha pelo povo idéias úteis, sãs e proveitosas, cria e fortalece a opinião pública. (MARQUES, 1878, p. 221).

A nossa intenção, neste trabalho, é dar uma visão a respeito dos discursos dos alunos do Liceu maranhense que circulavam na imprensa periódica publicada por eles. Dentre as diversidades de jornais dessa natureza (ou seja, redigidos, impressos e divulgados por alunos maranhenses de diversas instituições de ensino), escolhemos aqueles que julgamos os mais significativos por demarcarem um período conturbado na política maranhense com forte ressonância na educação, como apresentaremos no Quadro 1.

Assim, esse objeto de estudo, os discursos dos alunos do Liceu maranhense na Primeira República (1907-1930), adentra os domínios da pesquisa histórica quando pretendemos analisá-la cruzando os aspectos da história da imprensa (analisada como objeto/fonte), da história da educação (como campo de investigação) e da história cultural (como eixo teórico-metodológico) para uma maior aproximação da realidade educacional da Primeira República maranhense. A análise destas três especificidades da história pode ser visualizada como um triedro metodológico quando nos permite detectar os múltiplos vieses que a nova história cultural prioriza enquanto nos autoriza a transformar velhos objetos e problemas em novos objetos e novos problemas via lentes superpostas (CASTELLANOS, 2012).

Destarte, quando o objeto se comunga à história da imprensa educacional maranhense, correspondendo com as materialidades culturais que analisamos, esta operosidade culmina com a própria abordagem do objeto, centralizando-se a discussão na configuração textual do registro ( CASTRO, 2010; CASTELLANOS,2007, 2012), identificando-se em discutir quem escrevia, para quem escrevia e o que escrevia, denunciando-se os acordos ou rupturas das formas de ensinar atuais ou não na educação.

Abordarmos os impressos educacionais no domínio da história da educação tem extrema relevância para a observação dos rastros e vestígios deixados pelas “formas de fazer” (CERTEAU, 1994) das escolas maranhenses; ou seja, as práticas escolares que eram realizadas no interior da instituição educacional observadas nos periódicos dos agentes do processo educacional (alunos, professores e diretores), objetivando-se uma aproximação com a cultura escolar das instituições investigadas.

Numa perspectiva histórica, o objeto pode ser visualizado por um agrupamento de domínios, elucidando problemáticas que, talvez, somente o isolamento de concepção não expandiria a análise. A interdisciplinaridade da história permite-nos por novamente no campo de análise o mesmo objeto que fora estudado antes. Esta forma de escrita da história, como afirma Barros (2013, p. 15), “deixa o pesquisador a vontade para a escolha de um objeto antigo, reavaliando com novos olhares e transformando-os em novos objetos e novas fontes”. De igual modo, pretendemos compreender a cultura escolar enraizada nos interiores das instituições maranhenses por meio da multifocalidade dos olhares conceituais e das fontes, a fim de tornar audíveis vozes dos processos educacionais (FARIA FILHO, 2004).

Nesse sentido, utilizamos a pesquisa bibliográfica e a documental. Na primeira, realizamos os levantamentos conceituais sobre a história da imprensa, a história da educação e a história cultural, além do levantamento das fontes considerando sua historicidade, para uma melhor compreensão dos atos, ditos e fatos, como também das formas de pensamento que sustentam os discursos proferidos via imprensa pedagógica na Primeira República brasileira.

Em sendo assim, reservamos nossos olhares aos mais diversos “jornaizinhos escolares”, imprensa educacional ou imprensa pedagógica, nomenclaturas adotadas por diversos autores para denominar a cultura impressa escolar, que nessa conturbada sociedade (a recém instaurada República) a educação ganha destaque, na medida em que o país necessitava modernizar-se e, para isto, urgia a instrução da grande maioria da população que não possuía condições de educação formal.

Partindo da Pesquisa Bibliográfica e tendo por fim os estudos históricos que possuem como foco central a história dos impressos educacionais, nos auxiliamos de Catani (1988), quando investiga sobre a Revista de Ensino, publicada pela Associação Beneficente do Professorado Paulista; de Bastos (1994a, 1994b), ao analisar a Revista do Ensino do Rio Grande do Sul; e de Gandini (1990), que centraliza seu estudo na Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos, publicada pelo instituto Nacional de Estudos e Pesquisas (INEP).

O trabalho organizado por Schelbauer e Araújo (2007) sobre a História da educação pela imprensa nos revela os interesses dos pesquisadores em abordar os impressos escolares como fontes e objetos na História da Educação. Catani e Bastos (2002), por outro lado, com o livro Educação em revista: a imprensa periódica e a história da educação, reúnem artigos dos principais teóricos2 que trabalham com a temática da imprensa educacional, abordando-se as definições do que seria a imprensa educacional, o por quê de escolher um repertório ou corpus e qual a importância de se estudar este tipo de materialidade cultural como fonte e/ou objeto. Amaral (2002), em seu artigo denominado Os impressos estudantis em investigações da cultura escolar nas pesquisas histórico-institucionais, investiga a produção de jornais escolares estudantis sob a ótica da categoria escolar, na medida em que elenca as múltiplas fontes primárias e secundárias, ultrapassando a análise usual sobre as diretrizes que regeram a escola. Castro (2009,2011), na publicação Cultura material escolar: a escola e seus artefatos (MA, SP, PR, SC e RS, 1870-1925), retrata o processo de modernização pensado no Brasil República quando traz novos desafios para a construção de prédios com arquiteturas imponentes e localizados nas zonas centrais das cidades. Baseamo-nos em Castro (2010) quando aborda a História da Educação Maranhense no livro Leitura, impressos e cultura escolar, discutindo sobre a leitura e a prática pedagógica das discentes da Primeira República.

