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vol.31 número67“ES COMPLICADO, ESTÁN MUY CERRADOS”: ENSEÑANZA Y CULTURA INDÍGENA EN ESCUELASLA CUESTIÓN INDIGENISTA EN LA PERSPECTIVA DE DIFERENTES ESCRITORES DE FINALES DEL SIGLO XIX Y PRINCIPIOS DEL XX: PROYECTOS EDUCATIVOS Y CIVILIZATORIOS (1893-1910) índice de autoresíndice de materiabúsqueda de artículos
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Revista da FAEEBA: Educação e Contemporaneidade

versión impresa ISSN 0104-7043versión On-line ISSN 2358-0194

Revista da FAEEBA: Educação e Contemporaneidade vol.31 no.67 Salvador jul./set 2022  Epub 13-Ene-2023

https://doi.org/10.21879/faeeba2358-0194.2022.v31.n67.p127-142 

Artigos

MITOS E EDUCAÇÃO NA ANCESTRALIDADE TENTEHAR

MYTHS AND EDUCATION IN THE TENTEHAR ANCESTRALITY

MITOS Y EDUCACIÓN EN LA ANCESTRALIDAD TENTEHAR

Maria José Ribeiro de Sá*  Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Maranhão
http://orcid.org/0000-0001-9128-1466

Maria Conceição de Almeida**  Universidade Federal do Rio Grande do Norte
http://orcid.org/0000-0003-1850-5288

*Doutora em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Pedagoga do Departamento de Ensino Superior e Tecnologia do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Maranhão (IFMA) - Campus Imperatriz. Imperatriz. Maranhão, Brasil. E-mail: maria.sa@ifma.edu.br

**Doutora em Ciências Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP). Professora Titular do Departamento de Fundamentos e Políticas da Educação do Centro de Educação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN). Natal, Rio Grande do Norte, Brasil. E-mail: calmeida17@hotmail.com


RESUMO

O artigo trata de pedagogias da educação do povo Tentehar. O estudo foi desenvolvido junto aos Tentehar que vivem no território indígena Arariboia. Com método etnográfico, para os registros usamos entrevistas semiestruturadas, diálogos abertos, fotografias, anotações em caderno de campo. Os interlocutores do estudo foram intelectuais da tradição, anciãos, lideranças indígenas e professores da aldeia Juçaral. Na articulação entre narrativas míticas e a memória biocultural dos participantes, rememoramos princípios e valores que orientam o pensamento e a pedagogia no mundo indígena. O enredo foi produzido por homens e mulheres que compartilharam conosco saberes, modos de vida e problemas do seu cotidiano. Na cultura ancestral Tentehar, narrativas míticas alimentam o processo formativo entre este povo, por seu intermédio são transmitidos valores que educam na sua cosmologia. A repetição oral é um dos métodos para se aprender e ensinar nessa cultura. Entre os resultados obtidos destacamos que suas narrativas irrigam a memória individual e coletiva, alimentam pedagogias da resistência, do bem viver e do cuidado com a vida. Seus principais rituais tradicionais, da menina moça, dos rapazes e a festa do mel, os mantêm conectados com seus valores primordiais; alguns destes são: o respeito ao conhecimento dos anciãos e seus ensinamentos; o convívio respeitoso e equilibrado com a biodiversidade; agradecer e reverenciar a existência pela dádiva da vida.

Palavras-chave: educação indígena; narrativas; memória; povo Tentehar

ABSTRACT

The article deals with pedagogies of education of the Tentehar people. The study was developed with the tentehar people who live in the indigenous territory of Arariboia. Using the ethnographic method, we used semi-structured interviews, open dialogues, photographs, and notes in a field notebook. The interlocutors of the study went tradition intellectuals, elders, indigenous leaders, and teachers from the Juçaral village. In the articulation between mythical narratives and the participants’ biocultural memory, we recalled principles and values that guide thought and pedagogy in the indigenous world. The plot was produced by men and women who shared with us their knowledge, ways of life, and daily problems. In the ancestral culture, mythical narratives feed the formative process among these people, through which values that educate in their cosmology are transmitted. Oral repetition is one of the methods for learning and teaching in this culture. Among the results obtained, we highlight that their narratives irrigate individual and collective memory, feed pedagogies of resistance, of the good life, and of the care for life. Their main traditional rituals, of the young girl, of the boys, and the honey festival, keep them connected with their primordial values, some of which are: the respect for the knowledge of the elders and their teachings; the respectful and balanced coexistence with the diversity; thanking and revering existence for the gift of life.

Keywords: indigenous education; narratives; memory; Tentehar people

RESUMEN

El artículo trata de las pedagogías de la educación del pueblo tentehar. El estudio se desarrolló con el pueblo tentehar que vive en el territorio indígena de Arariboia. Con el método etnográfico, utilizamos entrevistas semiestructuradas, diálogos abiertos, fotografías y notas en un cuaderno de campo. Los interlocutores del estudio fueron intelectuales de la tradición, ancianos, líderes indígenas y profesores de la aldea de Juçaral. En la articulación entre las narrativas míticas y la memoria biocultural de los participantes recordamos principios y valores que guían el pensamiento y la pedagogía en el mundo indígena. La trama fue producida por hombres y mujeres que compartieron con nosotros sus conocimientos, formas de vida y problemas cotidianos. En la cultura ancestral, las narraciones míticas alimentan el proceso formativo entre estos pueblos, a través del cual se transmiten valores que educan en su cosmología. La repetición oral es uno de los métodos de aprendizaje y enseñanza en esta cultura. Entre los resultados obtenidos destacamos que sus narrativas irrigan la memoria individual y colectiva, alimentan pedagogías de la resistencia, del buen vivir y del cuidado de la vida. Sus principales rituales tradicionales, de la jovencita, de los chicos y la fiesta de la miel, los mantienen conectados con sus valores primordiales, algunos de los cuales son: el respeto por el conocimiento de los mayores y sus enseñanzas; la convivencia respetuosa y equilibrada con la biodiversidad; el agradecimiento y la reverencia a la existencia por el don de la vida.

Palabras clave: educación indígena; narrativas; memoria; pueblo Tentehar

Introdução

Entre diferentes povos indígenas, narrativas míticas são transmitidas milenarmente intergerações, pela sabedoria oral para comunicar valores, saberes, filosofia, ou seja, suas cosmovisões. O povo Tentehar (Guajajara) do estado do Maranhão, Brasil, também ensina e educa suas crianças e jovens, narrando histórias de um tempo pretérito, em que todos se comunicavam entre si, gente e bicho!, ou ainda, de quando gente virava bicho, bicho falava como gente, expressões ouvidas comumente todas as vezes que uma pessoa Tentehar vai narrar suas histórias ancestrais.

