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Revista Brasileira de Educação

versão impressa ISSN 1413-2478versão On-line ISSN 1809-449X

Rev. Bras. Educ. vol.27  Rio de Janeiro  2022  Epub 21-Dez-2022

https://doi.org/10.1590/s1413-24782022270122 

Artigos

Metassíntese: revisão sistemática qualitativa na área da educação

METASYNTHESIS: QUALITATIVE SYSTEMATIC REVIEW IN THE AREA OF EDUCATION

META-SÍNTESIS: REVISIÓN SISTEMÁTICA CUALITATIVA EN EL ÁREA DE EDUCACIÓN

Paula Maria Ferreira de Faria I   II 
http://orcid.org/0000-0001-6804-8711

Denise de Camargo I   III 
http://orcid.org/0000-0001-9092-9988

IUniversidade Federal do Paraná, Curitiba, PR, Brasil.

IIFaculdade Herrero, Curitiba, PR, Brasil.

IIIUniversidade Tuiuti do Paraná, Curitiba, PR, Brasil.


RESUMO

Diante da necessidade de desenvolver estudos qualitativos que possam subsidiar a tomada de decisões na área educacional e como forma de promover o desenvolvimento de pesquisas teóricas consistentes na área da Educação, este artigo apresenta a metassíntese, modalidade de revisão sistemática qualitativa que consiste em um processo complexo e delicado de integração interpretativa dos resultados de estudos qualitativos primários, alcançando um nível de compreensão teórica abrangente e profundo. O artigo descreve o conceito e as etapas para a realização de metassínteses e apresenta contribuições desenvolvidas pelas autoras no sentido de facilitar a organização e a síntese dos dados em metassínteses, colaborando para a realização de revisões de literatura consistentes e de qualidade, concordes aos pressupostos da pesquisa qualitativa em Educação.

PALAVRAS-CHAVE metassíntese; pesquisa qualitativa; revisão sistemática; educação

ABSTRACT

In view of the need to develop qualitative studies that can support decision-making in the educational field and as a way to promote the development of consistent theoretical research in the field of Education, this article presents meta-synthesis, a qualitative systematic review modality that consists of a complex and delicate process of interpretative integration of the results of primary qualitative studies, reaching a level of comprehensive and deep theoretical understanding. The article describes the concept and steps for performing meta-syntheses and presents contributions developed by the authors in order to facilitate the organization and synthesis of data in meta-syntheses, collaborating to carry out consistent and quality literature reviews, in accordance with the assumptions of qualitative research in Education.

KEYWORDS metasynthesis; qualitative research; systematic review; education

RESUMEN

Ante la necesidad de desarrollar estudios cualitativos que puedan sustentar la toma de decisiones en el área educativa y como vía para promover el desarrollo de una investigación teórica consistente en el campo de la Educación, este artículo presenta la meta-síntesis, una modalidad de revisión sistemática cualitativa que consiste en un proceso complejo y delicado de integración interpretativa de los resultados de estudios cualitativos primarios, alcanzando un nivel de comprensión teórica integral y profunda. El artículo describe el concepto y los pasos para realizar meta-síntesis y presenta contribuciones desarrolladas por los autores con el fin de facilitar la organización y síntesis de datos en meta-síntesis, colaborando para realizar revisiones de literatura consistente y de calidad, de acuerdo con los supuestos de la investigación cualitativa en Educación.

PALABRAS CLAVE Meta-síntesis; investigación cualitativa; revisión sistemática; educación

INTRODUÇÃO

A pesquisa qualitativa na área da Educação é bastante recente, remontando à metade do século XX (Weller e Pfaff, 2019). Desde então, as metodologias qualitativas têm sido utilizadas de modo crescente nas pesquisas empíricas educacionais, sobretudo nas últimas décadas, contribuindo para a compreensão de fenômenos como os “[...] processos escolares, de aprendizagem, de relações, dos processos institucionais e culturais, de socialização e sociabilidade, do cotidiano escolar em suas múltiplas implicações, das formas de mudança e resiliência presentes nas ações educativas.” (Gatti e André, 2019, p. 34).

A relevância da pesquisa qualitativa na área educacional foi efetivamente consolidada, dadas as características dinâmicas e subjetivas que permeiam as relações na Educação, superando a pretensa neutralidade científica do pesquisador e considerando-o “[...] como veículo inteligente e ativo entre esse conhecimento construído na área e as novas evidências que serão estabelecidas a partir da pesquisa.” (Lüdke e André, 2018, p. 5). Entretanto, é importante frisar que as contribuições da metodologia qualitativa ao contexto educacional não se restringem à pesquisa empírica; efetivamente, estudos teóricos podem se valer dos princípios qualitativos. Sob a perspectiva qualitativa, durante a revisão de literatura, “[...] o pesquisador utiliza os insights e as informações provenientes da literatura enquanto conhecimento sobre o contexto, utilizando-se dele para verificar afirmações e observações a respeito de seu tema de pesquisa naqueles contextos.” (Flick, 2009b, p. 62).