Os materiais da imprensa de ensino produzidos pelos alunos do Liceu Maranhense se assemelham no formato (contendo quatro folhas no mínimo) e nos modos de organização da primeira página, diferenciando-se na forma de apropriação e expressão dos assuntos voltados para a educação. Se, de um lado, os professores detinham uma arguição pedagógica dando prioridade aos métodos que deveriam ser adotados, às formas das práticas escolares e uma preocupação com o crescente número de analfabetos, por outro lado, os estudantes (de maneira mais subjetiva) fazem alusão de que somente pelo estudo se apontaria um desenvolvimento pessoal e profissional, podendo contribuir com a sociedade maranhense.

No Quadro 1 apresentamos os nove jornais analisados, abrangendo o espaço temporal de 1907 a 1930, dos quais procuramos nos centrar nos seguintes aspectos: editorial de abertura, circulação e permuta dos jornais, homenagens e crônicas.

Quadro 1 Impressos Estudantis Liceístas 

Impressos Estudantis
O Progresso (1907)
O Canhoto (1912)
A Inubia (1914)
O Excelsior (1914)
O Estudante (1915)
O Brazil (1907)
Lábaro (1921)
Alma Nova (1929)
Sangue Jovem (1930)

Fonte: Catálogo de jornais da Biblioteca Pública Benedito Leite (2016).

OS ASSUNTOS NAS PRODUÇÕES DOS ALUNOS LICEÍSTAS

Os assuntos recorrentes entre os jornais estudantis nos proporcionam perceber as maneiras de pensar, de se comunicar e a necessidade de serem ouvidos no cenário da imprensa jornalística, o que nos possibilita a investigação dos discursos juvenis, na medida em que categorizamos as notícias com a finalidade de compreender a relevância das escritas dos estudantes nas folhas ou nos jornais numa arena concorrida por jornalistas e de como conseguiram se manter, apesar de algumas folhas estudantis terem vida efêmera e outras sobreviverem no máximo até três anos de publicação. Na medida em que quantificamos as produções estudantis e organizamos as notícias, identificamos as semelhanças nas formas de publicação: número de colunas, quantidade de páginas, os conteúdos, o que por sua vez nos auxilia na formação de uma concepção do que seriam as apropriações dos discentes sobre os temas a seguir.

a) Editorial de Abertura dos jornais

Os editoriais de abertura são pequenas apresentações do que seriam as finalidades e funções dos jornais estudantis. As finalidades das publicações têm a intenção de alcançar o ápice do estudo, criticar o analfabetismo e desenvolver a instrução pública.

As funções tendem à caracterização de um grupo, podendo identificá-los como membros capazes de contribuir para o desenvolvimento pessoal e da sociedade maranhense. O jornal O Brazil é dirigido por estudantes, dos quais se espera não só “[...] dos seus amaveis collegas como do público em geral, que, vendo o gosto que temos para a carreira jornalística, devem ajudar-nos para que no futuro e pátria de João Lisboa e outros possa contar com escritores iguaes a eles” (EDITORIAL, 1907, p. 2).

Ideais da contribuição literárias são muito recorrentes em suas finalidades, bem como os preceitos de moralidade e civilidade que permeiam os discursos dos jovens no jornal O Progresso:

Caros amigos - O progresso é um jornal completamente independente, somos crianças, mas o nosso pequeno jornal pode ser apresentado perante qualquer família, por que será completamente moral, devemos nos esforçar para a moral publica e não salientar a imoralidade no nosso estado. (CARTA..., 1907, p. 1).

Conceitos fortemente apregoados e reforçados na Primeira República brasileira, aliados com os de ordem e progresso.

Outras finalidades dos jornais seriam adentrar no cenário da imprensa com a finalidade de “progredir, resistindo, com intrepidez, os escolhos que tolhem a nossa marcha evolutiva, este orgam da sociedade estudantal Machado de Assis sente-se com forças para lutar pelas letras e galgar o cimo da escada do progresso” (ABERTURA, 1915, p. 1).

Os objetivos dessas publicações possibilitam identificar os primeiros passos desses jovens para a formação de carreiras, despertando o interesse em contribuir para o desenvolvimento do Maranhão; isto pode ser confirmado no jornal O Canhoto, quando afirma que:

Funda-se a esperança desse futuro na dedicação desses moços ao progresso da instrução, eflúvio doce e vivificante que perpassa por nossa alma, dedicação esta de engrandecer a nossa querida pátria. Avante com o trabalho, pois é ele de origem nobre, se seus efeitos se fazem sentir em cada um de nós, por entre os menores atos de nossa vida no seio da sociedade inteira. (EDITORIAL, 1913, p. 1).

A possibilidade de circulação dos periódicos auxiliava na divulgação dos ideais e preceitos dos jovens, que, por sua vez, ganhavam notoriedade no interior e exterior dos muros da escola. Assim, destacamos o jornal Alma Nova (1929), quando afirma que em várias escolas professores e alunos fizeram espontaneamente a propaganda escolhida por eles: “De colegas, mestres e intellectuaes receberam os que aqui trabalham palavras de incinamento e aplauso. Parece que impressionou os espíritos sadios o desassombro com que expomos nossas idéas, o nosso horror ao engrossamento e á mentira” (EDITORIAL, 1929, p. 1).

As vozes faziam ressoar no cenário maranhense marcado por uma crise econômica, a turbulência no cenário político e muitos aspectos, entre eles o grande índice de analfabetismo, que incitavam os discentes a procurarem caminhos férteis para as próximas gerações. Argumento que foi utilizado pelo jornal A Inubia, na medida em que “reprezenta um grito de alarma, um apelo, um apelo a todos, uma vibração que nós, moços, queremos que se propague até o futuro, de geração a geração” (UM GRITO..., 1914, p. 1).

