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Revista Brasileira de Educação

versión impresa ISSN 1413-2478versión On-line ISSN 1809-449X

Rev. Bras. Educ. vol.23  Rio de Janeiro  2018  Epub 11-Sep-2018

https://doi.org/10.1590/s1413-24782018230061 

Espaço aberto

O esquematismo industrial e a produção das dificuldades para a educação formal

THE “INDUSTRIAL SCHEMATISM” AND THE PRODUCTION OF DIFFICULTIES FOR FORMAL EDUCATION

EL “ESQUEMATISMO INDUSTRIAL” Y LA PRODUCCIÓN DE LAS DIFICULTADES PARA LA EDUCACIÓN FORMAL

Cesar Augusto Alves da SilvaI 

IRede particular de Instituto de Ensino Superior de São Paulo, São Paulo, SP, Brasil.


RESUMO

Este ensaio procura apontar as condições atuais como inapropriadas a uma experiência própria à assimilação da educação formal. Possui sua base no conceito de esquematismo, formulado por Kant e utilizado por Horkheimer e Adorno, especificamente no capítulo sobre “A indústria cultural”. Utiliza esse conceito para investigar a produção das condições sociais, econômicas e culturais objetivas capazes de fundamentar ou bloquear a formação dos seres humanos contemporâneos, produzindo as ditas “dificuldades de aprendizagem”.

PALAVRAS-CHAVE: dificuldades de aprendizagem; esquematismo; pseudoformação; teoria crítica

ABRSTRACT

This essay seeks to point out the current conditions as inappropriate for an experience of assimilation in formal education. It is based on the concept of schematisms, formulated by Kant and used by Horkheimer and Adorno in the book “Dialectic of Enlightenment”, specifically in the chapter on the culture industry, conceptualized as “schematism of production,”. The present work uses this concept to investigate the production of objective social, economic and cultural conditions capable of founding or blocking the formation of contemporary human beings, thus producing learning difficulties.

KEYWORDS: learning difficulties; schematism; pseudoformation; critical theory

RESUMEN

Este ensayo busca apuntar las condiciones actuales como inapropiadas a una experiencia propia a la asimilación de la educación formal. Tiene su base en el concepto de esquematismo, formulado por Kant y utilizado por Horkheimer y Adorno, específicamente en el capítulo sobre “La industria cultural”. Utiliza ese concepto para investigar la producción de las condiciones sociales, económicas y culturales objetivas capaces de fundamentar o bloquear la formación de los seres humanos contemporáneos, produciendo las referidas “dificultades de aprendizaje”.

PALABRAS CLAVE: dificultades de aprendizaje; esquematismo; seudoformación; teoría crítica

Reformas pedagógicas isoladas, indispensáveis, não trazem contribuições substanciais. Poderiam até, em certas ocasiões, reforçar a crise, porque abrandam as necessárias exigências a serem feitas aos que devem ser educados, e porque revelam uma inocente despreocupação frente ao poder que a realidade extrapedagógica exerce sobre eles.

Theodor Adorno

INTRODUÇÃO

Este escrito possui como objetivo apresentar e discutir a estrutura objetiva presente e atuante na origem das causas que resultam em um sujeito avesso ou com enormes dificuldades de escolarização, de modo a não tratar-se mais de um sujeito, mas sim de um pseudosujeito. Convidamos o leitor a uma nova abordagem, pois não mais concentrada na sala de aula e pouco relacionada ao mundo fora dela. Propomos inverter essa forma e considerar de maneira primordial a “realidade extrapedagógica”, a que se referiu Adorno há mais de 50 anos, na formação pedagógica dos alunos e alunas e, com isso, conseguir pistas sobre os motivos que impedem esses jovens, como também muitos adultos, de se relacionar com a cultura escolarizada de maneira prazerosa. Talvez seja olhando para fora da escola que se encontre vestígios das razões que impelem alunos a, dentro dela, explodir em violência contra professores e seus pares. Para aqueles que insistem em manter seus olhos baixos e seu comportamento intelectual ortodoxo, argumentando a favor de se considerar unicamente uma extrema complexidade da relação interna à sala de aula como única fonte geradora da maioria dos problemas pedagógicos e de comportamento, contrapomos a verdadeira complexidade da realidade do sistema capitalista de produção de mercadorias que incluiu nelas tanto o ser humano, agindo sobre ele, no intuito pseudoformativo, bem antes de ele chegar à escola.

A nosso ver, a maioria dos teóricos da educação, de tanto olhar para a árvore, acabou por se esquecer da existência da floresta em torno dela. Consideramos que este é o momento de levantarmos os olhos e percebemos essa floresta, concentrando nossas análises na primeira para entender melhor a última. Se levarmos em consideração que para se escolarizar há necessidade de um comportamento ativo, e que a própria escolarização é a estimulação do desenvolvimento da iniciativa, como ficam esses componentes do processo de ensino-aprendizagem em uma sociedade inteiramente baseada e fundamentalmente dependente da produção em massa? O historiador Chistopher Lasch pode nos ajudar nessa questão:

Os arranjos sociais que sustentam um sistema de produção em massa e consumo de massa tendem a desencorajar a iniciativa e a autoconfiança e a incentivar a dependência, a passividade e o estado de espírito de espectador. (Lasch, 1986, p. 19)

A impossibilidade de separar escola e sociedade faz com que haja igualmente uma inconcebível abordagem da produção e da reprodução do conhecimento escolar sem atentar para as determinações das indústrias, pois, “sob o lema da gestão científica, os capitalistas expropriaram o conhecimento técnico anteriormente exercido pelos trabalhadores, reformularam-no em ciência e investiram em seu controle uma nova elite gerencial” (Lasch, 1986, p. 19-20). Em um mundo acirradamente competitivo e ulteriormente objetivando o lucro a qualquer custo, a tecnologia - voltada desde sua origem a esse objetivo - faz dos sentidos do ser humano, com suas capacidades de raciocinar e pensar (daqui em diante entendidas como cognição), seus principais alvos - ou vítimas. Esses elementos estruturadores do sistema capitalista (individualismo, competição, lucro e tecnologia) têm sua origem fora da escola e a afetam (sendo também reproduzidos) internamente não apenas por meio da legislação, verbas irrisórias, currículos, políticas públicas etc., mas sim e, acima de tudo, na figura de seu membro mais ilustre: o aluno. Este apresenta em si - em seus sentidos, interesses, desejos, necessidades e forma de pensar e raciocinar - não apenas aquela estrutura, amiúde conflitante ou reproduzida pelo sistema escolar, como também uma percepção em franca relação dialética com sua cognição e oriunda dessa mesma estrutura.