Neste artigo identificaremos em histórias e vivências de culturas indígenas, sobretudo da Tentehar, pedagogias, modos pensar e educar, que vêm umidificando o pensamento humano e a vida. Conhecer reservas de complexidade que o planeta apresenta enquanto estratégia para regenerar a civilização humana é uma das ideias do pensador Edgar Morin (2011), no documento intitulado “Para um pensamento do Sul”.

Em razão da ameaça de extinção da diversidade de vidas do planeta, diferentes autores consideram seminal encontrarmos outros alfabetos, conhecer uma profusão de ideias impressas em uma diversidade de formas de educar, a saber: Vitor Toledo e Barrera-Bassols (2015), Lévi-Strauss (2012a), Davi Kopenawa e Bruce Albert (2015), Daniel Munduruku (2010), Almeida (2018), Ailton Krenak (2020).

O artigo foi elaborado a partir de vivências junto aos Tentehar da Terra Indígena Arariboia, zona rural do município de Amarante do Maranhão. E integra ideias defendidas em uma tese de doutorado (SÁ, 2021). A necessidade de “reabilitar emergências de humanidades esquecidas” (ALMEIDA, 2018, p. 12) nos fez adentrar no imaginário Tentehar e apresentar um “referencial cultural que tem perdurado durante milênios e que tem dado certo como método pedagógico”, salienta o educador indígena Daniel Munduruku (2010, p. 11).

Fazendo uso do método etnográfico, o trabalho intercambia vivências em rituais, atividades de extensão na escola local, pesquisas e outras colaborações ocorridas nos últimos sete anos, registradas por meio de entrevistas semiestruturadas, diálogos abertos, fotografias, anotações em caderno de campo. Os interlocutores do estudo foram intelectuais da tradição, anciãs e anciãos, lideranças indígenas e professores da aldeia Juçaral. Com estas vozes polifônicas buscamos privilegiar um diálogo simétrico ou paritário entre autores consagrados no universo científico e sábios ou “intelectuais da tradição” (ALMEIDA, 2017) reconhecidos pelos Tentehar da Terra Indígena Arariboia.1

Em narrativas do cotidiano do povo Tentehar da terra indígena Arariboia identificamos pedagogias do bem viver, da resistência, do cuidado com a vida, da cura e da celebração da diversidade florestal. Elas contêm em si próprias o âmago de certa cosmologia do pensamento daquela cultura, um conjunto de princípios que iluminam uma forma de viver, ser e atuar no mundo. São pedagogias que nos ensinam a cuidar de todos os seres e agradecer pela diversidade existente, conforme veremos.

Histórias da tradição e memória indígena

O imaginário dos povos indígenas é povoado por uma constelação de narrativas culturais. As histórias alimentam seu sistema de crenças, práticas culturais, o saber-fazer do cotidiano, enfim, a educação da sua gente.

De acordo com o mitólogo Joseph Campbell (1990, p. 10), a capacidade de recordar, lembrar, iniciou provavelmente quando nossos primeiros ancestrais contaram histórias uns aos outros, “a respeito dos animais que eles matavam para comer, e a respeito do mundo sobrenatural”. Articulava-se uma memória cognitiva, quando diferentes povos ao redor do mundo passaram a usar a técnica de contar histórias para ensinar aos mais novos saberes aprendidos.

Com as migrações dos primeiros povos, as histórias eram matizadas. Contadas de boca em boca, ganharam ou perderam personagens, acréscimos de situações, outros cenários, e absorveram a visão de mundo e valores do contador de histórias. Ao falar sobre as diferentes versões dos mitos encontrados entre os povos indígenas sul e norte-americanos, Lévi-Strauss (2011, p. 7) reconhece que o mito “[...] é por natureza uma tradução, origina-se de outro mito proveniente de uma população vizinha, mas estrangeira, ou num mito anterior de mesma população”. Nessa direção, segundo Campbell (1990), essas histórias provêm de todas as culturas com temas atemporais, e a inflexão cabe a cada cultura.

Com o passar dos milênios, mesmo como todas as transformações ocorridas, os povos indígenas não cortaram os vínculos com suas raízes históricas mais profundas. A narração de histórias, cantadas ou contadas, é usada para registrar e transmitir conhecimentos acumulados. Isso porque, segundo o educador indígena Daniel Munduruku (2017), a memória é o que há de mais cultivado entre os diferentes povos indígenas. É ela que norteia a construção do ser pessoal e cria uma relação de resistência que vai além do desejo individual. Assim, ao alimentar a memória individual e coletiva através dos tempos, os povos indígenas mantêm o vínculo com o passado, compreendem como viver o presente e se conectam permanentemente com a sua tradição.

Para conhecer, inovar, diversificar e manter a diversidade biocultural, as inteligências indígenas configuram uma memória arquetípica com um importante método educativo. Alimentando uma memória individual e coletiva pela linguagem oral, os povos indígenas criaram coleções de narrativas míticas (TOLEDO; BARRERA-BASSOLS, 2015; MUNDURUKU, 2010).

Afinal, “contar histórias para exercitar a memória é um instrumento efetivo, bastante necessário para que as crianças possam guardar em si os elementos da tradição” (MUNDURUKU, 2010, p. 33).

Os guardiões da memória ancestral: os velhos

Se há algo que parece ser invariante para 305 sociedades indígenas brasileiras e falantes de 274 línguas, é a posição e a importância que os velhos ocupam nessas culturas. Nessas sociedades, anciãos são a referência para validar conhecimentos, uma espécie de biblioteca viva que guarda o patrimônio de saberes e valores construídos ao longo dos séculos. “Porque os mais velhos que são a nossa biblioteca, eles têm muitas histórias”, relatou o professor Toinho Guajajara (SÁ, 2014, p. 191). Os mais antigos já sentiram a passagem do tempo pelos seus corpos, e assim trazem consigo para o presente esse passado memorial. Eles são os guardiões da memória (MUNDURUKU, 2012).

Na cultura Tentehar, a constelação de narrativas culturais geralmente é contada por velhas, sábios, cantores, avós, pajés que as mantêm gravadas em suas memórias. Um cantor Tentehar, por exemplo, tem gravado em sua memória um vasto repertório de cantos dos rituais da festa da menina-moça, dos rapazes, do mel. Por isso, pode ser considerado verdadeiro homem-memória (SÁ, 2014).

Enquanto colecionadores de histórias culturais, os velhos são fundamentais para manter viva a tradição. Porque trazem consigo a generatividade, são os possuidores do fio que “[...] nos remete ao princípio de tudo, às origens” (MUNDURUKU, 2017, p. 116). Por isso, os compreendemos não apenas enquanto guardiões de uma tradição cultural em específico, mas também como guardiões da memória da espécie, pois guardam consigo histórias que ensinam sobre a diversidade cultural e biológica (TOLEDO; BARRERA-BASSOLS, 2015).