Os estudantes, de maneira geral, acreditavam que para se fazer um futuro prodigioso deveriam se basear em três conceitos: na instrução, na civilidade e, por último, no patriotismo. Assim alcançariam a ordem e o progresso.

A mocidade cabe a maior tarefa, e é por isso que a mocidade maranhense, toca rebate, para reunir num esforço unico todos os esforços, num pensamento único, todos os pensamentos, em um unico ideal, todos os ideaes, para ajir, para marchar, vencendo obstaculos, corajoza e forte, na senda larga que se termina na vitoria, e que culmina o progresso e o dezenvolvimento intelectual. (UM GRITO..., 1914, p. 1).

Os discentes, em suas apresentações, objetivavam metas em comum, sempre preservando os bons costumes na tentativa de ajudar na “educação e progresso na instrução a luta de ideais com o apoio moral desta mocidade generosa e altiva que ahi está horando as escolas e educando o caracter na lucta por ideaes” (SANGUE JOVEM, EDITORIAL, 1930, p. 2).

Juntamente com a necessidade de continuar nas tradições literárias do estado, “move-os o espírito de continuidade, de tradição, sob cujos auspícios se tem desenvolvido a nossa intelectualidade: esse [...] na guarda do belo renome na terra, na admiração dos vultos da passada vida literária maranhense” (VIDA..., 1914, p. 1). O jornal Labaro (EDITORIAL, 1921, p. 1) afirmara que as “noções de sciencia, arremedo de literatura, respigos de historia, tudo isso [procurariam] esboçar”.

b) Sociedades Literárias e Estudantis

Os estudantes se agrupavam em Uniões, Clubes, Associações ou Sociedades. A diferença entre os grupos estudantis e as sociedades literárias pode ser vista no jornal O Canhoto, quando se inicia como grupo estudantil e, enquanto estava inserido no contexto escolar do ensino secundário, autodenominando-se de crianças ou jovens, representando somente uma categoria.

Todavia, no mesmo periódico ocorre uma transição ou amadurecimento do órgão da imprensa, quando se formam no Liceu Maranhense e ampliam o grupo de discentes para uma sociedade literária denominada Barão do Rio Branco; ou seja, “em 1912, mais ou menos foi então organizada sob os incansáveis esforços de alguns associados de O Canhoto a Sociedade Literária Barão do Rio Branco, continuando aquele jornalzinho como seu órgão literário” (EDITORIAL, 1921, p. 2), sendo as diferenças de uma para outra devidamente observadas na medida em que criam estatutos da sociedade literária e do jornal.

Além disso, a simpatia que O Canhoto ganhou com a sociedade maranhense é evidenciada na quantidade de números que o jornal possuiu. E a organização em sociedade literária e o amadurecimento dos jovens nas formas de persuadir o leitor e organizar as colunas revelam um crescente quantitativo nas tiragens do periódico, que somente troca de nome, “do periódico O Canhoto para O Ateniense, [continuando] a ser publicado, porém com alguma irregularidade, [...] justificado pelas dificuldades que encontramos nesta capital” (EDITORIAL, 1921, p. 2), pois pretendiam contribuir para o desenvolvimento da Atenas Maranhense, unindo outros grupos estudantis em uma mesma liga em prol dos assuntos da instrução e literária.

Havíamos morrido...

Mas, julgamos, que tal contrasenso não encontrou apoio na opinião dos nossos leitores. De fato; pois hoje ressurgimos em formato maior, com o espírito mais aperfeiçoado e com mais força, para como dissemos no programa traçado no 1° numero: contra os espíritos zombeteiros, invejózos e pretenciozos, lutarmos em prol do progresso. [...] ´O Canhoto´, pertence agora, não à uma associação de estudantes, mas á um grupo de rapazes amantes do progresso e das letras. (EDITORIAL, 1913, p. 2).

As atividades das sociedades literárias eram as conferências, as reuniões e os salões de leituras, as festividades e as homenagens aos seus patronos. O Excelsior relatou o dia de posse da presidência da sociedade Barão do Rio Branco: “Tomou a prezidencia o Sr. Joaquim Luz, que nomeou os Srs. Clovis Castro e Almir Cruz para trazerem ao recinto do prezidente, Hilton Fortuna, eleitos para este ano, os quais assumiram os cargos, assim como o Sr. J. Luz o de tesoureiro e o Sr. Djalma Vasconcelos o de secretario” (A POSSE..., 1914, p. 2).

Esta sociedade literária publicou em seu periódico o seu estatuto:

Art. 1º

A sociedade e seus fins

Fica constituída uma sociedade jornalística, com titulo acima, tendo por orgam um periódico do mesmo nome que circulará duas vezes por mez.

1º- esta sociedade, é composta de 20 socios fundadores e tantos afetivos quantos forem propostos e aclamados.

2º destes socios serão, por eleição nomeados 2 para durante um ano exercerem as funções de: Redator-chefe e tezoureiro, podendo ser reeleitos.

3º só será admetido sócio, rapaz decente, que tenha habilitação para jornalismo.

4º se o redator chefe, o tezoureiro ou ambos, forem em sessão acusados como infrator ou infratores de qualquer dos artigos, será ou serão substituídos.

5º a sociedade, terá um “conselho julgador” composto de trez sócios que julgará os atos da diretoria, as propostas de admissão e demissão de sócios, quando seja precizo. (A SOCIEDADE, 1914, p. 2).

