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Revista Brasileira de Educação

versão impressa ISSN 1413-2478versão On-line ISSN 1809-449X

Rev. Bras. Educ. vol.28  Rio de Janeiro  2023  Epub 09-Out-2023

https://doi.org/10.1590/s1413-24782023280098 

Artigos

Plano Educacional Individualizado: implementação e influência no trabalho colaborativo para a inclusão de alunos com autismo

PLAN EDUCATIVO INDIVIDUALIZADO: IMPLEMENTACIÓN E INFLUENCIA EN EL TRABAJO COLABORATIVO PARA LA INCLUSIÓN DE ALUMNOS CON AUTISMO

Daniel Da Silva CostaI  , Escrita – Primeira Redação, Análise Formal, Metodologia
http://orcid.org/0000-0003-2888-1199

Carlo SchmidtII  , Escrita – Primeira Redação, Análise Formal, Metodologia, Supervisão
http://orcid.org/0000-0003-1352-9141

Síglia Pimentel Höher CamargoI  , Supervisão, Escrita – Revisão e Edição, Curadoria dos Dados
http://orcid.org/0000-0001-7058-6519

IUniversidade Federal de Pelotas, Pelotas, RS, Brasil.

IIUniversidade Federal de Santa Maria, Santa Maria, RS, Brasil.


RESUMO

O Plano Educacional Individualizado é importante na inclusão de estudantes com Transtorno do Espectro Autista por conduzir a prática pedagógica dos professores em direção às necessidades educacionais desses alunos, com base em um trabalho colaborativo com os pais e equipe multiprofissional. Este estudo buscou descrever, por meio de um estudo de caso, a implementação do Plano Educacional Individualizado na fase de elaboração e verificar sua influência sobre o trabalho colaborativo da equipe docente em uma escola de ensino fundamental. A equipe escolar respondeu a um questionário sobre trabalho colaborativo antes e depois de quatro meses da elaboração do Plano Educacional Individualizado para um estudante com autismo. Os resultados mostraram melhora em cada dimensão do trabalho colaborativo da equipe escolar. O potencial do Plano Educacional Individualizado para o maior envolvimento dos professores em torno de objetivos comuns para a aprendizagem de alunos com Transtorno do Espectro Autista por meio do trabalho colaborativo é discutido.

PALAVRAS-CHAVE autismo; Plano Educacional Individualizado; trabalho colaborativo

RESUMEN

El Plan Educativo Individualizado es importante en la inclusión de alumnos con Trastorno del Espectro Autista ya que orienta la práctica pedagógica de los docentes hacia las necesidades educativas de estos alumnos, a partir del trabajo colaborativo con los padres y un equipo multidisciplinario. Este estudio buscó describir, a partir de un estudio de caso, la implementación del Plan Educativo Individualizado en la fase de elaboración y verificar su influencia en el trabajo colaborativo del profesorado de una escuela primaria. El equipo de la escuela respondió un cuestionario sobre trabajo colaborativo antes y después de cuatro meses de la elaboración del Plan Educativo Individualizado para un estudiante con autismo. Los resultados mostraron una mejora en cada dimensión del trabajo colaborativo del equipo escolar. Se discute el potencial del Plan Educativo Individualizado para una mayor participación docente en torno a objetivos comunes para el aprendizaje de los estudiantes con Trastorno del Espectro Autista a través del trabajo colaborativo.

PALABRAS-CLAVE autismo; Plan Educativo Individualizado; trabajo colaborativo

ABSTRACT

The Individualized Educational Plan is important in the inclusion of students with Autism Spectrum Disorder because it leads the pedagogical practice of teachers towards the educational needs of these students, from collaborative work with parents and a multidisciplinary team. This study sought to describe, from a case study, the implementation of the Individualized Educational Plan in the elaboration phase and verify its influence on the collaborative work of the school team in an elementary school. The school team answered a questionnaire about collaborative work before and after four months of the Individualized Educational Plan elaboration for a student with autism. The results showed improvement in each dimension of the school team's collaborative work. The potential of Individualized Educational Plan for greater teacher involvement around common goals for the learning of students with Autism Spectrum Disorder through collaborative work are discussed.

KEYWORDS autism; Individualized Educational Plan; collaborative work

INTRODUÇÃO

Atualmente, a quinta edição do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais — DSM-5 (APA, 2013) classifica o autismo como transtorno do espectro autista (TEA). As principais áreas comprometidas são a sociocomunicativa, integrando as áreas da comunicação e socialização, e comportamento (Schmidt, 2013). Com a classificação atual do TEA, ultrapassando o entendimento do transtorno subdividido em categorias autoexcludentes, fica evidente o amplo espectro de variação sintomática. Há vários níveis do transtorno em que a pessoa pode estar situada, desde o mais severamente acometido, ou nível três de gravidade com necessidade de apoio substancial, até o menos acometido, ou nível um de gravidade, com pouca necessidade de apoio (APA, 2013). Dada esta heterogeneidade, pressupõe-se que nem todos os indivíduos com TEA respondem do mesmo modo à mesma intervenção, o que impossibilita a aplicação de uma única abordagem terapêutica ou pedagógica.

No âmbito educacional, pesquisas sobre a inclusão de alunos com TEA no Brasil demonstram uma realidade desafiadora para a efetivação deste processo. As matrículas de pessoas com TEA aumentaram consideravelmente nos últimos anos nas escolas regulares (Gomes e Mendes, 2010; Nunes, Azevedo e Schmidt, 2013; Brasil, 2019). No entanto, há pouca participação dos alunos no contexto escolar e falhas na oferta do ensino de qualidade e no avanço acadêmico desses estudantes, como: estagiários de baixo grau de instrução e sem formação específica para a função de auxiliar dos estudantes; retenção do aluno nos anos escolares por não corresponderem ao sistema de avaliação em curso e de anos subsequentes; baixa frequência dos alunos em sala de aula, ocasionando perda de conteúdos pedagógicos importantes para seu avanço; falta de adaptação metodológica em termos didáticos e na apresentação topográfica dos conteúdos, falta de conhecimento dos professores sobre o aluno, carência de estratégias de ensino, as próprias concepções docentes, pouco uso de práticas validadas, entre outras (Gomes e Mendes, 2010; Nunes, Azevedo e Schmidt, 2013; Pereira e Nunes, 2018). Isso pode ser explicado pelas dificuldades dos professores quanto aos aspectos comportamentais e pedagógicos (o que e como avaliar e ensinar) envolvidos no processo de inclusão de estudantes com autismo, amplamente documentado na literatura nacional (Bosa, 2006; Schmidt et al., 2016; Camargo et al., 2020).

Para a área da educação, esta realidade significa que é importante a flexibilização pedagógica e curricular (para os alunos que apresentam perfis de aprendizagem bem diferenciados) e disponibilização de ferramentas que norteiem o trabalho dos professores nesta direção em um contexto inclusivo. Dentre as alternativas pedagógico-metodológicas para alunos com TEA, a literatura destaca o Plano Educacional Individualizado (PEI) como ferramenta importante que pode auxiliar nesse processo (Nunes, Azevedo e Schmidt, 2013; Costa, 2016; Costa e Schmidt, 2019).

