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Revista Brasileira de Educação

versão impressa ISSN 1413-2478versão On-line ISSN 1809-449X

Rev. Bras. Educ. vol.27  Rio de Janeiro  2022  Epub 25-Fev-2022

https://doi.org/10.1590/s1413-24782022270014 

Artigos

Análise dos movimentos de sentidos sobre trabalho pedagógico na pesquisa em educação

ANÁLISIS DE LOS MOVIMIENTOS DE LOS SENTIDOS SOBRE EL TRABAJO PEDAGÓGICO EN LA INVESTIGACIÓN EDUCATIVA

Liliana Soares Ferreira I  
http://orcid.org/0000-0002-9717-1476

IUniversidade Federal de Santa Maria, Santa Maria, RS, Brasil.


RESUMO

Relata-se pesquisa com professores sobre os sentidos de trabalho pedagógico na escola. Como técnicas de produção de dados, aconteceram entrevistas e pesquisa bibliográfica. Toda a pesquisa teve como fundamento teórico-metodológico a análise de movimentos de sentidos, que consiste no estudo aprofundado e comparativo dos discursos, visando a esclarecer os sentidos, os quais constituem as categorias analíticas. Na medida em que se aborda a pesquisa, também se descreve e indica como proceder na análise dos movimentos de sentidos na pesquisa em educação. A análise possibilitou, além do aprofundamento das categorias, compreender que os professores, sujeitos sociais, cuja historicidade e trabalho pedagógico produzem-se cotidiana e coletivamente, no ambiente, específico e dinâmico da escola, em seus discursos, denotam obnubilamento da compreensão de si e do seu trabalho, por não terem mais o tempo e o espaço para discursivá-lo.

PALAVRAS-CHAVE trabalho pedagógico; análise dos movimentos de sentidos; pesquisa; práxis

RESUMEN

Se informa de investigaciones con los profesores sobre los significados del trabajo pedagógico en la escuela. Como técnicas de producción de datos se realizaron entrevistas e investigaciones bibliográficas. Toda la investigación se basó en el análisis teórico y metodológico del análisis de los movimientos de los sentidos, que consiste en un estudio en profundidad y comparativo de los discursos, con el objetivo de esclarecer los significados que constituyen las categorías analíticas. A medida que se aborda la investigación, también se describe e indica cómo proceder en el análisis de los movimientos de los sentidos en la investigación en educación. El análisis permitió, además de la profundización de las categorías, comprender que los docentes, sujetos sociales, cuya historicidad y labor pedagógica se producen cotidiana y colectivamente, en el ámbito específico y dinámico de la escuela, en sus discursos, denotan la subestimación de la de su trabajo, porque ya no tienen tiempo ni espacio para hablar de ello.

PALABRAS CLAVE trabajo pedagógico; análisis de los movimientos de los sentidos; investigación; práctica

ABSTRACT

Research is reported with teachers about the meanings of pedagogical work at school. As data production techniques, interviews and bibliographic research took place. The whole research was based on the theoretical and methodological analysis of the analysis of movements of senses, which consists in the in-depth and comparative study of the speeches, aiming at clarifying the meanings, which constitute the analytical categories. As the research is approached, it is also described and indicates how to proceed in the analysis of the movements of senses in research in education. The analysis made it possible, in addition to the deepening of the categories, to understand that teachers, social subjects, whose historicity and pedagogical work are produced daily and collectively, in the specific and dynamic environment of the school, in their speeches, denote the understatement of their understanding and of their work, because they no longer have the time and space to talk about it.

KEYWORDS pedagogical work; analysis of movements of senses; search; praxis

INTRODUÇÃO

Nos estudos e pesquisas realizados, tem-se posto em relevo a descrição do trabalho pedagógico dos professores na escola, problematizando-o em relação às políticas educacionais, a um imaginário da profissão, aos discursos cotidianos ouvidos e proferidos sobre esse trabalho, e, sobretudo, a uma perspectiva teórico-metodológica. Mesmo perpassados pela subjetividade, os discursos indicam uma posição social e uma posição que o próprio sujeito1 se atribui, na mediação com a objetividade que lhe exige o seu trabalho, com as diretrizes da instituição que o emprega e na qual trabalha2.

A abordagem de trabalho pedagógico implica pensá-lo como conceito: o que significa a expressão, sua descrição, e como categoria: como está articulada nos discursos dos professores, interlocutores dos estudos e pesquisas realizados? Esse apontamento faz-se fundamental para que se entenda que não é um ou outro, mas ambos. Trabalho pedagógico é tratado como conceito e como categoria de análise.

Cabe, de início, explicar que o conceito de trabalho pedagógico referido tem características atinentes e decorrentes da Pedagogia. Nessa perspectiva, o “pedagógico”, como qualificação e potencialidade, é sempre político, por implicar escolhas e ações humanas, dentro dos contextos sociais onde acontece. E, ainda, se trata de trabalho, mas o adjetivo “pedagógico” lhe caracteriza e este, como modulador, abriga o conjunto de características que interferem e potencializam a produção do conhecimento, desde a infraestrutura escolar até a convivência entre professores e estudantes, das cores que decoram o ambiente à organização da aula, passando por todos os aspectos culturais, políticos e sociais que possibilitam haver uma relação entre sujeitos que visam a conhecer. Com base nessas considerações, se pode sistematizar, inicialmente, uma concepção de trabalho pedagógico como sendo todo o trabalho dos professores na escola, nos contextos social, político e cultural, pretendendo produzir conhecimento (Ferreira, 2017).

Sem perder de vista esses prolegômenos, o objetivo deste texto foi, ao mesmo tempo, sistematizar pesquisa com professores sobre o seu trabalho pedagógico e apresentar como foi realizada a pesquisa, tendo por base a Análise de Movimentos de Sentidos (AMS). Essa dupla intenção é tratada associadamente na argumentação, como uma espécie de metalinguagem, em que se aborda a temática, relata a pesquisa e explica-se como se procedeu ao pesquisar.

Importante destacar que o propósito da investigação ora sistematizada neste artigo consistiu em atribuir sentidos aos discursos de professores sobre o seu trabalho pedagógico. Para tanto, foram analisados os discursos de interlocutores, os quais vivenciam posições marcadas pela subjetividade, pelas características da profissão e pela inclusão e pertença à escola. Em toda a investigação realizada, a historicidade foi entendida como elemento determinante e transformador dos discursos sobre educação, ao configurar a dimensão social que opera na articulação destes, passando a estabelecer os valores culturais intervenientes na elaboração subjetiva dos sujeitos.

O grupo de interlocutores foi composto por professores da Região Central do estado do Rio Grande do Sul, homens e mulheres, que participaram de entrevistas realizadas nos últimos anos, sendo 70% com mais de 30 até 56 anos. Os interlocutores atenderam o convite e inscreveram-se para participar da pesquisa3. Os critérios de seleção foram trabalhar nos anos finais do Ensino Fundamental da rede pública e ter concluído uma licenciatura. Tais critérios se justificam como um modo de criar certa característica comum entre os entrevistados e, em decorrência, por serem elementos intervenientes nos sentidos sobre trabalho pedagógico, na medida em que criam pertença4 a um grupo de trabalhadores, o de professores graduados e trabalhando no Ensino Fundamental, do sexto ao nono ano, da rede pública de educação. Outro destaque diz respeito ao fato de os interlocutores da pesquisa serem denominados por nomes fictícios, escolhidos por eles, com o intuito de proteger suas identidades reais.

