1 Introdução
O direito de crianças entre 0 e 6 anos à educação pública é um avanço relativamente recente na história do Brasil, garantido pela Constituição Federal de 1988 e pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) - Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Esses documentos são os principais marcos normativos para a Educação Infantil no país e, neles, o Brasil passou a incorporar concepções da educação inclusiva que vinham sendo discutidas desde meados do século XX e que culminaram na Declaração de Salamanca, em 1994, da qual o país é signatário. Em consonância com a Declaração, o termo utilizado para se referir às crianças atendidas pela Educação Especial era alunos com “necessidades educacionais especiais” (NEE), indicando dificuldades de aprendizagem que requerem uma intervenção específica. Por esse entendimento, as escolas regulares deveriam promover o desenvolvimento integral de todas as crianças, respeitando os diferentes ritmos de aprendizagem e propondo práticas que atendessem às diferentes NEE (Mendes, 2017).
A partir da Política Nacional da Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva - PNEEPEI (Ministério da Educação, 2008), o conceito de NEE, que até então poderia se aplicar a qualquer criança em algum momento de sua trajetória escolar, passou a ser vinculado a um Público-Alvo da Educação Especial (PAEE) - alunos com deficiência, transtornos globais de desenvolvimento e altas habilidades/superdotação. Diferentemente do sentido original, o termo “necessidades educacionais especiais” passou a se referir na legislação a um conjunto mais limitado de condições (aquelas vinculadas ao PAEE), distanciando-se de uma concepção de inclusão mais abrangente. A delimitação desse público continua em vigor, sob a justificativa de que dá visibilidade a um grupo com maior necessidade de apoio, facilita seu acesso a serviços especializados (Almeida et al., 2014) e indica que a prioridade da inclusão escolar (Mendes, 2017) é a garantia ao acesso ao currículo.
A PNEEPEI (Ministério da Educação, 2008) estabelece que a Educação Especial é uma modalidade de ensino transversal a todas as etapas, que deve ser integrada à proposta pedagógica das escolas e garantir acesso ao ensino regular com participação e aprendizagem das crianças, desde a Educação Infantil até o Ensino Superior. Mesmo prevendo a oferta de Atendimento Educacional Especializado (AEE), a formação de professores e a participação da família e da comunidade, o foco está na organização do sistema de ensino para suprir as NEE de todos os estudantes, não apenas os alunos PAEE e suas dificuldades, reconhecendo que essas necessidades são fruto de uma complexa relação entre fatores sociais e educacionais, não apenas biológicos e individuais (Sanches & Teodoro, 2006). O pressuposto é de que se deve levar em conta, desde o início, a diversidade, reconhecendo, porém, que crianças com mais dificuldades demandam níveis de apoio diferenciados - do professor e, eventualmente, apoio externo.
Mendes (2017) chama atenção para o fato de que a PNEEPEI não especifica o que os professores devem fazer para apoiar a aprendizagem dos estudantes PAEE enquanto estão na classe comum. Consequentemente, os professores de classes regulares não encontram amparo no documento oficial para direcionar sua atuação com esse público. Nesse cenário, é comum que os professores relatem inseguranças quanto à inclusão e expressem a necessidade de terem outros profissionais de apoio dentro da classe regular (De Vitta et al., 2010; Oliveira et al., 2015).
Apesar das dificuldades e das incertezas relatadas pelos professores de todos os níveis em relação ao processo de inclusão escolar, há um número reduzido de pesquisas empíricas sobre a atuação dos professores junto a crianças PAEE em classes regulares, especialmente na Educação Infantil. Predominam estudos teóricos, revisões de literatura e investigações sobre a percepção de professores quanto à inclusão, em detrimento a pesquisas sobre práticas inclusivas ou que promovam o acesso ao currículo de crianças com NEE (Amor et al., 2019; Carvalho & Schmidt, 2021). Dessa forma, no contexto brasileiro, ainda se produz pouca evidência sobre o que pode melhorar o atendimento educacional das crianças PAEE e sobre o que é efetivamente oportunizado a elas nas escolas. Há indícios, ainda, de que mesmo educadores especializados em Educação Especial utilizam de forma pouco frequente as evidências disponíveis na literatura científica em sua prática rotineira na Educação Básica, seja por ceticismo quanto à utilidade das pesquisas, falta de alfabetização científica e a maneira pouco acessível como as pesquisas são descritas (Behrstock et al., 2011; Burns & Ysseldyke, 2009; Williams & Coles, 2007).