Na cultura Tentehar, sábios cantores mantêm arquivados na memória o mito de origem que conta a história do ritual. Enquanto condutores dos rituais, cantores e cantoras da tradição guardam na memória a narrativa, a letra da música, os sons, as encenações do ritual. De acordo com o cantor da tradição Toinho Guajajara, para cada narrativa mítica há um canto, ou seja, uma história é sempre cantada ao final. Há um arquivo histórico dos Tentehar registrado não em livros, mas em mentes. O acervo mnemônico expressa o conhecimento desse povo sobre diferentes espécies vegetais, animais, paisagens, práticas de agricultura e manejo do ecossistema. Existe uma valorosa memória biocultural nos cantos Tentehar (SÁ, 2021).

No ritual da menina-moça, por exemplo, o cumprimento dos tabus alimentares, das etapas rituais pela moça e sua família, tem, entre muitos sentidos, o de deixar todos com saúde para se chegar à velhice. De acordo com Sá (2021), morrer velho é algo buscado entre os Tentehar; cumprir os resguardos das fases da vida, seus rituais e ensinamentos, é o meio para a longevidade.

Na visão Yanomami, morrer velho é também um privilégio bastante desejado, segundo o relato do pajé Yanomami Davi Kopenawa: “queremos nos extinguir só quando tivermos nos tornados velhos de cabeça branca, já encolhidos, descarnados e cegos.” (KOPENAWA; ALBERT, 2015, p. 251).

Visão semelhante também é compartilhada pelo povo Munduruku, pois a educação recebida em cantos e danças exprime o pedido para morrerem velhos. Então, educam para “[...] que uma criança seja plenamente criança, pois ela pode não alcançar a velhice, mas pedimos o tempo todo para morrer velhos, para ver as gerações crescendo e se reproduzindo” (MUNDURUKU, 2010, p. 30).

Nas filosofias indígenas tornar-se velho é uma espécie de distinção, poder alcançar a reconhecida posição do sábio, uma referência àquele que fala com propriedade. Por isso, para que uma afirmação sobre a cultura ancestral seja considerada verídica, é necessário fazer uma consulta prévia aos velhos para confirmar a informação.

Na cultura Tentehar as avós ocupam uma posição de destaque na transmissão da educação tradicional, representam o saber cuidar da vida ou do seu milagre. Essas matriarcas iniciam e transmitem às suas filhas, netas e bisnetas o legado matrilinear aprendido com suas mães, avós, tias ancestrais, repetindo, ano a ano, gestos e movimentos do ritual da menina-moça ou, ainda, narrando histórias (SÁ, 2021).

A escritora indígena Eliana Potiguara (2014), no seu livro O pássaro encantado, reconhece que todos os povos indígenas do Brasil têm uma relação sagrada com os avós e antepassados, pois são os responsáveis por transmitir suas culturas, tradições e línguas.

Mitos e pedagogia da resistência

No entanto, chegar à velhice não é algo fácil, a vida impõe muitos desafios, lutas constantes com seres animados e inanimados que povoam o imaginário e a vida do Tentehar. O mito de origem dos Tentehar narra sobre as aventuras de seus heróis culturais Maíra, seus filhos Maíra-yr e Mikura-yr e sua Mãe, e nos conta sobre os desafios do viver. A história narra a trajetória incerta de uma mulher grávida de gêmeos, morta com os filhos ainda na barriga.

Em uma floresta, na saga, os dois órfãos conseguem vencer vários desafios em busca do pai que os abandonou. As desordens e incertezas naturais fazem com que Maíra-Yr e Mikura-Yr se metamorfoseiem em toda a história para enfrentar e ultrapassar as dificuldades do percurso vivido. Afinal, a vida humana, como imagem da aventura cosmológica, é feita de desordens e acasos, uma aventura submetida a desafios ecológicos, acidentes, conflitos entre espécies (MORIN, 2012).

As dificuldades também aparecem na narrativa do menino Tentehar que se perde da mãe:

No tempo em que os animais sabiam falar, um menino que seguia o caminho da roça, acompanhando a mãe, distraiu-se a flechar passarinhos. Perseguindo um bacurau, distanciou-se do caminho, perdendo o turno. Foi dar a um lugar que, subitamente cercado pelas águas de um rio, o deixou ilhado. Muito triste, o menino não via jeito de atravessar toda aquela água. Nisto, passou um bacurau a quem o menino que o levasse para outra banda, onde havia terra firme. O bacurau não se importou e disse que ele era muito pesado. Avistando um pica-pau, o mesmo renovou o apelo, “deixa-me ir em tuas costas”. O pica-pau pousou e disse ao menino que montasse em suas costas. A muito custo levantou voo, porém, desistiu. Não aguentava o peso. Wiraí, assim se chamava o menino, procurou dessa vez o auxílio de um paturi (pequeno pássaro). O paturi foi incapaz de levantá-lo do solo. (WAGLEY: GALVÃO, 1961, p. 145).

Nesse pequeno trecho da narrativa que conta as aventuras do menino Wiraí, um jovem Tentehar, ele se perde na mata por se distrair flechando passarinhos à sua volta. Depois de um longo tempo perdido na mata, Wiraí conseguiu retornar ao seio de sua família. É importante notar que todas as narrativas míticas geralmente surgem de algum sofrimento terrível por que passa um grupo ou pessoa, ou seja, elas derivam de momentos vívidos de aflição. E, por mais paradoxal que seja, acrescenta Clarissa Pinkola Estés (1998, p. 10-11), essas “histórias que brotam do sofrimento profundo podem fornecer as curas mais poderosas para os males passados, presentes e futuros”. Para essa autora são histórias medicinais, pois servem para “[...] ensinar, para corrigir erros, para iluminar, auxiliar a transformação, curar ferimentos, recriar a memória. Seu principal objetivo consiste em instruir e embelezar a vida da alma e do mundo” (ESTÉS, 1998, p. 10).

No livro Meu vô Apolinário: um mergulho no rio da (minha) memória, o escritor Daniel Munduruku (2005) narra uma dessas experiências medicinais que viveu com seu avô, um sábio pajé Munduruku. Narrando histórias sobre a sabedoria de um rio ou ainda lhe proporcionando observar o canto dos pássaros embaixo de uma mangueira, seu avô lhe ensinou lições que funcionaram como um bálsamo para cicatrizar na sua alma as feridas abertas pelo preconceito vivido na escola por ser um indígena. Com essas histórias o jovem indígena pode recriar a memória da sua ancestralidade e ter orgulho das suas raízes, narra esse autor.