Quanto ao procedimento de pesquisa, realizou-se um estudo, tendo a entrevista como técnica de produção de dados, composta por perguntas semiestruturadas. Realizou-se, ainda, pesquisa bibliográfica. Após, aconteceu a análise dos dados. Todo esse processo orientou-se pela AMS, esclarecida a seguir.

Para a produção de dados, inicialmente, aconteceu o estudo de diversas obras, cujos autores consideram o trabalho como categoria essencial para explicar o social. Leitura perscrutadora no início, na medida em que significada nas discussões promovidas pelo grupo de estudo, ia, paulatinamente, revertendo-se em crítica e subsídio à análise do social. Processou-se uma elaboração conceitual. Dessa leitura, decorreu a seleção de índices de análise iniciais e, com elas, formulou-se a entrevista, tendo sua centralidade nas perguntas semiestruturadas e nas características da entrevista reflexiva (Szymanski, Almeida e Prandini, 2011). Agindo assim, permitiram-se intervenções, retomadas, interrupções, esclarecimentos, enfim, ações objetivando uma efetiva interação entre os sujeitos: os que ocupam o lugar de pesquisadores e o de interlocutores.

As perguntas que compuseram a entrevista apelavam para que os professores descrevessem seu trabalho pedagógico, as condições sociais em que realizam esse trabalho, suas percepções/compreensões e interpretações desse trabalho, além das características gerais quanto aos processos educativos que concluíram para trabalhar, faixa etária e tempo de emprego como professores. Em acordo com a AMS, as entrevistas foram lidas diversas vezes e organizadas conforme a idade e a autodescrição dos interlocutores; após, levou-se em conta o curso de graduação e a área de trabalho; as similaridades na escolha das palavras para organizar o discurso; e por último, a recorrência das palavras, indicando posições em acordo e em desacordo. Passou-se, então, à segunda fase, momento de analisar os movimentos de sentidos nos discursos, a partir das organizações discursivas antes descritas.

Toda essa ação visou à “reapropriação do real” (Wachowicz, 2001, p. 176), por meio da análise, um processo essencialmente dialético. Tais perspectivas e procedimentos de pesquisa exigiram manter presentes os fundamentos que orientaram a investigação, o que resultou, imbricadamente, em uma leitura dos sentidos, os quais, genericamente (dadas as características deste texto), passa-se a descrever.

Na primeira seção deste artigo, caracteriza-se o aporte teórico e metodológico, a AMS, destacando as categorias e descritores aplicados no processo de produção, leitura e análise dos discursos. Pressupondo-se a especificidade da metodologia de produção e análise dos dados, dedica-se parte do texto a descrevê-la. Por esse motivo, esse trecho tem preponderância sobre os demais, uma vez que caracteriza a pesquisa e, simultaneamente, expõe crenças e processos teórico-metodológicos. Na continuidade, analisam-se os discursos relativos ao trabalho pedagógico, destacando-se os sentidos e relacionando-os aos discursos dos professores, ainda que excertos dos discursos integrem e sejam abordados nas demais seções. Seguem considerações finais que alinhavam a argumentação.

APORTES TEÓRICO-METODOLÓGICOS: A PESQUISA E ELEMENTOS DA ANÁLISE DOS MOVIMENTOS DE SENTIDOS

Como referencial teórico-metodológico para subsidiar o estudo dos discursos dos interlocutores da pesquisa, recorreu-se à AMS, entendida como uma maneira de estudar dialética, aprofundada e criativamente os dados. De acordo com Löwy, Marx caracterizou a dialética como diferenciada de uma análise positivista5 porque ensejaria compreender os fenômenos sociais e políticos, organizados em acordo com as “chamadas leis da economia e da sociedade”. Além de compreendidos, poderiam ser transformados, porque essas leis “[...] resultam da ação e da interação, da produção e da reprodução da sociedade pelos indivíduos e, portanto, podem ser transformados pelos próprios indivíduos num processo que pode ser, por exemplo, revolucionário” (Löwy, 1988, p. 15).

Cabe esclarecer também que se refere à AMS como um fundamento teórico-metodológico, cuja centralidade está no discurso, “[...] entendido como materialidade possível de ser analisada em suas contradições, movimentos, sentidos, indicando por meio destes, suas características, que podem ser sintetizadas sob a forma de categorias” (Ferreira, Cezar e Machado, 2020, nota de rodapé 5). Discursos são manifestações humanas indicando o lugar que os interlocutores se atribuem como trabalhadores e seres sociais:

Tratam-se de enunciados organizados e expressos pelos sujeitos, mediante uma intencionalidade, um objetivo em relação aos interlocutor(es), preestabelecido e teleologicamente elaborado, porque antecipam reações, compreensões, interações a serem alcançadas por meio da organização expressiva da linguagem. Discursivar, primeiramente, é repartir-se no social, indo ao encontro do outro, seja para compartilhar, seja para contrariar. Essa dimensão do discurso é que o consubstancia como produção social. Pelo discurso, os sujeitos narram, descrevem, planejam, projetam, avaliam, reconstroem e registram seu trabalho. (Ferreira, 2020, p. 4)

Por abordar os sentidos em seus movimentos, a AMS viabiliza a inserção criativa ao investigador, impelindo-o a um entendimento ativo do mundo, não como este se revela, mas como se transformou ou transformará e pode ou poderá ser. Nesse aspecto, extrapola os modelos investigativos originários do positivismo, reconfigurando os fenômenos por sua característica social e humana, além de tornar os pesquisadores, ao interagirem com os interlocutores ou artefatos pesquisados, protagonistas, cujas escolhas e análises atribuem-lhe maior implicação na pesquisa.

Então, sentidos são, na perspectiva da AMS, anteriores às categorias. Estas configuram-se em um estágio de estabilidade, ou seja, são um significado mais abrangente, que perpassa os textos, palavras, discursos. Pondera-se que estão relacionadas ou indicam que os sujeitos se encontram sob determinações. Para entender essas determinações, as categorias configuram-se na chave, na medida em que indicam aspectos discursivos relativos ao viver, e, portanto, ao trabalhar.

Relevante esclarecer que, nesse contexto, a noção de conhecimento, objeto do trabalho pedagógico dos professores, é relacionada à produção social, que se dá em ambientes de linguagem. Em tais ambientes, os sujeitos produzem linguagem para expressar saberes, os quais, mediante diálogo, compõem-se, decompõem-se, transformam-se, reorganizam-se, enfim, são significados naquilo que a linguagem, se consideradas suas marcas ideológicas, permite acessar. A formulação e apreensão desse significado, isolando-o, dependem, obviamente, de certo grau de subjetividade, que faz os sujeitos perceberem esse ou aquele significado. Todos esses aspectos que caracterizam a produção do conhecimento e, nela, os processos de interpretação, encontram-se pressupostos na realização de uma pesquisa e dessa pesquisa, em especial. A leitura e a releitura dos discursos possibilitaram a descrição das categorias e, estas, constituíram-se em evidências do estágio do conhecer em que se encontram os sujeitos.

Para dirimir os índices de subjetividade, nessa etapa de categorizar, teve-se por base um referencial, um pressuposto contido, no caso desta pesquisa, já na pergunta feita aos interlocutores. Ainda que essa pergunta possa ter sido reelaborada quanto à escolha vocabular, dado o caráter de reflexão que perpassa o processo de entrevistar, em seu argumento, traduz já as categorias basilares e de interesse da investigação, também antevistas ao formular a problematização. As categorias, assim, incluem os elementos discursivos comuns, a constituição de princípios seletivos desses elementos, a percepção de sua validade e adequabilidade, tendo como parâmetro o aporte teórico-metodológico. Nesse processo, como estratégias, aplicam-se:

  • seleção;

  • disposição dos itens selecionados em tabelas organizativas, criadas para esse fim;

  • leitura e análise do material.