O PEI é um instrumento que tem sido utilizado no cenário internacional, em países da Europa e América do Norte, com a finalidade de viabilizar as condições adequadas ao processo de inclusão na escola comum para crianças e jovens com necessidades educacionais especiais (Tannús-Valadão, 2010). O PEI pode ser compreendido como uma ferramenta de instrução que fornece orientação para o ensino, que atende às necessidades individuais do aluno com deficiência, de forma documentada. Sua composição é delineada pelo nível de desempenho atualizado do aluno, metas anuais, serviços suplementares e acomodações ou modificações necessárias, organizados com base em uma avaliação precisa do desenvolvimento do educando nas áreas acadêmicas e funcionais. Dessa forma, o PEI oportuniza avanço do estudante em áreas críticas e documenta educação e serviços adequados que vão além do mero cumprimento de imposições legais. Nesse sentido, caracteriza-se como uma ferramenta regulatória que procura conectar exigências legais, objetivos acadêmicos e o trabalho diário da educação para a inclusão dos alunos com deficiências (Yell et al., 2016; Bray e Russel, 2018; Tran, Patton e Brohammer, 2018).

A reunião da equipe que compõe o PEI ocorre pelo menos uma vez ao ano (Burke e Goldman, 2017), dependendo das demandas do estudante, e é considerada um ambiente “chave” para a implementação, onde os pais trabalham junto com a escola para discutir as necessidades do estudante e construir o seu plano. Trata-se, portanto, de uma oportunidade de os pais defenderem os direitos de seus filhos nas escolas. Muitas decisões são tomadas nesses encontros sobre a elegibilidade, programas educacionais e locais de atendimento do aluno com deficiência, onde os profissionais da escola, ao lado dos pais, definem o programa educacional final do estudante, com objetivos e metas de aprendizagem a serem alcançadas (Meirelles, Dainese e Friso, 2017; Schanding et al., 2017).

A utilização do PEI no Brasil ainda se mostra uma prática embrionária, consistindo em iniciativas escassas e isoladas (Glat e Pletsch, 2013). Na realidade nacional, embora seu uso seja estimulado, não há uma determinação legal para a utilização específica do PEI como ferramenta de auxílio no processo de inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais nas escolas (Tannús-Valadão, 2010; Tannús-Valadão et al., 2016). No entanto, o PEI pode contribuir significativamente para a instrumentalização dos professores de forma bastante objetiva e prática (Pereira e Nunes, 2018).

Já as pesquisas internacionais apresentam o PEI como mecanismo fundamental para documentar o processo de ensino aos estudantes da educação especial (Tran, Patton e Brohammer, 2018). O PEI busca garantir que os conteúdos do plano do aluno sejam relevantes e apropriados para suas necessidades, viabilizar o envolvimento dos pais no planejamento, possibilitar ganhos educacionais significativos, oportunizar ao estudante o progresso em áreas importantes e contar com uma avaliação que considera o nível do potencial cognitivo e o desempenho funcional atual do aluno (Yell et al., 2016). Com base em uma análise sobre a dinâmica entre as demandas institucionais e a prática para a implementação do PEI, entende-se que este é um documento legal que procura orientar a educação do aluno por meio de ensino direcionado para as necessidades individuais de aprendizagem. Ainda, é um instrumento regulatório para conectar as exigências legais e os objetivos com o trabalho diário na educação de estudantes com deficiência (Bray e Russel, 2018). Um dos aspectos mais importantes que contribuem para a efetividade da educação especial é a implementação, ou execução do PEI em si (a ideia de oposição à mera existência de um objeto burocrático), após o processo avaliativo do aluno. Além disso, esse plano possibilita o monitoramento do progresso do aluno, influencia a participação discente no currículo, orienta adaptações para os métodos de ensino e os meios de avaliação do estudante e é considerado pela maioria dos países uma prática universal e um elemento essencial para as provisões ao aluno com deficiência nas escolas (Sackes e Halder, 2017). Em um artigo para discutir as principais falhas dos profissionais da educação no desenvolvimento do PEI, Yell et al. (2016) analisam o cenário judicial e citam Bateman (2011), que descreve a grande importância do PEI por estar no centro da maioria das disputas da educação especial nos tribunais americanos. A efetividade do PEI é descrita como positiva na pesquisa de Ahmed (2015), que investigou sua aplicação pelos professores entre alunos com dificuldades de aprendizagem, dado o desafio que encontravam no manejo de situações de aprendizagem e para aumentar as competências dos alunos e desenvolver suas habilidades acadêmicas. A despeito de alguns posicionamentos equivocados sugerirem que a inclusão requer uma reconfiguração, substituição e/ou elaboração de um novo currículo, a prática do PEI no cenário internacional sugere uma gradação de ações, partindo de acomodações e ajustes discretos pelo ensino diferenciado até modificações mais significativas no conteúdo e na avaliação, para apoiar o processo de aprendizagem do aluno, com base no no mesmo currículo trabalhado com os pares de desenvolvimento típico (Osarti, 2013; Costa, 2016; Pereira e Nunes, 2018).

Assim, verifica-se a necessidade de pesquisas que investiguem as contribuições do PEI no contexto educacional brasileiro, visto que este apresenta diferentes aspectos nas suas condições básicas, como: avaliação do aluno; apresentação do nível de desenvolvimento atual discente; qualificação das metas (específicas, mensuráveis, realísticas e com tempo/prazo adequado); operacionalização das metas (metodologia clara de avaliação do seu progresso, bem como responsabilidade de monitoramento dela); perspectivas e anseios dos pais; entre outros; quando comparado a outros países. Essas ações poderão formar um escopo mais robusto de comprovações que justifiquem a possibilidade de uma implantação futura do PEI, de forma legal, em todas as instituições de ensino.

O PLANO EDUCACIONAL INDIVIDUALIZADO E O TRABALHO COLABORATIVO

O PEI é uma metodologia que pode ser muito útil quando tomada com base em alguns princípios para sua funcionalidade, como: colaboração, individualização e formação. Todos são necessários, porém a importância da colaboração, como é destacada em outros estudos (Costa, 2016; Pereira e Nunes, 2018), torna-se mais relevante nesta pesquisa por ser o foco de análise.

Uma das características que define o PEI como único em relação aos demais planejamentos escolares é a atuação da equipe de profissionais que participa de sua elaboração, e não apenas na execução mecânica, articulada ou cooperativa. Esse aspecto é especialmente descrito por Glat e Pletsch (2013, p. 32, grifo nosso), que destacam que “[…] é fundamental que a proposta do PEI seja elaborada de forma colaborativa entre os professores […]”. Tannús-Valadão (2010) corrobora a mesma operacionalidade indicando a necessidade de o PEI ser desenvolvido colaborativamente com a participação da escola, dos pais, do próprio estudante (sempre que possível), bem como outros profissionais e agências educativas relevantes.

Assim sendo, esta perspectiva de construção coletiva traz consigo o pressuposto de um trabalho colaborativo como forma de condução de todo o processo. Para Damiani (2008), o trabalho colaborativo traz a ideia de um esforço em conjunto, mas não apenas na operação de um sistema pronto, e sim na própria geração deste, deflagrada pelas tomadas de decisões compartilhadas e responsabilização mútua. De forma mais clara, um trabalho em equipe pode ser conduzido por um empreendimento cooperativo entre os indivíduos.