Para Joseph Campbell (1990, p. 45), a função pedagógica do mito é nos ensinar “[...] como viver uma vida humana sob qualquer circunstância”. Por isso, na visão desse autor, todas as pessoas deviam tentar se relacionar com essa pedagogia, que nas culturas indígenas caracterizamos como pedagogia da resistência. Nas narrativas míticas ou históricas dos Tentehar é notória tal pedagogia. Nelas a metamorfose é um fenômeno constante e fundamental para continuarem a existir. Tal transformação é sempre irrigada pela afetividade e a reverência aos seus antepassados.

Os ensinamentos de pedagogias da resistência começam cedo, e se concretizam em diferentes momentos dos rituais de iniciação Tentehar: a festa da menina-moça e a dos rapazes. Em tais celebrações que marcam ciclos e metamorfoses, ou seja, o fim e o início de uma nova fase de vida, as pessoas são incentivadas a “amadurecer sua personalidade e a aperfeiçoar suas qualidades” (UBBIALI, 1998, p. 38). Nas pedagogias das cosmovisões indígenas se cuida da casa física e casa psíquica habitada por todos nós, não há separação entre corpo, mente e espírito, ressalta Daniel Munduruku (2010).

Em um trecho da história de surgimento do ritual da menina-moça Tentehar, bem como em vários momentos dessa celebração, é possível perceber a importância da formação psíquica na sua educação tradicional. Em resumo, a história conta sobre a morte da menina-moça que tem seu sangue sugado após se relacionar com o espírito sedutor das águas (Ywán), como segue: “[...] sem que a menina soubesse que aquele rapaz era uma cobra que se transformava num homem, que chupava todo o seu sangue, a menina começou a adoecer e ficar bastante amarelada e passou muito mal e morreu [...]”. (MARANHÃO, 2010, p. 28-29).

Segundo Clarissa Pinkola Estés (1998), no mundo inteiro há muitas histórias antigas que giram em torno da ideia de uma ironia amarga, porém instrutiva. Embora algumas tratem de ironias banais, outras lidam com questões de vida e morte. As histórias funcionam como uma espécie de farol, pois iluminam a vida. Nessa direção, estão ligadas à pedagogia do indivíduo, pois fornecem pistas que servem de guia (CAMPBELL, 2015).

Na trágica história da menina-moça que morre sem sangue, o sábio Maíra busca demonstrar que nem tudo que parece ser, é, como aparenta à primeira vista. A ingenuidade da menina não lhe deu condições de reconhecer o perigo, a ponto de não perceber que se tratava de Ywán, o espírito sedutor das águas, um predador natural da psique feminina que consome toda sua vida. Ao comentar sobre a mulher ingênua como presa, citando o conto do barba-azul, Estés (2018, p. 63) diz:

No início de nossas vidas, nosso ponto de vista feminino é muito ingênuo, o que quer dizer que nossa compreensão emocional do que está oculto é muito tênue. [...] Não ser iniciada nos detalhes dessas questões significa estar num estágio da nossa vida em que somos propensas a perceber apenas o que está às claras.

Nas memórias dos Tentehar continuam vivas muitas histórias de sofrimentos vivenciados por seus ancestrais para terem chegado até aqui. A narrativa que deu origem à festa dos rapazes, entre vários temas, aborda a morte e traição entre dois irmãos, e instrui para superação dos medos e dificuldades. Por isso, é preciso cantar alto todos os dias, como faz um gavião, o pássaro homenageado na festa dos rapazes, como é possível ver no trecho final da narrativa, descrita a seguir:

De manhãzinha ele começou a cantar e insistiu em que todos o acompanhassem nas cantigas. Somente os pais o fizeram. Ao pôr do sol a casa ergueu-se do chão, levando-os em direção à aldeia dos gaviões, lá no céu. A maloca foi inundada por uma enchente e os Tenetehara que se tinham recusado a cantar foram transformados em passarinhos para serem caçados pelos gaviões. (WAGLEY; GALVÃO, 1961 p. 151).

E todos os dias eles cantam: wyrawaxo azo uhapukaz terez nuàm uwyrawaxo azo uhapukaz terez nuàm ahe hehehe (2x) uhapukaz terez nà, uhapukaz terez nà ahe hehehe (3x) (DUARTE et al., 2018, p. 26).

O gavião é o pássaro dono da festa dos rapazes. A mudança de voz indica que o menino poderá participar da sua celebração de passagem. Na mata, os gaviões são excelentes caçadores, dotados de uma voz pujante, habilidades muito valorizadas nessa cultura. No dia da festa os rapazes são pintados com urucum e jenipapo e, formando uma camisa, as penugens de gavião adornam seus peitos e cabeças.

A iniciação dos rapazes para pegar o maracá acontece na sua festa, os iniciados ou as pessoas autorizadas pelo mestre podem usar o instrumento nos rituais. Depois desta celebração o rapaz poderá assumir responsabilidades, se tornar uma liderança, guerreiro, cantor, pajé, e casar. A narrativa “O Tentehar e a filha do gavião” (Tentehar Wiraru Imemyr Kury) traz a memória da preparação dos rapazes, ressalta a importância do saber cantar aprendido na festa do mel para esta tradição, entre outras questões.

Entre os Yanomami, o gavião é reverenciado por motivos semelhantes. De acordo com Davi Kopenawa, os grandes homens, que têm no peito a imagem do gavião kãokãoma, sabem proferir exortações longas e potentes dos discursos hereamuru que acontecem no reahu, seu principal ritual. Por isso ele pediu para seu sogro, um grande xamã Yanomami, lhe enviar o espírito do gavião (KOPENAWA; ALBERT, 2015).

Então, a pedagogia da resistência Tentehar, narrada em suas histórias tradicionais e ensinada nos seus rituais, os educam para cuidar da casa física e espiritual. Assim, os prepara para vivenciar as dificuldades existentes em seu caminho, se sobressairem e ultrapassá-las, como fez o gavião da narrativa. Talvez por isso os Tentehar não desistam fácil! A história desse povo demonstra que nos momentos difíceis de extermínio da sua população eles conseguiram dar a volta por cima. Atualmente, se reconhecem como um povo guerreiro e são a maior nação indígena do estado do Maranhão.

O apreço à oralidade e o seu poder de negociação com os não indígenas têm sido, desde o primeiro contato, há mais de quatrocentos anos, um dos seus diferenciais para continuar a existir.

Memória e oralidade entre os Tentehar

Por isso, para os Tentehar a oratória é condição fundamental para se tornar um chefe ou cacique. O fascínio e o respeito que o discurso exerce sobre esse povo são notórios; em qualquer reunião para se debater algum assunto é dado o direito a todos os presentes falarem e serem ouvidos, quando um fala todos escutam. Um discurso só tem hora para começar, muitas das vezes uma só pessoa pode falar até mais de uma hora, por isso as reuniões são sempre muito longas.