As tabelas não costumam ser apresentadas nas sistematizações, mas foram primordiais para organizar, e, em consequência, analisar os dados que estão na base dos argumentos, configurando-se em modos de pensamento, análise, estudo e argumentação.

Logo, objetivou-se entender os movimentos entre a totalidade e o específico, entre causas e consequências, os contraditórios, as recorrências, destacando as evidências orientadoras de argumentos e defesas, além de sistematizações relativas à problematização originária dessa pesquisa. Localiza-se tal opção quanto ao que se julga significativo para compreender o trabalho pedagógico escolar: analisar os discursos dos interlocutores, lendo os sentidos sobre seu trabalho, inserindo-os na totalidade social, nas relações sociais de produção, na mediação entre o sujeito e sua pertença a coletivos sociais. Frisa-se que totalidade é uma categoria fundamental para a AMS, entendida como a compreensão e a associação entre duas pressuposições:

[...] de um lado que, a realidade objetiva é um todo coerente em que cada elemento está, de uma maneira ou de outra, em relação com cada elemento e, de outro lado, que essas relações formam, na própria realidade objetiva, correlações concretas, conjuntos, unidades, ligados entre si de maneiras completamente diversas, mas sempre determinadas. (Lukács, 1967, p. 240)

A totalidade, em relevo na análise, implica que os fenômenos sejam estudados somente se vinculados ao “desenvolvimento das classes sociais, da história, da economia política” (Löwy, 1988, p. 16).

Portanto, com base na AMS, pretendeu-se criar parâmetros de análise capazes de superar as bases assentadas nas impressões, nos julgamentos e nas cogitações, buscando-se evidências comprováveis dentro do discurso relativo à totalidade social. A concepção de evidência refere-se ao que está latente e, posto em análise, faculta interpretação e compreensão e, como tal, evidencia-se primordial para o entendimento do discurso e, nele, no caso, dos sentidos sobre trabalho pedagógico.

Quanto à sua operacionalidade, diferenciam-se as categorias que integram o método e as categorias que compõem o escopo da pesquisa, evidenciadas já na problematização. A interpretação, portanto, está implicada por esses dois níveis de categorias. Essa distinção encontra respaldo em Wachowicz (2001), quando a autora delineia as “categorias de conteúdo”, elaboradas pelos pesquisadores desde a problematização e as “categorias metodológicas”, que são

[...] aquelas que constituem a teoria que vai informar a maneira pela qual o pesquisador trabalha o seu objeto. Se ele contextualiza seu objeto, então estará respeitando a categoria metodológica de historicidade. E se ele optar pelo estudo de seu objeto na relação que se estabelece em seu pensamento, entre os aspectos pelos quais tomou esse objeto, e verificar que as relações assim estudadas se apresentam numa relação de tensão, então terá chegado à dialética, que é uma concepção que tem nessas categorias metodológicas as suas leis principais: a contradição, a totalidade, a historicidade. (Wachowicz, 2001, p. 5)

Reitera-se que não se está defendendo as categorias como síntese de sentidos possíveis se relacionadas à totalidade, à pertença social dos sujeitos, enfim, à sua realidade, no trabalho e a partir dele.

Também não se está insinuando a dissociação entre os sentidos e os seres. Os seres humanos produzem sentidos e os mantêm como manifestações, orientando-se por eles e reorganizando-os, na medida em que vivem, interagem e produzem conhecimentos. Dito de outra forma, os sentidos são sociais, no espaço e tempo no qual os sujeitos, por meio da linguagem, descrevem compreensões do mundo, sistematizando-as, apropriando-se delas, sob a forma de conhecimentos. Para tanto, foram desconsiderados, na análise, os sentidos em, somente, sua perspectiva individual, mas no que eles têm de coletivo e em suas condições de produção. Ou seja, os sujeitos, interlocutores da pesquisa, embora sejam entrevistados cada um como individualidade, são compreendidos como representantes de uma classe social, marcada por suas contingências, por sua historicidade, por seu trabalho e por seus lugares sociais, a partir de onde elaboram os sentidos que compõem os seus discursos. Isso porque, nessa perspectiva, a categoria implica nos sentidos em sua forma social, circulando pelo social.

Ao fazer referência à concepção de classe social, acrescenta-se outra, a de consciência de classe. Mais que a pertença, importa o conhecer e o saber próprio do grupo. Segundo Braverman (1987, p. 36), “[...] uma classe não pode existir na sociedade sem manifestar em algum grau uma consciência de si mesma como um grupo com problemas, interesses e expectativas comuns [...]”. Essa manifestação, de caráter discursivo, é perpassada por influências culturais, econômicas e, inclusive, por influência de outra classe, com predisposição a ficar imersa, obtusa ou não revelada. Os professores, por exemplo, raramente participaram da formulação de políticas educacionais e demais diretrizes para seu grupo de trabalhadores por séculos a fio, iniciando um processo de coesão, sindicalização e luta por melhores condições de trabalho somente nas últimas décadas, ao qual se tem acesso por meio dos discursos dos professores em suas manifestações ou mesmo em publicações de seus sindicatos e organizações.

Destarte, a AMS, em sua complexidade, pressupõe que: “Uma vez que não existem princípios eternos, nem verdades absolutas, todas as teorias, doutrinas e interpretações de realidade têm que ser vistas na sua limitação histórica” (Löwy, 1988, p. 15). Portanto, a historicidade, tida como elemento próprio da análise, remete os pesquisadores para a “[...] transitoriedade de todos os fenômenos sociais [...]” (Löwy, 1988, p. 11). Se pautada pela historicidade, afirma-se que a significação é, portanto, social. Pode-se concluir que as categorias, esses compostos evidenciados nos discursos e decorrentes dos sentidos, refletem, relacionam-se e são resultantes das interações sociais.

Por essas razões, reitera-se que o social se trata de elemento indeclinável para a interpretação, pois contém em si o movimento do significar e do interagir. Por isso, nesse contexto, e devido à participação nele, acontecem os processos de análise e interpretação dos discursos dos interlocutores da pesquisa.

Em decorrência desses pressupostos, teve-se na investigação ora relatada, com base na AMS, os seguintes índices para categorização:

  • • trabalho, genericamente, e trabalho pedagógico, especificamente: os seres humanos, produzem a cultura e se autoproduzem, trabalhando, enquanto vivenciam o modo de produção geral, aquele que organiza a sociedade. Entretanto, produzem no espaço individual, no espaço de si. Os sentidos que atribuem ao que vivem configuram-se em uma confluência desse movimento entre o social, o geral, o seu trabalho e sua individualidade. Nessa confluência, encontram-se, além dos sentidos, os conhecimentos, assim com as imagens, o simbólico, sem uma separação absoluta, delimitadora dos aspectos relativos ao social e os aspectos gerados no particular, pois estão imbricados e continuamente se renovando. O individual aqui citado, somente possível na relação com o coletivo, existe pertencendo a um geral e sendo parte desse geral. O individual abrange singulares que o compõem e vão gerando características perceptíveis do mesmo modo em outros individuais, tornando-se coletivos, grupos de pertença. Ainda, o geral é um conjunto de particulares, cada qual com suas características e desafios.