O estudo de Tucker e Schwartz (2013), sobre a perspectiva dos pais quanto à colaboração com os profissionais da escola, relata que a informação dos pais no processo do PEI é um componente importante para a criação de uma parceria colaborativa e que essa ação é uma das melhores práticas para auxiliar as crianças com TEA. Quando os pais são muito envolvidos, o professor também tem maior engajamento com aqueles estudantes e, trabalhando junto e recebendo dicas dos pais, o professor pode reconhecer com maior facilidade as dificuldades do aluno para auxiliar precocemente a sua vida acadêmica. Os estudantes, então, passam a apresentar menos problemas de comportamento e alcançam níveis mais altos academicamente (Roe, 2008). O estudo de Fontes (2009), embora verse sobre o trabalho colaborativo na bidocência, aponta a importância da construção de uma rede colaborativa entre as instituições escolares e de saúde para que as decisões e ações sejam consensuais e impactem positivamente o trabalho pedagógico do professor na escola. Por fim, é necessário enfatizar o trabalho colaborativo para construir um espaço de conhecimento sobre a educação especial, a fim de reduzir a conversa técnica e propiciar um ambiente de comunicação mais confortável e favorável aos interesses educacionais do estudante (Roe, 2008).

Autores como Ferreira et al. (2007) e Friend e Cook (1990) entendem o trabalho colaborativo não como condição dicotômica em que a colaboração está ou não está presente. Para eles, o trabalho colaborativo pode ser entendido em termos de graus ou níveis de colaboração. Nesse sentido, observam-se algumas dimensões que influenciam o nível de colaboração de uma equipe de trabalho, as quais podem ser sumarizadas em oito:

  1. objetivos em comum;

  2. participação compartilhada;

  3. responsabilidade compartilhada;

  4. equivalência entre participantes;

  5. recursos compartilhados;

  6. apoio administrativo;

  7. expectativas realísticas; e

  8. voluntariedade.

Os objetivos em comum são considerados imprescindíveis, exigindo que o grupo tenha ao menos um que seja significativo (Friend e Cook, 1990). Esses objetivos devem ser caracterizados por uma consciência recíproca das motivações, preocupação e compromisso entre os membros (Kingdon, 1973; Appley e Winder, 1977). Já a participação compartilhada depende do engajamento ativo de cada membro (Friend e Cook, 1990). Não implica necessariamente um desempenho quantitativamente equivalente entre os indivíduos, mas o envolvimento nas tomadas de decisão e uma divisão de trabalho (Hord, 1986). Outra dimensão considerada nodal para que um trabalho seja mais colaborativo é a responsabilidade compartilhada. Esta estabelece-se quando indivíduos se comprometem mutuamente com seus resultados, tanto positivos como negativos (Friend e Cook, 1990). Envolvem um grande espectro de atribuições para a gestão de situações diversas: financeiras, políticas, filosóficas, logísticas, entre outras (Hoyt, 1978). A dimensão equivalência entre participantes tem o sentido de tratar com igualdade ou valorizar igualmente a contribuição de cada pessoa no grupo (Friend e Cook, 1990). Os recursos compartilhados destacam a importância da contribuição significativa de recursos entre os profissionais quando em uma atividade colaborativa, os quais podem ser caracterizados por objetos, mas também por ações financeiras, alocação de tempo, medidas de gestão, incentivo, valorização, entre outros (De Bevoise, 1986; Friend e Cook, 1990). O apoio administrativo traduz-se como uma ação essencial da gestão institucional para o apoio de uma colaboração significativa entre os membros da equipe. Podem ser ações para a remoção de entraves burocráticos, apoio de recursos, incentivos e reconhecimento da equipe de trabalho (De Bevoise, 1986). As expectativas realísticas estão relacionadas com a necessidade de haver um olhar mais amplo para o contexto em que está inserido o trabalho colaborativo. Devem-se considerar as dificuldades internas e externas para a realização da atividade em equipe (ibidem). Por fim, a dimensão voluntariedade também tem sido pontuada na literatura como premissa para o trabalho colaborativo. A voluntariedade aqui é entendida como a disponibilidade autodeterminada de cada membro na busca dos objetivos do grupo (Friend e Cook, 1990).

No contexto escolar, constata-se que o trabalho colaborativo tensiona o deslocamento do epicentro do processo de ensino-aprendizagem: do profissional, como único agente responsável, para a equipe multiprofissional; ou seja, há uma mudança de foco do individual para o coletivo. Essa ênfase observa-se também na inclusão educacional porque “[…] o trabalho colaborativo movimentou as escolas para um novo eixo de ação frente aos alunos com deficiência” (Givigi et al., 2016, p. 370). Este aspecto é fundamental no atual contexto da inclusão escolar de alunos com deficiências, em que se preconiza que não somente o professor, o educador especial ou o coordenador pedagógico deve deter a responsabilidade de planejar para o aluno, como em outras formas de planejamento escolar, mas sim toda a equipe — e tanto de avaliar e planejar como de monitorar e tomar decisões no processo de ensino-aprendizagem do estudante. Isso, até mesmo, com a participação dos pais nessa construção (Yell, Bateman e Shriner, 2020). Lembrando que a educação de qualidade para estudantes com deficiência é um dever do Estado, da família e da comunidade escolar (Brasil, 2015a).

Há estudos, nacionais e internacionais, que indicam possíveis incrementos na inclusão de alunos com deficiência, sugerindo o afastamento de ações docentes solitárias e a aproximação de um modelo de ação colaborativa, incluindo principalmente os pais do estudante e, quando possível, o próprio estudante (Roe, 2008; Mendes, Almeida e Toyoda, 2011; Tucker e Schwartz, 2013). Nesse contexto, existe a tendência de as escolas se mostrarem mais inclusivas, alunos com TEA serem assistidos com uma abordagem efetiva, os professores disponibilizarem mais atenção e auxílio para o estudante, os problemas de comportamento serem minimizados, níveis acadêmicos mais altos serem alcançados, um espaço de conhecimento sobre a educação especial ser criado para gerar uma comunicação mais fluida entre os agentes envolvidos no trabalho educacional e o processo inclusivo encontrar viabilidade. Todavia, não há pesquisas que verifiquem a relação “PEI/trabalho colaborativo” e suas implicações decorrentes para o processo inclusivo.

Por essa razão, o objetivo deste estudo foi descrever o processo de implementação do PEI em sua fase de elaboração, estruturado pela capacitação da equipe, avaliação pedagógica do aluno e redação do PEI; e verificar a influência dessa implementação sobre o trabalho colaborativo de professores e família, em uma escola de Ensino Fundamental no interior do estado do Rio Grande do Sul.

METODOLOGIA

DELINEAMENTO

A dimensão social — trabalho colaborativo da equipe — deste estudo remete a um tipo de pesquisa com viés qualitativo, na modalidade de estudo de caso (Gil, 2002; Anache, 2009). O estudo de caso é muito abrangente nas ciências sociais e permite um aprofundamento teórico de um ou mais objetos (Gil, 2002). Mais especificamente, Alves-Mazzotti (2006) afirma que o estudo de caso se caracteriza pelo conhecimento da unidade, podendo ser um pequeno grupo. Nesse sentido, a pesquisa considera como unidade de análise a equipe escolar (o caso) para observar as implicações do PEI no trabalho colaborativo do grupo durante o processo de implementação do plano, com medidas de pré e pós-implementação.

Outro aspecto importante é que o estudo de caso se caracteriza como a metodologia mais adequada para o conhecimento de um fenômeno contemporâneo, em seu contexto real. Esse aspecto vai ao encontro dos objetivos desta pesquisa, que procura fomentar o conhecimento sobre o fenômeno contemporâneo denominado “inclusão” em um contexto real da “escola”. Ainda, esta pesquisa classifica-se como estudo de caso na modalidade instrumental, pois propõe-se a auxiliar o conhecimento e atingir metas específicas (Gil, 2002). Para Alves-Mazzotti (2006), o estudo de caso instrumental fundamenta-se na crença de que o caso específico poderá subsidiar o entendimento de algo mais amplo, favorecendo assim a possibilidade de descobertas e até mesmo o questionamento de generalizações.