Pois, então, o sistema capitalista, em sua produção e reprodução, prepara uma base formativa para os seres humanos, as condições concretas das quais se erigem a percepção e a cognição necessárias à própria reprodução daquele sistema. Urge, portanto, irmos além dos muros da escola para entendermos com profundidade as relações educativas obstaculizadas e frustradas, a priori, pela organização da produção e reprodução da vida que se inserem naquela instituição. Para tal, o ensaio aponta e discute a contradição existente entre a educação formal e a maneira como o modo de produção capitalista de mercadorias organiza o mundo social e cultural, a nosso ver, o verdadeiro território da formação do aluno que não age como tal. Nossa hipótese para essa atitude é a de que esse aluno já está formado (a rigor, pseudoformado) por aqueles elementos acima elencados, pertencentes à ordem econômica e essenciais a praticamente todas as relações atuais, daí o conflito entre professores e alunos na sala de aula. Pois o esquema racional e técnico desta ordem econômica constrói e requer da percepção e entendimento dos indivíduos uma forma diferente de atuação no mundo daquela que é exigida e construída pela educação formal escolarizada.

Esta é uma discussão que considera a cultura escolar para além da simples teoria da reprodução, ou da emancipação social. Entendida geralmente como uma relação de continuidade ou de reprodução, a dinâmica de correspondência entre ordem econômica e educação formal é aqui aceita e questionada. Do ponto de vista econômico, a educação escolar, desde a Revolução Industrial, é nitidamente utilizada como argumento real para expansão da produção material. A forma técnica e tecnológica adquirida por essa produção afeta diretamente a cognição dos indivíduos. Neste ponto, a educação escolar é reconhecida desde seu início como compensação a certo bloqueio cognitivo causado no indivíduo pela sua limitada atividade laboral na linha de produção. Produção material e produção intelectual estão entrelaçadas desde tempos imemoriais erigindo a cultura (compreendida como forma de entender, expressar e se relacionar com o mundo, produzindo-o e reproduzindo-o) e os seres humanos que desfrutam e são atingidos por ela. No capitalismo, esse âmbito da vida (a cultura) - assim como outros - é engendrado por um esquema industrial de produção, um rigoroso sistema que a define e, detalhadamente, cada produto, antes mesmo de materializá-los.

Desse modo, a ação produtiva, que confecciona uma caixa de fósforos ou um filme de Hollywood, corresponde a uma rigorosa e apriorística determinação esquemática, uma verdadeira metafísica que se torna concreta. Tal determinação é, pois então, criada de maneira alienada tanto do produtor quanto do consumidor. Essa alienação neutraliza o desenvolvimento cognitivo em sua função eminentemente reflexiva e, igualmente, o ser humano em sua estrutura de caráter, já que percepção e entendimento do homem jazem antecipados na própria lógica do modo de produção, no próprio esquema produtivo tornado, de forma sub-reptícia, uma epistemologia, uma forma concreta de abordagem e produção do mundo. O homem deixa de sê-lo, de ser sujeito, quando é introduzido na relação de troca, passando a ser, exclusivamente, produtor e consumidor - características de um cidadão. Para isso, ele, inconscientemente,1 deve se esforçar - sendo também, a um só tempo, forçado, de modo sorrateiro, insidioso, pelo sistema produtivo - para abdicar de si mesmo e aceitar as imposições produtivas industriais - materializadas também no modo de consumir, antecipadamente formulado no produto - tão massificadas quanto almejadas por ele mesmo. Daí que a educação escolar, nesta forma produtiva, encontra um obstáculo objetivo, que limita a fonte primeira e última das ideias, do homem, do sujeito, a saber: a experiência. Esta já vem realizada em cada produto produzido ou utilizado pelo ser humano, sendo uma condição imanente ao próprio modo de produção empregar a tecnologia para reduzir, cada vez mais, a participação humana sem uma contrapartida verdadeiramente formativa desse humano.

Assim, iniciaremos o texto discutindo exatamente a perda das condições objetivas para a realização da experiência. Se esta possui como resultado a formação humana, a perda dessas condições implica no desaparecimento momentâneo da formação, pois, como escreve Jaeger (2003, p. 13-14, grifo meu): “A palavra alemã Bildung (formação, configuração) (...) aparece sempre que o espírito humano abandona a ideia de um adestramento em função de princípios exteriores e reflete, na essência, a própria educação”. Em seguida, discutiremos o que aparece no lugar dessas condições perdidas, bem como seus resultados, qual seja, uma formação antecipada àquele que se forma - falsa, portanto. Desse modo, não mais formação, mas sim pseudoformação. Na continuidade, faremos uma reflexão sobre a contradição entre a impossibilidade da experiência no mundo externo à escola e a exigência da experimentação do mundo por esta última. Sobre isso, podemos dizer ao atento leitor cuja atividade laboral é a docência, que esta seção trata mais diretamente das possíveis explicações das dificuldades atuais dos alunos na relação de ensino-aprendizagem - observando a internalidade das causas, e não sua externalidade, tal qual os culturalistas fazem. Nossas conclusões consideram como produto da atual ordem econômica - que submete a seus interesses a tecnologia, a sociedade e a cultura - a aversão ora manifestada pela maioria dos alunos - e por pessoas em geral - em relação aos processos, exigências cognitivas e afetivas, atividades de estudos e assimilação da cultura letrada. Não obstante, um produto social que encontra eco nos indivíduos e que assim é requisitado por eles, antes mesmo que tais produtos existam, constituindo uma via de mão dupla. Pois, como afirma Adorno (2005, p. 36, tradução nossa):

A velha explicação de que os interessados controlam todos os meios da opinião pública não é suficiente por si só, porque as massas apenas se deixariam levar por uma propaganda torpe, intermitente e falsa se algo nelas mesmas não correspondesse aos chamados pelo sacrifício e à vida perigosa.

Portanto, para a diminuição dessa aversão, fazem-se necessárias medidas que vão além do espaço circunscrito da escola e não se resumam a reformas pedagógicas pontuais e internas àquela e ao sistema de ensino, sem, é óbvio, dispensá-las quando realizadas com o objetivo de contribuir para o desenvolvimento humano, e não apenas para adequar ou fazer florescer as capacidades humanas requeridas pela demanda da tecnologia de trabalho e lazer.

A PRODUÇÃO INDUSTRIAL ESQUEMATIZA PELO INDIVÍDUO E FAZ ESVAECER A VONTADE PELA EXPERIÊNCIA

Se levarmos em consideração o pensamento de Benjamin a respeito da teoria de Proust sobre a nossa incapacidade de nos servir dos dados da memória conforme nossa necessidade, o que indicaria também uma impossibilidade de a construirmos segundo nossas vontades, e expresso na frase: “As inquietações de nossa vida interior não têm, por natureza, um caráter irremediavelmente privado. Elas só o adquirem depois que se reduziram as chances dos fatos exteriores se integrarem à nossa experiência” (Benjamin, 1989, p. 106), podemos deduzir que, especificamente na contemporaneidade, as condições para a experiência - isto é, dos “fatos exteriores se integrarem” a nós - foram subtraídas ao sujeito e, com ela, a possibilidade de contraposição, pelo indivíduo, aos sistemas sociais de representação dominantes. Pois, se o indivíduo nunca o é isoladamente - sempre socialmente, somente há indivíduo em sociedade -, o fato explicativo dessa incapacidade individual de contrapor-se à imposição social se encontra nas condições impróprias à experiência. Isso nos leva ao paradoxo do desaparecimento do indivíduo imerso em uma sociedade de massas e o agravamento do isolamento dos seres humanos.