Embora a compreensão qualitativa do referencial teórico já venha sendo utilizada por pesquisadores da área da Educação (Maranhão e Manrique, 2014; Alencar e Almouloud, 2017; Fiorentini e Crecci, 2017; Cristovão e Fiorentini, 2021), observa-se que a produção de revisões teóricas ainda tem sido realizada predominantemente por meio de metodologias quantitativas (Walsh e Downe, 2005). Além disso, há poucos materiais que abordem especificamente o procedimento metodológico de produção de metassínteses em língua portuguesa. Para investigar tal cenário na literatura brasileira contemporânea, realizamos dois levantamentos exploratórios na base de dados SciELO Brasil.1 Ambos buscaram publicações nos últimos cinco anos (2015 a 2020) com os seguintes filtros de pesquisa: “coleções: Brasil”, “idioma: português”, “área temática: education” e “tipo de literatura: artigo”. O primeiro levantamento utilizou os descritores “educação” AND “revisão sistemática” e apresentou 54 resultados; nenhum dos artigos, entretanto, consistia em revisões sistemáticas do tipo metassíntese. Realizamos então um segundo levantamento, com os descritores “educação” AND “metassíntese”, porém a busca não identificou nenhum resultado. Evidenciou-se, desse modo, a necessidade de divulgação entre os pesquisadores brasileiros de modos de pesquisa e revisão sistemática alinhados à tipologia qualitativa de pesquisa que permitam uma compreensão ampla e profunda do fenômeno estudado, e que sejam “[...] abertos o suficiente para permitir um entendimento de um processo ou relação.” (Flick, 2009a, p. 16).

Nesse sentido, diante da necessidade de fortalecimento das estratégias de pesquisa científica, em especial no contexto da Educação, este artigo contribui ao desenvolvimento de revisões de literatura qualitativas, caracterizando e apresentando as etapas de realização para revisões sistemáticas qualitativas da literatura do tipo metassíntese. Fundamentado na conceituação teórica proposta no idioma inglês por Sandelowski (Sandelowski, Docherty e Emden, 1997; Sandelowski e Barroso, 2003; 2007; Sandelowski, 2012), o artigo apresenta também contribuições desenvolvidas pelas autoras que podem facilitar a organização e a síntese dos dados na elaboração de metassínteses. Pretende-se, assim, fomentar em pesquisas nacionais a utilização da metassíntese, já amplamente utilizada nas ciências da saúde (Lopes e Fracolli, 2008; Matheus, 2009), também na área educacional, configurando investigações científicas de qualidade que sirvam como base para práticas educacionais e que possam subsidiar e promover o desenvolvimento de pesquisas futuras.

DESCRIÇÃO E CONTEXTUALIZAÇÃO

A metassíntese é uma modalidade qualitativa de revisão sistemática de literatura. Como toda revisão sistemática, trata-se de “[...] um método que permite maximizar o potencial de uma busca, encontrando o maior número possível de resultados de uma maneira organizada.” (Costa e Zoltowski, 2014, p. 56). Tal como a nomenclatura descreve, as revisões sistemáticas utilizam critérios científicos claros para a busca, permitindo a eventual replicação do estudo; constituem, portanto, contribuições originais “[...] abrangentes e não tendenciosas [...]” (Galvão e Pereira, 2014, p. 183) que apresentam a análise de estudos acerca de determinada temática e são consideradas “[...] o melhor nível de evidência para tomadas de decisão.”, especialmente na área da saúde (ibidem, p. 183).

Como tipologia qualitativa de revisão sistemática, a metassíntese permite integrar os resultados de diferentes estudos qualitativos primários, alcançando um nível de compreensão teórica profundo que supera a mera apresentação descritiva ou comparativa entre os estudos identificados, sendo capaz de “[...] incluir todos os significados das experiências encontrados nos estudos primários.” (Matheus, 2009, p. 544). Consiste em um processo complexo e delicado de integração interpretativa dos achados primários identificados em outras investigações. Cabe reiterar que somente estudos primários qualitativos são incluídos em revisões sistemáticas de literatura do tipo metassíntese, tais como dissertações, teses e artigos oriundos de investigações empíricas.

O objeto de revisão da metassíntese não são as pesquisas propriamente ditas, mas os relatórios dessas pesquisas, que são criteriosamente analisados e interpretados com a finalidade de obter um novo nível de síntese, que congregue e sustente os conceitos de cada um desses estudos (Matheus, 2009; Sandelowski, 2012).

Os resultados apresentados em uma metassíntese não podem ser encontrados em outros estudos, visto que não são a mera síntese de achados, mas oferecem uma integração que é fruto da interpretação conjunta de todos os estudos analisados, consistindo um todo coerente. Desse modo, sua validade não reside em uma lógica de replicação, e sim, em uma lógica interpretativa, única e particular de cada pesquisador (Sandelowski e Barroso, 2007).

Embora seja possível realizar a síntese qualitativa dos achados também por agregação (integração dos resultados), a proposta da metassíntese é realizar sua combinação (ou configuração); ou seja, promover uma interpretação dos achados qualitativos (Sandelowski e Barroso, 2003; Sandelowski, 2012). Trata-se, portanto, de um procedimento abrangente e sistemático de recuperação de todos os estudos empíricos qualitativos acerca de determinada temática, que emprega técnicas interpretativas e reflexivas que otimizam a validade dos procedimentos e resultados finais do estudo (Sandelowski, 2012).