PARTICIPANTES

Participou do estudo uma equipe formada de sete pessoas: uma coordenadora pedagógica, uma educadora especial, três professores regentes, uma monitora e a mãe de um aluno com autismo, que desenvolveram o PEI conforme as demandas do aluno selecionado. Em apoio à equipe, o primeiro autor deste trabalho, com graduação em educação especial e mestrando em Educação pela Universidade Federal de Santa Maria, na época, participou como agente de intervenção. Uma graduanda em educação especial pela Universidade Federal de Santa Maria participou como assistente de pesquisa.

O aluno para o qual o PEI foi desenvolvido pela equipe, um menino de 11 anos, tinha, na ocasião do estudo, o diagnóstico clínico de Síndrome de Asperger, ou autismo de alto desempenho. Atualmente essa classificação foi substituída apenas por TEA. O estudante não demonstra dificuldades cognitivas no seu nível escolar e tem preferências por temas científicos e jogos de computador. Entretanto, necessita de apoio para organização pessoal e do material na escola. O aluno é muito ativo e apresenta dificuldade de permanecer sentado em sala de aula por longos períodos. Seus maiores desafios são de ordem social, pois ele apresenta comprometimento das competências sociais necessárias para interações típicas.

INSTRUMENTOS

Escala de trabalho colaborativo (Costa, 2016): construído especificamente para este estudo com base em revisão de literatura sobre trabalho colaborativo (De Bevoise, 1986; Friend e Cook, 1990; Damiani, 2008; Mendes, Almeida e Toyoda, 2011; Mendes, Vilaronga e Zerbato, 2014). Verifica as percepções de cada integrante da equipe quanto ao trabalho colaborativo por meio de uma escala likert com oito dimensões, a quais podem receber pontuação entre 0 e 5:

  1. objetivos em comum;

  2. participação compartilhada;

  3. responsabilidade compartilhada;

  4. equivalência entre participantes;

  5. recursos compartilhados;

  6. apoio administrativo;

  7. expectativas realísticas; e

  8. voluntariedade.

Neste caso, o registro da escala pelo próprio integrante da equipe representa o método de autorrelato, em razão da natureza subjetiva do fenômeno (trabalho colaborativo) observado.

Quadro de capacidades e dificuldades do aluno: adaptado da pesquisa de Goepel (2009), coleta informações sobre as capacidades e dificuldades do aluno no contexto escolar. Permite a organização de até 12 itens para cada categoria (capacidades e dificuldades), com base na perspectiva dos profissionais e dos pais/responsáveis.

Inventário de habilidades escolares (Pletsch, 2009): tem a função de conhecer o desenvolvimento do aluno nas habilidades de comunicação oral, leitura e escrita, raciocínio lógico-matemático e informática, para verificar se ele apresenta tais habilidades sem necessidade de suporte, com suporte ou se não as realiza.

Diário de campo: adaptado com referência em modelos utilizados em outras pesquisas que investigaram o PEI (Pletsch, 2009; Braun e Vianna, 2011; Glat, Vianna e Redig, 2012). Tem como objetivo orientar a equipe PEI quanto às questões a serem observadas e relatadas durante a observação do aluno incluído, em sala de aula. Contém eixos de observação, tais como: o comportamento do aluno em sala de aula; interações e participação do aluno, atividades desenvolvidas pelo professor; e demais observações sobre as áreas acadêmica e social do aluno.

PROCEDIMENTOS DE COLETA E ANÁLISE DOS DADOS

Os procedimentos desta pesquisa contemplaram as seguintes fases:

  1. avaliação pré-intervenção do trabalho colaborativo;

  2. implementação do PEI; e

  3. avaliação pós-intervenção do trabalho colaborativo.

O aluno com autismo foi selecionado após uma consulta prévia no sistema Censo Escolar da Educação Básica, do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Anísio Teixeira (INEP), de 2015 (Brasil, 2015b). Por meio de visitação agendada com a escola, a pesquisa foi apresentada para apreciação da equipe diretiva da escola e mãe do aluno. A própria direção da escola identificou os professores que teriam interesse em fazer parte da pesquisa e organizou a equipe PEI de acordo com os critérios preestabelecidos para os docentes — se voluntariar para a pesquisa e atender aluno com autismo — e para o estudante — ter o diagnóstico médico de TEA, de acordo com o Manual de Diagnóstico e Estatístico dos Transtornos Mentais (APA, 2013). O presente estudo foi submetido à análise e aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa (CEP), via Plataforma Brasil, da Universidade Federal de Santa Maria, sob o número de Certificado de Apresentação para Apreciação Ética (CAAE) 55556016.8.0000.5346; sendo preservada a identidade dos participantes com a utilização de nomes fictícios.

Na fase da pré-intervenção do trabalho colaborativo foi aplicado o instrumento Escala de Trabalho Colaborativo, que captou individualmente a percepção dos participantes sobre o trabalho colaborativo entre eles e os demais profissionais envolvidos na escolarização do aluno com autismo, antes da implementação do PEI pela equipe. O preenchimento da escala foi realizado nas dependências da própria escola, em momento único pra todos, em que cada integrante era responsável pelo registro, de forma individual, coordenado pelo agente de intervenção. Ainda nesta fase, os professores, com a mãe do aluno, preencheram o instrumento Quadro de capacidades e dificuldades do aluno, com a finalidade de coletar dados sobre o estudante para a fase de implementação do PEI.

Durante a implementação do PEI as seguintes etapas intermediárias foram seguidas: capacitação da equipe, avaliação pedagógica e redação do PEI. Nesta fase, o objetivo foi realizar a coleta de dados para a construção do PEI. Foi proposta uma capacitação para o nivelamento do conhecimento da equipe sobre os seguintes temas: políticas e inclusão, TEA (especificamente Síndrome de Asperger), conceito e estrutura do PEI e detalhamento dos procedimentos envolvidos para a realização da pesquisa na escola. Foi realizado o total de quatro encontros, de quatro horas de duração cada, uma vez por semana, no turno da manhã, completando 16 horas de capacitação na própria escola. A capacitação da equipe foi produzida no formato de aulas expositivas, com projeção em multimídia. Nessas ocasiões, realizaram-se leituras e reflexões sobre textos com relação aos assuntos relevantes (políticas, inclusão, autismo, PEI e pesquisa). Ao final de cada encontro, eram entregues novos textos à equipe, com a intenção de fomentar as discussões e reflexões em relação às temáticas das próximas reuniões.

Na avaliação pedagógica, a equipe PEI realizou observações diretas no aluno, em sala de aula e nos demais ambientes da escola, em dias e horários aleatórios, durante o período de nove dias úteis. No entanto, o tempo decorrido para a efetivação de todo o processo avaliativo do aluno foi de 21 dias úteis. É necessário acrescentar que todo o processo foi acompanhado pelo agente de intervenção, que auxiliou e orientou nas dúvidas durante essa avaliação.

