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Revista da FAEEBA: Educação e Contemporaneidade

versión impresa ISSN 0104-7043versión On-line ISSN 2358-0194

Revista da FAEEBA: Educação e Contemporaneidade vol.31 no.68 Salvador oct./dic 2022  Epub 13-Ene-2023

 

Apresentação

APRESENTAÇÃO

Renata Junqueira de Souza*  Universidade Estadual Paulisa
http://orcid.org/0000-0003-2227-2544

Rosemary Lapa de Oliveira**  Universidade do Estado da Bahia
http://orcid.org/0000-0003-1165-8265

*Doutora em Letras pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho. Livre-docente da Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho. Presidente Prudente, São Paulo. E-mail: recellij@gmail.com

**Doutora e pós-doutora em Educação. Professora Titular da Universidade do Estado da Bahia. Salvador-BA. E-mail: rosy.lapa@gmail.com


Sabemos que nas sociedades de tradição oral os contadores de histórias fazem uso da palavra também em sua dimensão educativa, uma vez que reconhecem, na oralidade, o principal veículo de transmissão de saberes. Esses contadores têm consciência de que o sujeito já nasce imerso em saberes que lhe atravessam. Nas sociedades em que a escrita tem papel mais central que a oralidade, como a nossa, somos influenciados por uma oralidade secundária, na expressão de Walter Ong (1993), fortemente demarcada por suportes tecnológicos que difundem a voz e a imagem em dimensões diversas. Gislayne Matos (2012), associando a arte de contar histórias com a educação, na perspectiva da dimensão formativa, afirma que o desenvolvimento humano, seja ele razão, sentimento, corporeidade ou espiritualidade, se realiza através da arte de viver. Ela cita a expressão usada por Amadou Hampaté Bá (2010) “do berço ao sarcófago”, para expressar a ideia harmoniosa de “educação formativa”, que começa quando o indivíduo nasce e segue com ele até o final da vida.

A narrativa encena, dramatiza a relação expressa por Mikhail Bakhtin quando afirma que: “Eu sou na medida em que interajo com o outro. É o outro que dá a medida do que sou. A identidade se constrói nessa relação dinâmica com a alteridade.” (BAKHTIN, 2003, p. 15). Através dela, o sujeito é, ao mesmo tempo, projeção de si e do outro, porque nenhum discurso provém de um sujeito adâmico que, num gesto inaugural, emerge a cada vez que fala ou escreve, como fonte única do seu dizer. Segundo essa perspectiva, o conceito de subjetividade se desloca para um sujeito que se cinde porque é átomo, partícula de um corpo histórico-social no qual interage com outros discursos dos quais se apossa, ou diante dos quais se posiciona (ou é posicionado) para construir sua fala.

Essas ideias deram mote para o presente número temático1, que tem inspiração na contação de histórias, notadamente, em seu viés lúdico-pedagógico, no sentido de ampliar os dizeres proferidos na docência na perspectiva da formação continuada de sujeitos envolvidos na educação de criança, de jovens, de adultos ou de idosos em espaços etnoformativos diversos (MACEDO, 2013). Portanto, o principal objetivo é contribuir com as discussões levantadas em pesquisas relativas a esse objeto de estudo que apresentam interfaces com outras áreas, especificamente, a Arte e a Educação.

O dossiê é composto por 15 artigos apresentando pesquisas desenvolvidas na intercessão entre a tradição ancestral da contação de histórias e da docência como hoje a conhecemos, passando pela literatura oral e a oralidade e performance, uma vez que contar histórias é uma arte e um modo de ensinar e de aprender.