  • Portanto, no processo de categorização, levou-se em conta que existem, implicados, valores semânticos relativos a essa concepção geral de trabalho e o individual, no caso dos professores, de produzir o trabalho pedagógico, orientadores de todo o discurso. São indicados sentidos que são de âmbito geral, perpassando os discursos, e os que são próprios de determinadas culturas, entre elas, a cultura escolar. Outros são restritos a algumas culturas, por exemplo, a cultura escolar de uma escola específica. Exemplifica-se com o sentido de trabalho pedagógico dos professores, o qual se apresentou de forma restrita nos discursos. E há um sentido abrangente, enunciado como consenso entre os estudiosos da área: “o de trabalho dos professores”, por exemplo. Apreender a tensão entre esses sentidos significa um movimento entre o geral e o particular, entendendo-os em sua relação com quem disse e por que o disse, portanto, em conjunto com os aspectos históricos e ideológicos que os constituem.

  • A interpretação, tendo em vista o individual e o coletivo como par dialético, permite os critérios de avaliação e julgamento dos fenômenos (em sua acepção mais ampla, tudo o que acontece). Paradoxalmente, julgar é uma forma simples de pensamento, revelando, aparentemente, reduzir e nivelar os fenômenos apenas ao âmbito do particular, tido como modelo, como verdade, ainda que pertençam ao geral. Ao ampliar o juízo, tentando aplicá-lo igualmente ao geral, acaba-se por imprecisá-lo, ocorrendo, não raramente, generalizações apressadas, um argumento falacioso. Muitas vezes, os interlocutores da pesquisa, em seus cotidianos, movimentam-se entre juízos particulares e gerais, transitando entre eles e apropriando-se deles para organizarem os sentidos evidenciados em seus discursos, sem condições de analisá-los como evidências também de si. Nesse viés, a AMS apresenta-se como uma rica possibilidade de, por meio das técnicas para comparar, interpretar, analisar, encontrar evidências da compreensão dos discursos no cotejamento com os sujeitos que os produzem em seus contextos de pertença.

  • • sentidos: objetivando serem apreendidos, os fenômenos são formulados e reelaborados pelos sujeitos na linguagem, produzindo-se, por conseguinte, o conhecimento. Conhecer implica produzir linguagem sobre os fenômenos (Ferreira, 2017). Implica não somente entender o fenômeno, mas entender sua mudança contínua, em meio a outros fenômenos geradores ou gerados por aquele que é objeto do conhecer. Percebem-se relações de sentidos (pluralizadas, pois são múltiplas) entre os discursos. Sentidos, então, podem ser explicados como “[...] elaborações alteráveis e o significado se configura em um sentido com mais estabilidade e precisão” (Ferreira, 2020, p. 12).

  • Interpretar os discursos dos interlocutores da pesquisa - dos professores, por exemplo - permite visualizar os movimentos de sentidos quanto a seu trabalho pedagógico e à sua condição de sujeitos. Por sua vez, estes movimentos facultam observar e interpretar os discursos relacionando-os aos sujeitos. Nesse estudo, por meio da linguagem, os sentidos percebidos indicam a interação entre os sujeitos, as compreensões dos fenômenos, os discursos, as percepções da totalidade, modificando-se mutuamente.

  • • os contraditórios: os sentidos, nos discursos, por serem evidências de si e/ou sobre o geral, revelam elementos em embate com as características de fenômenos diferentes entre si. Estão em embate, pois negam e afirmam, construindo e desconstruindo-se, revelando mais sobre os sujeitos, culturas e vivências, do que propriamente sobre os fenômenos. Aplicados à compreensão do social, indicam referências quanto a mudanças e, destarte, quanto ao contínuo movimento que se espera dos coletivos articulados, como, por exemplo, o grupo de professores dentro de uma escola. No processo de analisar os sentidos subjacentes nos discursos dos interlocutores da pesquisa encontraram-se também as relações que esses sujeitos estabelecem no interior de uma elaboração. Tais relações revelam suas formulações políticas e, por isso mesmo, profissionais, posto serem as referências às profissões a soma das formulações políticas dos sujeitos, sobretudo as relativas ao campo da educação.

Assim procedendo, em acordo com os pressupostos antes descritos, pode-se passar a outra etapa na análise, pois, após categorização, há a explicitação do lido e sua correspondente teorização, que indicará essa compreensão dialética facilitada pela AMS nos discursos dos interlocutores. Tal ação, mais uma vez, exigiu parâmetros de validade, credibilidade e fidedignidade, facilitados em muito pelo processo de categorização, no modo como foi explicitado.

SENTIDOS EM MOVIMENTO NOS DISCURSOS DOS INTERLOCUTORES DA PESQUISA

Reitera-se a importância de ouvir, ler e interagir com os professores acerca de seu trabalho pedagógico. Tendo oportunidade para expor discursos sobre seu trabalho, os professores lidam com o material simbólico com o qual orientam seus movimentos e, dificilmente, em seus cotidianos atribulados, discursam sobre esse material. O discurso é, nesse contexto, uma produção e, como tal, são os próprios professores assumindo-se como professores, projetando ao social os sentidos que estão na base do trabalho pedagógico realizado.

Tendo em vista esse contexto, como já mencionado, os sentidos, lidos e analisados nos discursos, em movimento, no social, geraram categorias. Estas, uma vez agrupadas, foram estudadas e as análises estão expressas nos argumentos a seguir:

SENTIDOS DO INDIVIDUAL PARA O COLETIVO E DESTE PARA AQUELE: TRABALHO PEDAGÓGICO NA ESCOLA (DIALÉTICA DO SOCIAL/INDIVIDUAL)

No intuito de caracterizar a escola, resgatam-se as observações de Santomé quanto a um crescente processo de mercantilização não somente de cada instituição, mas de todo o sistema escolar, assentado em quatro pontos: “descentralização; privatização; favorecimento do credenciamento e da excelência competitiva; naturalização do individual recorrendo ao inatismo” (Santomé, 2003, p. 39). E Pérez-Gómez similarmente adverte com referência à mercantilização das práticas escolares:

A cultura concebida como pura mercadoria perde sua identidade essencial como manifestação de diferença de formas de vida, como valor de uso na satisfação singular de necessidades para se converter em puro valor de troca. O sincretismo que requer o livre mercado trivializa tudo, dissolvendo o valor singular das identidades morais, artísticas, políticas ou culturais em simples manifestações descontextualizadas que se exibem nas vitrinas do supermercado mundial. (Pérez Gómez, 2001, p. 94)

Para contribuir nessa descrição de escola, cabe lembrar que essa instituição se insere em um contexto social capitalista onde se desenvolve o conceito da educação como bem de consumo, o que implica promover uma mentalidade consumista em seus usuários e usuárias: professores e estudantes. Esse conceito estimula a perceber o trabalho escolar e as ofertas de educação a partir do ponto de vista de consumidores e consumidoras, isto é, levando em conta unicamente o seu valor de troca no mercado, os benefícios dessa ou daquela disciplina, especialidade ou título resultante do processo educativo escolar. Um dos interlocutores da pesquisa descreve o trabalho dos professores como um meio para o alcance de um objetivo demandado pela sociedade capitalista:

[...] é uma coisa muito ampla para ser definida em algumas palavras, mas eu vou tentar. Eu acho que esse trabalho é além de transmitir o conhecimento, também é uma formação de opinião, de valores, principalmente nós que trabalhamos com Ensino Fundamental. Então, é uma coisa assim, de muita responsabilidade. Se tu deixares de abordar algum tema, alguma coisa, por exemplo, se tu trabalhas com História e não trabalhares muito algum aspecto o estudante seguirá com esta lacuna para o mercado de trabalho. A gente não consegue fazer tudo, apesar de a educação ser uma coisa contínua, mas a gente sempre tem que fazer o que puder, para não ser cobrado por deixar de ensinar o estudante, por exemplo, a passar no vestibular. (Professor José)