As dificuldades em promover a inclusão de alunos com NEE vêm chamando atenção para a qualidade da formação inicial e do desenvolvimento profissional continuado dos professores do ensino regular. Abuchaim (2018) explicita o fato de que os currículos dos cursos de Pedagogia revelam uma formação abstrata e pouco integrada ao contexto de sala de aula que os futuros docentes vão encontrar após se graduarem. Alves e Tebet (2009) destacam que as disciplinas sobre inclusão escolar são escassas, optativas e focam muito mais na sensibilização dos professores, o que, embora essencial para a formação de profissionais reflexivos, é insuficiente para o trabalho com crianças que apresentam NEE.
Pesquisas observacionais podem ser úteis ao descrever a interação entre professores e alunos no cotidiano das atividades pedagógicas, bem como seus efeitos sobre a aprendizagem. É preciso, inicialmente, identificar se práticas descritas na literatura como tendo evidências de eficácia/efetividade para o ensino de crianças PAEE são utilizadas por professores nas suas atividades com a classe e com as crianças PAEE de modo específico.
No Brasil, o movimento da Educação Baseada em Evidências é ainda incipiente. Segundo seus apoiadores, o uso das melhores evidências científicas sobre o que realmente funciona na prática educativa é caminho profícuo para atingir os resultados almejados com os estudantes (Sousa, 2017). Construir um repertório de estratégias efetivas é importante para amparar as decisões que os educadores precisam tomar em sala de aula, associando-se aos conhecimentos sobre desenvolvimento infantil, aprendizagem e as habilidades de cada criança atendida (National Association for the Education of Young Children [NAEYC], 2009). A proposta de amparar-se nas evidências não significa o seguimento de um roteiro rígido, mas o conhecimento sobre instrumentos pedagógicos que podem ser úteis para a criação de um ambiente educacional que oportunize a aprendizagem de todas as crianças, considerando suas necessidades de apoio e seus diferentes estilos de aprendizagem.
A revisão de literatura de Carvalho e Schmidt (2021) descreveu práticas educativas inclusivas voltadas a crianças que apresentam diferentes tipos e níveis de NEE. Os estudos, todos internacionais, destacaram a importância de o professor planejar as atividades com base em objetivos educacionais claros, contextualizar as crianças quanto à proposta da atividade, proporcionar um ambiente que favoreça o engajamento nas atividades propostas, dar feedback consistente ao seu desempenho, apoiá-las quando demonstram dificuldades, valorizar aquilo que elas conseguem fazer e ser responsivo a seus interesses e a suas motivações. Essas práticas, que podem ser consideradas simples e corriqueiras no cotidiano escolar, estruturam a aprendizagem de forma intencional e partem das habilidades prévias das crianças para desenvolver seu potencial máximo.
Considerando a necessidade de identificar as lacunas na formação de professores para atuar com o PAEE, o número reduzido de estudos empíricos sobre práticas baseadas em evidências no cenário brasileiro e a constatação de que crianças com dificuldades específicas necessitam de apoios específicos, a presente pesquisa foi conduzida. O objetivo foi verificar, em uma amostra de professoras da Educação Infantil, se suas práticas cotidianas incluem práticas descritas pela literatura recente como recomendadas para promover o acesso de crianças PAEE às atividades desenvolvidas em sala de aula. Além disso, buscou-se verificar se existem diferenças na abordagem geral utilizada na interação com crianças típicas e crianças PAEE.
2 Método
Nesta seção, descreve-se o perfil dos participantes da pesquisa; na sequência, discorre-se sobre os procedimentos utilizados para a coleta de dados; e, por fim, explana-se como se deu a análise desses dados.
2.1 Participantes
Participaram cinco professoras de 35 a 53 anos e seus alunos, 115 crianças entre 2 e 5 anos de idade. Cada professora era responsável por uma turma e, portanto, este estudo incluiu cinco turmas. Nove dessas crianças foram consideradas pelas professoras crianças PAEE6. Na Tabela 1, a seguir, são apresentadas informações que caracterizam as professoras e as crianças PAEE presentes em suas turmas. Todas as professoras tinham formação em nível superior, a maioria em Pedagogia, e uma delas também havia concluído uma pós-graduação. As professoras provinham de três diferentes unidades educacionais: uma instituição filantrópica (UE1), uma municipal (UE2) e uma estadual (UE3). Todas essas unidades de ensino atendiam a um público majoritariamente de baixa renda. Em cada turma, havia de uma a três crianças PAEE (n=9).
Tabela 1 Caracterização da amostra
Participantes | UE | Idade (anos) | Formação | Experiência na Educação Infantil (anos:meses) |
Criança PAEE |
Turma | Diagnóstico/ Condição | Proporção de presença* |
---|---|---|---|---|---|---|---|---|
P1 | UE1 | 41 | Pedagogia | 1:6 | C1 | MI | Microcefalia | 1/4 |
C2 | TEA | 1/4 | ||||||
P2 | 53 | Magistério e Pedagogia | 12:0 | C3 | MII | TEA | 1/3 | |
C4 | Síndrome de Cri-Du-Chat | 1/3 | ||||||
P3 | UE2 | 40 | Magistério, Pedagogia e Pós- -Graduação em Psicopedagogia |
14:0 | C5 | MII | Em investigação | 1/1 |
P4 | 35 | Magistério e Letras | 14:0 | C6 | MII | Em investigação | 3/3 | |
P5 | UE3 | 48 | Magistério e Pedagogia | 30:0 | C7 | Pré-I | Em investigação | 2/3 |
C8 | Atraso de fala | 3/3 | ||||||
C9 | Em investigação | 1/3 |
Nota.