O artigo que inicia o dossiê é de autoria de Flavia Diniz Roldão, Anderson Francisco Vitorino e Ricardo Antunes de Sá e tem como título: Narrar histórias sob o pensar complexo: compreender o humano, incluir e religar saberes. Nele, os autores apresentam uma investigação teórico-bibliográfica em relação ao ato de contar histórias à luz do pensamento complexo, a partir de escritos selecionados de Edgar Morin. Os autores buscam construir uma compreensão de como a narração e a fruição de histórias podem ser trabalhadas na educação sob a perspectiva da inclusão. A investigação aponta que, segundo Morin, a literatura pode favorecer a compreensão do humano e sua multidimensionalidade. Sendo assim, desvela a religação entre a razão e a emoção; a dimensão subjetiva e a objetiva; o imaginário e o real; a linguagem lógica racional e a analógico-simbólica; os aspectos da singularidade e da universalidade humana; a dimensão individual e suas tensões com a sociedade. Propõe-se a literatura como um caminho de inclusão na educação.

O artigo seguinte traz três pesquisadoras da área: Luciene Souza Santos, Mary de Andrade Arapiraca e Luciana Maria Ávila Carvalho, as quais falam sobre A preparação do conto e do contador de histórias. O objetivo é refletir sobre a constituição do sujeito como contador de histórias, defendendo a ideia de que existe um portador de memórias em cada pessoa, que pode se revelar e se constituir em contador ou contadora de histórias, se dessa forma se descobrir. Tomando a Faculdade de Educação da Universidade Federal da Bahia (UFBA) como lócus da investigação, de inspiração etnográfica, e estudantes de Pedagogia como sujeitos da pesquisa. O estudo se desenvolveu seguindo uma combinação de procedimentos e de dispositivos de produção e coleta de dados e informações. Isso foi possível através da criação e da implementação de uma oficina de contação de histórias para os sujeitos da pesquisa. A discussão aqui posta é resultado do percurso de contação e de escuta de muitas histórias que nasceram a partir da questão norteadora desse estudo: que caminhos podem ser percorridos para a formação de sujeitos contadores de histórias? Tal questionamento foi respondido ou, por vezes, desdobrado em muitos outros. As reflexões que o estudo produziu, a partir da interação com os jovens estudantes, autorizam as autoras a apontar como resultado a seguinte afirmação: o contador de histórias aprende a contar a partir da rememoração das suas histórias fundantes - memória afetiva - contando muitas e muitas vezes. É assim que se forma na arte de contar.

O artigo subsequente é fruto de uma parceria entre Brasil e EUA, através dos pesquisadores: Isabela Delli Colli Zocolaro, Renata Junqueira de Souza e Jefferson A. Stevenson. Sob o título Plan and tell: experience with storytelling at CELLIJ e, considerando a relevância do contar e do ouvir histórias para a formação humana e leitora, os autores buscam mostrar a importância de se planejar as contações de histórias, pensando no texto, nas técnicas, nos gestos e nos elementos que serão utilizados na narrativa para que o ouvinte tenha uma experiência prazerosa com a história e a literatura, além de possibilitar leitura em voz alta, relacionando texto e imagem. Para isso, foram realizados estudos bibliográficos a partir de Busatto (2003), Sisto e Motoyama (2016), Silva (1986) e outros, e relatos de experiências ocorridas no Centro de Estudos em Leitura e Literatura Infantil e Juvenil (CELLIJ) da UNESP de Presidente Prudente, e na biblioteca da escola Wickliffe Progressive Community School, ambos espaços buscam meios de oferecer uma experiência humanizadora com o texto literário. Com os estudos e as experiências descritas, é possível concluir que essa prática milenar deve continuar fazendo parte da vivência das novas gerações.

No artigo Contação de história mediada pela comunicação alternativa no TEA: revisando estudos, Ana Aparecida de Oliveira Machado Barby, Paloma Aparecida Oliveira Ratuchne e Gabriela Christine Spinardi mostram resultado de investigação acerca da contação de histórias, utilizando a Comunicação Ampliada e Alternativa (CAA) como recurso pedagógico para estudantes no Transtorno do Espectro Autista (TEA) entre os anos de 2015 e 2021. A pesquisa foi de análise qualitativa, com revisão bibliográfica, através de estudos selecionados nas plataformas Google Acadêmico, CAPES e SciELO. Todos os estudos selecionados relataram resultados positivos na comunicação com crianças no TEA a partir do emprego da CAA na contação de histórias. Concluiu-se que o número de pesquisas sobre o tema é escasso e recente, e, quando são encontrados, grande parte se localiza na área da saúde, evidenciando a necessidade de maiores investimentos em metodologias alternativas de ensino para estudantes TEA e incentivo às produções acadêmicas na área educacional.