Na sociedade da produção em série, para atingir milhões de indivíduos não há a necessidade, e muito menos a possibilidade, de o homem pensar e atuar individualmente com base na herança racional e científica socialmente conquistada, já que tal herança foi subsumida ao rígido controle do capital, sendo dirigida e utilizada superiormente conforme os interesses deste último. Daí que a dinâmica do capital se entrelaça à ciência - por meio de incentivos, arquivamento de descobertas ainda não rentáveis e outras formas - e a apresenta quase como uma magia pronta e acabada no interior de seus produtos massivos, cujos processos não devem interessar a ninguém, mas apenas seu uso irrefletido. Uma ação que banaliza a ciência e, ao mesmo tempo, torna-a mito, pois inatingível em seus processos de consecução e alvo de iniciados, dotados de algum tipo sobrenatural de talento ou genialidade, seres com imagem tacitamente construída para não transparecer uma diferença de classe, e sim apenas biológica.

Essa construção do falso mito, que inclui o gênio e o ser dotado de talento, atua como um elemento de valorização econômica em todos os setores dominados pelo capital, inclusive na cultura. O banal da cultura de massas pertence a essa categoria econômica, porque é vendido como se não fosse algo simples e fútil, mas sim como produto de indivíduos dotados de certa superioridade cultural - a rigor, algo falso, inexistente em um mundo ordenado pela simplificação imposta como estratégia de produção e venda de mercadorias. Além disso, essa suposta superioridade da cultura - mesmo que de uma cultura administrada - é a forma de construir a falsa formação, a pseudoformação, já que espiritualizada, abstraída de sua verdadeira base material, é o próprio engodo, a falácia sob a qual se erige a mercadoria, e não a formação, um golpe publicitário dos que não sabem o que é verdadeira poesia. Não obstante, a própria poesia não encontra mais público em uma sociedade em que “tudo que estimula a formação acaba por contrair-lhe os nervos vitais” (Adorno, 1964, p. 150, tradução nossa).

Para Adorno e Horkheimer (2006), a indústria cultural - isto é, o advento da sistematização, padronização e controle, com fins lucrativos, da produção cultural - se torna uma verdadeira instituição da sociedade moderna, um marco desta época. Essa indústria opera por meio de paradigmas absolutamente externos ao ser humano, factíveis a este, é claro, porém completamente separados dele e que destroem, antes mesmo que se forme, qualquer lampejo de espontaneidade, submetendo e enquadrando toda e qualquer manifestação individual (o que inclui a memória) e artística a seus processos de produção previamente configurados por um único critério: a rentabilidade. Por meio da organização da produção e reprodução da vida pautada sob a determinação do rentável, tal indústria usurpou aos indivíduos o seu próprio processo individual cognitivo de concatenações de ideias a partir do contato com a realidade para a aplicação de um conceito (categoria) a um fenômeno. A esse processo individual, Kant (1994, p. 183) nomeia como “esquematismo” ou “o processo pelo qual o entendimento opera com esquemas”. Um método de representação daquilo que não podemos intuir: “este pensamento é antes a representação de um método para representar um conjunto de acordo com certo conceito (...) que eu, no último caso, dificilmente poderia abranger com a vista e comparar com o conceito” (Kant, 1994, p. 183). Quando analisamos as argumentações desse autor - considerando o caminho do entendimento da realidade empírica para o conceito, comparando com o inverso - a riqueza de elaborações cognitivas possíveis tende só a aumentar:

O esquema do triângulo só pode existir no pensamento e significa uma regra da síntese da imaginação com vistas a figuras do espaço. Muito menos ainda um objeto da experiência ou a sua imagem alcançaria alguma vez o conceito empírico, pois este refere-se sempre imediatamente ao esquema da imaginação, como uma regra da determinação da nossa intuição de acordo com um certo conceito geral. (Kant, 1994, p. 183)

Com o desenvolvimento da indústria - por meio da tecnologia a seu serviço - e da indústria cultural, essa dinâmica, esse trabalho da “imaginação produtiva” (Kant, 1994, p. 184), procurando entender o mundo à nossa volta, é tolhido, restringido e, verdadeiramente invadido, pois “acontece uma abertura da alcova aos meios de informação de massa” (Marcuse, 1967, p. 38) e até a imaginação é assenhorada pela produção em série de imagens. Essa capacidade humana, de tanto receber os estímulos externos daquela produção padronizada, atrofia-se em sua espontaneidade, em suas possibilidades de articulações e criações livres. Assim, não é qualquer imagem e imaginação, mas sim aquela fornecida pelo padrão da indústria. “A estética ganhou um peso ontológico como nunca tivera.”, diz Türcke (2010, p. 65). Dessa forma, até mesmo o próprio esquematismo é tomado de assalto pelo esquema de produção industrial, pois há uma grande redução na diferenciação daquilo que é fabricado:

O esquematismo do procedimento mostra-se no fato de que os produtos mecanicamente diferenciados acabam por se revelar sempre como a mesma coisa (...). Até mesmo as diferenças entre os modelos mais caros e mais baratos da mesma firma se reduzem cada vez mais (...) os próprios meios técnicos tendem cada vez mais a se uniformizar. (Adorno e Horkheimer, 2006, p. 102)

Se o sistema de produção capitalista industrial está a se expandir, abarcando todos os produtos e destruindo qualquer sistema, processo ou relação social não capitalista, o que está a acontecer, então, é uma imposição de condições que impedem a experiência - tal qual Benjamin2 a apresenta - a partir de tal expansão. Em lugar da rica imaginação produtiva de Kant - e que Valéry percebe a perda como uma impossibilidade de “formular desejos especiais, que exijam para sua realização ‘algo belo’” (Valéry apudBenjamin, 1989, p. 138) atuante no esquematismo, entra em cena uma uniformização da realidade e de seu processo de produção, a partir de meios técnicos, que não permite espaço para que o indivíduo produza suas próprias classificações e esquemas.

Não obstante, poderíamos pensar que tal fato fizesse parte apenas do âmbito interno à fábrica e a outros empreendimentos capitalistas; porém, e este é o ponto, o processo fabril invade o espaço de produção do espírito e passa a tutorá-lo segundo suas concepções e por meio de seus produtos e processos. Processos esses de aceleração em todos os âmbitos da vida, inclusive esse a que chamamos cultural, que passa a receber produtos de alto estímulo perceptivo tanto auditivo quanto visual. A velocidade e a intensidade de sons e imagens, produzidos sob a técnica da microeletrônica, acabam potencializando as sensações, viciando os sentidos que passam a exigir estímulos cada vez mais fortes e, ao mesmo tempo, provocam também um prazer diametralmente contrário, como uma sedação: “As sensações que agitadamente tomam o organismo, fazendo-se sentir em todas as suas fibras, e que parecem dar-lhe de volta a percepção subtraída, o sentimento pleno de si, são precisamente aquelas que os anestesiam” (Türcke, 2010, p. 68). É um fluxo contínuo e fervoroso de inervações que não permitem ao organismo fixar-se em absolutamente nada, seja tempo ou espaço, som ou imagem. Tal fixação é central para a experiência, ou, podemos dizer, para o aprendizado. Ambos os efeitos (estímulo e sedação) produzidos por esse arroubo do esquematismo da indústria como um todo, e pela cultural em específico, distanciam o ser humano das condições objetivas para a experiência, como, por exemplo, o ambiente da sala de aula: “Os estímulos do ambiente do dia a dia não são páreo para a torrente de excitação midiática do espetacular” (Türcke, 2010, p. 66). Devemos entender esse “ambiente”, a que se refere Tücker, como espaços ainda não invadidos completamente não apenas pela intensidade dos estímulos fornecidos pelos aparelhos tecnológicos de comunicação, trabalho, lazer, e sua programação, como também pela velocidade da vida e relações dentro deles - um deles é a sala de aula.3