Uma boa memória, voz e saber ouvir constituem atributos indispensáveis para cantar um ritual, e vir a ser um cantor tradicional nessa cultura, relatou o cantor Antonio Guajajara: “Tem que ter memória boa. E ter voz também. São vários cânticos. [...] quando os velhos tão cantando, [...] o aluno acompanha, espera eles cantar.” (SÁ, 2014, p. 112).

De acordo com Daniel Munduruku (2010, p. 33), a oralidade “[...] é importante porque passa ser instrumento para que a tradição continue viva”. A repetição entre os Tentehar parece os fazer lembrar as reponsabilidades assumidas perante os valores do povo, as lutas dos antepassados, os direitos conquistados, são discursos sempre presentes em suas reuniões. Para Ailton Krenak (2020), conhecer as diferentes manobras que seus antepassados fizeram, alimentam sua resistência.

No cântico, as estrofes e refrões se repetem sucessivas vezes até o mestre de cantoria decidir encerrá-lo. Nas culturas que têm por base a oralidade, a repetição é fundamental para a construção de uma memória ao mesmo tempo individual e coletiva. A capacidade de recordar é fundamental para a espécie humana. Somos a única espécie capaz de remontar recordações das relações estabelecidas com a natureza, nossa base de sustentação e referencial de existência ao longo da história (TOLEDO; BARRERA-BASSOLS, 2015).

Pedagogias da diversidade: o bem viver indígena

Em meio a uma floresta de histórias ancestrais, os Tentehar aprenderam a dar vida à diversidade em seus quintais, rituais, ou seja, na vida cotidiana.

É importante reconhecer que muito dos conhecimentos dos quais nos valemos atualmente foram sendo gestados por meio de inúmeras experimentações e aprendizagens das populações humanas ao longo dos séculos. Homens e mulheres que consolidaram, transformaram e acresceram conhecimentos que chegaram até nós como um presente, ressalta a professora Maria da Conceição Almeida (2012).

Nas histórias plantadas nos quintais de uma família tradicional indígena podemos aprender com inteligências muito antigas que manejam a biodiversidade silvestre e domesticada com base em uma pedagogia do cuidado com a vida para “satisfazer as suas necessidades e aspirações sem diminuir as chances das gerações futuras” (CAPRA, 2006, p. 13).

Por meio de narrativas míticas acessamos a memória biocultural da espécie, podemos conhecer valores, sabedorias e cosmologias que nos revelam “[...] as relações que a humanidade tem estabelecido com a natureza, sua base de sustentação e referencial de sua existência ao longo da história” (TOLEDO; BARRERA-BASSOLS, 2015, p. 23). Inclusive, muitos povos originários “contam histórias de um tempo antes do tempo” ressalta o pensador indígena Ailton Krenak (2020, p. 70).

Da interação com a natureza podem ser encontrados valores e saberes nos terrenos alagadiços das residências situadas ao lado esquerdo da aldeia Juçaral, cujo fundos encontram o rio Buriticupu. Lá avistamos palmeiras nativas, como a juçara (açaí), o buriti, o guarumã, o inajá, a bacaba e a buritirana. Palmeiras, árvores de médio e grande porte, cipós, uma rica biodiversidade que a artesã de cestarias Maria Parazawu preserva em seu quintal. Lá presenciei a técnica artesanal de extração do óleo de andiroba. Em espaços da tradição indígena, os Tentehar aprenderam “[...] a realizar uma produção não especializada, explorando o princípio da diversidade de recursos e das práticas produtivas” (TOLEDO; BARRERA-BASSOLS, 2015, p. 73).

Entrançando palhas de várias palmeiras, Maria Parazawu dá vida a cestarias e objetos diversos como pacará, abanos, esteiras, peneiras, panacu, quibano, tápiti e balaio. Sua mãe lhe ensinou a fazer uma simples oferenda a Tupàn, Deus do trovão na mitologia Tupi-Guarani. A simpatia lhe rendeu a habilidade para tecer cestarias. “Pois a natureza é feita de maneira a ser mais vantajosa para a ação e o pensamento agir como se uma equivalência que satisfaz o sentimento estético correspondesse também a uma realidade objetiva.” (LÉVI-STRAUSS, 2012b, p. 32).

Nos quintais da aldeia Juçaral também encontramos várias plantas medicinais, tais como: o frondoso e cheiroso cumaru (Dipteryx odorata); a quina (Cinchona officinalis); a andiroba (Carapa guianensis); a copaíba (Copaifera langsdorffii); o jaborandi (Pilocarpus microphyllus); o urucum (Bixa orellana); e a maconha (Canabis sativa).

A resina da almesca (ihik) ou almecega (Protium heptaphyllum), por exemplo, é utilizada para grudar as penugens de gavião no peito de rapazes e moças em seus rituais de passagem. Na sua medicina tradicional é indicada para dores de cabeça. A resina defumada em um pedaço de algodão ou pano afasta os maus espíritos, as doenças, protege a casa e reverencia os antepassados. O incenso da planta também é usado pelo pajé para purificar o ambiente, e para conexão espiritual. Entre os Pataxó, a almesca possibilita entrar em contato com seus ancestrais para tomar decisões acertadas (PATAXÓ, 2012; SÁ, 2014; ZANNONI, 1999).

Ao descrever sobre o caráter científico do conhecimento indígena, Lévi-Strauss (2012b, p. 31) reconhece que

[...] para transformar grãos ou raízes tóxicas em alimentos ou ainda utilizar essa toxicidade para a caça, a guerra ou o ritual, não duvidemos de que foi necessária uma atitude de espírito verdadeiramente científico, uma curiosidade assídua e sempre alerta, uma vontade de conhecer pelo prazer de conhecer.

Um vasto e minucioso inventário na classificação de espécies vegetais e animais de diferentes povos primitivos demonstra que elas são conhecidas não porque são úteis, mas são consideradas úteis ou interessantes porque são primeiro conhecidas, conclui Lévi-Strauss (2012b) em O pensamento selvagem.

A composição da biodiversidade da qual os saberes da tradição fazem uso em seus quintais expressa o tom heterogêneo dos cheiros, cores, sabores e curas. Na sua vasta extensão podemos encontrar flores, plantas medicinais, plantas mágicas, fruteiras, diferentes sementes usadas para produção de adornos corporais, além da criação de animais domésticos e silvestres. Os usos múltiplos de um ecossistema foi possível graças à capacidade da espécie humana em se adaptar às peculiaridades de cada habitat, tirar proveito das particularidades e das singularidades do entorno local (TOLEDO; BARRERA-BASSOLS, 2015).

Um mosaico de culturas, agricultura, caça, pesca, extração florestal, artesanato, favorece o aproveitamento máximo dos produtos que cada estação oferece ao longo do ciclo anual.