Já Maria Alice Gouvêa Campesato nos apresenta o artigo: Contação de histórias no tempo-atenção da aula: conversações com/ entre ancestralidades, no qual explora o lugar da contação de histórias no tempo-atenção da aula em época de hiperaceleração e de excessos. O estudo apresenta maneiras como a palavra pode ser tomada como força-potência (trans)formadora de mundos e de modos de existência. Para tal, estabelece aproximação entre práticas ocidentais muito antigas e as tradições africana e ameríndia desde a perspectiva da oralidade. O texto parte de uma arquegenealógica que investigou a aula da antiguidade aos dias atuais, além da investigação da relação entre palavra, voz e escuta nas tradições africanas e indígenas. Como material empírico, toma textos da tradição greco-romana e os textos A queda do Céu, de Kopenawa e Albert, e A tradição viva, de Hampâté Bâ. Como ferramental teórico-metodológico, utiliza-se da análise do discurso foucaultiana. Nesse sentido, apontou-se como conclusão que a contação de histórias, no espaço áulico, é uma possibilidade para provocar outras formas de existência e de fabricação de novas verdades.

Em Contação de histórias para, com e por crianças na escola da infância, Débora Cristina Sales da Cruz Vieira propõe a análise de performances narrativas de crianças pequenas produzidas na oficina lúdica Caixinha de guardar o tempo, realizada presencialmente em dezembro de 2021, em quatro instituições públicas de Educação Infantil localizadas em regiões periféricas do Distrito Federal. Estabeleceu-se um diálogo entre saberes da Teoria Histórico-Cultural, dos Estudos Sociais da Infância e dos Estudos da Performance como aporte teórico, para discutir a potência da contação de histórias por crianças pequenas na escola da infância em uma perspectiva de partilha dialógica. O percurso metodológico foi trilhado a partir da etnografia performativa com práticas artístico-pedagógicas de mediação de leitura e de contação de histórias, abrindo espaço e tempo para a criação e a materialização das performances narrativas das crianças pequenas, com a gravação em áudio, a transcrição e a produção da obra Crianças Narradoras. A autora destacou a compreensão das formas singulares como crianças pequenas criam e (re)criam, com autoria, as histórias narradas em contextos educativos, que se evidenciam como prática performativa de produção de culturas na infância.

Jaqueline Sousa Santos Pita e Rosemary Lapa de Oliveira assinam o artigo Contar Histórias no Atendimento Educacional Especializado: perspectivas contemporâneas, o qual tem como objetivo analisar os fundamentos da educação especial e AEE no âmbito da educação Inclusiva, a partir das contribuições contidas em marcos legais e de autores como Mazzotta (2011), Mantoan (2015), Diniz (2009), entre outros. Na perspectiva da Educação Especial e Inclusiva, a pesquisa ressalta possibilidades e contribuições no contexto escolar na contemporaneidade. Nesse sentido, a partir das discussões apresentadas, ratificam a importância de estudos a serem realizados no binômio educação inclusiva e Contação de histórias, oportunizando a ampliação de habilidades, ao suscitar a reflexão, a imaginação, a criticidade, o questionamento, a oralidade e a comunicação, além de proporcionar a interação, uma vez que as histórias tocam, indiscriminadamente, as pessoas, não importando suas especificidades, mas respeitando suas diferenças.