A aceleração produzida na vida urbana, pública e privada, nada mais é do que o reflexo do mesmo efeito conseguido na produção por meio do avanço tecnológico. Isso cria um turbilhão social que antecipa para cada um de nós a forma das relações, sensações, entendimentos, comportamentos, interesses e até desejos que não permite espaço para o indivíduo sequer piscar, muito menos esquematizar por si. Nos termos de Türcke (2010, p. 66), uma “torrente” que tem seus efeitos: “A torrente de excitação, porém, representa estímulos demais. Ela coloca organismo na situação paradoxal de não mais ser capaz de transformar os puros estímulos em percepções”. Essa cisão entre percepção e estímulo causa a sensação de uma suspensão do sujeito, incapaz de “localizar-se, orientar-se e muito menos apresentar-se” (Türcke, 2010, p. 66). Ou seja, decidir por si mesmo, tocar, ouvir, pensar. São estímulos que, de tão fortes, desestimulam e estimulam; como dissemos, chegam a sedar: desestimulam o sujeito e estimulam a sujeição. De modo que entra no lugar desse sujeito o pseudosujeito, o pseudoformado, aquele que, sem muita alternativa para se reproduzir ou se socializar, deixa-se levar pelo redemoinho social, deixa que o esquematismo industrial tome o seu lugar, estimule e perceba para ele. Assim, sucumbe a experiência capaz de formar:

Apenas na medida em que a percepção é capaz de fixar-se em algo, juntar-se a algo, é que ela pode tornar-se uma unidade concreta de experiência, pode dar coesão ao organismo sensível, uma identidade, um “aí”, tanto em sentido objetivo quanto subjetivo, como o “aí” é algo determinado, que posso localizar e fixar, posso eu mesmo me localizar, ter um apoio, sentir-me como unidade de minhas percepções e sentimentos, estar “aí”. (Türcke, 2010, p. 66)

Dessa forma, o espaço do lazer e da formação é invadido definitivamente, e a realidade se faz antes de chegar ao indivíduo, sendo confirmada por ele e criticada quando diferente, pois ninguém compra um produto difícil de ser operado, que não esteja pronto ou diferente daquilo cujo hábito a propaganda e o convívio social alçaram ao primeiro lugar. As sensações obtidas pela vida cotidiana em sua concretude não fornecem mais aquilo que os sentidos viciados na intensidade de cores e sons, fornecida pelos media, clama. É assim que os seres humanos contemporâneos já não precisam colocar em prática seu aparelho mental ao se deparar com algo novo e encetar complexas funções, chegando a sínteses críticas a partir de seu metabolismo com o mundo à sua volta, pois os modelos são disponibilizados em todos os setores do conhecimento ao comportamento, passando pelos juízos e se tornando praticamente uma estrutura cognitiva anterior ao próprio processo de formação de tal estrutura, ou seja, antes da experiência, configurada como o contato com aquilo que se quer conhecer. O problema reside no fato de que o próprio sistema produtivo não permite que haja uma dinâmica cognitiva para levá-la além daquela estrutura, constituindo, assim, o desenvolvimento humano.

Em seu lazer as pessoas devem se orientar por essa unidade que caracteriza a produção. A função que o esquematismo kantiano ainda atribuía ao sujeito, a saber, referir de antemão a multiplicidade sensível aos conceitos fundamentais, é tomada ao sujeito pela indústria. O esquematismo é o primeiro serviço prestado por ela ao cliente. Na alma devia atuar um mecanismo secreto destinado a preparar os dados imediatos de modo a se ajustarem ao sistema da razão pura. Mas o segredo está hoje decifrado. Muito embora o planejamento do mecanismo pelos organizadores dos dados, isto é, pela indústria cultural, seja imposto a esta pelo peso da sociedade que permanece irracional apesar de toda a racionalização, essa tendência fatal é transformada em sua passagem pelas agências do capital do modo a aparecer como o sábio desígnio dessas agências. Para o consumidor, não há nada mais a classificar que não tenha sido antecipado no esquematismo da produção. A arte sem sonho destinada ao povo realiza aquele idealismo sonhador que ia longe demais para o idealismo crítico. Tudo vem da consciência, em Malebranche e Berkeley da consciência de Deus; na era da arte para as massas, da consciência terrena das equipes de produção. (Adorno e Horkheimer, 2006, p. 103)

Enfim, a experiência é bloqueada ou, em linguagem mais acessível à e de acordo aos cânones da pedagogia ora reinante, a aprendizagem significativa não é realizada. Esta é caracterizada como aquilo que verdadeiramente é assimilado pelo indivíduo, se internalizando a ele; para isso acontecer, há a necessidade de que ele possa utilizar isso na sua vida. Só utilizamos aquilo que podemos tocar, sentir, ouvir, pensar e realizar por nós mesmos. Ora, como fica, então, a aprendizagem significativa em uma organização social em que estamos, na condição de produtores, completamente alienados de toda e qualquer produção, seja ela da fábrica, do escritório, dos porões da política ou da justiça e da cultura, enfim, da produção de nós mesmos e de nossos caminhos e descaminhos? Essa é uma questão ontológica. Deveria ser realizada antes de toda teoria educacional ou, pelo menos, considerá-la como base e fundamento. Para tentar iniciar a resposta a essa pergunta, podemos considerar a seguinte assertiva de Adorno e Horkheimer (2006, p. 41): “A regressão das massas de que hoje se fala, nada mais é senão a incapacidade de poder ouvir o imediato com os próprios ouvidos, de poder tocar o intocado com as próprias mãos: a nova forma de ofuscamento que vem substituir as formas míticas superadas”.

AS CONDIÇÕES OBJETIVAS DA CONSTRUÇÃO DA PSEUDOFORMAÇÃO

Tendo em vista as afirmações acima sobre esquematismo e indústria cultural - levando em consideração que essa indústria não opera exatamente igual à que confecciona os produtos unicamente materiais -, se utilizando e ao mesmo tempo tentando abrir um caminho novo, todavia pari passu, às análises realizadas por Türcke e apresentadas anteriormente, devemos pensar a respeito dos possíveis efeitos de todo esse esquema de produção sobre e em relação recíproca à cultura, às capacidades de percepção e à cognição dos indivíduos, gerando uma possível, e até inconsciente, aversão à cultura escolar.