Os instrumentos Inventário de habilidades escolares e Diário de campo foram disponibilizados durante esta fase da avaliação pedagógica, após a etapa de capacitação, como suporte às observações. Os membros da equipe, depois de orientações sobre a estrutura e os itens a serem considerados desses dois instrumentos, fizeram suas observações individuais. Ao fim desse período de observação, todos os instrumentos de coleta de dados sobre o aluno foram entregues e, posteriormente, as informações foram compiladas e sistematizadas pelo agente de intervenção e entregues para a equipe PEI na forma de tabelas e gráficos. Esse procedimento de sistematização dos dados procurou auxiliar a equipe, para facilitar a interpretação e compreensão do grande volume de informações sobre as potencialidades e dificuldades do aluno, disponibilizadas na fase da avaliação pedagógica. Também objetivou apoiar a elegibilidade e a prioridade das metas do PEI pela equipe. Ainda, os dados possibilitaram contribuições para as análises deste estudo, como subsídios às inferências e à compreensão dos fenômenos no trabalho colaborativo da equipe.

Todas as informações coletadas no processo de avaliação, incluindo aquelas fornecidas pela mãe, foram concluídas em forma de um relatório descritivo, o qual foi assinado pelos membros da equipe PEI. Posteriormente foi impressa uma cópia do relatório e entregue a mãe para conhecimento e concordância com a respectiva avaliação.

A redação do plano consistiu no registro dos principais itens que compõem o PEI, contidos em um modelo de plano disponibilizado para os redatores da equipe — coordenadora pedagógica e professora de educação física —, escolhidos pela própria equipe para redigirem uma proposta de plano, de acordo com os protocolos de elaboração verificados em Tannús-Valadão (2010), Autism Speaks ([s.d.]) e U.S. Departament of Education (2000). O texto foi construído processualmente pelos redatores, com o registro das possíveis adequações curriculares, flexibilizações de horário, logística, estratégias de ensino, apoio especializado etc. Os redatores tiveram um período de 13 dias para a redação do PEI, de forma independente dos demais membros da equipe. Todo o processo de redação do PEI foi acompanhado pelo agente de intervenção para auxiliar e orientar as possíveis dúvidas durante esta etapa. A redação do PEI foi finalizada em forma de relatório descritivo, o qual também foi assinado pelos membros da equipe, com a anuência da mãe. Posteriormente, foi impressa uma cópia do plano e entregue à mãe para conhecimento e concordância com o respectivo planejamento.

A avaliação pós-intervenção do trabalho colaborativo ocorreu depois de quatro meses de implantação do PEI pela equipe e foi realizada com a replicação da Escala de Trabalho Colaborativo. O objetivo desta última avaliação foi verificar, de forma comparativa à pré-intervenção, a contribuição do PEI no trabalho colaborativo da equipe, com base na percepção dos professores. Assim, a Escala de Trabalho Colaborativo foi analisada de forma comparativa entre as fases pré e pós-implementação do PEI. Foi verificada a pontuação geral da escala de colaboração, tomando-se as dimensões como um todo e cada dimensão individualmente, por meio do somatório das pontuações (0–5), relativo aos conceitos atribuídos a cada uma.

A avaliação inicial sobre o trabalho colaborativo dos profissionais, membros da equipe PEI, foi desenvolvida por meio da Escala de Trabalho Colaborativo. Sua aplicação foi concomitante com o instrumento Quadro de capacidades e dificuldades do aluno. Cada dimensão da escala foi explicada com base em seu conceito pelo agente de intervenção aos participantes (professores e mãe do aluno), separadamente. Quando todas as dúvidas foram dirimidas, os profissionais e a mãe preencheram a escala de forma independente, sem a interferência de terceiros, nas dependências da própria escola. Na avaliação pós-implementação do PEI, a aplicação da Escala de Trabalho Colaborativo para cada participante ocorreu imediatamente após a finalização da escrita, correções e impressão do plano, e todas as dimensões do formulário foram retomadas de forma coletiva, e não individual, pelo agente de intervenção. Quando todas as dúvidas foram abordadas, realizaram-se os mesmos procedimentos da pré-intervenção.

RESULTADOS

Os dados da implementação do PEI (capacitação da equipe, avaliação pedagógica e redação do PEI) serão demonstrados primeiramente, e os dados da escala de colaboração da equipe nos momentos de pré e pós-intervenção, comparativamente, depois.

CAPACITAÇÃO DA EQUIPE DO PLANO EDUCACIONAL INDIVIDUALIZADO

Os resultados da capacitação foram coletados de observações registradas pelos pesquisadores (agente de intervenção e assistente de pesquisa) durante os encontros. Dessa forma, os dados foram organizados em duas categorias: participação e assuntos relevantes. Em relação à participação, o Quadro 1 indica a frequência da equipe durante a capacitação, sendo o último encontro penalizado pela ausência de alguns professores.

Quadro 1 Participação dos membros na capacitação da equipe Plano Educacional Individualizado. 

Categoria Encontro Frequência
Participação 1 Integral 6
Parcial 1
Nula 0
2 Integral 4
Parcial 2
Nula 1
3 Integral 5
Parcial 1
Nula 1
4 Integral 4
Parcial 0
Nula 3

Durante a capacitação da equipe, a participação integral na aula (do início ao fim) foi acima da média, com 67,8%. A parcial (presença por algumas horas) foi baixa, com percentual de aproximadamente 14,2%. A nula (ausência do membro) resultou em torno de 17,8%. É importante destacar que houve um resultado crescente da participação nula (não participação) em toda a capacitação. Com isso, verifica-se frequência pouco estável durante o período da capacitação da equipe, considerando-se os poucos dias de encontro para a capacitação (quatro) e o pequeno grupo de pessoas (sete). Por outro lado, entende-se que quando se tem um período mais longo de capacitação (mais horas) e também com maior número de participantes (grupo maior), a frequência nos encontros presenciais está mais suscetível a oscilações.

A categoria dos assuntos relevantes reuniu o total de 26 itens, apresentando as principais preocupações demonstradas pelos professores que emergiram durante a capacitação, dentre elas: importância da troca mútua entre instituições, construção do Plano Político Pedagógico, barreiras atitudinais dos professores e dificuldades pela falta de tempo na escola. Essas informações foram importantes para subsidiar as interpretações e discussões dos dados deste estudo.

AVALIAÇÃO PEDAGÓGICA DO ALUNO

O emprego do Quadro de capacidades e dificuldades do aluno possibilitou o acesso às informações iniciais, com a demonstração da perspectiva individual de cada integrante da equipe PEI sobre o aluno. Os percentuais mais relevantes (representando a maioria, com total de 68% em relação às demais atividades observadas), para a categoria capacidades/interesses do aluno, envolveram: jogos no computador, atividades gerais no computador, dinossauros, desenhos e jogos não eletrônicos. Na categoria dificuldades/desafios do aluno, os percentuais com mais ênfase foram para: dificuldade com a palavra “não” (quando contrariado), permanecer em sala de aula/sentado, habilidades motoras fina e ampla, alimentação e relacionamento com os colegas.

O Inventário de habilidades escolares possibilitou uma avaliação mais objetiva do aluno. Os professores realizaram observações do estudante, em sala de aula e demais ambientes da escola, e registraram suas competências para 45 itens nas áreas de comunicação oral, raciocínio lógico-matemático, leitura e escrita e informática. Os percentuais das observações individuais de cada integrante da equipe possibilitaram uma média aritmética global de concordância de todas as avaliações sobre o desempenho do aluno nas áreas observadas, de acordo com a Figura 1.