O jornal A Inubia (1914), órgão da União Estudantal “Silvio Romero”, circulou uma vez em 1914. Em suas publicações, relatam a solenidade de abertura da União no salão de honra do Liceu Maranhense: “O salão ornamentado com simplicidade e bom gosto, regorjitava de senhoritas, cavalheiros, e representantes das diversas classes sociaes. As nove horas e meia, deu-se inicio aos trabalhos” (ABERTURA, 1914, p. 3). Falaram as liceístas: Cotinha Mora, Faraildes Campelo e os liceístas Bendito Ferreira, Almir Braga, José Monteiro, Emiliano Macieira, sendo o orador oficial Erson Souza. Festividades que envolviam os professores, as autoridades locais e conclamavam a juventude a continuar com os grupos. Como representante dos professores, Antônio Lobo discursou incentivando a mocidade a progredir (ABERTURA, 1914).

A Sociedade Estudantal Machado de Assis foi inaugurada em 1914 e publicou na imprensa quatro vezes o jornal O Estudante. A solenidade, de igual modo, foi aberta pelo Presidente honorário, professor Domingos Machado, catedrático de português do Liceu Maranhense, que empossou a diretoria eleita; posteriormente foi dada a palavra ao orador oficial, o Sr. Astrolábio Caldas, o qual proferiu um discurso que foi muito aplaudido.

Encerrada a sessão pelo presidente eleito Henrique Guimarães, que leu um texto adequado ao ato, seguiu-se “animado sarau dançante, que se prolongou até a alta noite, reinando sempre franca animação, e intensa cordialidade” (EDITORIAL, 1913, p. 3).

O seu quadro social, é atualmente, o seguinte: honorários, Dr. Antonio Batista Barboza de Godois, Prof. Domingos Afonso Machado e Jose Nascimento de Moraes, Benemérito, Hercules Caldas; fundadores Lauro Lima, Astrolábio Caldas, Olimpio Lima, Raul Viana, Oscar Carvalho, João Palácio, Jose Ribamar de Padua Fortuna, Pedro Belo, Antonio Sodre; João Rodrigues, Clodomir Pinheiro Costa, Clovis Raiol, [...] Torres Rapozo, [...]. (EDITORIAL, 1913, p. 3).

Posteriormente, o Presidente nomeou: tesoureiro, a Astrolábio Caldas; redator, a José Fortuna, e a diretor do teatro, Raimundo Belo. Realizavam conferências, uma delas sobre “Os apuros de uma festa estudantal”, pelo sócio Astrolábio Caldas; a 2ª e 3ª “sobre o meu diário”, pelo sócio José Fortuna; a 4ª sobre “as conferências”, pelo poeta sócio Lauro Lima, e a 5ª sobre “o esquecimento”, pelo sócio Evandro Rocha (OS MEMBROS, 1913, p. 3). Observamos que os estudantes socializavam informações entre si e participavam das solenidades de ambas as Uniões ou Sociedades. Representando, cada um, a sua sociedade de origem, discursavam em solenidades de aberturas, proferiam conferências, todavia, depois de criadas, se desanimavam e faziam suspender as atividades:

Agora vou deixar-vos inteiramente conhecedores do motivo da pouca duração das sociedades, caso o leitor não esteja acostumado do movimento destas. Hoje funda-se aqui uma sociedade, convida-se uma meia dúzia de rapazes. Fazem-se reuniões, propõem-se novos sócios, determinam-se dia e hora para instalação, faz-se logo contribuição para instalação, trata-se da comissão para se encarregar dos festejos e do programa. Finalmente, é chegada a hora, da instalação. (AS SOCIEDADES, 1917, p. 85).

Organizavam os Salões, espalhavam os escudos das sociedades, destacavam a bandeira nacional ou inauguravam o retrato do patrono. Abriam a sessão, proferiam discursos e dançavam etc. Isto indica o cotidiano e como as sociedades organizavam as solenidades.

c) Circulação e Permuta dos Jornais Estudantis

Os jornais se comunicavam entre si, na medida em que permutavam os seus números com outras redações, publicando notas de boas-vindas, reconhecendo a circulação das folhas e, por último, chamando atenção dos leitores para a compra dos números. Há de se destacar que estas formas de fazer circular as publicações podem ser pensadas como táticas de apropriações em detrimento das imposições financeiras que os surpreendiam, como imprimir um quantitativo grande de tiragens e se manter por um período superior a um ano de existência.

As formas de circulação presentes no jornal O Brazil (1907) nos indica a comunicação realizada com A Revista Typographica, recebendo “[...] o primeiro número desta, que há bem poucos dias começou a circular nesta capital. Ao novo collega desejamos um illimitado numero de anos” e “Temos sobre a nossa meza de trabalhos os ns. 3, 4, 5 e 6 d’O Progresso, os quaes agradecemos aos seus dignos redactores” (DIVULGAÇÃO, 1907, p. 1). Notamos que era muito comum a comunicação entre jornais de outros estados e até mesmo com os internacionais. No Jornal O Estudante encontramos algumas permutas:

Os caros colegas: a cidade de São Paulo, o rubi, o alto-purus, o arrebol, o anapuru, a gazeta, o irará, o lírio, o carasinho, o reformador (revista), o condor, o norte, os simples, o itabuanense, o jornal baptista, os anaes (revista), a taca, a tesoura, a pátria, a vontade e a cultura alemã (revista). (PERMUTA, 1915, p. 2).

Além de receber visitas de outros lugares, eles, em seus tempos de férias, realizavam excursões com o fim de “abraçar os seus amáveis colegas, cujas visitas muito os agradece o estudante” (PERMUTA, 1915, p. 2).