No artigo A Performance da contação de histórias: uma coreografia do pensamento a partir das infâncias, Thais Duarte e Cilene Canda apresentam a relação entre a contação de história e a educação básica compreendida em sua dimensão cosmoperceptiva e em referência aos princípios de sociedades de tradição oral. A performance se constitui como conceito e fio metodológico para entender acontecimentos do estado brincante ao contar histórias. A metodologia é revestida pelo campo epistemológico da afroperspectividade, assentado em saberes afrocentrados, concebendo, desse modo, a pesquisa como acontecimento que atravessa corpos, memórias e sentidos. No estudo, são recuperados fios de experiências de performances, para analisar a natureza híbrida e a potencialidade da contação de histórias. Assim, é dada à criança a voz de seus saberes uma vez que ela se torna atenta aos mistérios, pois se interessa pela magia dos contos e apresenta lições sobre a existência: viver entre a brincadeira e a narrativa, convite profundo a uma compreensão complexa sobre a oralidade que dá corpo à contação de histórias.

Em Comunidade Narrativa e performance: a formação de crianças contadoras de história, Elisa Maria Dalla-Bona, Selma Sockecki Leal e Adriana Vaz apresentam sua compreensão sobre como os recursos internos das crianças e da professora foram aflorados na experiência de aprender/ensinar o ofício de narrar. O artigo apresenta um estudo de caso centrado no curso Arte de Contar História, realizado em um Centro Municipal de Educação Cultural do Município de Araucária, estado do Paraná, Brasil. Foram selecionados quatro participantes: uma professora e três estudantes com idade entre 7 e 11 anos. Descrevem-se três vivências, rememorando as histórias que abordaram temas difíceis como a morte, a condição da mulher na sociedade e o racismo. As principais reflexões teóricas versam sobre: a instauração da performance lúdica; o processo simbiótico entre quem narra uma história e quem a escuta; o protagonismo da criança, que no exercício de contar e ouvir histórias constrói saberes, alimenta sua imaginação e desenvolve sua criatividade; e sobre os benefícios da horizontalidade da relação entre crianças e adultos, que passam a se constituir como autores mais conscientes das suas histórias de vida. Como resultado, a pesquisa evidenciou que as trocas de saberes entre professora e estudantes contadores de histórias contribuíram para a instauração da performance e a formação de uma comunidade narradora.

Educação Social e Contação de História como Aporte Didático-Metodológico é o texto apresentado por Danielle Rezera e Walson Lopes no qual discutem a contação de histórias como metodologia didática no processo formativo de crianças entre 6 e 12 anos de idade, que participaram de um programa de educação integral, sob a perspectiva da educação não formal e orientação formativa de educadores sociais. O objetivo foi discutir a relação construída, por meio de metodologias educativas de caráter crítico, que envolveram a oficina de teatro, realizada durante o período de 2015 a 2019. Uma das experiências formativas naquele período foi analisada com enfoque na metodologia qualitativa, posto que se levou em consideração um relato de experiência, que apresentava a importância da contação de histórias como ferramenta metodológica na superação das tensões sócio-históricas, assim como na construção da superação do senso comum, em sentido gramsciano, e práticas de sociabilidade mais cidadãs e críticas.

O texto que se segue tem como título Contribuições da Contação de Histórias em Libras para a Educação de Surdos e foi escrito por Lidiane Rodrigues Brito e Maria Clara Maciel de Araújo Ribeiro. O estudo discute as contribuições da contação de histórias em Libras para a educação de surdos no Ensino Fundamental. Para tanto, explora o potencial de desenvolvimento cognitivo, linguístico e cultural-identitário proporcionado pela contação de histórias, por meio do suporte da Linguística Aplicada e dos Estudos Surdos. Foram selecionados três vídeos de contadores disponíveis em canais do YouTube para análise, apresentando, ao fim, possibilidades didáticas para a sala de aula. Os resultados sugerem que ao imergirem em histórias contadas em língua de sinais, crianças surdas entram em contato com aspectos que permitem o desenvolvimento global, ainda que as intencionalidades, por parte do professor contador das histórias, não estejam postas.