A metassíntese é conduzida conforme protocolos de pesquisa sistemáticos e explícitos, porém flexíveis e modificáveis ao longo da pesquisa, ajustando-se à natureza dos achados e à própria estrutura de uma pesquisa de cunho qualitativo. Por isso, embora previamente o revisor estabeleça um roteiro, esses passos podem ser modificados ao longo da execução de seu estudo - tais adaptações devem, entretanto, ser meticulosamente discutidas entre o grupo de pesquisa e cuidadosamente registradas (Sandelowski, 2012). Os revisores2 buscam, então, agrupar os achados em tópicos ou temáticas em comum, produzindo sínteses intermediárias que ao final da metassíntese serão interpretadas coletivamente.

A seleção dos estudos qualitativos que serão analisados na metassíntese é um aspecto que requer atenção especial dos revisores. Considerando a ampla variedade de estudos que se denominam como qualitativos e as distinções entre eles, é necessário que a equipe de pesquisa elabore e utilize critérios para definir operacionalmente um estudo qualitativo, aplicando-os à metassíntese (Sandelowski, 2012).

Cabe ainda mencionar a falta de parâmetros claramente estabelecidos para as diferentes tipologias de pesquisa qualitativa e a frequente confusão dos próprios revisores acerca dessas tipologias - por exemplo, em muitos casos, a metodologia alegada pelos revisores se enquadraria melhor em outro tipo de definição metodológica. Entretanto, é importante que tais estudos não sejam simplesmente descartados em razão da inconsistência da definição metodológica, caso apresentem resultados consistentes que possam contribuir à metassíntese (Sandelowski, 2012). Desse modo, propõe-se que “[...] uma alegação de ter usado um método que não é suportado pelo conteúdo e pela forma das descobertas ostensivamente produzidas pelo uso desse método não deixa por si só as descobertas sem suporte.” (Sandelowski e Barroso, 2003, p. 906, tradução nossa). Portanto, nesses casos, a despeito da inconsistência na definição da metodologia utilizada, os estudos devem ser mantidos e analisados, sendo esse também um fator importante para sua análise interpretativa (Sandelowski, 2012).

A confiabilidade dos estudos de metassíntese pode ser avaliada em termos de sua validade descritiva (abrangência dos procedimentos de pesquisa, identificação de todos os relatórios relevantes à temática estudada e caracterização precisa das informações de cada relatório), interpretativa (representação completa e justa dos achados dos pesquisadores primários), teórica (otimização da credibilidade dos revisores da metassíntese e da própria metassíntese) e pragmática (aplicabilidade da pesquisa e transposição para a prática) (Sandelowski e Barroso, 2007; Sandelowski, 2012). Considerando os aspectos apontados por Sandelowski e Barroso (2007) para assegurar a validade das metassínteses, elaboramos a Figura 1.

Fonte: Elaborado a partir de Sandelowski e Barroso (2007).

Figura 1 - Critérios de validade para metassínteses. 

A partir dos critérios de validade, alguns procedimentos essenciais para a realização de uma metassíntese de qualidade são a manutenção de uma trilha de auditoria (documentação minuciosa das estratégias usadas em cada fase do seu projeto e das justificativas desses processos, incluindo a seleção, uso, desenvolvimento ou abandono de estratégias), a negociação consensual da validade (não necessariamente a unanimidade, mas a explicação dos critérios de julgamento utilizados e sua validação pela equipe de pesquisa) e a revisão entre pares por especialistas (submissão dos procedimentos e resultados do estudo ao escrutínio e crítica de pessoas com conhecimento específico) (Sandelowski e Barroso, 2007).

Sandelowski e Barroso (2003; 2007) distinguem os dados (material bruto da pesquisa) dos achados (descobertas ou teorias advindas da interpretação dos dados); dessa forma, relatos que envolvam apenas a transcrição literal dos procedimentos de pesquisa (ou seja, os dados brutos, sem a intervenção interpretativa do pesquisador), tais como citações diretas, descrição de histórias ou relatos orais obtidos dos participantes, são considerados estudos que apresentam dados, mas não achados de pesquisa (Sandelowski e Barroso, 2003).

Sandelowski e Barroso (2003; 2007) classificam os resultados dos estudos qualitativos em cinco diferentes tipos: sem achados, pesquisa em tópicos, pesquisa temática, descrição conceitual/temática e explicação interpretativa. Esses tipos encontram-se em um continuum de transformação de dados que se inicia com não classificação como pesquisa qualitativa, aproximando-se mais ou menos de diferentes abordagens de revisão sistemática qualitativa (metassumarizações e metassínteses), conforme mostra a Figura 2.

Fonte: Elaborado a partir de Sandelowski e Barroso (2007).

Figura 2 - Tipologias da pesquisa qualitativa. 

Sandelowski e Barroso (2003; 2007) apresentam a definição de cada um dos tipos de pesquisa propostos no continuum. Conforme a Figura 1, as pesquisas “sem achados” e “pesquisas em tópicos” são as tipologias mais próximas dos dados, nas quais há menor interpretação por parte do revisor. Sem pretender atribuir juízo de valor, as autoras consideram que tais estudos não configuram pesquisas efetivamente qualitativas, por isso, não podem ser incluídas em uma metassíntese.