O trecho do discurso do Professor indica um comprometimento do seu trabalho pedagógico com um resultado final para além da escola. A vivência escolar é, nesse prisma, preparação para esse além dela. Resulta que a instituição escolar se torna imprescindível como recurso para obter, no futuro, importantes benefícios privados, para favorecer individualmente (Santomé, 2003). Por tais motivos, Santomé critica a mídia, sobretudo alguns programas televisivos, que denomina alarmistas, incitando a violência e o negativismo, ao lado de discursos ideológicos que apregoam o caos e chegam facilmente à mídia, apontando para um trabalho centrado no sujeito. Após a denúncia, o autor revela-se otimista e entende ser possível transcender esse caos divulgado, ao se pensar que há sentido para a educação, mesmo no contexto neoliberal, podendo também se aplicar às vivências mais recentes, esse período de pandemia causada pela COVID-196, que modificou substancialmente a vida, as relações e o trabalho humanos:

Educar significa oferecer a cidadãos e cidadãs conhecimentos e habilidades para analisar o funcionamento da sociedade, e para poder intervir em sua orientação e estruturação. Isto inclui também gerar capacidades e possibilidades de obter informações para criticar esses modelos produtivos e essas instituições do Estado quando não funcionam democraticamente e favorecem os grupos sociais mais privilegiados. (Santomé, 2003, p. 38)

Dentro da escola, contratados por esta ou pelo Estado, os professores compõem um sistema organizativo e trabalham em acordo com orientações, planejamentos, regulamentos dos quais nem sempre participam da elaboração. Sua autonomia e capacidade de trabalho parecem determinadas por fatores externos às suas escolhas. Reproduzem os efeitos do sistema capitalista sobre sua vida, naquilo que tem de mais perverso: a perda do direito de gerenciar e aplicar os conhecimentos da ciência com a qual trabalham.

Em decorrência desses impactos, sobre os quais, nem sempre podem refletir, quanto ao aspecto participação na coletividade, a escola, os professores se sentem seres isolados, ainda que vivam o coletivo cotidiano. Talvez se sintam e assim se apresentem porque há certa resistência demonstrada em continuar isolado em meio a discursos pregando o coletivo, a pertença e a inserção. Fala-se resistência para explicitar aquele desejo inconsciente de não se comprometer, permanecendo no lugar comum. Tal percepção ocorre quando os discursos dos interlocutores afirmam serem coletivas as decisões, com a implicação de todos, porém o agir profissional ainda é solitário.

Bom, o meu trabalho é tentar transmitir o saber acumulado pela sociedade e tentar trabalhar a consciência sobre a manutenção da vida. Aqui na escola, temos um projeto coletivo sobre valorização da vida. Há várias atividades coletivas, mas eu faço minha parte dentro da minha aula, em acordo com meu planejamento. Preocupa o quanto os jovens não dão valor à vida. Passamos anos ensinando a cuidar-se, cuidar o outro, ser cidadão, ser responsável. Então, um dia, eles pegam o carro dos pais e saem em alta velocidade, acabam causando acidentes. Tudo isso parece voltar para nós, para nosso trabalho: “No que eu falhei como professora? Por isso, em meio a minhas aulas de Ciências, eu falo muito no valor da vida”. (Professora Rochele)

Dito de outra forma: os professores relatam que já conseguem planejar coletiva e solidariamente; no entanto, em sala de aula, agem individualmente. Do ponto de vista do grupo de professores entrevistados, há o real e um plano para agir quanto a esse real. Por sua vez, individualmente, dentro da sala de aula, há uma repetição que remete à inércia, à falta da almejada mudança, abrindo espaço para uma queixa que também se repete, gerando cada vez maior queixa e menos ação coletiva. No espaço da queixa, fica subsumido o lugar para a ação. A queixa pode acomodar e gerar a impressão que, dessa maneira, os sujeitos estão contribuindo, pois estão denunciando. A queixa assemelha-se a uma denúncia, todavia, é aparente, pois não se converte em discurso crítico no sentido de propor análise, interpretação e ação decorrentes do observado e denunciado. Neste ínterim, o trabalho pedagógico tende a continuar igual, repetitivo, restando o desigual, inovador e sem rotina somente para aqueles que conseguem transgredir e impor a não-acomodação, aprendendo a trabalhar em conjunto, sem lugar preponderante para a queixa.

Outro aspecto aplicado nos discursos, até inconscientemente, para a acomodação em vez de para a crítica e, desta, para transformar, foi a intensificação do trabalho, esse processo imerso e acentuado pela sociedade capitalista no atual estágio. Sabe-se que, para conseguir melhorar seu salário, os professores têm se desdobrado em dois a três turnos de aula (esse aspecto foi destacado nas entrevistas). Nem de longe indica ser uma situação simples, ao contrário, gera a insatisfação de não estar inteiramente em uma escola e dela participar, integralmente, pertencer. Há dificuldade em driblar o tempo, pois isto é humanamente impossível, assim, buscam adequá-lo. A ação e o planejamento em conjunto foram mencionados como alternativas para esse redimensionamento temporal, ainda mais quando se trata de uma ação solidária, no coletivo, somando esforços, articulando momentos, discursos e condições. Os interlocutores indicaram desejar realizar um trabalho caracteristicamente pedagógico e visam a permanência, a convivência e oportunidades de debater dentro da escola, e que essa passe a ser entendida como comunidade acadêmica, objetivando:

[...] um trabalho mais integrado em torno de objetivos comuns, potencializando características individuais que se tornam vetores para a produção coletiva do conhecimento. Na comunidade, então, vai-se além, produzindo-se o entrecruzamento de leituras, argumentos, experiências, subjetividades que, ao se movimentarem, se recriam e demandam análise, interpretação e sistematização. (Ferreira, 2017, p. 106)

Em suma, depreendeu-se dos discursos que a escola se constitui, prioritariamente, no tempo e no local de trabalho dos professores, que, “por sua finalidade e por sua natureza peculiar, supõe critérios especiais de organização. Tais critérios devem ser estabelecidos a partir das características do trabalho que ali se desenvolve” (Silva Júnior, 1995, p. 21). Nesse tempo e local, em movimentos dialéticos do individual para o coletivo, os professores desenvolvem seu trabalho pedagógico.

OS CONTRADITOS: SENTIDOS OBNUBILADOS PELA (NÃO)PERCEPÇÃO DE PERTENÇA (DIALÉTICAS DO TRABALHO COMO PRÁXIS E DA PROFISSÃO IMPLICADAS NO TRABALHO PEDAGÓGICO)

Na escola, estão associados, no imaginário, o trabalho que os professores realizam e o trabalho pedagógico que acreditam que deveriam realizar para atender às demandas lidas no social. E uma interlocutora, descrevendo seu trabalho quanto a esses aspectos, se manifestou:

Eu acho que se espera dos professores, além de mediar o conhecimento, fazer com que o aluno pesquise, aprenda, leia, escreva, enfim, tem um papel de auxiliar como puder na construção dos valores. Eu acho que esse é o papel de mais responsabilidade até porque forma o ser humano. Isso se nós, professores, conseguíssemos realizar tal trabalho. Também porque o conhecimento é muitíssimo importante, mas o conhecimento tu adquires hoje até pela Internet. Tem a formação de valores, prevista no PP, que exige um adulto bem comprometido para passar o que é certo, o que ele acha, o que a sociedade considera como certo. (Professora Ângela)

Uma leitura desse trecho do discurso de uma das professoras entrevistadas, autoriza a observar que os objetivos que atribui a seu trabalho se configuram em objetivos alheios: do social, do estudante, das políticas públicas. Os profissionais entendem ser sua atribuição propor condições para a produção do conhecimento, criar desejos e faltas quanto ao aprender, mas esperam do estudante, o outro sujeito, que revele ter aprendido. Talvez, em consequência, por vezes, percebem-se distanciados ou sem segurança quanto à eficácia de sua produção e desconectados da historicidade profissional.