Se, de acordo com Caldas (2001), a percepção está na base de nosso processo cognitivo e esta, para erigir-se, depende da realidade externa a ela, teremos que nos ater à formulação da indústria cultural e das novas tecnologias que a ela dão suporte em sua dinâmica e capacidade de dirigir, estimular, hiperbolizar, influenciar e dirimir determinados sentidos, fazendo com eles produzam estímulos cerebrais concernentes à necessidade, ou não, de processos complexos de sínteses de informações.

A percepção está na base do fenômeno de cognição, é a matéria que a alimenta, é o plano no interior do qual a cognição se processa. Se é verdade que não existe cognição sem signo, é verdade também que esta inicia-se com a percepção. Este é o módulo que está na base da inteligência, delimitando a sua esfera de cognição, e na vida cultural consiste em uma de suas matrizes básicas. (Caldas, 2001)

Ora, se para percebermos necessitamos que haja algo a ser percebido, isso significa que toda percepção é social, histórica e cultural. Calcados nesse fato, será a capacidade intelectiva dos humanos completamente dependente do que há ao seu redor para ser percebido? Para pensarmos sobre essa questão, é prudente lembrarmos Adorno e Horkheimer (2006, p. 156): “A profundidade interna do sujeito não consiste em nada mais senão a delicadeza e a riqueza do mundo da percepção externa”. Todavia, e se toda a sensibilidade já estiver preconcebida pelo aparelho conceitual, fazendo com que a percepção esteja balizada, ou até mesmo concretizada, antes mesmo que ela aconteça? Sendo assim, o que nos restaria não seria mais um processo formativo da cognição por meio de uma dinâmica ativa entre esta última e a percepção, a partir de regras universalmente válidas e dadas a priori, e sim o puro mimetismo. O ser humano, no campo filogenético, sempre foi afetado por toda a evolução histórica e social que o fez se afastar do comportamento meramente mimético. Não obstante, no ambiente atual, erigido pelo modo de produção industrial e pela indústria cultural, em que o imperativo do gozo se impõe como dever moral, o divertir-se é a palavra de ordem. Daí que: “toda diversão, todo abandono tem algo de mimetismo” (Adorno e Horkheimer, 2006, p. 149).

Podemos dizer que a “torrente” a que se referiu Türcke (2010, p. 66), cujo resultado é a retirada do “aí” - o controle individual, autônomo - do ser humano a ela entregue, também produz esse “abandono”. Não obstante, essa “torrente” também se ergue da dinâmica do trabalho automatizado, e não apenas como efeito dos produtos tecnológicos oriundos da indústria cultural. Isso fica evidente no relato de um trabalhador, trazido à luz por Marcuse (1967, p. 44), diz o homem: “tudo considerado, vamos com o balanço das coisas”. Sob o viés tecnológico industrial com fins de ganho e lucro unicamente, a capacidade de autonomia não encontra condições objetivas para ser desenvolvida: “A máquina parece instilar certo ritmo de servidão nos operadores” (Marcuse, 1967, p. 44). Walker (1957, p. 104) fornece mais munição para Marcuse sustentar seu argumento ao dizer: “Está geralmente aceito que movimentos interdependentes realizados por um grupo de pessoas que seguem um padrão rítmico proporcionam satisfação - assaz independente do que esteja sendo feito por meio dos movimentos”. Nessa mesma linha, Marx (1989) vai apresentar fatos que sugerem, em razão das condições objetivas de produção e reprodução da vida, a possibilidade de camponeses e artesãos independentes desenvolverem mais capacidades que os trabalhadores das manufaturas, diz ele:

O camponês e o artesão independentes desenvolvem, embora modestamente, os conhecimentos, a sagacidade e a vontade, como o selvagem que exerce a arte da guerra apurando sua astúcia pessoal. No período manufatureiro, essas faculdades passam a ser exigidas apenas pela oficina em seu conjunto. As forças intelectuais da produção só se desenvolvem num sentido, por ficarem inibidas em relação a tudo que não se enquadre em sua unilateralidade. (Marx, 1989, p. 413)

Um pouco antes desse trecho, Marx (1989) faz uma forte crítica à repressão das capacidades humanas sob o trabalho na manufatura:

a manufatura (...) deforma o trabalhador monstruosamente, levando artificialmente a desenvolver uma habilidade parcial, à custa da repressão de um mundo de instintos e capacidades produtivas, lembrando aquelas práticas das regiões platinas onde se mata um animal apenas para tirar-lhe a pele ou o sebo. (Marx, 1989, p. 412)

Ocorre que sorrateiramente, insidiosamente, esse processo de produção vazou e se instalou para além dos muros das fábricas sobre toda a realidade do mundo social e cultural, dominando esses âmbitos e determinando as relações entre homens, comportamentos, desejos, configurando até uma epistemologia - como já foi dito, mas é importante lembrar para se entender o que virá adiante -, com a tecnologia, tal dominação se totalizou. Essas, a rigor, são as condições objetivas aludidas, amiúde, por Adorno em seu texto “Teoria da pseudoformação” e responsáveis pela pseudoformação - segundo o alemão, condições que até os socialistas perceberam:

Quando as teorias socialistas tentavam despertar a consciência de si mesmo aos proletários, estes não se encontravam em nada mais avançados que a burguesia. Não se deve ao acaso os socialistas terem alcançado sua posição chave na história baseando-se em seu lugar econômico objetivo e não em seu contexto espiritual. (...) a desumanização, devida ao processo capitalista de produção, negou aos trabalhadores todos os pressupostos necessários para a formação cultural e, acima de tudo, o ócio. (Adorno, 1964, p. 148, tradução nossa)

Em franco ataque ao reducionismo dos apologistas de esquerda da educação - que a espiritualizam e alçam a um valor estratosférico, instrumento capaz de sozinha alterar a realidade, como os cristãos protestantes fazem com sua fé -, e aos ideólogos de direita - que utilizam a educação como argumento para não precisarem mudar as condições de produção e reprodução da vida das pessoas no capitalismo -, Adorno (1964, p. 148) se pronuncia contra a “massificação4 (ou vulgarização no sentido de popularização) da formação por meio da pedagogia” que, como não poderia deixar de ser, se constituiu em fracasso de seus objetivos, pois, se a formação cultural diz respeito ao espírito, ela somente existe em relação mútua com a materialidade:

As tentativas de remediar pedagogicamente a questão da formação tem-se transformado em caricaturas. E toda a chamada popularização (da formação) - e este termo foi escolhido afinando-se muito o ouvido - padece da ilusão de achar que a mera formação poderia sozinha revogar a exclusão dos proletários dessa formação, algo que é ditado pelas condições sociais. (Adorno, 1964, p. 148, tradução nossa)

Sendo rigorosos à teoria da pseudoformação, ao conceito exposto aqui, os indivíduos, teóricos da educação, que apostam nela sozinha para resolver todos os problemas do mundo são, sem sombra de dúvida, tão pseudoformados quanto os seres humanos embrutecidos pelas condições objetivas de vida - resumidas a trabalho e consumo - no capitalismo hodierno: “não se ousa tocar na ferida exposta de que ela (a formação cultural) sozinha não garantirá uma sociedade razoável, nem se quer soltar a esperança - desde o início enganosa - de que poderia originar de si mesma e dar aos homens o que a realidade lhes recusa” (Adorno, 1964, p. 147). A realidade do capitalismo tardio sugou todos os elementos que antes existiam descolados dela, porém sob os seus auspícios, e os transformou em mercadoria. Esse foi o caso dos produtos culturais, da escola e de seu conteúdo e forma: “a pseudoformação é o espírito aprisionado pelo fetiche da mercadoria” (Adorno, 1964, p. 159). O pseudoformado é o resultado desse aprisionamento; um produto contraditório da formação social contraditória, por isso vive em conflito consigo mesmo em meio a traumas e a busca incessante de ser aceito, não como é individualmente, mas desfavorecendo a si mesmo, reprimindo seu ser em favor da adaptação social. O vazio é o seu conteúdo, e a próxima onda, a próxima moda, o próximo turbilhão social, sua torrente.