No jornal O Progresso, observamos a acolhida dos jornais mais influentes no cenário da imprensa maranhense, como no caso da Pacotilha: “agradecemos as nossos colegas a pacotilha e a imprensa pelas maneiras delicadas com que fomos acolhidos, enviando-nos phrases animadoras que nos encorajam a prosseguirmos na tarefa que empreendemos, e estamos com maior enthusiasmo” (ACOLHIDA, 1908, p. 1). O jornal O Canhoto, por sua vez, adotava o sistema de permutas:

De Pernambuco, recebemos ‘O Despertar’, periódico que se publica na cidade de Palmares e ‘A Lanceta’ que incontestavelmente é uma das melhores folhas humorísticas do norte. Demasiadamente apreciamos a leitura desses colegas e com indizível satisfação permutaremos. Recebemos o n. 1 do ‘Labor’ orgam de alunos do colégio S. Francisco de Paula e recebemos a ‘União’, orgam hebdomadário da ‘União Caxeiral Caruarense’ de Pernambuco. Muito temos a agradecer as lisonjeiras referencias a nosso respeito. -Temos entre nossas permutas, 2 numeros do ‘O Popular’ que se publica na Parnahyba e obdece a sabia direção de Americo Ribeiro. (PERMUTA, 1912, n. 12, p. 2).

Além disso, as formas para persuadir os seus leitores e fazer circular os números seriam nas escritas de pequenos contos ou anedotas sobre situações cotidianas: “Pedro: o que tens João? João: estou aborrecidíssimo da vida. Pedro: sabes qual é o remédio para isto? João: não sei, não. Pedro: é a leitura do progresso. João: muito obrigado, muito obrigado e até logo que vou já comprar um número para distrahir-me.” (CARTA..., 1907, p. 1).

d) Críticas/Crônicas dos escritos estudantis

As crônicas produzidas pelos discentes discorriam desde a arte de escrever até os aspectos que envolviam a política e pessoas contrárias a suas produções. Os conteúdos das crônicas são pequenos textos com acontecimentos do cotidiano dos autores. As críticas aos que escreviam eram ferrenhas e publicavam as respostas em formato de crônicas:

Aconselho-te também que, quando escreveres, penses um pouco, deixes a produção para corrigir no dia seguinte, quando estiveres mais calmo, com as idéas mais aclaradas. Toma o meu conselho e verás quanta coiza retocarás, quantos disparates eliminarás. [...] Melhor seria que, caImo e refletido como o extinto papa, não desses a publicidade, com tanta precipitação, os tens artigos, pois com isso fazes um mal enorme: enfastias uma população inteira com os teus vomitórios. (CRÔNICAS, 1912, p. 2).

O aspecto mais relevante para eles seria uma boa escrita de acordo com a norma padrão da língua portuguesa, e não dispensavam nenhuma crítica quando observavam erros ortográficos: “os escritores, pouco inteligentes, não se deverão aproveitar dos tipógrafos, que tiverem de compor seus artigos, para distribuir a pontuação nos logares que julgarem competentes” (CRÔNICAS, 1912, p. 2). Estes aspectos eram requisitos mínimos para aqueles que perseguiam a carreira jornalística ou literária.

e) Aniversários/ Homenagens

Cumprimentavam os professores as professoras normalistas, os lentes do Liceu Maranhense, as pessoas influentes da sociedade maranhense, além de incentivar aqueles que escreviam juntos nas mesmas redações. Em relação às homenagens, por sua vez, os professores eram representantes de uma autoridade máxima aos estudantes, que necessitavam seguidores dos seus exemplos, para aqueles que almejavam postos na vida literária ou somente pelos exemplos de bons cidadãos.

Quadro 2 Aniversários nos Jornais Estudantis 

A INÚBIA O PROGRESSO O BRAZIL
“A 22 de setembro a gentil senhorita Nadina Assis, dileta filha do sr. José Semião de Assis chefe da sessão de Obras Graficas da Imprensa Official.

A 26 do mesmo, o professor Raimundo Lopes da Cunha, lente de Corografia e Historia do Brazil, do Liceu Maranhense.

A 5 de outubro, d. Analia Gulhermina da Costa, professora normalista.

A 12 do mesmo, o estudante Benedito Ferreira, tesoureiro da União Estudantil «Silvio Roméro».

A 13, a professora normalista, d. Zuleide Bogéa.

A 19, a professora normalista d. Romilda Freire.

A União Estudantal «Silvio Roméro», se faz representar, a todos, os quaes fazem parte do quadro social, exceto o primeiro e segundo.

Faz a 5 do corrente, o interessante menino Geraldo, filho do nosso amigo Odilon Melo.
«A Inubia» deseja-lhe felicidades”.
(ANIVERSÁRIOS, 1914, p. 3).
“Completa amanhã treze primaveras o nosso companheiro de redação Luiz Raimundo Correa de Faria. Podemos dizer que Luiz Faria, pela sua idade, é um menino inteligente, não só por ter iniciado a seguir a carreira jornalística e mesmo porque ainda não teve um menino no nosso estado que tivesse uma vocação brilhante, como a de Luiz Faria.

O nosso companheiro é pequeno no tamanho, mas é grande na inteligência, se dissemos assim porque contamos nas nossas fileiras com um combatente forte para enfrentar o analfabetismo.

Prossegue a tua carreira, amiguinho, que mais tarda verás o teu nome laureado como os dos nossos mestres: Edmundo Bittencourt, I. Xavier de Carvalho, José Barreto e outros.” (PRIMAVERAS, 1907, p. 2).
“Fazem annos n’esta semana:

Dia 21 - o Exmo. Sr. D. Francisco de Paula e Silva, illustrador do Bispo da nossa Diocese.

Dia 22 - O nosso amigo, Sr. Flavio Góes dos Santos, hábil empregado da Agencia Novo Lloyd Brasileiro.

- O jovem Raymundo Mattos applicado alumno do Lyceu Maranhense.

Congratulações.” (ANIVERSARIANTES,1907, p. 3).

Fonte: Elaborado pelos autores deste artigo.