Observou-se, também, que os professores, interlocutores da pesquisa, caracterizam-se como profissionais, todavia, denotando uma tendência em perder ou descaracterizar sua condição profissional, agindo em acordo com esse sistema social que reproduz a lógica do capital. Por sua vez, o capital propaga e alimenta uma “reprodução social metabólica” (Mészáros, 2005, p. 43), gerando, como já se afirmou, a intensificação e a desvalorização do trabalho dos professores. Destaca-se, ainda, que a desvalorização se fez sentir em momentos em que os interlocutores descreveram o trabalho e a profissão.

Acho que atualmente nós ensinamos, transmitimos o conhecimento, ajudamos o aluno. Temos que compreender seus problemas pessoais e devemos compreender sobre o momento que ele está passando, se tem problemas na família, o que está acontecendo para poder auxiliá-lo. Temos que ser médicos, temos que ser psicólogos, temos que ser muito atualizados. Somos criticados porque só corremos atrás dos conteúdos, que devemos nos atualizar, porque hoje nós temos as crianças superinformadas, elas nos cobram isso, nos cobram aulas diferentes, não querem saber de coisas pequenas. Eles querem mais, uma aula diferente, e nós não estamos preparados para isso, não temos uma vontade ou não dispomos de condições. (Professora Daiane)

O trecho destacado do discurso da Professora exemplifica a intensificação que seu trabalho pedagógico sofre e a insatisfação por ter dificuldades em atender a todas as demandas percebidas como profissional, uma dissonância entre seu contexto e a totalidade social. Sente-se cobrada como coletivo, pois responde por um sujeito coletivo, um “nós”, mas denota responsabilizar-se por atender a essa cobrança como sujeito individual. Esse sentido foi indicado, também, no seguinte discurso:

Eu entro para sala de aula e tento resolver sozinha, tudo. Às vezes, a gente se apoia nas colegas. Uma colega ajuda a outra. A gente que chama os pais, a gente conversa com eles separadamente. Então, muitas vezes, a Supervisão nem fica sabendo. A vice direção e direção, jamais. Não há, assim, um acompanhamento da direção dos assuntos que acontecem com os alunos. Eu consigo trabalhar? Dentro do possível eu acho que sim. Mas deixo muito a desejar neste outro lado. A gente poderia fazer muito mais coisas se tivesse esse apoio, esse respaldo. (Professora Denise)

Arroyo denuncia haver uma alienação do sujeito dentro da escola, quando afirma que, se o tema é saúde, pensa-se não no hospital, mas nos profissionais da saúde: “[...] Saúde nos lembra os médicos. Educação nos lembra a escola, não seus profissionais, os educadores. Estes não conseguem ser a referência, mas a instituição” (Arroyo, 2000, p. 10). Subsumidos à escola, os profissionais têm limites ao encaminhar um trabalho pedagógico descrito como práxis. E, paradoxalmente, a produção do conhecimento, objeto do trabalho pedagógico dos professores, acontece “[...] na e pela práxis. A práxis expressa, justamente, a unidade indissolúvel de duas dimensões distintas, diversas no processo de conhecimento” (Frigotto, 1994, p. 81). Os professores intuem haver a dissonância entre sua produção e a totalidade social, mas, muitas vezes, as alternativas são raras. Em decorrência, percebem se tornarem escassas as condições e oportunidades de agir para superá-la.

SENTIDOS, LINGUAGEM E PRÁXIS (DIALÉTICAS DO TRABALHO PEDAGÓGICO)

Trabalho vai além da prática. Trabalho também não é somente atividade. É mais, é práxis. Reduzir o trabalho à prática ou à atividade consiste, no limite, em reduzir o ser humano à condição de ser e sentir-se somente força de trabalho, diminuindo sua expectativa de pensar, planejar e premeditar seu fazer, integralmente. Por que não se trata somente de prática? Uma resposta encontra-se no discurso de uma das interlocutoras da pesquisa, quando sugere que a prática exige repetir para o alcance de sua efetividade:

A gente montou um comitê para organizar a horta. Todo dia, nós vamos ao local da horta, regamos e, se der, colhemos. Isto precisa ser diariamente, porque eles esquecem sobre o assunto, sobre como se cuida uma horta. E, se eles praticarem todo dia, a gente acredita que vão dar valor ao cultivo. (Professora Iris)

As palavras práxis e prática em algumas línguas não se dissociam7, mas, na Língua Portuguesa, sim. Têm sentidos diferenciados. No interior dessa diferença argumenta-se, defendendo a necessidade de superar conceber o trabalho dos professores como prática tão-somente, o que o relaciona de imediato ao seu aspecto mais utilitário. Propõe-se pensá-lo efetivamente como trabalho, intencional, histórico e práxis humana, que por sua vez é material e envidada pelo ser humano social. A práxis não é neutra. Possui uma clara conotação política, desde como é planejada e se é planejada.

Na sua “filosofia da práxis”, situada como transformação crítica e conhecimento da realidade, Sánchez Vásquez (2007, p. 394) esclarece práxis como: “atividade material humana”; “transformadora do mundo e do próprio homem”; “real, objetiva é, ao mesmo tempo, ideal, subjetiva e consciente”. E explica que há uma unidade entre teoria e prática, e, simultaneamente, uma diferença e autonomia: “A práxis não tem para nós um âmbito tão amplo que possa inclusive englobar a atividade teórica em si, nem tão limitado que se reduza a uma atividade meramente material” (Sánchez Vázquez, 2007, p. 394).

Diferentemente de práxis, a prática se estabelece, na profissão dos professores, como seu trabalho, mostrando-o como localizado, presentificado e, sobretudo, tecnologicamente elaborado. Nessa perspectiva, as tecnologias educacionais (especialmente no atual momento em que os professores trabalham em home office, em virtude da pandemia causada pela COVID-19) aparecem sob a forma de estratégias, que não se isentam de intencionalidade, pelo contrário, no campo educacional, a tecnologia acaba por, em determinadas situações, sutilmente, maquiar as relações entre educação e classe social, relegando à escola e aos profissionais a responsabilidade por quaisquer problemas se não efetivar o trabalho pedagógico. Assim descrita, a prática restringe-se a contribuir para a produção capitalista, engendra valor à produção e cria mais-valia, produzindo mercadorias, consumindo o trabalho e evidenciando-o no valor de troca das mercadorias e, como tal, é só um estágio de uma práxis que poderá ser reiterativa ou transformadora (Sánchez Vázquez, 2007).

Um mergulho profundo na prática pode gerar, segundo Sánchez Vásquez (2007, p. 34), a despolitização, quando se cria “[...] um imenso vazio nas consciências que só pode ser útil à classe dominante que o preenche com atos, preconceitos, hábitos, lugares comuns e preocupações [...]”, capaz de contribuir para que se mantenham os padrões sociais, para o isolacionismo e os mal-estares muito frequentes entre os professores. Nesse encaminhamento, configuram-se dois processos, denominados pelo autor de “politicismo prático e apoliticismo”, os quais apenas contribuem para, na aparência, se estar defendendo os interesses dos seres humanos práticos, e, efetivamente, acomodá-los por mecanismos ideológicos nessa prática que, em última instância, beneficia o avanço do capital. E adverte que o politicismo e o apoliticismo “práticos” constituem-se em “[...] parte da ideologia da burguesia, sobretudo quando se considera que sua política a partir do poder perdeu toda a força de atração para as classes oprimidas e exploradas” (Sánchez Vásquez, 2007, p. 34).