Conforme sua denominação, os estudos do tipo sem achados apresentam exclusivamente os dados da pesquisa - e não os achados dos pesquisadores (autores do estudo). Os dados são reproduzidos com uma intenção autoexplicativa; assim, embora possa haver alguma ligação mínima com certos conceitos teóricos apresentados na sessão de discussão dos resultados, os dados não recebem nenhum tipo de tratamento por parte dos pesquisadores (Sandelowski e Barroso, 2003).

Os artigos sem achados que contenham trechos de dados ou histórias de entrevistas dados podem evocar emoções e sentimentos fortes pelo contador de histórias original e, portanto, têm um papel importante a desempenhar na definição de práticas e políticas. No entanto, argumentamos aqui que elas não são pesquisas, nem são pesquisas qualitativas em particular, pois não contêm nenhuma interpretação do significado dessas histórias ou de onde estão localizadas no mundo das histórias. (Sandelowski e Barroso, 2003, p. 910, tradução nossa)

Por sua vez, as pesquisas em tópicos, embora encontrem-se no âmbito da pesquisa, não são caracterizadas pelas autoras como pesquisa qualitativa (Sandelowski e Barroso, 2003). Apesar da aparente similaridade com estudos qualitativos pela ênfase nos dados sob forma de nomes, categorias ou tópicos, não há um tratamento efetivamente qualitativo dos dados de pesquisa. Por isso, embora frequentemente associem-se à pesquisa qualitativa em razão das técnicas de produção de dados (como entrevistas e grupos focais) e de análise (principalmente análise de conteúdo), a forma como esses dados são tratados não permite configurá-las como qualitativas.

As pesquisas tópicas parecem se diferenciar das pesquisas quantitativas tradicionais pela ausência de um esforço ou intenção de obter uma amostra estatisticamente representativa e pela presença de algum esforço para qualificar os resultados, geralmente com uma pitada de aspas. No entanto, essas citações funcionam como números, pois foram usadas para especificar tópicos em vez de edificar os leitores sobre a experiência a que o tópico se refere. De fato, o formato usual da pesquisa em tópicos é nomear um tópico (às vezes chamado de tema), defini-lo brevemente, contá-lo e ilustrá-lo com uma ou duas citações ou referências a eventos. (Sandelowski e Barroso, 2003, p. 911, tradução nossa)

As pesquisas temáticas são a primeira tipologia efetivamente qualitativa no esquema proposto por Sandelowski e Barroso (2003; 2007) e se localizam no limiar mínimo de abstração dos estudos qualitativos por oferecerem dados mais transformados que as pesquisas em tópicos, porém menos transformados que outros tipos de descobertas qualitativas. Embora mais descritiva que a tipologia anterior, o principal elemento que a diferencia das pesquisas em tópicos não é o detalhamento da narrativa, mas o esforço no sentido de oferecer um tratamento interpretativo de cunho qualitativo aos dados.

Embora as pesquisas temáticas tendam a oferecer mais texto verbal do que as pesquisas tópicas, a mera presença de mais palavras em oposição a mais números não foi o que nos levou a classificar um conjunto de descobertas como temáticas em oposição a uma pesquisa tópica. Em vez disso, o que as diferenciava era o grau em que os autores desses trabalhos haviam transformado os dados que haviam coletado ou detalhado as experiências que os dados representavam. (Sandelowski e Barroso, 2003, p. 912, tradução nossa)

Seguindo em direção às pesquisas que apresentam maior riqueza de achados (afastando-se, portanto, dos dados brutos), as pesquisas de descrição conceitual/temática indicam representações teóricas dos pesquisadores que revelam um padrão latente nos dados, abrangendo ações interpretativas na integração dos dados de pesquisa (Sandelowski e Barroso, 2003).

Em contraste com as pesquisas temáticas, nas quais os autores de conceitos utilizados ou temas da literatura empírica ou teórica existente amplamente organizam a apresentação de suas descobertas, em pesquisas de descrição conceitual/temática os autores importaram conceitos ou temas para reformular um fenômeno, evento ou caso. Nós diferenciamos aqui entre o uso nominal de conceitos ou temas, onde eles são usados apenas para rotular e ordenar partes dos dados, e o uso interpretativo de conceitos ou temas, onde conceitos são realmente usados conceitualmente ou temas são realmente usados tematicamente para reformular partes de dados. Tais apresentações têm o efeito não apenas de servir como uma maneira razoável de agrupar dados, mas de estender a tradição teórica ou outra tradição intelectual da qual foram importadas e/ou iluminar uma experiência. (Sandelowski e Barroso, 2003, p. 913, tradução nossa)

Por fim, à extrema direita do continuum apresentado por Sandelowski e Barroso (2003; 2007), estão as pesquisas de explicação interpretativa. A característica central desses estudos é precisamente seu caráter qualitativo, ou seja, o trabalho de interpretação dos dados realizado pelos pesquisadores ante aos dados, acompanhado por esclarecimentos ou explicações teóricas que os contextualizam, transformando-os qualitativamente. Desse modo,

[...] as explicações interpretativas oferecem um modelo coerente de algum fenômeno, ou uma única tese ou linha de argumento que lhes confere causalidade ou essência. Além disso, essas explicações atendem plenamente às variações relevantes na amostra e nos dados. (Sandelowski e Barroso, 2003, p. 914, tradução nossa).