Nesse corpo múltiplo, a agricultura é uma das principais fontes de alimentos das famílias extensas da aldeia Juçaral. Na roça, os membros de uma família extensa, pai e mãe, filhos, filhas, genros e noras trabalham coletivamente, rateando a produção entre si. No seio familiar, o trabalho é dividido de acordo com sexo e idade, por isso a família se vale do conhecimento acumulado por cada pessoa. A produção da farinha de mandioca promove o encontro entre três ou mais gerações de um mesmo grupo familiar compartilhando saberes entre si. As crianças em volta observam e aprendem. É da farinha de mandioca imersa na água que se produz o chibé, um dos seus alimentos tradicionais. As diferentes gerações ensinam e aprendem saberes e técnicas, enquanto alimentam ao mesmo tempo a memória individual e coletiva.

Nas suas raízes míticas o desenvolvimento da agricultura está associado ao cultivo da mandioca. Parece ter sido a curiosidade, a dúvida de uma jovem mulher, que possibilitou aos Tentehar o desenvolvimento de tal prática, ampliando o cardápio de opções para sua subsistência. Em três narrativas provenientes de fontes diferentes, com algumas variações, a história é contada mais ou menos assim:

Quando Maíra andava neste mundo, os Tentehar não precisavam ir à roça. O machado e o facão trabalhavam por si mesmos. Sem que ninguém os levassem. As varas de mandiocas caminhavam para os roçados. Era plantar num dia e colher no outro.

[…]

Maíra mandava a mulher buscar mandioca plantada na véspera. A mulher encontrava muita mandioca que trazia para casa e preparava mingau. Quando a companheira caiu doente, Maíra arranjou outra mais nova. Mandou que fosse buscar a mandioca plantada na véspera, como sempre tinha feito. Mas a jovem mulher duvidou de que estivesse crescida, o que fez Maíra, zangada, falar: agora você vai esperar todo inverno (estação chuvosa) até a mandioca, arroz, milho, batata e feijão crescer. (WAGLEY; GALVÃO, 1961, p. 136).

O trabalho para o sustento diário é sintonizado com os ritmos naturais, pois combinam de forma articulada e cíclica as práticas da agricultura, da caça, da pesca e da coleta, um sistema ecológico complexo que integra roça -mata-rio-igarapé-quintal (LOUREIRO, 1992). “Os sistemas de cultivo incluem uma relação simbiótica entre solo, água, plantas e animais domésticos.” (SHIVA, 2003, p. 56).

Diz Edgar Morin (2015, p. 70) que “[...] quanto mais um ecossistema é complexo, mais ele é rico em diversidade, mas ele é flexível, mas contém o impreciso, o incerto [...]”. De acordo com Toledo e Barrera-Bassols (2015, p. 67), as agriculturas indígenas são sistemas de alta complexidade, já que suas principais características “são a diversidade de culturas, o uso bastante reduzido de insumos externos, a predominância do trabalho manual e o uso de tecnologias adaptadas in-situ voltadas para a conservação dos recursos locais”.

Em razão das suas práticas pedagógicas tradicionais, os povos indígenas, em muitos casos, vivem em territórios com níveis elevados de biodiversidade. Dessa forma, ocupam uma porção dos ecossistemas menos perturbados do planeta, como florestas tropicais e boreais, as montanhas, as savanas, tundras e desertos, e ainda grandes áreas ribeirinhas do mundo, incluindo manguezais e recifes de corais. A título de exemplo, os povos indígenas reúnem juntos 60% de todas as florestas tropicais do mundo (DURING, 1993 apud TOLEDO; BARRERA-BASSOLS, 2015).

A aurora e o crepúsculo marcam não só a quietude diária na aldeia, mas também o início e o fim de um ritual, as canções encenadas. O dia vai passando com a força do presente, sem qualquer preocupação com o porvir. Em frente às casas, uma tábua estendida acima de dois pequenos troncos é um lugar de encontros, das pessoas se sentarem para conversar e descansar depois de um dia de trabalho na roça calculado na medida de garantir o sustento.

Numa aldeia Tentehar da terra indígena Arariboia ainda é possível facilmente contemplar o nascer e o pôr do sol, assim como contar as estrelas, ver o “caminho de a anta beber água no céu” (a nossa via láctea), e outras constelações que é possível identificar em noites frias da estação seca maranhense. Nessas culturas, os animais do ecossistema local são protagonistas celestes. Os pontinhos brilhantes no céu contornam as formas das constelações do jabuti, da ema, da onça, do tamanduá, por exemplo.

O ritmo da vida na aldeia ainda acompanha os ciclos naturais. Viver o presente significa acompanhar os ciclos da natureza vivendo um dia de cada vez, sem pressa. Viver o agora é produzir o necessário para a existência do dia a dia. Os povos indígenas não costumam amarrar o tempo presente ao futuro, como fazemos nós ocidentais, lembra Daniel Munduruku (2010). Segundo esse autor, “para o indígena o tempo é circular, holístico, de modo que vez ou outra os acontecimentos se encontram sem, no entanto, se chocarem. O passado e o presente ganham dimensões semelhantes e se autorreforçam mutuamente” (MUNDURUKU, 2012, p. 70).

A conservação dos conhecimentos bioculturais aprendidos é um dos valores caros da educação ancestral dos povos indígenas. Tal perspectiva também tem a ver com um sentimento de fraternidade entre todos os seres, uma pedagogia que integra homem e cosmos. Afinal,

[...] o indígena se sente como pertencente à natureza, como uma espécie entre outras [...]. Ao pensar assim, o indígena compreende que sua participação na grande teia da vida, é basicamente, fortalecê-la para que todos os seres vivos possam usufruir das dádivas que ela oferece. Dessa maneira, [...] acreditam que estão contribuindo para manter o ‘céu suspenso’ e que são partícipes na cocriação dos cosmos, em parceria direta com todos os outros viventes. (MUNDURUKU, 2017, p. 53).

Essa sensibilidade e preocupação também é a base da sabedoria que educa na pedagogia do povo Okanagan da América do Norte. Segundo a indígena Jeannette Armstrong (2006, p. 41), seu povo reconhece que “a terra sustenta todas as formas de vida e seu esgotamento tem que ser evitado para que ela possa manter-se saudável e capaz de prover o sustento de uma geração após a outra”.

Uma pedagogia do bem viver é uma filosofia presente nas cosmologias indígenas, com base na lembrança da sua ancestralidade, no equilíbrio, na harmonia e na convivência entre os seres. Esse modo de viver refere-se à “vida em pequena escala, sustentável e equilibrada como meio necessário para garantir uma vida digna para todos e a própria sobrevivência da espécie humana e do planeta” (TURINO, 2016, p. 15).