Já no artigo “Vitória, vitória acabou a história!” Narrativas infantis em Podcasts, as autoras Letícia Águida Bento Ferreira e Lidnei Ventura apresentam resultados de uma pesquisa sobre a produção de podcasts por um grupo de crianças pequenas de uma unidade pública de educação infantil. A pesquisa aproxima os campos da narrativa, numa visão benjaminiana de intercâmbio de experiências, tecnologias digitais de produção de podcasts e educação infantil. Elas realizaram pesquisa qualitativa, de natureza narrativa, a partir da qual foram coletadas histórias de crianças para produção de Podcasts, os quais foram publicados em plataformas on-line. A coleta dos dados ocorreu por meio de observação participante, registro em diário de campo e em gravações de rodas de conversa e de contações em podcasts. O material foi interpretado de acordo com a hermenêutica fragmentária de Walter Benjamin. Fundamentadas nesse autor, as pesquisadoras tomam a criança como sujeito produtor de narrativas de experiências comunicáveis. Os resultados indicam que a produção de Podcasts, por crianças da educação infantil, amplia o espaço narrativo e torna-se um importante meio de potencializar suas experiências.

Literatura digital infantil, experiências sonoras e audição de histórias foi o artigo escrito por Edgar Roberto Kirchof e Giselly Lima de Moraes. Eles discutem tanto as potencialidades da voz na literatura infantil digital quanto ao que ela acrescenta à experiência de audição de histórias por crianças e por jovens. O estudo depreende uma análise sobre os modos da utilização da voz em sete narrativas digitais para crianças, como um recurso semiótico capaz de produzir efeitos de sentido tais como humor, afetividade, imersão, entre outros. O corpus de análise é composto de produções brasileiras e internacionais. A fundamentação teórica que sustenta as reflexões se baseia nos estudos de Walter Ong, Frédéric Barbier e Roger Chartier sobre oralidade, cultura escrita e cultura digital; nos estudos de Gunther Kress no que concerne à multimodalidade; e nos estudos de Paul Zumthor sobre a palavra poética. A análise revela que a literatura infantil digital recupera aspectos da tradição narrativa e promove rupturas nessa tradição ao converter a voz em recurso semiótico que compõe a obra literária, a qual se torna multimodal e interativa.

Simone Ribeiro, Danielle Fortuna e Jacqueline Lima apresentam o artigo Literatura africana e afro-brasileira na construção da identidade da criança na pré-escola. O objetivo foi discutir, de forma interdisciplinar - estabelecendo um diálogo, principalmente, entre educação e sociologia -, a questão da leitura de história e a contribuição da literatura africana e afro-brasileira na formação da identidade da criança negra na pré-escola. Para tanto, apresenta um relato de experiência desenvolvida em uma escola do Município de Duque de Caxias, na Baixada Fluminense, no estado do Rio de Janeiro, que atende crianças da pré-escola e do ensino fundamental. A prática pedagógica em questão inseriu a literatura africana e a afro-brasileira na rotina de uma turma de Educação Infantil, composta por 20 crianças na faixa dos cinco anos. O relato de experiência está ancorado, principalmente, nos pressupostos de Kabengele Munanga (2009) como base para a discussão teórica em torno da construção da identidade negra. Para o autor, o conceito de identidade no Brasil se refere a uma realidade complexa que envolve fatores distintos como: histórico, linguístico e psicológico. Os resultados alcançados foram significativos tanto na relação de respeito entre as crianças, quanto na mudança de comportamento de algumas delas em relação a si.

O artigo que fecha o dossiê tem por título Recontextualizar ciências por meio da contação de histórias: rede e hibridismo na educação e foi escrito por Luciane Backes, Catherine Bruguière, Vera Lucia Felicetti e Naidi Carmen Gabriel. O objetivo do estudo foi refletir sobre os aspectos mobilizados na ação de recontextualizar as ciências por meio da contação de histórias para a educação. As reflexões emergem do projeto de pesquisa Recontextualizar as Ciências e a Contação de Histórias para os processos de Ensino e de Aprendizagem da Educação Básica na Formação de Professores em Nível Internacional, envolvendo três grupos de pesquisas da França e do Brasil. No contexto educativo, a pesquisa, de natureza qualitativa, explorou diferentes situações na configuração do espaço de convivência entre participantes, conhecimentos e tecnologias. A recontextualização das ciências, por intermédio da contação de histórias, ocorreu na constituição de rede de conhecimento para a formação de professores e na educação enquanto perspectiva híbrida para espaço, linguagem, modalidade e tecnologia.