Por isso, considerando o propósito das metassínteses, de acordo com Sandelowski e Barroso (2003; 2007), tais pesquisas devem abranger somente estudos do tipo descrição conceitual/temática e explicação interpretativa.

Cabe destacar que essa tipologia enfatiza a diferença de tipo entre os achados das pesquisas, não se prestando a avaliar a qualidade dos estudos propriamente ditos. Além disso, a classificação considerada nem sempre é a declarada pelos pesquisadores, mas a que a equipe de revisores identifica, após criterioso estudo. Desse modo, a ênfase reside não nos métodos de análise e interpretação declarados nos artigos, mas no conteúdo da pesquisa e na forma como os resultados de pesquisa são apresentados nesses artigos (Sandelowski e Barroso, 2003; 2007).

A partir das diretrizes norteadoras propostas por Sandelowski (Sandelowski, Docherty e Emden, 1997; Sandelowski e Barroso, 2003; 2007; Sandelowski, 2012) e considerando nossa experiência anterior com a realização de revisões sistemáticas (Faria e Camargo, 2018; 2020), percebemos a necessidade do estabelecimento de um protocolo de pesquisa claro, que permitisse a visualização de cada uma das etapas a ser percorrida ao longo da revisão de literatura. Nesse sentido, conforme as orientações de Sandelowski e Barroso (2007), elaboramos a Figura 3, cujo objetivo é nortear o processo de busca e de seleção inicial do material relevante para metassínteses.

Fonte: Elaboração das autoras.

Figura 3 - Busca e seleção inicial em metassínteses. 

Frisamos que, a despeito da possibilidade da realização de metassínteses a partir dos achados de dissertações e teses, a proposta aqui apresentada propõe a utilização de estudos publicados no formato de artigos científicos, conforme estipulado por Sandelowski e Barroso (2003; 2007). As autoras justificam que, embora também possam ser realizadas por meio de produções como dissertações e teses, as metassínteses devem privilegiar o estudo de artigos veiculados em periódicos, por serem os veículos mais comumente utilizados para a disseminação de resultados de pesquisas científicas e também por serem um tipo de relatório que costuma apresentar, de modo sucinto e direto, os procedimentos de pesquisa (Sandelowski e Barroso, 2003). Por isso, em conformidade com Sandelowski e Barroso (2003; 2007), optamos pela utilização de artigos científicos como fonte base para a realização de metassínteses.

ETAPAS DA METASSÍNTESE

As etapas básicas para o desenvolvimento de uma metassíntese envolvem a busca de similaridades entre os estudos, a realização da comparação metodológica e a explicação dos métodos e técnicas de síntese, em um exercício complexo de interpretação por parte dos revisores, que devem tanto preservar a integridade de cada estudo, como ser capazes de produzir uma síntese que agregue conhecimento e contribua para a tomada de decisões acerca da temática de estudo (Sandelowski, Docherty e Emden, 1997).

Os passos iniciais da metassíntese consistem em determinar o objeto de estudo, eleger os descritores e os critérios de inclusão e exclusão para em seguida realizar a busca em bases de dados relevantes. A existência de dúvidas entre a equipe de pesquisa deve ser dirimida por meio da busca por consenso, compreendida não como a unanimidade entre os revisores, mas como o ponto de vista que melhor pode ser argumentado e se mostre mais incisivo e aplicável à temática do estudo, junto à equipe (Sandelowski e Barroso, 2003).

A próxima etapa é a avaliação individual do material, que visa determinar se o artigo, a despeito de possíveis falhas metodológicas, é aceitável para a metassíntese. Novamente cada revisor deve registrar seu parecer e os motivos do julgamento, para posterior discussão entre a equipe de pesquisa. A análise da similaridade temática e metodológica dos estudos deve permitir a compreensão profunda e particularizada de cada estudo, considerando as especificidades de seu contexto (Lopes e Fracolli, 2008). Ao final desse processo, será possível, então, finalizar os critérios de inclusão e exclusão, determinando em definitivo os estudos que farão parte da metassíntese (Sandelowski e Barroso, 2007).

O passo seguinte é a avaliação comparativa, cujo foco central são os resultados apresentados em cada estudo. Esse processo pode envolver a elaboração de resumos e a exibição de pontos-chave dos estudos, que facilitarão sua integração final à metassíntese. As descobertas de cada estudo podem ser agrupadas em tópicos, o que permitirá determinar se diferentes pesquisas se confirmam, ampliam, refutam ou se complementam. A avaliação comparativa também evidencia informações relevantes à metassíntese que eventualmente estejam ausentes dos artigos; nesses casos, é possível entrar em contato com os pesquisadores primários que conduziram esses estudos para obter mais informações. Esse processo de avaliação permite, ainda, identificar artigos derivados de amostras em comum, que utilizam a mesma amostra de participantes para diferentes análises, bem como diferentes artigos que retratam um mesmo estudo. Todas essas informações são relevantes e devem ser consideradas na elaboração da metassíntese (Sandelowski e Barroso, 2007).