O El buen vivir (sumak kawsay), termo de origem kíchwa, correspondente a suma qamanã (aymara) e nhandereko (guarani) (ACOSTA, 2016) e diz respeito ao “[...] reconhecimento del derecho universal de las personas a vivir em um ambiente sano y ecologicamente equilibrado que garantisse la sostentabilidad.” No Brasil a tradução da expressão é bem viver (AGUIRRE, 2011, p. 28).

Baseados em redes culturais de reciprocidade, os povos indígenas ensinam uma sabedoria de uso múltiplo e manejo dos recursos locais. Manter e enriquecer a diversidade biocultural parece ser seu horizonte coletivo (TOLEDO; BARRERA-BASSOLS, 2015).

Rituais da diversidade biocultural

Na tessitura cultural Tentehar, toda a diversidade encontrada no território do Arariboia está entre os principais motivos para celebrar a existência em seus rituais. Em narrativas míticas da festa do mel e dos irmãos Mayra-yr, por exemplo, diferentes animais e plantas compõem o repertório conforme descrição a seguir:

Aruwê, caçador tentehar, buscava na mata uma espera, onde a caça fosse proveitosa. Encontrou uma faveira com muitas flores, que pelas araras aí pousadas lhe pareceu um bom local. Construiu uma tocaia sobre um dos galhos e foi tão feliz que nesse primeiro dia matou muitas araras. Entretanto, ainda não descera da árvore quando percebeu a aproximação de onças. Escondido, observou que elas vinham a essa árvore colher mel. Com cabaças dependuradas ao pescoço para juntar o mel, elas espremiam a flor para juntar o mel, pois tinham mão de gente. Somente após as onças se retirarem é que Aruwê desceu da árvore e voltou maloca. No dia seguinte, retornando à faveira, Aruwê matou outras araras, porém, como na véspera, cuidou para que as onças não o percebessem [...] (WAGLEY; GALVÃO, 1961, p. 148).2

Passados uns anos já são dois jovens, Maíra-yr e Mykura-yr, o primeiro com poderes especiais, o segundo como coadjuvante desajeitado. Vão no mato, Maíra-yr pega uma flor, envolve-a na mão, sopra e a transforma no corrupião, outra no xexéu assim nos demais pássaros canoros. Zary lhes adverte para não irem adiante das capoeiras, pois há uma ave faladora por lá. Eles vão e escutam o jacu cantar e contar a história deles, da morte de sua mãe nas garras das onças. Mykura-yr chora muito, Maíra-yr menos, e resolvem se vingar [...] (GOMES, 2002, p. 54).

No trecho da primeira história, o irmão vai caçar araras para ornamentar o seu cocar. Na combinação de cores contidas nas penas de uma arara, por exemplo, se destaca a matiz azul celeste com nuances violeta de sua longa cauda, dispostas em filas nos capacetes ou cocás que os homens usam. No centro do cocar, duas penas maiores fixadas pelo seu lado vermelho realçam não só a beleza do adorno, mais toda simbologia contida. A arara é um dos pássaros homenageados no ritual. A indumentária e os cantos do ritual parecem refletir a emoção sentida com a beleza e admiração originada no espetáculo da natureza, pois “sentir” é aisthèstikos, o sentido original do termo estética (MORIN, 2012).

O fascínio ou a admiração diante das habilidades de aves e animais alimentam a poesia das canções dos rituais Tentehar. Nas narrativas de Maíra-Yr e Mikura-Yr, o jacu é reconhecido como ave faladora, pois é quem conta a verdade para os gêmeos sobre a morte da mãe; pássaros canoros como o papagaio, corrupião e xexéu são chamados de passeadores pelos Tentehar, e são considerados importantes por anunciarem muitas notícias (ZANNONI, 1999). Assim, as indumentárias e as melodias cantadas, a musicalidade, vêm dos sons da própria natureza.

Os cantos da madrugada do ritual da menina-moça homenageiam muitos pássaros encontrados no seu ecossistema, entre alguns estão: zapi’izu (xexéu); terepuwir (corrupião); azuruhu, azuruxo, azuru’i (espécies de papagaios); ánákázu (curica); piripipi; warizu (papagaio amarelo); arar’ete (arara de peito amarelo); ararun (arara azul escuro); arar kariné (ararinha); arar kág (arara vermelha); tukánuhu (tucano de peito branco); tukánzu (tucano de peito amarelo); tukáni (tucano do peito listrado); ywname (pássaro encontrado no cerrado e mata atlântica); warataimir (pássaro que imita todos os pássaros); zawxi (jabuti3); tururizu (lambu tona), conforme descrito por Sá (2021).

As espécies de gavião urutaw da mata virgem, zawato, urutawi são cantados de madrugada logo antes da chamada da menina-moça. Logo após se canta wirahaw (plumas de gavião) em referência aos enfeites brancos usados pela manhã pela menina-moça. Quando já amanheceu o dia, cantam os pássaros zapuhu (recongo) e wiriri (andorinha). Assim, para Sá (2021, p. 140), “um ritual pode ser considerado uma grande aula da biodiversidade local”.

As penas e plumas enfeitam os adornos que cobrem os corpos e cabeças de meninos e meninas em seus rituais. No ritual da menina-moça

As coroas com três tiras de aproximadamente 4 cm são cobertas com a plumagem branca do peito do gavião, adornadas com pequenos arranjos de penas de arara nas cores laranja, vermelha e verde, simetricamente dispostos em alguns pontos da cauda. Sobre o rosto, a coroa pode ser coberta com penas amarelas ou alaranjadas dos pássaros tucano e xexéu, com penas vermelhas do corrupião ou ainda com as penas na cor azul anil, lembrando as cores de uma espécie de uirapuru. No peito e cume de suas cabeças foram novamente fixadas plumas de gavião. (SÁ, 2021, p. 146).

Não só as aves fazem parte de um ritual, mas espécies vegetais da flora cuidam do corpo e do espírito no cotidiano do Tentehar. O jenipapo é talvez o mais importante de todos, pois está presente desde o primeiro mês de vida, no primeiro ritual da infância, aos nove meses de idade, e acompanhará ao longo de toda a vida. Usado na forma de uma tintura de cor preto- azulada impressa no corpo, o fruto é colhido ainda verde e passa por um processo químico natural para chegar a essa tonalidade. O jenipapo funciona como uma espécie de cobertura protetora para o corpo, como nos relatou o mestre de cantorias José Maria Paulino Guajajara (SÁ, 2014).