Nessa perspectiva, o jornal O Excelsior destaca a figura de Antônio Lobo, autor do livro Os novos atenienses. Para eles, a figura de Lobo foi uma das mais marcantes na vida intelectual maranhense.

Através de suas publicações na Revista do Norte revelou-se escritor, publicando: A Carteira de um Neurastenico (romance); Pozitivismo e Microbios (estudo biolojico); A doutrina transformista e a variação microbiana (idem); Os novos atenienses (critica literária), e Pela rama (crônicas). (LOBO, 1914, p. 2).

A presença de Antônio Lobo no cotidiano dos jovens era importante, o professor participava das reuniões das sociedades literárias, incentivava na produção dos jornais e perpassava os ideais que influenciavam esses jovens no modo de pensar numa sociedade por meio da ordem e progresso. Literato participativo na vida da juventude que para eles “não deixava de se impor sempre como a figura mais completa da nossa vida mental” (LOBO, 1914, p. 2).

O jornal A Inubia destacou a figura do professor Silvio Romero: historiador, crítico, jurista, filósofo, professor, polemista e patrono da sociedade estudantil, e lhe prestou homenagem afirmando que era um exemplo de “Mestre guapissimo das nossas letras, [...] dos que recebem de braços abertos os moços que se armam cavalheiros, para a nova cruzada da cultura. Amigo da mocidade, sentiam-se bem a seu lado, despido das altas insígnias que lhe conferiram o talento e estudo.” (SILVIO..., 1914, p. 2).

Outro professor aclamado pelos alunos era Domingos Afonso Machado. Para eles era o mestre incansável e por isso manifestavam grande apreço. Realizaram uma solenidade em homenagem a seu natalício e o liceísta José Monteiro proferiu um discurso enaltecendo os méritos do educador maranhense: “temos no professor Machado um vivo espelho de saber e honestidade, cujas pegadas muito prazem aqueles que as seguem” (O CANHOTO, PROFESSOR..., 1914, p. 1). A Sociedade Estudantal Machado de Assis, que o tem como sócio honorário, enviou os seus cumprimentos desejando-lhe felicidades (EDITORIAL, 1915). O jornal O Canhoto lembrou da figura deste professor como “Quazi todo o Maranhão lhe é grato pelos grandes serviços a êle prestados, como rejente da cadeira de Portuguez no Liceu. [...] Entre estes, estamos nós que muito o queremos como mestre” (UMA HOMENAGEM, 1914, p. 2).

Jamais poderíamos desmentir esses louvores filhos da verdade e inspirados pela boa índole e talento essencialmente dele, pois os artistas da nossa tenda o tiveram por mestre. [...] Participamos outrora dessa imensa lejiao de almas que atravessa o vasto deserto da vida onde se defronta o oazis almejado a que chamamos a escola. E o nosso guardião, o luminoso guia dessa jornada, foi o professor Domingos Machado. (UMA HOMENAGEM, 1914, p. 2).

A homenagem ao Barão do Rio Branco, patrono desta Sociedade Estudantil, descrita n’O Canhoto: “prestaram com ufania e saudade as nossas homenagens humildes ao nosso querido patrono, ao colossal chanceler, ao diplomata sem rival, ao benemérito brasileiro, ao trabalhador da paz [...]” (UMA HOMENAGEM, 1914, p. 1).

Os estudantes Jozé de Ribamar Pereira, Francisco Teixeira Leite, Jozé Maria Fernandes, Nilo Monteiro, Reinaldo Cunha, João Rodrigues de Oliveira, Fernando de Moura Viana e Adalberto Serrão Branco, do Instituto Maranhense, convidaram a Sociedade Literária Barão do Rio Branco para os festejos em homenagem ao natalício do Dr. Oscar Duarte de Barros, diretor do Instituto Maranhense, “um dos mais acreditados estabelecimento de ensino, onde se ministra, com mestria a educação moderna” (UMA HOMENAGEM,1914, p. 2):

É este o programa organizado pela comissão: as 20 horas, uma conferência literária pelo Dr. Antonio Lopes, as 21, um concerto vocal e musical, onde tomará parte o exímio pianista Dr. Carlos Marques, o violoncelista acadêmico Eneas Costa, o aplaudido tenor Antônio Vivas e o esperançoso barítono amador Jozé do Ribamar Pereira. (UMA HOMENAGEM, 1914, p. 2).

Os discentes se agrupavam para prestar homenagens ao poeta maranhense Antônio Gonçalves Dias, que para eles representava “mais que um incentivo, é um exemplo, ou melhor, ainda, é um belíssimo refletor da nossa tão celebrada pujança intelectual” (GONÇALVES..., 1914, p. 2). Reuniu-se a seguinte comissão promotora dos festejos: presidente Djalma Fortuna, da Sociedade Literária Barão do Rio Branco; Acrizio Figueiredo, da União Estudantal Silvio Romero; e José Vieira, do Grêmio Estudantal Rui Barboza.

Até agora, sabe-se que as homenagens constam de uma passeata, a partir da praça João Lisboa, onde tomará parte o governador do estado; o corpo militar, o inspetor e oficiais da guarda nacional; liceu maranhense, escola modelo e demais estabelecimentos públicos estadoais de ensino; Instituto Roza Nina; colejio do Sagrado Coração de Maria; Escola de Aprendizes Artifices; Externato Rio Branco; Instituto Maranhense; Colejio de Nossa Senhora da Vitoria e Instituto Sotero dos Reis, as 16 horas, que se dirijira a Praça Goncalves Dias. (UMA HOMENAGEM, 1914, p. 2).