A partir das diretrizes norteadoras de Sandelowski e Barroso (2007), desenvolvemos um protocolo para o registro e estudo inicial, após a leitura dos títulos dos artigos selecionados para a metassíntese (Figura 4). O instrumento deve ser utilizado por cada membro da equipe, facilitando a posterior comparação entre os revisores das informações iniciais, obtidas a partir da leitura dos títulos dos artigos.

Fonte: Elaboração das autoras.

Figura 4 - Seleção dos artigos para metassíntese (leitura dos títulos). 

A vantagem do uso do protocolo é assegurar que todos os revisores estejam atentos aos mesmos aspectos avaliativos durante a análise de todo o material; adicionalmente, a possibilidade de assinalar com um X os motivos principais de inclusão ou exclusão de artigos confere praticidade e rapidez ao processo de registro.

O protocolo para leitura dos títulos inclui um campo para o registro da tipologia de pesquisa qualitativa utilizada em cada artigo, conforme os referenciais de Sandelowski e Barroso (2007); dessa forma, pode-se visualizar com maior clareza os artigos selecionados, procedendo a exclusão de materiais que não preenchem os critérios para compor uma metassíntese de acordo com Sandelowski (Sandelowski, Docherty e Emden, 1997; Sandelowski e Barroso, 2003; 2007; Sandelowski, 2012) e mantendo essas informações claramente acessíveis durante todo o processo de pesquisa. A quantidade de linhas pode ser aumentada ou diminuída, conforme a quantidade de estudos primários selecionados. O objetivo de pesquisa e os descritores utilizados na busca foram intencionalmente incluídos no protocolo, com vistas a manter claro o foco principal do trabalho para todos os revisores. Similarmente, a inclusão de símbolos visuais nos campos de inclusão do protocolo (“sim”, “não” ou dúvida”) visa facilitar a identificação visual e garantir o correto registro desses campos, minimizando falhas por distrações ou erros de preenchimento.

As dúvidas que emergirem ao longo do processo são discutidas entre a equipe da pesquisa, com a utilização das estratégias como o pensamento em voz alta e a busca pelo consenso (Sandelowski e Barroso, 2007), por meio das quais cada revisor pode fazer a explanação oral das razões que levaram à classificação dos estudos em questão, discutindo e chegando então a uma decisão conjunta.

Após a leitura inicial dos títulos dos artigos e discussão das informações por meio da revisão por pares, obtém-se a seleção de artigos para inclusão e para exclusão, conforme os critérios determinados pela equipe da pesquisa. Alguns artigos podem suscitar dúvidas e não serem imediatamente classificados, demandando análise mais aprofundada e a discussão reflexiva (consulta por consenso) entre os revisores. Seleciona-se, desse modo, os artigos para leitura dos resumos. A Figura 5 apresenta o protocolo por nós desenvolvido, com vistas a organizar as informações a partir da leitura dos resumos e facilitar sua discussão comparada entre os membros da equipe de pesquisa. Esse protocolo foi idealizado para preenchimento por meio de programas de edição de textos, que permitam a cópia do resumo na íntegra de cada um dos estudos primários selecionados. O instrumento sugerido é um modelo que pode ser facilmente adaptado às necessidades de pesquisa de cada equipe, adicionando ou removendo informações importantes para a elaboração da metassíntese.

Fonte: Elaboração das autoras.

Figura 5 - Seleção dos artigos para metassíntese (leitura dos resumos). 

A leitura dos resumos permitirá a identificação de artigos para exclusão (por não preencherem os critérios gerais para metassínteses e/ou por não corresponderem aos critérios de inclusão determinados pela equipe de pesquisa) e a seleção de artigos para a leitura na íntegra; nessa fase, ainda pode haver artigos não classificados pela equipe, assinalados como “dúvida”.

Para essa fase da pesquisa, desenvolvemos o protocolo de fichamento apresentado na Figura 6. Fundamentado nas orientações de Sandelowski e Barroso (2007), o instrumento deve ser utilizado por todos os revisores. Ressaltamos que, embora o preenchimento de todos os protocolos possa ser realizado manualmente, sua utilização foi idealizada para o registro por meio de programas de edição de textos, agilizando tanto o preenchimento, como o compartilhamento das informações e a análise comparada dos registros pela equipe de pesquisa.

Fonte: Elaboração das autoras.

Figura 6 - Fichamento dos artigos selecionados para a metassíntese. 