Tal contexto, associado ao imediatismo e ao culto do objeto, muito frequentes, contribui para os impactos no trabalho narrados pelos professores: “No meu trabalho vivo em constante desafio: como encaminhar melhor a aula? Como conseguir que meus estudantes aprendam? São questões que me atormentam todo dia” (Professora Nice). Em busca de respostas, esses trabalhadores podem, em alguma perspectiva, tornarem-se práticos imediatistas, reduzindo seu trabalho a tão-somente atender o que se apresenta emergente, sem teorizar ou refletir, ao contrário, afastando-se da teorização por exigir um tempo que lhes falta. Nesse contexto, a prática é algo rápido, sem implicações, respondendo ao que se faz demandado cumprir, buscando soluções, alicerçadas ou na própria ação ou na experiência sempre repetida, do que propriamente em implicações, análises e indagações. Deixa de ser transformadora, porque lhe falta implicação, ainda que seja resultante de sujeitos históricos, realizando uma prática ou uma práxis primária, “[...] em um sentido utilitário, individual e auto-suficiente (ateórico)” (Sánchez Vázquez, 2007, p. 35).

Considerando essas ponderações, reitera-se que se descreve o trabalho dos professores como trabalho pedagógico, por se compreender ser o modo de agir no social, contribuindo para sua transformação, por meio de um conjunto de ações planejadas. Nessa perspectiva, indica ser pedagógico por ser intencional. Uma intencionalidade tendo a linguagem como elemento primordial.

A linguagem, organizada sob a forma de discurso, materializa os sentidos produzidos pelo sujeito em relação ao social, a si como ser social, é, portanto, um trabalho e, como tal, produz. Vale dizer: um discurso é material, porque é composto de linguagem e esta, de caráter histórico, é produção humana com a qual é organizado o social e, portanto, é trabalho, elemento pelo qual os humanos se produzem humanos. A linguagem não é o discurso, este se compõe por ela, de modo político, pois é escolha, limite, possibilidade e coaduna-se com a posição social dos sujeitos. (Ferreira, 2020, p. 16)

O trabalho dos professores privilegia, em suma, a produção do conhecimento em aula, sua e dos estudantes, por meio da linguagem, algo que se tem repetido, no intuito de demarcar onde e em quais condições os professores trabalham. O agir que integra o trabalho dos professores produz conhecimento, e além dele, implica, também, na aplicação desse conhecimento. Por isso, se fala em produção do conhecimento, que abarca, semanticamente, apreendê-lo e aplicá-lo. Nesse afã, importante frisar que há distinção entre prática e trabalho pedagógico por meio da produção do conhecimento. Isso porque, sendo essa a razão de ser daquele, significa mostrar que não se restringe a práticas e técnicas, as quais, quando muito, diversificam as relações entre os sujeitos, sem necessariamente os colocar em condições de conhecer, já que tais condições denotam caráter político e transformador, ou seja, pedagógico.

O TRABALHO PEDAGÓGICO E OS PROFESSORES COMO SUJEITOS SOCIAIS (SENTIDOS DE TRABALHO PEDAGÓGICO)

A análise dos discursos dos interlocutores da pesquisa indicou que intuem que seu trabalho deixou de ser inquestionavelmente aquilatado como representativo no social ampliado. Em seus discursos, descrevem que parecem apenas reproduzir funções, sob a forma de um emprego, denotando ter dificuldades em se enxergarem trabalhadores pedagógicos, capazes de se produzir e autoproduzir8. Arroyo (2000, p. 10) ainda complementa, em direção a tal argumento: “[...] houve no imaginário sobre a educação uma despersonalização que não acontece em outros campos sociais”. Esse processo se relaciona a uma lógica vivencial caracteristicamente desumanizadora, oriunda do enorme esforço neoliberal em globalizar e regular todos os segmentos sociais. Tais efeitos acabam por gerar nos professores a busca de alternativas para que se sintam melhores como profissionais e expressam essa busca em seus discursos, apelando para metáforas com as quais organizam seus imaginários quanto ao próprio trabalho pedagógico:

Trabalho de um professor é boomerang, aprender e ensinar, sem saber quando se está aprendendo e quando está ensinando. Como professores, parecemos estar sempre desejando o melhor, querendo que nossos estudantes aprendam mais. Percebi, depois de anos de trabalho no Magistério, que gosto do que faço, me renovo a cada ano, tentando fazer melhor o meu trabalho. Os professores precisam acreditar mais em si, no que fazem e entusiasmarem também os alunos. (Professora Silvia)

Essa busca, muitas vezes, torna-se descontextualizada, não acontece nos ambientes de compreensão das relações entre capital e trabalho, tendendo a certo romantismo que se manifesta, por exemplo, na opção por se declarar funcionário ou empregado, e não, trabalhador. Entretanto, como já referenciado, sabe-se que função e emprego (a alocação social da força de trabalho por meio de um contrato de venda) se diferenciam de trabalho. Sobretudo quanto aos professores, há demandas de compreensão de seu trabalho para além do tecnicismo ou de uma função. Mais que uma ocupação especializada, exige pertença a um grupo de profissionais, tendo por referência uma totalidade social, na qual se incluem e buscam contribuir praxicamente.

Tais argumentos foram suscitados, por exemplo, pela análise do discurso da Professora Maria, ao descrever o que seria trabalhar como professora: “Olha, para mim, ser professora é uma função muito grande que acho que tu exerces, uma responsabilidade muito grande, né? É a função de, com meu trabalho, formar alunos, formar futuros cidadãos” (Professora Maria). A Professora isola discursivamente seu trabalho na escola, desconecta-o da historicidade e da totalidade social, para que possa explicá-lo. Revela também auto intensificação, na medida em que a profissional traz para sua responsabilidade individual a “formação de futuros cidadãos”, assumindo-a, parecendo conformar-se e até justificar-se com esse lugar de atender a objetivos mais amplos, quase inatingíveis. No trânsito de uma percepção do geral, aplicando à sua condição particular de trabalhadora, a Professora Maria acaba por conformar-se à lógica do capital. Mészáros (2005, p. 43), em sua obra, esclarece:

As determinações gerais do capital afetam profundamente cada âmbito particular com alguma influência na educação, e de forma nenhuma apenas as instituições educacionais formais. Essas estão estritamente integradas na totalidade dos processos sociais. Não podem funcionar adequadamente exceto se estiverem em sintonia com as determinações educacionais gerais da sociedade como um todo.

Os professores organizam seus discursos em acordo com sua imersão no social, incluindo a imagem de si como sujeitos. A sua compreensão sobre o trabalho que realizam, expressa nos discursos, tende a assemelhar-se ao afastamento (provavelmente de modo não refletido) de um trabalho pedagógico como ação social e política. O trabalho pedagógico, por suas dimensões, configura-se sempre político, implica escolhas decorrentes e relativas aos contextos sociais onde os sujeitos - trabalhadores pedagógicos - estão imersos. Talvez a dificuldade para assumir esse sentido quanto à sua produção na escola diga respeito ao fato que o trabalho pedagógico “[...] exige do sujeito que se movimente entre o que lhe é demandado pelo contexto capitalista e o que acredita como trabalhador” (Ferreira, 2017, p. 8). Com esse objetivo o pedagógico do trabalho se põe em relevo, potencializando política e socialmente a produção do conhecimento na escola e, como efeito, os próprios professores, como trabalhadores pedagógicos.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A AMS nos discursos dos interlocutores da pesquisa facultou ler os sentidos demarcados pelas posições sociais, pela pertença a um grupo profissional, pelas decorrências de trabalhar em uma escola inserida na totalidade social capitalista e como efeito dessa inserção no trabalho pedagógico. Os interlocutores foram professores, homens e mulheres, que desenvolvem um trabalho pedagógico, porém, os sentidos desse trabalho se diversificam, supondo o exigido, na escola e a partir dela, e por suas próprias crenças, no contexto de suas licenciaturas e nos cotidianos dos quais participam, visando a estudarem para realizar seu trabalho. Expressam-se de modo cambaleante, porque parecem expressar algo externo: seu trabalho pedagógico parece-lhes estranho, está e vai além de si. Preferem, então, como revelaram os excertos, referirem-se aos estudantes, à escola, às políticas públicas, dado o estranhamento referente ao resultado de sua ação profissional. Desenham, como um modo protetivo, sentidos de idealização e romantismo para acobertar esse estranhamento.