Posteriormente, em frente à estátua de Gonçalves Dias, o professor Antônio Lobo se fez ouvir; foi escolhido unanimemente para ser o orador oficial, tarefa que gentilmente aceitou. Falaram também: João Ribeiro, pela Sociedade Rio Branco; Jozé Perdigão, pela Silvio Romero; a Professora Zuleide Bojea, pelo quadro social feminino da Silvio Romero; o Professor Raimundo Lopes, pelo corpo docente do Instituto Maranhense; Jozé de Ribamar Pereira, pelos alunos do mesmo instituto; o liceísta Joze Pinheiro; e o aluno do Externato Rio Branco, Oswaldo Paraizo.

Segundo A Inúbia, “A festa de hoje, é resultado da confraternização das sociedades ‘Barão do Rio Branco’, ‘Ruy Barbosa’ e ‘Silvio Romero’ que encontraram apoio decidido e franco em sua Exc. O Sr. Dr. Herculano Parga, Governador do Estado” (GONÇALVES..., 1914, p. 2).

f) Contos estudantis

Os contos escritos pelos alunos ressaltavam as ideias que gostariam de compartilhar numa linguagem simples e presente no cotidiano. Apesar das histórias fictícias, os conteúdos tinham um fundo de interesse em persuadir o leitor ou implantar tal ideia. Por sua vez, n’O Canhoto, o conto que retrata a vida de Jaques, um rapaz sonhador de ideais socialistas que admirava a beleza dos campos vastos onde morava e sentia a falta de estabelecimentos fabris que lhe movimentasse a vida.

Desse modo, como forma de solucionar seus problemas, imaginava que se fosse rico construiria estabelecimentos de instrução, desenvolveria a indústria, impulsionaria, enfim, tudo referente ao engrandecimento daquela terra, porém era pobre e nada podia melhorar, ou seja, se questionava sobre “quando os homens compreenderam o que é a vida dos pobres, talvez isto melhore, mas em que tempo será?” (UMA HOMENAGEM, 1914, p. 2), debatendo-se sobre a importância do estudo, sobre necessidade de os pobres estudarem em prol do desenvolvimento do lugar onde ele vivia.

Essas pequenas histórias remontam aos desejos que os estudantes queriam propagar à população em geral, observando-se n’O Canhoto (1914), quando denuncia os males que o consumo de álcool causava na vida de um ser humano, e transformava o maior número de homens em brutos: “[...] tenho feito milhões de lares infelizes. Tenho transformado muitas vidas jovens e esperançozas em abjetos parazitas. - destruo o fraco, e faço o forte fraco. Eu sou o Alcool.” (A BEBIDA, 1914, p. 3).

A necessidade do desenvolvimento intelectual de acordo com a história sobre as escolas se une com a concepção desta última, na medida em que, para conseguir alcançar o ápice dos estudos, neste período eles acreditavam que a mente e o físico teriam que estar em harmonia, entrando os discursos sobre a higiene mental e física, civilidade e moralismo.

g) Moral, Civilidade e Nacionalismo

A moral, no contexto da Primeira República brasileira, adentra os domínios da cultura, da educação, da tradição e do cotidiano, sendo compreendida como um conjunto de regras que orientam o comportamento humano dentro de uma sociedade. O significado de moral, etimologicamente, deriva do latim morales, cujo significado é “relativo aos costumes”.

Nessa perspectiva, os alunos preservavam os preceitos em ordem com a moral, na medida em que debatiam acerca dos aspectos que os irritavam sobre o costume: “[...] com os rapazes que não seguem a moda; - com certas moças de fabricas que bem café na garrafa; - com os rapazes que não uzam collarinho postiço; - com os cachimbos dos velhos; - com as mercearias que levam abertas até depois de 9 horas da noite” (A MODA, 1907, p. 2).

Os bons costumes são argumentos muito utilizados na medida em que remetem ao cotidiano da família. O jornal O Progresso relatou o exemplo de um homem que lutou com grande afinco a fim de criar, educar, instruir e colocar seus filhos, e estes, depois de servidos, deram o desprezo. O jornal fez um alerta para o fato de que deviam os filhos deveriam tratar os pais com dignidade para que não fossem tão desconhecidos e ingratos (CARTA..., 1907, p. 1).

Os discursos de moral e civilidade perpassavam o de nacionalismo, pois não haveria progresso se não existissem cidadãos honestos seguidores das regras e amadores da pátria, “porque o homem que observa os postulados da consciência moral e cívica cultiva o patriotismo” (A CIVILIDADE, 1915, p. 3).

A identidade nacional estava sendo construída. Impulsionados pela recente implantada República e pela influência dos fatores externos, os estudantes discutiam sobre os acontecimentos históricos imbuídos de sentimentos patrióticos; ou seja, pensavam que “se houvesse uma guerra do Brasil com outro paiz, [se] alistariam para defender [a] pátria” (A CIVILIDADE, 1915, p. 3).

Para eles, o patriotismo não podia ser demonstrado somente na guerra, mas cumprindo os seus deveres, observando as leis que regiam o país. De igual modo, aquele que estudava para engrandecer a pátria seria um patriota, contribuindo para a manutenção da ordem e para a continuidade do progresso.