Figura 1 Média da concordância da equipe em relação ao desempenho do aluno nas habilidades. 

O instrumento Diário de campo também foi utilizado pelos integrantes da equipe PEI para coletar informações do ambiente da sala de aula, com descrições sobre a turma, as interações sociais do aluno, atividades ofertadas e executadas. De acordo com os pareceres resultantes dos professores, houve a possibilidade de agregar as informações por categorias: ambiente físico e social, aprendizagem, sugestões acadêmicas, sugestões sociais e comportamentos. As características físicas e sociais da turma foram relatadas como muito agitada e ruidosa, porém havia uma convivência social, com interações e conversas com o aluno. Nas aprendizagens se destacaram: dificuldade para copiar do quadro, não organiza o material escolar adequadamente, tem boa leitura e compreende as orientações do professor. As sugestões acadêmicas foram registradas com opções para facilitar o aprendizado do aluno, como: utilizar os interesses do aluno pelo desenho e por atividades desafiadoras e montar aulas bem estruturadas com imagens. Nas sugestões sociais foi dada ênfase à restrição do uso do computador durante o período de recreio, para estimular as interações sociais com os colegas; e trabalhar com a turma todas as questões de convivência e comportamento social. E, por fim, no comportamento foi preponderante o relato dos episódios em que o aluno saía frequentemente da sala de aula e também suas dificuldades para aceitar limites.

Na avaliação pedagógica, nem todos os membros participaram efetivamente e alguns, ainda, nem preencheram os instrumentos de observação. Por causa dessas falhas, a avaliação não pôde ser mais completa. De forma geral, apenas 57% dos membros em média estavam envolvidos em todo o processo avaliativo, o que se traduz como baixa participação na fase mais fundamental da construção do PEI (avaliação pedagógica do aluno).

REDAÇÃO DO PLANO EDUCACIONAL INDIVIDUALIZADO

Na primeira parte do PEI é apresentado o nível atual de desenvolvimento educacional do aluno. Ou seja, como a condição do aluno afeta o seu envolvimento e progresso no currículo geral. Trata-se de um relato atual da condição do aluno, baseado nos aspectos gerais observados durante a avaliação pedagógica. Em seguida, são expostas todas as metas a serem trabalhadas com o aluno durante o ano. O total de objetivos que compuseram o PEI do aluno neste trabalho foi de 22 metas, as quais abrangeram várias áreas de desenvolvimento do aluno: cognitivas (14), comportamentais (4), sociais (3), coordenação motora (1). Esses objetivos, junto com as estratégias sugeridas, os prazos para a conclusão da meta, a forma de avaliação do avanço do aluno na meta e as observações sobre qual profissional estaria diretamente envolvido com o objetivo específico são detalhados. Nas próximas seções do PEI foram relacionados serviços de educação especial na escola e apoio suplementar que o aluno recebe de outros profissionais. Também o PEI trouxe informações sobre a possibilidade de o aluno participar de outros tipos de avaliações regionais, estaduais ou nacionais, como o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM), e as modificações necessárias para o aluno na escola. As demais informações contidas no PEI trataram das metodologias a serem utilizadas pela equipe PEI para monitorar o desenvolvimento do aluno, as comunicações necessárias entre a equipe e os responsáveis pelo aluno e a data de início da implementação do plano. Todos os atos planejados neste plano foram devidamente reconhecidos por todos os membros da equipe PEI, por meio da aposição de suas assinaturas neste documento, embora durante a reunião final para a redação do PEI estivessem presentes apenas três membros da equipe.

A redação do PEI foi um procedimento mais simples, pois apenas contemplou a escrita do plano previamente elaborado pela equipe de redatores, orientados pela avaliação pedagógica e por um modelo de PEI ofertado pelo agente de intervenção, de acordo com os protocolos de elaboração verificados em Tannús-Valadão (2010), Autism Speaks ([s.d.]) e U.S. Departament of Education (2000).

TRABALHO COLABORATIVO

Quanto ao trabalho colaborativo, a Figura 2 exibe os resultados das médias entre os momentos de pré e pós-implementação do PEI para cada uma das oito dimensões. Destaca-se que, na pré-implementação, os sete integrantes da equipe PEI preencheram a escala e, na pós-implementação, apenas seis o fizeram.

Figura 2 Médias nas pontuações das oito dimensões do trabalho colaborativo antes e depois da implementação do Plano Educacional Individualizado. 

Pela análise comparativa, constata-se um crescimento geral do trabalho colaborativo após a implementação do PEI. Observa-se que a dimensão objetivos em comum apresentou diferença de 2,1 entre as duas médias. Essa dimensão foi a que apresentou maior crescimento de pontuações quando comparada com as demais. A última avaliação dessa dimensão atingiu o valor máximo da média de suas pontuações. Por outro lado, a dimensão que teve menor acréscimo de média de suas pontuações foi apoio administrativo, com um adicional de 0,6 entre a primeira e a segunda média. As demais dimensões tiveram acréscimo mediano de 1,3 em suas respectivas médias.

DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

Neste estudo, a implementação do PEI na escola propiciou momentos coletivos para pensar, avaliar e planejar o processo de ensino-aprendizagem do aluno. Por conseguinte, também permitiu a criação de um espaço na rotina escolar para que o trabalho colaborativo da equipe fosse aprimorado em toda a sua estrutura. Desse modo, a implementação do PEI também promoveu o aumento do nível de colaboração, diretamente beneficiando o envolvimento de cada membro do grupo em relação às demandas do processo inclusivo do aluno. Nesse contexto, o papel da dimensão equivalência entre participantes, por exemplo, foi fundamental. Essa dimensão apresentou-se entre as mais altas pontuações na primeira avaliação do trabalho colaborativo, mas não deixou de demonstrar acréscimo na percepção dos participantes na segunda avaliação. Isso indica uma percepção ainda maior de equidade entre os membros, na valorização das contribuições de cada um, importante para o trabalho colaborativo (Lago, 2014). Percebe-se a existência de um sentimento de valorização e de respeito individuais pelo emprego de atividades colaborativas entre os professores (Damiani, 2008), mas a participação da família ganhou relevo neste trabalho, em que a mãe do aluno se mostrou muito ativa em todo o processo de construção do PEI. O nível de participação dos pais no PEI, além de importante, pode ser elevado, exatamente porque os pais percebem uma valorização de suas contribuições por parte dos professores (Santos, 2017). A dimensão recursos compartilhados também exerceu função significativa na elevação do nível do trabalho colaborativo, e os recursos também podem compreender o tempo de planejamento entre os professores (De Bevoise, 1986). Nesse sentido, os momentos de capacitação da equipe, avaliação e planejamento do estudante propiciados pelo PEI, agregados à utilização de instrumentos estruturados de observação, pode ter favorecido uma observação mais adequada do aluno, gerando, portanto, segurança e estímulo para toda a equipe PEI, segundo o relato dos próprios professores na pesquisa de Costa (2016).

Os resultados da soma total dos pontos (baseados em conceito) no instrumento Escala de Trabalho Colaborativo exibiram crescimento para todas as dimensões, com pontuações diferentes umas das outras em ambas as avaliações. A variação nos pontos das dimensões mostrou-se importante, pois refletiu as perspectivas dos integrantes da equipe PEI em relação ao trabalho coletivo que estava sendo realizado na escola. Os conceitos lançados por cada membro podem suscitar questionamentos em relação a qual deles informa de maneira mais precisa o trabalho colaborativo da equipe na escola. No entanto, é improvável encontrar uma única explicação que justifique os diferentes conceitos, tampouco qual perspectiva melhor representa a realidade. Logo, a alternativa mais adequada é considerar que o conjunto dos dados das pontuações de todos os membros assegura um valor médio geral (4,5) acima da média inicial para o trabalho colaborativo (3,0), indicando positivamente as mudanças ocorridas após a implementação do PEI.