A pesquisa foi desenvolvida para analisar os discursos dos professores sobre trabalho pedagógico, tendo por referência categorias relativas à historicidade, à totalidade, aos contraditos, às causas e efeitos subjacentes aos discursos. De tal forma, igualmente, intencionou-se, por meio da entrevista, que os professores, ao produzirem linguagem, pudessem entender e assentirem ser entendidos em seus discursos.

Concluído o estudo, acredita-se que, ao expressarem os sentidos atribuídos ao seu trabalho na escola, os professores tiveram oportunidade para comprometer-se, pois, em raras situações, formalmente, expressam-se acerca de si como trabalhadores e sobre o trabalho que realizam. Nesse processo de expressar e se comprometer, conjecturou-se, tendo por fundamento a AMS, acerca de um elemento geral indicado pelas entrevistas: que o trabalho pedagógico dos professores necessita ser discursado, socializado e, com isso, assumido como produção do conhecimento. E a escola, como comunidade acadêmica, social e política, articulada, estampa-se como espaço e tempo propícios para esse empreendimento.

Em suma, a análise indicou que os professores, sujeitos sociais, cuja historicidade e trabalho pedagógico compõem-se cotidiana e coletivamente, sobretudo no ambiente, específico e dinâmico da escola, em seus discursos, denotam obnubilamento da compreensão de si e do seu trabalho, por falta de mais oportunidades para discursá-lo, o que contribuiria para materializá-lo como pertença. Alguns interlocutores revelaram, também, que quando sozinhos em sala de aula, repetem-se em uma prática desconectada de um projeto pedagógico crítico. Tudo isso acontece dentro da escola, em discursos sobre o trabalho de produção do conhecimento, disseminados no social.

Com base nos discursos, vislumbrou-se, ainda, possibilidades conjuntas de superação dos sentidos cotidianos repetitivos, que podem contribuir, se não forem objeto de reflexão, pouco a pouco, para o afastamento entre professores e seu trabalho, tornando essa uma prática reiterativa e sem vigor. Restou o desejo de que os professores, como declararam alguns interlocutores, em seus coletivos, criem alternativas e caminhem juntos na direção do trabalho pedagógico, concebido conforme se argumentou, como crítico, político e capaz de dar sustentação a um projeto coletivo de educação.

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1 Sujeito entendido como ser de possibilidades, subjetividades e responsável por suas ações. Nessa perspectiva, os professores são responsáveis pelo trabalho que realizam, para o qual escolhem, planejam, realizam e avaliam, em acordo com suas crenças e compreensões do contexto de produção.

2 Para fins deste texto, é estabelecida uma diferença, sem excluir um ou outro, entre trabalho e emprego. Trabalho é entendido como “[...] todo processo demasiadamente social, por meio do qual acontece a produção e a autoprodução humana. Já o emprego, a aplicação burocratizada do trabalho, é de ordem da pertença ao social, da necessidade de sobreviver obtendo recursos econômicos com a venda da força de trabalho” (Ferreira, 2017, p. 599).

3 As entrevistas foram realizadas presencialmente entre 2015 e início de 2019. Participaram 32 professores de escolas públicas. O roteiro da entrevista foi dividido em módulos: a) descrição dos sujeitos, suas características pessoais e profissionais; b) descrição de seu trabalho na escola, como professores.

4 Por pertença, especificamente, por pertença profissional, entende-se a chance de os sujeitos incluírem sua condição de trabalhadores e de trabalho: “a pertença à profissão se processa no âmbito de mediações, não podendo ser entendida a priori, mas a partir das relações de trabalho em um contexto sócio-histórico determinado. A pertença profissional [no caso dos professores] se refere a um viés político da docência já que concebe que os professores se percebem pertencentes ao contexto por meio do trabalho e do reconhecimento social através dele na coletividade” (Amaral, 2016, p. 27).

5 Como é bastante conhecido, em vez de descrever conceitos, são apresentados os contrapontos ao positivismo, com argumentos de Schaff, ao abordar a pesquisa em história, que se coadunam com os que se defende no texto: “[...] no conhecimento histórico, o sujeito e o objeto constituem uma totalidade orgânica, agindo um sobre o outro e vice-versa; a relação cognitiva nunca é passiva, contemplativa, mas ativa por causa do sujeito que conhece; o conhecimento e o comprometimento do historiador [pesquisador] estão sempre socialmente condicionados; o historiador [pesquisador] tem sempre um ´espírito de partido” (Schaff, 1986, p 105).

6 A produção de dados aconteceu anteriormente à pandemia causada pela COVID-19 e a escrita do texto foi concluída durante este período: “A COVID-19 é uma doença causada pelo coronavírus, denominado SARS-CoV-2, que apresenta um espectro clínico variando de infecções assintomáticas a quadros graves. De acordo com a Organização Mundial de Saúde, a maioria (cerca de 80%) dos pacientes com COVID-19 podem ser assintomáticos ou oligossintomáticos (poucos sintomas), e aproximadamente 20% dos casos detectados requer atendimento hospitalar por apresentarem dificuldade respiratória, dos quais aproximadamente 5% podem necessitar de suporte ventilatório” (Disponível em: www.coronavirus.saude.gov.br. Acesso em: 20 set. 2020).

7 Segundo Sánchez Vásquez, “Também em italiano se pode dizer ‘práxis’ e ‘prática’. Em francês emprega-se quase exclusivamente o termo ‘practique’, em russo somente se usa o vocábulo ‘práktika’, e em inglês a palavra correspondente é ‘practice’. Em alemão, conserva-se o termo grego original transcrito do mesmo modo que em espanhol e em português (isto é, ‘práxis’), com a particularidade de que apenas se dispõe deste último, ao contrário do que ocorre, como acabamos de ver, com as demais línguas modernas que têm um termo próprio usado com caráter exclusivo ou junto com a palavra grega ‘práxis’” (Sánchez Vázquez, 2007, p. 27, nota de rodapé 1).

8 “O trabalho ― a produção ― é o que eleva o homem sobre a natureza exterior e sobre sua própria natureza, e é nessa superação de seu ser natural que consiste propriamente sua autoprodução” (Sánchez Vázquez, 2007, p. 128).

Financiamento: Texto elaborado a partir de projeto desenvolvido com financiamento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), processo 306603/2019-5, e da Fundação de Apoio à Pesquisa no Estado do Rio Grande do Sul (FAPERGS), processo 2333-2551/14-7.

Recebido: 29 de Outubro de 2020; Aceito: 26 de Abril de 2021

Liliana Soares Ferreira é doutora em educação pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Professora da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). E-mail: anaililferreira@yahoo.com.br

Conflitos de interesse: A autora declara que não possui nenhum interesse comercial ou associativo que represente conflito de interesses em relação ao manuscrito.

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