A política delineava os discursos que permeavam o Brasil republicano e a população em geral acompanhava os fatos sem distinção de classes sociais, já que as discussões entre “[...] duas cozinheiras, uma conhecida por Anastácia e a outra por Almerinda” (A CIVILIDADE, 1915, p. 3), que comentavam sobre política e sobre as passeatas, foram despedidas pela patroa quando descobriu tais conversas nas dependências da casa (A CIVILIDADE, 1915). As emergências estavam postas na sociedade, a ideia de progresso ganhava espaço para as conversas corriqueiras, as fraudes políticas dos coronéis corriam as cozinhas e faziam circular naturalmente; ou seja, “não [havia] em um recanto brasileiro, atualmente, quem não falle constantemente em politica, ficando este um tanto semelhante a guerra que todos discutem” (A CIVILIDADE, 1915, p. 4).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os discursos estudantis possibilitaram a compreensão do cotidiano escolar do Liceu Maranhense, na medida em que denunciaram em suas produções as dificuldades que este estabelecimento de ensino passou durante a Primeira República. No mapeamento dos jornais estudantis liceístas, nota-se que os autores (os alunos, auxiliados ou não pelos seus professores) necessitavam denunciar problemáticas de ordem organizacional e material que prejudicavam o ensino secundário do Liceu Maranhense, como também discutiam a este respeito se posicionando por meio da escrita e da publicação de forma enérgica, ao criticarem as medidas instauradas pelo governo e denunciarem as carências de toda ordem no que se referia ao ensino público, entre elas a falta de professores e a precária formação, a intransigência nos exames e a escassez de livros para acompanharem as disciplinas ou para se prepararem para as avaliações, a falta de manutenção nos espaços de ensino e a insuficiência de ambientes adequados.

A imprensa como objeto de pesquisa é colocada aqui nos movimentos de objetos da nova história cultural, que pelo alargamento das fontes permite considerar os documentos não oficiais como materiais possíveis de conceder-lhes um novo olhar, se compreendidos os acontecimentos em um dado tempo e espaço.

Nesse caso, os jornais estudantis, fonte do nosso objeto de investigação, foram analisados partindo da perspectiva dos alunos liceístas que representavam uma posição social alta, ao mesmo tempo em que defendiam ideais igualitários. Portanto, nos dedicamos em mapear e categorizar esses discursos, organizando as notícias de seus diferentes títulos e verificando as necessidades dos autores dos registros na imprensa estudantil, que retrataram desde seus pontos de vista os assuntos do cotidiano escolar secundário.

Cabe ressaltar a dificuldade que esses órgãos tiveram em fazer imprimir e circular os jornais pela cidade de São Luís, uma vez que, de cada título estudado, somente encontramos um ou dois números, o que aponta para a falta de recursos, o não incentivo dos demais periódicos, o quantitativo mínimo de assinantes, aspectos que conspiraram para o desfecho destas iniciativas escolares. Além do desânimo latente no início republicano como consequência da insatisfação política e econômica que deixara os jovens desgostosos, vítimas do regime coronelista instaurado na sociedade maranhense.

Todavia, os discursos estudantis representavam os propósitos dos alunos acerca das melhorias e das reformas do ensino secundário maranhense. Incentivados pelo movimento reformista educacional do período, os liceístas, por sua vez, discorriam sobre a necessidade de uma efetivação destas medidas, atribuindo a responsabilidade ao Estado por garantir o conhecimento para todos. Por isso, denunciavam, partindo das suas próprias experiências escolares, as imposições do governo, tendo como respostas as suas táticas de apropriação, que indicavam, via denuncia e crítica por meio da imprensa, uma nova forma de se conceber o ensino público de ensino.

Para os estudantes, a responsabilização do Estado com o ensino público garantiria o desenvolvimento da nação, a construção de um homem nacionalista e cívico que contribuiria com o país, seja pelo ensino primário e profissional, seja em postos de trabalho subalternos, mas necessários à nação. E que pelo ensino secundário deveriam os mais prestigiados pôr a ordem e o progresso e contribuir intelectualmente para “descurar o mal do analfabetismo” (ABERTURA, 1914, p. 1).

Devemos pontuar que os estudantes liceístas se posicionavam conforme as ideias que os influenciavam; neste caso, denunciavam as necessidades de âmbito escolar do liceu maranhense, entre elas a falta de material e de professores. Portanto, o pensamento estudantil via imprensa expressa o descontentamento com as medidas empregadas, com a forma de exposição e implantação das reformas, com as exigências sobre os exames, anunciando-se que a teoria estava em descontinuidade com a prática e que os modos de se pronunciarem os estudantes poriam em dúvida as ações reguladoras do Estado.

Dessa forma, os estudantes, como atores de um processo educacional, adentram o espaço das discussões sobre as reformas, os exames; e os professores, na medida em que denunciaram suas necessidades cotidianas escolares em periódicos de natureza singular. Pela análise das fontes, percebemos um paradoxo: por um lado, o quantitativo de regulamentos e de leis estaduais proferidas no período em foco, e, por outro, o número de reclamações dos estudantes sobre “a falta” nos estabelecimentos de ensino.

A carência do ensino público foi a marca que caracterizou sua existência, independentemente das múltiplas legislações que acabaram por desarticular e desorientar os níveis de ensino, e nos discursos dos jovens liceístas encontramos suas angustias, denúncias e posicionamentos em razão da instrução pública sem incentivo e preocupação por parte do poder público.

Nesse sentido, acreditamos que este trabalho dará oportunidade para que outros pesquisadores acrescentem novos elementos e posicionamentos, dando continuidade a este estudo focalizado sob a perspectiva dos estudantes, pois não se esgotam as possibilidades de inclusão de novas fontes, novas ideias e novas problemáticas, fundamentos particulares que dependerão da escolha de cada investigador, bem como da delimitação do tempo/espaço que se configura de modos diferenciados.

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1O Conciliador começou a circular manuscrito em 15 de abril de 1821 (MARQUES, 1878).

2Antonio Nóvoa, Pierre Caspard, Pénélope Caspard, Ana Laura Godinho Lima, Cynthia Pereira de Sousa, Julieta B. Ramos Desaulniers, Lúcio Kreutz, Paula Perin Vicentini e Rosario S. Genta Lugli (BASTOS; CATANI, 2002).

Recebido: 10 de Maio de 2020; Aceito: 25 de Agosto de 2020

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