Com relação aos resultados específicos do comportamento das dimensões, reitera-se que o trabalho colaborativo foi avaliado pela aplicação de uma escala que trazia o conceito do membro (0–5) para as dimensões que o estruturam: objetivos em comum, participação compartilhada, responsabilidade compartilhada, equivalência entre os profissionais, recursos compartilhados, apoio administrativo, expectativas realísticas e voluntariedade. Destaca-se que, de todas as dimensões, apenas a objetivos em comum se comportou com variação percentual de quase 100% das suas pontuações, entre as testagens de início e fim do trabalho colaborativo. Essa elevação na pontuação da dimensão demonstra uma possível adesão aos objetivos em relação ao aluno quando os profissionais trabalharam colaborativamente para desenvolver o plano educacional. Também, a clareza quanto aos objetivos de aprendizagem de um aluno com deficiência que a elaboração de um PEI possibilita aos membros da equipe também pode explicar tanto a elevação na pontuação atribuída pelos participantes quanto a própria importância do PEI para guiar a atuação profissional docente diante de um aluno com deficiência. A participação compartilhada, como demonstrada anteriormente, teve a pontuação mais baixa inicialmente e também se manteve entre as dimensões de menor pontuação na segunda avaliação. Esse comportamento pode estar relacionado de forma geral com o perfil de alguns membros da equipe, que apresentaram pouca participação ativa, o que não pode ser confundido com a pouca participação numérica de membros nas fases de implementação do PEI.

A dimensão apoio administrativo foi a que demonstrou menor percentual de variação entre os dois momentos de avaliação do trabalho colaborativo e pontuação mais baixa na última avaliação. A pouca variação pode ser indicadora de um escasso apoio da gestão escolar para o trabalho colaborativo da equipe durante as atividades de implementação do PEI. Algumas justificativas dos membros para suas ausências nos encontros de capacitação estavam diretamente ligadas a questões da gestão institucional. A falta de apoio da gestão escolar tem sido referenciada como uma barreira para o processo inclusivo, caracterizada por uma frágil rede de apoio a alunos com autismo (Nunes, Azevedo e Schmidt, 2013). A carência de participação ativa da gestão escolar, até mesmo a inexistência de qualquer apoio, é percebida como impedimento para a inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais, visto que, “[…] a partir desse apoio é que surge o tempo para o planejamento conjunto entre professores […]” (Lago, 2014, p. 194). Outra pesquisa apresenta “[…] duas características para uma escola se tornar mais inclusiva: gastar tempo e energia formando a equipe escolar e capacitar equipes educacionais para tomar decisões de forma colaborativa” (Vilaronga e Mendes, 2014, p. 140). Nesse aspecto, os estudos de De Bevoise (1986) mostram que o apoio administrativo é imprescindível para a efetivação de um trabalho colaborativo.

De forma geral, as outras dimensões também apresentaram média superior em suas pontuações, comparando-se os períodos de avaliação. Isso pode ser entendido como a influência que uma dimensão exerce na outra, mesmo sendo elas independentes. Ou seja, no momento que uma é estimulada e desenvolvida é provável, mas não necessário, que as demais também apresentem o mesmo comportamento. Nesse sentido, como houve elevação nas pontuações de todas as dimensões entre as duas avaliações, o nível do trabalho colaborativo também foi elevado. Esse fenômeno reflete a dependência do trabalho colaborativo em relação às dimensões que o compõem. Mesmo com alterações no percentual de variação entre as dimensões, o nível do trabalho colaborativo avançou em curto intervalo de tempo entre as duas avaliações (em torno de quatro meses). Assim, esta pesquisa pode demonstrar um significante acréscimo no nível do trabalho colaborativo da equipe durante a construção do PEI na escola. É importante salientar também que a mãe do aluno foi o membro da equipe que apresentou as maiores pontuações por instrumento durante as duas avaliações do trabalho colaborativo; o que pode ser interpretado como uma perspectiva ou expectativa elevada da mãe em relação ao trabalho colaborativo realizado na escola. Esse fato pode ser traduzido pela boa relação entre família e escola e a possibilidade de que a escola e a pesquisa tenham propiciado à mãe participar do planejamento escolar de seu filho.

Constatada a elevação nas pontuações de todas as dimensões e do nível do trabalho colaborativo entre as avaliações de pré e pós-implementação do PEI, há de se ponderar a inerente influência da própria implementação do PEI, estimulada pela pesquisa, na elevação desses níveis, em um curto período (quatro meses). O trabalho integrado entre os membros para desenvolver as fases de forma colaborativa, em uma ação conjunta e sistemática, somado à necessidade intrínseca de participação de vários profissionais, principalmente da família, na elaboração do plano, foi o grande responsável pela elevação do nível do trabalho colaborativo da equipe nesse curto período de tempo. Em adição, a possível necessidade de cada membro da equipe em se ver como parte de um processo em benefício de alguém pode ter estimulado a colaboração, e isso é intrínseco ao processo de implementação do PEI, o que destaca ainda mais a importância de sua utilização. Além de promover o trabalho colaborativo da equipe, a literatura demonstra que esta forma sistemática de trabalho, consequentemente, também tem favorecido o processo inclusivo de alguns alunos com deficiência (Lago, 2014).

Os benefícios para a equipe PEI presentes neste estudo também são confirmados em outras pesquisas sobre o trabalho colaborativo, na modalidade do coensino, tais como: a geração de confiança mútua entre os membros, sensação de amparo, encorajamento para atuar com o aluno, ampliação de conhecimentos sobre o aluno, autorreflexão sobre as práticas pedagógicas, espaço de formação continuada e desenvolvimento pessoal e profissional (Capellini, 2004; Damiani, 2008; Toledo, 2011; Rabelo, 2012; Lago, 2014). Destaca-se o empoderamento do professor pelo trabalho colaborativo que possibilita aos docentes outras práticas no processo de ensino-aprendizagem, evitando o “velho modelo excludente” (Givigi et al., 2016, p. 368). A importância dessa especificidade operacional de trabalho e seus consequentes benefícios é descrita por Mendes, Almeida e Toyoda (2011, p. 89) da seguinte forma:

[…] a aprendizagem colaborativa oferece grandes vantagens que não estão disponíveis em ambientes de aprendizagem mais tradicionais, uma vez que o grupo permite um grau mais significativo de aprendizagem e reflexão do que qualquer indivíduo poderia fazer de forma isolada.