A leitura detalhada resultará na seleção final dos artigos que comporão a metassíntese, de acordo com as diretrizes de Sandelowski e Barroso (2003; 2007). Resta, por fim, proceder à síntese integrativa do material, que vai além da mera descrição dos resultados de cada artigo, constituindo um novo estudo a partir dos artigos primários já existentes. Esse é o diferencial da metassíntese:

A metassíntese qualitativa não envolve nenhuma reanálise de dados primários, mas fornece novas sínteses interpretativas baseadas em dados interpretados pelos pesquisadores apresentados como descobertas em seus relatórios de pesquisa. Metassínteses qualitativas são compostas de interpretações dos revisores das interpretações dos pesquisadores sobre seus dados, não desses dados propriamente ditos. (Sandelowski, 2012, p. 20, tradução nossa)

A metassíntese não somente indica ou descreve as diferenças e similaridades entre os artigos selecionados, mas também busca uma via interpretativa que seja capaz de integrar todos os resultados e compreendê-los como um conjunto. Nesse processo, pode se valer de diversas técnicas interpretativas. Algumas estratégias úteis para a síntese são a importação de conceitos (utilização de conceitos provenientes da literatura, que não foram utilizados pelos pesquisadores primários em seus estudos) e a tradução e síntese recíproca de conceitos in vivo (uso de conceitos teóricos apresentados em alguns estudos primários como pontos de síntese e integração para os demais estudos analisados). Ao final, essas informações podem ser organizadas por meio de algum dispositivo visual, como diagramas, figuras ou tabelas ou pela criação de uma taxonomia que facilite a identificação de tendências ou padrões que contribuam para a construção de um contexto interpretativo (Sandelowski e Barroso, 2007). As figuras intencionalmente inseridas neste artigo visam também demonstrar a utilidade dos recursos visuais na síntese dos dados e na compreensão das informações, tanto para a equipe de pesquisa, como para os leitores.

Os estudos de metassíntese permitem compreensão nova e aprofundada da temática de estudo, constituindo uma tradução interpretativa ampliada de todas as pesquisas primárias que o compõem; configuram, portanto, uma interpretação dos revisores da interpretação dos achados dos pesquisadores primários (Lopes e Fracolli, 2008). Nesse sentido, as metassínteses atingem alto nível de compreensão e abstração, com potencial para ampliar o alcance de achados referentes a experiências subjetivas, percepções, emoções e vivências particulares dos participantes dos estudos primários (Lopes e Fracolli, 2008; Alencar e Almouloud, 2017). Frisamos que a noção de que a pesquisa qualitativa deve promover avanços efetivos na compreensão da temática estudada evidencia a construção de “[...] conexões e relações que possibilitem a proposição de novas explicações e interpretações.” (Lüdke e André, 2018, p. 58).

Como se pode perceber, a elaboração desse tipo de revisão sistemática de literatura demanda, para além do conhecimento teórico dos revisores, é um profundo envolvimento e sensibilidade para com a pesquisa, resultando na integração de múltiplos resultados em um conjunto coeso, capaz de fornecer uma explicação interpretativa que considere os achados como um todo.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Embora os estudos de revisão sistemática qualitativa já estejam bem estabelecidos pela literatura internacional, a metassíntese é uma técnica relativamente nova que tem sido utilizada principalmente para a realização de pesquisas na área da saúde (Walsh e Downe, 2005). A despeito da existência de estudos nacionais realizados com esse referencial metodológico (Maranhão e Manrique, 2014; Alencar e Almouloud, 2017; Fiorentini e Crecci, 2017; Cristovão e Fiorentini, 2021), como revelam os levantamentos por nós realizados, trata-se de uma tipologia ainda pouco explorada por pesquisadores brasileiros na área da Educação.

É importante ainda ressaltar a necessidade da promoção de estudos teóricos que permitam a construção de revisões de literatura consistentes, conduzindo a uma compreensão aprofundada dos fenômenos educacionais alinhada aos pressupostos da pesquisa qualitativa. Para além da realização de estudos empíricos, já bastante consolidados no campo qualitativo na Educação, a noção do desenvolvimento de revisões sistemáticas de literatura de abordagem qualitativa ainda carece de maior divulgação na área. Desse modo, considerando a importante contribuição que as metassínteses aportam ao desenvolvimento de pesquisas especificamente no contexto educacional, este artigo contribui à literatura brasileira, apresentando informações quanto à descrição e à orientação acerca do desenvolvimento dessa modalidade de pesquisa qualitativa.

A utilização dos procedimentos descritos por Sandelowski e Barroso (2003; 2007) para a elaboração de metassínteses constitui uma importante diretriz norteadora, dada a vasta experiência teórico-prática das autoras na construção e no estudo desse tipo de pesquisas. Entretanto, de acordo com os próprios pressupostos da pesquisa qualitativa, tais diretrizes não são um conjunto prescritivo de normas, mas ferramentas metodológicas que estimulam o pensamento, a criatividade e a inovação do pesquisador/revisor durante a elaboração de estudos qualitativos. Nesse sentido, “[...] sem violar os pressupostos ou imperativos dos métodos, você deve acomodar métodos ao seu estudo, não seu estudo aos métodos. Projetos de síntese de pesquisa qualitativa requerem habilidade metodológica, não ‘metodolatria’ ou ‘pureza’ metodológica.” (Sandelowski e Barroso, 2007, p. xv, tradução nossa).