* Proporção de presença indica o número de atividades em que a criança PAEE esteve presente. P = professoras; UE = unidades educacionais; C = crianças; M=Maternal; TEA = Transtorno do Espectro Autista.
Seis das crianças PAEE estavam no maternal e três na Pré-escola I (idades entre 2 e 5 anos), em turmas com aproximadamente 23 crianças. Cinco crianças tinham diagnóstico confirmado (uma com Microcefalia, duas com TEA, uma com Síndrome de Cri-Du-Chat e uma com atraso de fala), e as demais estavam passando por avaliação especializada com médicos e fonoaudiólogas. Na turma de Pré-escola I, havia uma criança imigrante cuja língua materna era diferente da língua portuguesa e, portanto, apresentava dificuldades de comunicação. A presença das crianças PAEE nos dias de filmagem foi baixa - em média, 57%. De acordo com as professoras, essas crianças normalmente apresentavam baixa frequência às aulas, o que se refletiu também na frequência às filmagens.
As professoras e os pais assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE), autorizando a filmagem das aulas e a realização da pesquisa. Esta pesquisa foi aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) com Seres Humanos.
2.2 Procedimentos
As filmagens foram realizadas nas classes em dia e horário indicados pela professora. Pedia-se que ela indicasse uma atividade em que ela tivesse planejado previamente intervenções ou interações mais diretas ou dirigidas junto às crianças (e.g., atividades de ensino). Como o objetivo desta pesquisa era analisar a interação da professora com as crianças, tentou-se, com isso, evitar a indicação de atividades de rotina em que as interações entre a professora e os alunos fossem pouco frequentes (e.g., lanche), ou em que a professora interagisse pouco com as crianças (e.g., brincadeiras livres no parque). Durante as filmagens, a câmera filmadora (Sony/ Handycam HDR CX220) foi posicionada sobre um tripé em um local fixo, de forma a incluir no campo de visão a professora e o maior número possível de crianças. Antes do início das filmagens, foi feito um período de habituação, em que uma pesquisadora acompanhou as atividades da classe sem filmar por um período (manhã ou tarde), apenas observando e interagindo com a turma.
As professoras participantes não receberam devolutiva referente ao resultado do estudo, pois foram convidadas a participar de um segundo estudo, que implementava um programa de formação continuada sobre práticas descritas pela literatura como eficazes na promoção de um ensino inclusivo, não descrito aqui.
2.3 Análise dos dados
Cada filmagem foi assistida e o seu conteúdo foi dividido em unidades de atividade, realizadas pelas professoras, marcando-se o início e o fim de cada unidade. O critério para início de uma unidade foi a professora apresentar um dos seguintes comportamentos: iniciar a filmagem com a situação de ensino já organizada e, logo em seguida, emitir alguma prática da Seção 3 (“Práticas durante as atividades em geral” - ver Tabela 2); emitir a prática “Assegurar a atenção da(s) criança(s) à tarefa”; reorganizar a situação de aprendizagem (e.g., trocar os materiais, mudar o tema etc.) ou sinalizar verbalmente a mudança da atividade (e.g., “Agora, nós vamos fazer outra atividade/ a atividade de desenhar o corpo”). Não foram consideradas na análise atividades rotineiras com função de marcar períodos do dia (e.g., canção para começar o dia, canção para lavar a mão).