A CONTRADIÇÃO ENTRE A IMPOSSIBILIDADE DA EXPERIÊNCIA NO MUNDO EXTERNO À ESCOLA E A EXIGÊNCIA DA EXPERIMENTAÇÃO DO MUNDO POR ESTA ÚLTIMA

Então, na atual configuração social, por meio dos mecanismos engendrados pelo capital para se reproduzir, a cognição, a reflexão e a concatenação das ideias se tornam dispensáveis? Elas regridem a estágios anteriores da evolução humana? Como se comporta o indivíduo que passa o maior tempo de sua vida no ambiente construído pela indústria cultural, que usurpa o trabalho cognitivo da construção de conceitos, e é enviado a outro em que ele é obrigado a pensar, a refletir, a colocar em prática um trabalho conceitual?

Bem, se o esquematismo nasce pela tentativa de Kant de solucionar o problema da consciência empírica em dissonância com a razão pura - isto é, as concepções de Descartes versus as dos empiristas -, este acaba sendo obrigado a deslocar os termos do debate para o entendimento humano da objetividade. No entanto, delimita tal entendimento ao âmbito das regras universalmente válidas, ao que ele chama de transcendental. É visível que tais regras podem ser sintetizadas pelo conceito de ciência no mundo moderno. Porém, a esse respeito, Adorno e Horkheimer (2006, p. 73) asseveram:

A verdadeira natureza do esquematismo, que consiste em harmonizar exteriormente o universal e o particular, o conceito e a instância, acaba por se revelar na ciência atual como o interesse da sociedade industrial. O ser é intuído sob o aspecto da manipulação e da administração. Tudo, inclusive o indivíduo humano, para não falar do animal, converte-se num processo reiterável e substituível, mero exemplo para os modelos conceituais do sistema. (...) Os sentidos já estão condicionados pelo aparelho conceitual antes que a percepção ocorra, o cidadão vê a priori o mundo como a matéria com a qual ele o produz para si próprio.

Desse modo, todo o trabalho cognitivo conceitual já fora executado antes mesmo que o sujeito viesse ao mundo, preparando-o com fins de dominação. Na contemporaneidade, com o advento do capital a cooptar a tudo e a todos para sua própria reprodução (homem, ciência e tecnologia), há uma “usurpação do esquematismo pela indústria cultural”, nos diz Duarte (2009, p. 08). Não obstante, seu resultado acaba por ser ainda maior. Pois, se em épocas anteriores, esse “trabalho do conceito” não estava de antemão preparado ao homem, fazia com que este fosse obrigado a realizá-lo sob regras ainda não universais. Ou seja, em razão da sobrevivência, havia a necessidade da execução de tarefas muitas vezes complexas que, para não perderem seus procedimentos, tinham por base a tradição oral; no entanto, não havia um sistema de regras e equipamentos absolutamente rigorosos, e muito menos a alienação dos indivíduos em relação ao que estavam produzindo. Além disso, para aqueles que não precisavam garantir sua sobrevivência por meio da atividade laboral, havia o estímulo social ao desenvolvimento intelectual. É possível afirmar que, diferentemente de hoje, eram absolutamente necessários e plausíveis a conjectura, a digressão, enfim, o processo cognitivo do indivíduo no sentido de entender, alterar, ampliar e tentar melhorar aquilo que estivesse fazendo, com base em determinadas regras apresentadas pela tradição, nos termos kantianos: esquematizar, para colocar em prática o seu entendimento a partir, é claro, da realidade encontrada à sua volta. Portanto, o verdadeiro esquematismo - aquele do indivíduo socialmente inserido em sua comunidade - era indiscernível da realização da vida, e as marcas dos indivíduos nos produtos realizados por meio desse esquematismo concretizado materialmente necessariamente ocorriam, assim “como os vestígios da mão do oleiro no vaso de argila” (Benjamin, 1989, p. 107) - algo impossível de ocorrer na atual fase tardo-capitalista.

Baseando-nos na seguinte afirmação de Adorno e Horkheimer (2006, p. 156): “mesmo como ego objetivado de maneira autônoma, ele só é o que o mundo objeto é para ele”, podemos vislumbrar um problema sério vivido por alunos e alunas para sua efetiva escolarização. É possível perceber nitidamente uma verdadeira contradição entre o ambiente em que se encontra mergulhada a consciência empírica individual fora da sala de aula - o ambiente da cultura de massas, do esquematismo usurpado pela indústria, mesmo com todas as lamúrias dos culturalistas que defendem a existência de um multiculturalismo - e aquele em que ela se vê confrontada no espaço escolar em suas atividades cotidianas. Pois, se dentro da sala de aula o indivíduo deve concentrar-se em um único objeto, perceber e compreender as regras universalmente válidas, praticamente reengendrá-las, colocá-las em prática, testá-las, enfim, realizar aquele esquematismo kantiano e, verdadeiramente experimentar, fora da sala, “a arte oculta nas profundezas da alma humana” (Kant, 1994, p. 184) foi descoberta e absorvida pelos “organizadores de dados das agências do capital” (Adorno e Horkheimer, 2006, p. 103), que, para dar continuidade à dinâmica da ampliação capitalista, abreviam e antecipam todo o processo de cognição dos indivíduos (o que inclui percepção e entendimento), condicionando-os a essa antecipação. A rigor, aquilo que Marx (1989, p. 81) denominou de “fetiche da mercadoria” engendra uma limitação para o processo cognitivo de cada indivíduo. Em um mundo que possui a reprodução ampliada do dinheiro como núcleo central para sua existência, a produção de imagens, sons e ideias se mantém quase que congelada em um mesmo ponto - que as torna idênticas -, requisitando a mínima necessidade da capacidade cognitiva para poder entendê-las, isto é, consumi-las. Como há uma identidade, a estrutura cognitiva para o entendimento é sempre a mesma, antecipada pelo próprio produto e sistema de trabalho - que, hoje, com os computadores pessoais, tablets e celulares padronizados em suas operações, possui seu treinamento mesmo antes de se trabalhar e até nos momentos de lazer. Essa é a estratégia utilizada pela indústria como um todo, mas principalmente a cultural, para assegurar a reprodução do valor e a expansão do capital. Desse movimento resulta um efeito direto no comportamento dos seres humanos, pois, como assevera Zuin (2007, p. 5): “Os produtores identificam-se libidinalmente com tais objetos. Já seus fetiches, elevados aos postos de senhores, não admitem mais ser reduzidos à condição de mero objetos”. Daí a “prisão” no circunscrito espaço da amplidão da cultura de massas e da indústria cultural em que vigora nenhuma exigência ao pensamento complexo e àquele diferente do que é erigido em função da pobreza da experiência das imagens produzidas para vender produtos. Sobre isso, nos afirma Benjamin (1984, p. 174-175):