Além desses artigos versando sobre a contação de histórias em diferentes aspectos, temos ainda a Seção Estudos com dois artigos. O primeiro tem por título Famílias de pessoas com deficiência intelectual: cuidar e educar nas redes parental e social de apoio de Cláudia Paranhos Portela e de Lívia Alessandra Fialho Costa. O artigo é resultado de uma pesquisa de natureza qualitativa, desenvolvida em Salvador, no ano de 2014, cujo tema foi o percurso de cuidado e de educação das pessoas com deficiência, especificamente, sobre a formação e atuação das redes de apoio parental e social no que diz respeito ao cuidado e à educação da pessoa com deficiência intelectual. Analisou-se, assim, as estratégias de cuidado elaboradas e experienciadas pelas famílias diante da necessidade de cuidar, de educar e de socializar filhos(as) com deficiência intelectual. A pesquisa foi baseada em entrevistas semiestruturadas com dezesseis famílias de pessoas com deficiência intelectual, adultas, moradoras de Salvador, Bahia. Os resultados obtidos na investigação revelaram uma realidade familiar em que as mães aparecem como as principais cuidadoras dos(as) filhos(as). Evidenciou-se, também, que o apoio fornecido pelas redes parental e social se revelam como fatores determinantes no processo de cuidado, de educação e de socialização do(a) filho(a) com deficiência intelectual, tendo em vista que, quanto maior é o apoio recebido, mais qualidade de vida se garante às pessoas com deficiência e às suas famílias. A pesquisa aponta a necessidade de novos estudos comparativos que estabeleçam a relação entre a influência das redes de solidariedade familiar e social no desenvolvimento da pessoa com deficiência intelectual.

O segundo artigo da seção e que fecha o dossiê 68 tem por título Protagonismo e processos formativos: um estudo de caso da alfabetização em Cuba (1961). Foi escrito por José Joaquim Pereira Melo, Roseli Gall do Amaral e Dayane Colombo, os quais discutem, a partir de uma pesquisa bibliográfica com caráter qualitativo, a Campanha Nacional de Alfabetização em Cuba em 1961 e o material didático utilizado na formação do professor alfabetizador em sua expressão didática, psicológica e militar para uma formação autônoma. O texto destaca os princípios do Currículo Oculto expressos no Alfabeticemos: manual para el alfabetizador, que teve como objetivo proporcionar orientações sobre o processo de alfabetização e treinar jovens que se alistaram como professores voluntários, cujas idades eram entre 12 a 16 anos. Determinada abordagem buscava estimular o protagonismo educacional e político da época. Após a intervenção, o índice de analfabetismo em Cuba caiu de 23,6% para 3,9%, o que configurou a ilha como o primeiro território, declarado pela UNESCO, como livre de analfabetismo da América Latina. Os “jovens maestros” se configuraram como protagonistas de um novo processo formativo que fez da educação cubana referência mundial.

REFERÊNCIAS

BAKHTIN, Michael. Estética da criação verbal. São Paulo: Martins Fontes, 2003. [ Links ]

HAMPATÊ BÁ, Amadou. A tradição viva. In: História Geral da África I: Metodologia e pré-história da África. P. 167-212. Editado por Joseph Ki-Zerbo, 2ª Ed. Brasília: UNESCO, 2010. Acesso: http://unesdoc.unesco.org/images/0019/001902/190249POR.pdf.Links ]

MACEDO, Roberto Sidnei. Atos de Currículo e Autonomia Pedagógica: o socioconstrutivismo curricular em perspectiva. Petrópolis, RJ: Vozes, 2013. [ Links ]

MATOS, Gislayne Avelar. A palavra do contador de histórias: sua dimensão educativa na contemporaneidade. São Paulo, Martins Fontes, 2005. [ Links ]

ONG, W. J. Oralidade e cultura escrita. Campinas, SP: Papirus, 1998. [ Links ]

1Texto da Apresentação revisado por Aline Barbosa de Almeida Cechinel.

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