Na cosmovisão Tentehar, logo após a sua menarca, a menina-moça ficará encantada, ou seja, encontra-se extremamente vulnerável à ação de espíritos. Por isso, necessita de proteção. Desde então, a família dispensará cuidados especiais a fim de garantir para a nova mulher uma vida saudável e longeva. Por isso, a família da menina-moça providencia a colheita de jenipapos para produção de uma tintura que cobrirá todo o seu corpo. A cobertura do corpo da menina com pinturas específicas dependerá de cada momento ou fase do ritual.

Seja num ritual, na casa de farinha ou no roçado, entre os Tentehar a educação acontece pelo compartilhamento de saberes com pessoas em diferentes fases da vida, crianças, jovens, adultos e velhos presentes num mesmo espaço. Essa educação circular é percebida, sobretudo na organização de um ritual, no qual cada membro da família possui uma tarefa para o todo acontecer. Um dos momentos mais emblemáticos, que demonstram essa comunhão ou partilhar de experiências, é o encerramento dos seus rituais.

Aprendendo com pedagogias das tradições indígenas

Nos rituais Tentehar todos se juntam para comer ou beber, ou seja, na festa do moqueado, na festa do mel ou ainda no ritual de mesada, como o próprio nome indica, o desfecho das celebrações acontece com a distribuição de alimentos entre todas as pessoas. O espírito de partilha, de celebrar e provar da mesma comida, forma a consciência de que são parte de uma coletividade. Afinal, na experiência dos rituais a pessoa vai percebendo o seu pertencimento a uma comunidade, adquire uma visão particular de mundo que o coloca no coração do seu povo (MUNDURUKU, 2019).

O ensinar, aprender e sentir coletivo faz parte das pedagogias indígenas. Para o filósofo Daniel Munduruku (2019), o espírito comunista é intrínseco às filosofias indígenas. Atestam esse diferencial os sistemas políticos indígenas autônomos e os rituais coletivos. No ritual reahu dos Yanomami, por exemplo, existe um sistema de trocas intercomunitário motivados pelos sentimentos de generosidade e amizade, conhecido como o “caminho das pessoas generosas”. Ao recepcionar em sua aldeia pessoas desconhecidas para o ritual reahu, os Yanomami trocam ou dão aos visitantes todos os objetos desejados por estes. E, segundo Davi Kopenawa (KOPENAWA; ALBERT, 2015, p. 414), dizem assim: “Leve estas mercadorias e sejamos amigos! [...] leve-as [...] e mais tarde, não deixe de dá-las por sua vez aos que vierem visitar sua casa.”

Amizades são construídas, consolidadas durante o ritual. Para essa filosofia, os bens materiais não existem para serem trancados ou vendidos, mas trocados ou doados. Na filosofia Yanomami as pessoas generosas e amigas são reconhecidas como inteligentes e valentes. A generosidade é sinal de bravura e coragem, os grandes guerreiros são pessoas generosas. “Nós, habitantes da floresta, só gostamos de lembrar dos homens generosos. Por isso, temos poucos bens e estamos satisfeitos assim”, disse Davi Kopenawa (KOPENAWA; ALBERT, 2015, p. 420).

As premissas de uma vida sem apego à posse material se concretizam no ritual reahu. Além de ser uma grande festa intercomunitária de aliança política, é também um rito funerário. Logo depois da morte da pessoa Yanomami, bens patrimoniais e corpo são queimados e transformados em cinzas do esquecimento. A sabedoria Yanomami compreende que o sopro da vida dos humanos é muito curto. A pessoa generosa dissemina felicidade, e será lembrada após sua morte enquanto tal.

Tanto na cosmologia Yanomami quanto na Krenak ou na Tentehar, a perspectiva humana não é a referência para filiação existencial. Seguindo as pegadas deixadas por seus ancestrais, é preferível aprender a partir do diálogo com o movimento dos astros celestes, o ritmo dos rios e dos ventos, o temperamento das montanhas, o canto dos pássaros, gozar da sombra de uma árvore e dos seus frutos, explica Krenak (2020). Há uma pedagogia do cuidado com a vida, sentimento de fraternidade, parceria e responsabilidade entre animais e humanos (ALMEDA; SEVERO, 2016, p. 84).

Na compreensão de Ailton Krenak (2020), a humanidade e sua técnica têm deixado marcas profundas no planeta, exterminando diferentes espécies. Nossa abstração civilizatória vem suprimindo a diversidade e negando a pluralidade das formas de existências. Escolhemos o caminho do nosso total desligamento com o organismo da Terra, pois passamos a pensar que a Terra é uma coisa e a humanidade é outra. No entanto, “tudo é natureza. O cosmo é natureza. Tudo o que eu consigo pensar é natureza”, indaga Krenak (2020, p. 83).

Considerações finais

De fato, as culturas indígenas não perderam o hábito de se recolher, de saber ouvir a ordem do dia, os sons do universo, aprender com os sonhos, com as histórias e memórias de seus ancestrais, por isso repetem a cada ano os mesmos rituais. Afinal, um ritual é um momento significativo de parada, de ouvir e contar histórias, pois como diz Clarisse Pinkola Èstes (2018, p. 33): “Contar ou ouvir histórias deriva da energia de uma altíssima coluna de seres humanos interligados através do tempo e do espaço, sofisticadamente trajados com farrapos, mantos ou com a nudez da sua época, e repletos a ponto de transbordarem de vida ainda sendo vivida”. Que possamos aprender com as sabedorias indígenas...

A cultura Tentehar, como tantas outras originárias brasileiras, são um exemplo claro de que é possível viver de forma diferente daquilo que a civilização ocidental escolheu para si enquanto modelo hegemônico. Além do mais, as culturas indígenas demonstram uma forma mais equilibrada, generosa e sustentável de viver.

Nessa direção, as pedagogias do povo Tentehar nos ensinam sobre o bem viver indígena. As histórias contadas e ou cantadas são usadas para constituir uma memória individual e coletiva, assim não esquecem valores primordiais. Nos seus quintais e roçados, fazem o uso múltiplo e o manejo equilibrado dos recursos naturais, e dessa forma mantêm e enriquecem a diversidade biocultural. Seus rituais são momentos de paradas que os fazem perceber e aprender que a natureza é cíclica. Por isso, são momentos de ensinar e aprender a cuidar, agradecer e celebrar a dádiva da vida, mesmo diante de todas as dificuldades para existir.

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1O texto decorre da convivência de uma das autoras com o povo indígena Tentehar (Guajajara) da aldeia Juçaral, no Maranhão, autorizada por esta comunidade. Os estudos foram financiados pela Fundação de Amparo a Pesquisa do Maranhão (Fapema) e pelo Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).

2Texto adaptado do original por Maria José Ribeiro de Sá (2021).

3Na tradição ancestral Tentehar o jabuti é considerado um pássaro que não voa, me explicou o professor e cantor tradicional Toinho Guajajara (2020).

Recebido: 14 de Abril de 2022; Aceito: 15 de Julho de 2022

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