desde o seu surgimento, a fotografia, e mais tarde o cinema, as revistas ilustradas e os jornais tiveram como características a pré-formação da percepção das pessoas, como um requisito necessário para a compreensão do sentido por eles pretendido. Segundo ele, “essas fotos [de Atget] orientam a recepção num sentido predeterminado. A contemplação livre não lhes é adequada. Elas inquietam o observador, que pressente que deve seguir um caminho definido para se aproximar delas. Ao mesmo tempo, as revistas ilustradas começam a mostrar-lhe indicadores de caminho - verdadeiros ou falsos, pouco importa. Nas revistas, as legendas explicativas se tornam, pela primeira vez, obrigatórias. É evidente que esses textos têm um caráter completamente distinto dos títulos de um quadro. As ilustrações que o observador recebe dos jornais ilustrados através das legendas se tornarão, em seguida, ainda mais precisas e imperiosas no cinema, em que a compreensão de cada imagem é condicionada pela seqüência de todas as imagens anteriores”.

Não há como deixarmos de considerar a impressionante evolução tecnológica que atualmente nos impacta. Mas também não podemos desconsiderar que seu caminho progressivo foi delimitado pelo capital. Ela, indiscutivelmente, alterou nossa capacidade perceptiva em correspondência ao nosso entendimento. Além de nos ter mergulhado num mundo unicamente composto por imagens que sempre nos direcionam - pois como nos disse, na citação acima, Benjamin: “a contemplação livre não é adequada” por isso “as legendas explicativas se tornam, pela primeira vez, obrigatórias” - ela também erigiu uma determinada forma única de pensamento. Isso é o que revelam as palavras do diretor de uma grande empresa brasileira, colhidas durante uma pesquisa:

As pessoas não precisam mais saber gerar informação, pois sua geração é automática. Precisam, sim, saber usar a informação. Caso a empresa não tenha tempo nem recursos para investir em treinamento, torna-se necessário fazer uma reciclagem dos quadros. Tenta-se mudar as pessoas, mas, se precisar, muda-se de pessoas. (Mendes do Carmo, 2011, p. 01)

Esse relato parece ter emergido das páginas de Adorno, pois exemplifica e reforça refinadas e perspicazes observações feitas por esse pensador ainda nos anos 1940, a saber:

No mundo da produção em série, a estereotipia - que é seu esquema - substitui o trabalho categorial. O juízo não se apóia mais numa síntese efetivamente realizada, mas numa cega subsunção. (...) Antes, o juízo passava pela etapa da ponderação, que proporcionava certa proteção ao sujeito do juízo contra uma identificação brutal com o predicado. Na sociedade industrial avançada, ocorre uma regressão a um modo de efetuação do juízo que se pode dizer desprovido de juízo, do poder de discriminação. (Adorno e Horkheimer, 2006, p. 166)

Se ponderarmos que “pensar é julgar”, então, segundo a análise acima, efetuada por Adorno e Horkheimer, habitamos um tempo e um lugar em que o pensamento foi abolido. Mais ainda, ao adicionarmos as taxativas argumentações do diretor do empreendimento comercial, registradas por Mendes do Carmo, podemos dizer que a cognição dos indivíduos está praticamente em desuso e enjaulada pela realidade externa, que só exige mínimos recursos operacionais em um único padrão (o uso da informação) que se repete para todos os objetos engendrados pelo aparato técnico. Parece-nos que a necessidade de erigir maiores concatenações desapareceu da face da terra no mesmo processo que engendrou incríveis descobertas e ganhos científicos. Assim sendo, haveria uma verdadeira contradição entre a exigência social da consciência empírica no mundo fora da escola e a demanda para essa mesma consciência no universo do currículo escolar. Neste último, as atividades cognitivas não seriam apenas funcionais ou operacionais, mas de construção, ou, nos termos de Kant (1994), de síntese de representações.

CONCLUSÕES

Podemos concluir este estudo apontando que o fenômeno conceituado por Adorno e Horkheimer (2006, p. 103) como “esquematismo da indústria” vai além do âmbito da indústria cultural e afeta de modo indiscutível percepção, sensações e entendimento dos indivíduos, estimulando nestes, ou habituando sua fisiologia a, um processo diametralmente oposto àquele necessário à escolarização formal. Como naquele momento os referidos autores se concentravam na crítica àquele objeto (a indústria cultural), essa ideia de esquematismo pareceu se limitar apenas aos produtos dessa indústria; no entanto, é possível perceber que tal esquematismo se inicia com a cientifização da produção industrial de mercadorias, anteriormente à produção “industrial” da cultura. Sendo assim, tal forma esquematizada de produção, com objetivos de gerar capital, produz um ambiente formativo - condições concretas de relações sociais, limites para o pensamento e para a ação, comportamento e relações entre os seres humanos ditos civilizados, atingindo um nível didático e pedagógico para todos esses, independentemente de sua idade - que não se coaduna àquele necessário para uma experiência condizente com a educação formal.

É possível dizer também que a aversão aos estudos e à cultura letrada, tão frequente não apenas entre os jovens como também entre adultos, talvez não seja apenas uma questão de capacidade de entender, elaborar e reelaborar os conceitos da ciência e da cultura letrada pelas pessoas que vivem nesses limites e condições engendradas pelo capitalismo, verdadeiramente entendendo-os, mas sim uma neutralização de tais conceitos, gerada como subproduto pelas relações sociais engendradas por esse esquematismo da produção industrial, no capitalismo tardio, para a vida cotidiana, ou seja, para essas próprias relações sociais.

Ainda concluindo, poderíamos argumentar que, com a expansão da racionalidade técnica instrumental, determinada pela lógica de produção e reprodução do capital, tal racionalização se tornou um instrumento para o desenvolvimento de produtos e processos sociais que obedecem a uma única fórmula para serem rapidamente vendidos: a simplificação de suas operações em seu uso cotidiano, pois se trata de objetos e processos destinados a diversão, entretenimento, ajuda e facilitação de tarefas diárias (sejam domésticas ou não). Com a usurpação do esquematismo kantiano pela indústria, compondo e condicionando a vida diária dos seres humanos numa base de brevidade e simplificação máxima de tarefas, isolamento, alienação e destituída da necessidade de concatenações encadeando as cognições em pensamentos complexos, podemos indicar uma contínua regressão, no mínimo, na capacidade de cognição dos seres humanos na atualidade.