Similarmente, a inclusão dos protocolos por nós elaborados neste artigo visa compartilhar estratégias que possam otimizar a realização da revisão sistemática de literatura, contribuindo para a agilidade no processo e assegurando que cada um dos revisores registre, de modo claro e sistemático, os mesmos aspectos, minimizando a ocorrência de erros na elaboração da metassíntese. Desse modo, longe de estabelecer um modelo fixo ou rígido, a inclusão de outras informações ao protocolo pode e deve ser realizada, conforme os objetivos propostos para a revisão por cada equipe de pesquisa. O intuito é proporcionar uma ferramenta que auxilie na classificação dos estudos úteis a cada tipo de revisão sistemática qualitativa que se pretenda realizar, apresentando em língua portuguesa “[...] uma tipologia que seja analiticamente útil para discernir as semelhanças e diferenças entre conjuntos de achados, independentemente da orientação metodológica declarada.” (Sandelowski e Barroso, 2003, p. 907, tradução nossa).

A tipologia aqui descrita visa contribuir para a realização de estudos de metassíntese de qualidade, que apresentem revisões da literatura que avancem na compreensão de sua temática de estudo, indo além da mera apresentação de um conjunto de resultados obtidos por diversos pesquisadores em determinado recorte espaçotemporal; tais estudos constituem, efetivamente, uma produção nova, que reflete o aprofundamento interpretativo acerca dos referenciais teóricos que sustentam os estudos primários analisados (Alencar e Almouloud, 2017). Desse modo, considerando o contexto específico da pesquisa educacional brasileira, endossamos o posicionamento de Gatti e André (2019, p. 37):

Não podemos abrir mão do compromisso com a produção de conhecimentos confiáveis se queremos que tenham impacto sobre a situação educacional em nosso país, pois só assim, estaremos contribuindo para tomadas de decisão mais eficazes, substituindo as improvisações e os modismos que têm guiado as ações em nossa área.

Nesse sentido, este artigo contribui trazendo fundamentos iniciais para o desenvolvimento de estudos de revisão sistemática da literatura em consonância com os pressupostos da pesquisa qualitativa, tendo como foco específico a área da Educação. Embora os passos aqui apresentados possam efetivamente ser utilizados para o desenvolvimento de estudos em diversas áreas do conhecimento, enfatizamos a necessidade de que a pesquisa educacional busque, cada vez mais, ferramentas e dispositivos qualitativos compatíveis com o rigor científico que permitam o avanço no conhecimento, tendo em vista as especificidades que permeiam os desafios pertinentes à área educacional, como questões relacionadas ao currículo, avaliação, gestão escolar, relação professor-aluno, integração entre a família e a comunidade escolar, formação docente, inclusão e diversidade escolar, dentre outras facetas que compõem o universo da escola.

A elaboração de metassínteses aporta importantes contribuições ao contexto da pesquisa educacional no Brasil, colaborando para o fortalecimento científico da área por meio do desenvolvimento de estudos respaldados em referenciais teóricos e metodológicos consistentes, concordes aos princípios da pesquisa qualitativa. A utilização desses estudos teóricos contribui para a tomada de decisões na Educação, consolidando referenciais teórico-epistemológicos capazes de justificar e sustentar a adoção de práticas relacionadas ao cotidiano escolar que consideram a “[...] realidade dinâmica e complexa do seu objeto de estudo, em sua realização histórica.” (Lüdke e André, 2018, p. 6).

Por seu caráter interpretativo e por permitir uma compreensão profunda e integrada, relacionando os achados de diferentes estudos primários com vistas a constituir um conjunto significativo de informações acerca de determinado fenômeno, os estudos de metassíntese configuram uma possibilidade inovadora de construção de revisões sistemáticas da literatura, que efetivamente avança para além da mera compilação de dados rumo a uma compreensão inovadora que integra e sintetiza os achados, proporcionando um corpus de dados que pode subsidiar a tomada de decisões e alavancar o desenvolvimento de pesquisas complexas na área educacional.

REFERÊNCIAS

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1 Levantamentos realizados na base de dados Scientific Eletronic Library Online (SciELO) Brasil em maio de 2021.

2 Adotamos a terminologia utilizada por Sandelowski e Barroso (2003), que denominam os autores da metassíntese de revisores, enquanto os autores dos estudos primários a partir dos quais é realizada a metassíntese são denominados pesquisadores.

Financiamento: O estudo não recebeu financiamento.

Recebido: 29 de Julho de 2021; Aceito: 21 de Março de 2022

Paula Maria Ferreira de Faria é doutora em Educação pela Universidade Federal do Paraná (UFPR). Coordenadora do curso de Psicologia da Faculdade Herrero. Recebeu bolsa de Doutorado CAPES-PROEX (nº 88887.288270/2018-00). E-mail: paula.pmff@gmail.com

Denise de Camargo é doutora em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP). Professora sênior da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e professora titular da Universidade Tuiuti do Paraná (UTP). E-mail: denicamargo@gmail.com

Conflitos de interesse: As autoras declaram que não possuem nenhum interesse comercial ou associativo que represente conflito de interesses em relação ao manuscrito.

Contribuições das autoras: Conceituação, Visualização, Escrita - Revisão e Edição: FARIA, P. M. F. Administração do projeto, Supervisão: CAMARGO, D. Curadoria de dados, Análise Formal, Investigação, Metodologia, Validação, Escrita - Primeira Redação: FARIA, P. M. F.; CAMARGO, D.

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