O processo de desenvolvimento do PEI, harmonizado com a grade curricular, propicia os benefícios trazidos pelo trabalho colaborativo e capitaliza indiretamente avanços na inclusão do estudante, na medida em que os educadores se sentem amparados e motivados pela própria equipe e suas práticas passam a ser norteadas por um plano de ensino detalhado e bem fundamentado. Isso pode aumentar o atendimento às reais necessidades educacionais especiais do aluno e seu tempo de permanência na escola, bem como oferecer suporte da educação especial e de outros serviços na sala de aula regular, contribuindo, portanto, para sua efetiva inclusão e aprendizagem na escola. Quando possível, a participação do aluno no desenvolvimento do seu próprio PEI também pode trazer benefícios como aumento do nível de participação, autoconfiança, maior qualidade do PEI e melhores resultados acadêmicos (Blackwell e Rossetti, 2014). Em suma, o trabalho colaborativo, estimulado pela implementação do PEI nesta pesquisa, transcende os resultados da ação docente particularizada, por potencialmente gerar grau significativo de aprendizagem para o grupo, elevar a confiança dos professores, desenvolver habilidades interpessoais e de comunicação da equipe, provocar mudanças atitudinais de cada docente e desencadear potenciais resultados positivos para os alunos com deficiências em seu processo inclusivo e de desenvolvimento e aprendizagem (Mendes, Almeida e Toyoda, 2011; Costa, 2016).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O processo de implementação do PEI foi caracterizado pelas ações empregadas de capacitação da equipe, avaliação pedagógica do aluno e, por fim, a redação do plano. Estas práticas foram utilizadas em tempos sequenciais, com arranjos e instrumentos pertinentes à natureza de cada etapa. Com base em uma análise holística dos dados apresentados e das ações que envolvem este processo, constataram-se resultados positivos aos professores, os quais se tornaram agentes educacionais informados e com conhecimento mais amplo sobre o aluno, desenvolvendo assim maior consciência de suas potencialidades e dificuldades. O compartilhamento de informações sobre o aluno, durante o processo, também favoreceu a autoconfiança dos professores, acrescido da possibilidade de avaliação mais detalhada do estudante, com a utilização de instrumentos de observação mais objetivos. O trabalho colaborativo da equipe (professores e pais) durante todo o processo de implementação do PEI foi visivelmente influenciado, sendo cada dimensão modificada, ocasionando uma elevação do nível do trabalho colaborativo percebida pela equipe. Esse resultado pode ter provocado maior envolvimento da equipe PEI em torno de objetivos em comum para o aprendizado do aluno.

No entanto, apesar de adicionar informações a respeito dos benefícios que a implementação de um PEI pode proporcionar para o processo inclusivo de estudantes com deficiências, este trabalho apresentou limitações pertinentes à avaliação do trabalho colaborativo da equipe, bem como ao processo de implementação do PEI. Observa-se que houve dificuldade para a manutenção do mesmo quantitativo de participantes nas duas aplicações da Escala de Trabalho Colaborativo, pré e pós-implementação do PEI, com sete e seis integrantes, respectivamente. Todavia, a falta de participação de alguns membros não pode ser traduzida como uma imagem do trabalho colaborativo real da equipe, pois o baixo desempenho nas dimensões do trabalho colaborativo está relacionado aos conceitos atribuídos a cada uma e não ao quantitativo de membros que participaram das suas avaliações. Nesse sentido, conceitualmente a dimensão participação compartilhada se refere ao engajamento ativo do membro nas tomadas de decisões da equipe, principalmente em fases importantes do trabalho colaborativo (Friend e Cook, 1990). Já a responsabilidade compartilhada, que está diretamente relacionada com a participação, é descrita como comprometimento mútuo pelos resultados, até mais importante que a hierarquização e a expertise presente entre os membros (Rabelo, 2012; Lago, 2014). Assim sendo, a hipótese é de que as falhas de algumas dessas dimensões acarretariam também prejuízo ao trabalho colaborativo como um todo. Isso, porém, não foi verificável durante a implementação do PEI pela ausência de alguns membros. Tampouco as outras dimensões foram afetadas pela redução dos membros ao longo do estudo, a exemplo dos recursos compartilhados. Nesta dimensão especificamente, a possibilidade de troca de recursos (tempo, experiência dos profissionais e outros) foi agregada ao grupo durante o trabalho coletivo da avaliação pedagógica. A própria redução e a dificuldade na presença dos membros apresentaram-se nas demais fases da implementação do PEI — capacitação da equipe, avaliação pedagógica e redação do PEI —, que demonstram o sentido de voluntariedade expresso nessa dimensão.

Outra dificuldade apresentada durante este processo foi o preenchimento da Escala de Trabalho Colaborativo durante a aplicação pré-intervenção do PEI. Nesse momento, um dos integrantes não atribuiu conceito para a dimensão voluntariedade, deixando “em branco” a pontuação. Como justificativa, declarou que “a participação está baseada em um cumprimento legal e também na disponibilidade autodeterminada”. Entretanto, fica patente a confusão conceitual sobre voluntariedade quando se a entende com duplo sentido — determinado e autodeterminado. Circunstâncias do cotidiano escolar, em que professores são convidados a participar de um curso e aceitam voluntariamente realizá-lo e, ainda, estendem o convite a outros professores podem ser esclarecedoras para representar ações voluntárias e não determinadas (Vilaronga e Mendes, 2014).

Por uma avaliação qualitativa da capacitação da equipe e avaliação pedagógica, podemos verificar três demandas que influenciaram na presença efetiva dos membros às aulas: institucionais, pessoais e desconhecidas. Durante a capacitação da equipe, a monitora do estudante foi menos participativa em razão das necessidades institucionais. Dois professores regentes apresentaram predominantemente problemas pessoais de saúde. Entretanto, verificou-se atitude de autodeterminação para sobrepor essas dificuldades particulares demonstradas pela coordenadora e a mãe do aluno. Houve também razões desconhecidas nesta pesquisa para explicar a ausência da educadora especial nos encontros. Semelhantemente, a falta de participação dos membros na avaliação pedagógica deve-se às mesmas demandas. Essa dificuldade de atuação (presença) dos membros também é percebida como uma limitação significativa na pesquisa (Toledo, 2011).

Todos os resultados desta investigação indicaram possibilidades e desafios para o planejamento da inclusão escolar de um aluno com TEA, especificamente com a aplicação da metodologia de trabalho PEI. Logo, há necessidade de continuidade e ampliação desta pesquisa, visando à aplicação em mais escolas, para agregar evidências com relação às contribuições do PEI no trabalho colaborativo dos professores e consequentemente na inclusão de estudantes com autismo no contexto educacional brasileiro, visto que este apresenta diferentes aspectos nas suas condições básicas em relação a outros países. Considerando-se que o impacto de um PEI na vida acadêmica de um estudante também é em grande parte determinada pelas estratégias de ensino adotadas para atingir objetivos de aprendizagem, são necessários novos estudos que investiguem como a adoção de um PEI pode auxiliar na organização de práticas de ensino mais efetivas para impactar o desempenho acadêmico de um estudante com deficiência. Essas ações poderão formar um escopo mais robusto de comprovações, gerando evidência expressiva que justifique a possibilidade de implantação futura do PEI, de forma legal, em todas as instituições de ensino.

Financiamento: O estudo não recebeu financiamento.

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Recebido: 09 de Julho de 2022; Aceito: 25 de Outubro de 2022

Daniel da Silva Costa é doutor em Educação pela Universidade Federal de Pelotas (UFPel). E-mail:daniel.pesquisa.autismo@gmail.com

Carlo Schmidt é doutor em Psicologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Professor da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). E-mail:carlo.schmidt@ufsm.br

Síglia Pimentel Höher Camargo é doutora em Psicologia Educacional pela Texas A&M University (Estados Unidos). Professora da Universidade Federal de Pelotas (UFPel). E-mail: siglia.camargo@ufpel.edu.br

Conflitos de interesse: Os autores declaram que não possuem nenhum interesse comercial ou associativo que represente conflito de interesses em relação ao manuscrito.

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