Luc Ferry (2009) narra o desenvolvimento da teoria epistemológica de Kant a partir das ideias de Descartes e dos empiristas. Kant, percebendo os problemas de cada um desses sistemas, opta por uma inversão radical na abordagem para solucionar os impasses, verdadeiras aporias metafísicas e céticas, contidos em ambos, daí elabora o pensamento:

Ora, admitindo que o nosso conhecimento por experiência se guia pelos objetos, como coisas em si, descobre-se que o incondicionado não pode ser pensado sem contradição; pelo contrário, desaparece a contradição se admitirmos que a nossa representação das coisas, tais como nos são dadas, não se regula por estas, consideradas como coisas em si, mas que são esses objetos, como fenômenos, que se regulam pelo nosso modo de representação. (Kant, 1994, p. 22, grifos do original)

Se o modo pelo qual se organiza a percepção humana, “o meio em que ela se dá, não é apenas condicionado naturalmente, mas também historicamente” (­Benjamin: 1984, p. 169), isto é, a percepção é histórica, pois fruto de uma práxis social, então, a imersão dos indivíduos num mundo formado maciçamente por imagens habilitaria o entendimento de tais seres a processá-las com maior facilidade e significado, considerar como objetivo, do que textos escritos ou símbolos numéricos.

Desta forma, é factível dizer que são equivocados aqueles que aludem ao problema educacional apenas se referindo a elementos, atores e condições concernentes ao âmbito interno à sala de aula. Pois, se o aparelho perceptivo dos indivíduos está condicionado pelos produtos e pela dinâmica social e cultural engendrada pela indústria como um todo, e pela cultural em específico, a não reconhecer textos escritos de modo científico ou literário como significativos - e a ter enorme dificuldade em compreendê-los -, tais indivíduos, além de avessos ao próprio processo de reflexão - já que eles se habituaram à passividade diante dos produtos da indústria cultural, situação em que não há necessidade de fornecer nada de si mesmo aos objetos, apenas receber, produzindo o que poderíamos denominar de pseudoexperiência -, permitem-se, e se forçam de bom grado, visto que não há alternativa para a socialização, que a indústria cultural usurpe a sua atividade de esquematizar. Daí perguntamos: como tal sujeito pode se inserir com prazer e aproveitamento no mundo da educação escolar ou da cultura letrada se esta, em sua relação com os indivíduos, se aproxima e exige deles o que, novamente, Ferry (2009, p. 51) explica sobre a dinâmica cognitiva do esquematismo:

a concepção kantista do conceito como esquema representa uma verdadeira revolução. De fato, com ela o conhecimento deixa de ser pensado essencialmente como uma contemplação, uma theoria, e passa a ser pensado como uma atividade. Deixamos o vocabulário da visão para entrar naquele da ação: conhecer é “sintetizar”, ou, como diz Kant, “pensar é julgar”, ou seja, combinar as representações entre si seguindo certas regras. (...) Com Kant, o conhecimento não se definirá mais como “Ideia” (termo cuja etimologia remete ao registro da visão), mas como conceito, Begriff (termo cuja etimologia remete a uma atividade de síntese, a uma prática, pois significa “colocar junto”). (...) o pensamento aparece como uma construção, tema a ser retomado várias vezes pela epistemologia contemporânea, que, segundo a famosa frase de Bachelard, costuma sustentar que “nada é dado, tudo é construído”.

Se, como nos diz Adorno (2004, p. 01), “Reformas educacionais isoladas indispensáveis não trazem contribuições substanciais. Podendo até, em certas ocasiões, reforçar a crise, porque abrandam as necessárias exigências aos que devem ser educados e porque revelam uma inocente despreocupação frente ao poder que a realidade extrapedagógica exerce sobre eles”, é imprescindível, mas muitíssimo pouco realizado, a inserção da análise do modo de produção capitalista erigindo a “realidade extrapedagógica”, como ponto fundamental para entendermos o fracasso da educação escolarizada no Brasil, bem como em outras partes do planeta; como algo maior que apenas as desgastadas afirmações sobre professores malformados, currículos e didáticas equivocadas ou outras causas que dizem respeito apenas ao âmbito do ensino - e um efeito da natureza, isto é, relacionado à idade daqueles que frequentam a escola -, já que sobre tudo isso há uma vasta literatura que, em algumas vezes, resultou apenas naquelas “reformas educacionais indispensáveis”, as quais Adorno aludiu, porém, sem chegar a uma solução ou melhoria definitiva à educação formal. Portanto, tudo aponta para que os problemas educacionais não sejam oriundos apenas dessas causas pedagógicas e didáticas isoladas em salas de aula, nem em conjunto, mas sim como produtos, efeitos colaterais do próprio capitalismo em sua dinâmica de valorização do valor na produção de mercadorias, gerando uma cultura de indivíduos e sociedade conscientes e inconscientemente avessos à escolarização.

REFERÊNCIAS

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NOTAS

1 Aqui poderíamos utilizar o termo “naturalmente” para aludir a uma ação histórica determinando a natureza, já que a tão propalada (muitas vezes de forma leviana e irrefletida até pelos meios acadêmicos) “natureza humana” é eminentemente histórica.

2 De forma sucinta, Walter Benjamin explica sua ideia de experiência: “Onde há experiência no sentido estrito do termo, entram em conjunção, na memória, certos conteúdos do passado individual com outros do passado coletivo” (Benjamin, 1989, p. 107). Ainda para explicar o conceito que guarda em si este termo benjaminiano, os tradutores de “Alguns temas em Baudelaire” se reportam a outro autor brasileiro especialista em Benjamin: “Diz Leandro Konder, ‘Erfahrung é o conhecimento obtido através de uma experiência que se acumula, que se prolonga, que se desdobra, como numa viagem; o sujeito integrado numa comunidade dispõe de critérios que lhe permitem ir sedimentando as coisas com o tempo” (Benjamin, 1989, p. 146).

3 E aqui fica a lacuna para um debate extremamente importante, mas que não é nosso intuito neste ensaio e muito menos há espaço para tal, a saber: a tão incentivada, principalmente por empresas bilionárias, como também por incautos pseudoteóricos da educação, questão da tecnologia nas salas de aula como se fosse a panaceia para a educação formal.

4 Aqui, o termo empregado na tradução espanhola do texto de Adorno é “vulgarización”. Não há referências à educação, somente à formação de um modo pedagógico, que pode ser entendido como uma maneira didática de transmitir os conteúdos da música, literatura, ciência e arte como um todo, e não apenas do âmbito escolar realizar essa atividade. Em uma contribuição fundamental para o conhecimento do pensamento de Adorno entre nós, os Professores Newton Ramos de Oliveira, Bruno Pucci e Cláudia B. M. de Abreu realizaram uma tradução do texto “Halbbildung”. Em alguns momentos, esta última se afasta da versão espanhola, a qual também nos baseamos para a construção deste ensaio. Este é um deles. A tradução dos brasileiros substitui o termo espanhol “vulgarización” por “educação popular”. Optamos pela interpretação da expressão usada pelos espanhóis no contexto apresentado.

Recebido: 17 de Setembro de 2017; Aceito: 03 de Abril de 2018

Cesar Augusto Alves da Silva é doutor em psicologia escolar pela Universidade de São Paulo (USP). Professor da rede particular de IES de São Paulo. E-mail: cesaraa@usp.br

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