Tabela 2 Práticas educativas analisadas nas filmagens, distribuídas em seções
Seções | Práticas educativas |
---|---|
1. Práticas de engajamento e orientações iniciais para atividades em geral. | 1) Assegurar a atenção da(s) criança(s) à tarefa. Oferecer orientações claras sobre a atividade. Propor atividades com foco nas interações entre pares. Lembrar regras de comportamento. Estruturar transições. |
2. Preparações para brincadeira estruturada. | 6) Eleger um tema para a brincadeira entre as crianças. Apresentar os papéis das personagens. Ensinar palavras relacionadas à brincadeira. Ler ou narrar uma história para ilustrar/contextualizar o tema da brincadeira. Planejar a brincadeira com as crianças. |
3. Práticas realizadas durante as atividades em curso. | 14) 11) Oferecer oportunidade para as crianças realizarem a tarefa proposta. 12) Apresentar um conteúdo pela primeira vez oferecendo modelo. 13) Ajudar a criança a se engajar na tarefa. Repetir pergunta ou solicitação da tarefa. Oferecer modelo. |
4. Práticas durante leitura ou narração de histórias. | 16) Fazer afirmações informativas. Ensinar palavras relacionadas à história. Fazer pergunta não retórica. Promover o engajamento coordenado. Fazer solicitação. |
5. Práticas após a resposta da(s) criança(s) referente à atividade proposta. | 21) Feedback específico contingente ao desempenho. 21.1) Feedback instrutivo. Considerar válidas formas alternativas de resposta. Correção com apoio progressivo. Revisar o aprendizado. |
6. Práticas direcionadas a comportamentos não solicitados da(s) criança(s). | 25) Ajudar as crianças a resolverem problemas não sociais. Demonstrar consideração. Identificação e gerenciamento de emoções. Ajudar as crianças a resolverem problemas sociais. |
Nota. O feedback instrutivo foi identificado como 21.1 porque é dependente da ocorrência da prática 21. Por isso, a Tabela apresenta 29 práticas, embora a última seja identificada como 28.
O critério para término de uma unidade de atividade foi a professora emitir uma das seguintes ações: explicitamente encerrar a atividade em curso, sinalizando verbalmente que ela chegou ao fim (e.g., “Acabou! Tchau, caixinha!”); iniciar uma nova atividade ou iniciar uma atividade que não se adequava ao critério de interação direta com as crianças (e.g., levar as crianças ao pátio e deixá-las brincando livremente).
Em seguida, cada unidade de atividade foi analisada quanto à ocorrência ou não-ocorrência de uma lista pré-definida de práticas educativas com evidência de efetividade no ensino de crianças com NEE, desenvolvida a partir da revisão de literatura realizada por Carvalho e Schmidt (2021). Essa revisão elencou práticas descritas na literatura não direcionadas a diagnósticos específicos e que foram revisadas e ampliadas para construir a lista empregada neste estudo: foram excluídas práticas que não pudessem ser observadas durante a filmagem (e.g., práticas relacionadas ao planejamento prévio da professora) e foram acrescentadas práticas que detalhavam as ações do professor em atividades específicas (brincadeiras estruturadas e leitura de livros). A lista final, que foi utilizada para categorização das atividades, foi composta de 29 práticas, organizadas em seis seções temáticas (Tabela 2).
Para registrar a ocorrência de uma prática, ela deveria ser executada pela professora pelo menos uma vez ao longo da unidade de atividade analisada. As práticas foram registradas, tanto quando direcionadas à criança PAEE especificamente, como quando dirigidas à turma inteira ou a outras crianças específicas, de maneira que fosse possível comparar a forma da professora organizar suas práticas (dirigidas ou não especificamente à criança PAEE). Uma segunda juíza independente (a última autora, integrante do mesmo laboratório das demais) avaliou 35% das amostras analisadas (cinco unidades de atividades), obtendo-se um índice médio de concordância de 93,6% (DP = 9,2) para práticas direcionadas às turmas e 95,9% para as crianças PAEE (DP = 8,2).
3 Resultados
Conforme se observa na Tabela 3, foram realizados 12 dias de filmagem com, em média, 25 minutos de filmagem por dia (mínimo de dez e máximo de 51). No total, foram identificadas 14 unidades de atividades, pois em alguns dias as professoras propuseram mais de uma atividade por filmagem.
Tabela 3 Unidades de atividade e número de práticas educativas dirigidas para a turma como um todo e para as crianças PAEE
Participante | Tempo de filmagem | Atividade | Número de práticas | |||
---|---|---|---|---|---|---|
Turma | C1 | C2 | ||||
P1 | 61’43” | 1 | 10 | - | - | |
4 dias | 2 | 10 | 0 | 0 | ||
3 | 8 | - | - | |||
4 | 5 | - | - | |||
Média | 8,3 | 0 | 0 | |||
Turma | C3 | C4 | ||||
P2 | 73’36” | 1 | 9 | 5 | 0 | |
3 dias | 2 | 5 | - | - | ||
3 | 8 | - | - | |||
Média | 7,3 | 5 | 0 | |||
Turma | C5 | |||||
P3 | 23’27” | 1 | 12 | 6 | ||
Média | 1 dia | 12 | 6 | |||
Turma | C6 | |||||
P4 | 65’11” | 1 | 11 | 8 | ||
2 dias | 2 | 10 | 5 | |||
3 | 4 | 6 | ||||
Média | 8,3 | 6,3 | ||||
Turma | C7 | C8 | C9 | |||
P5 | 89’41” | 1 | 9 | 0 | 1 | - |
2 dias | 2 | 6 | 0 | 0 | - | |
3 | 5 | 0 | 1 | 0 | ||
Média | 6,7 | 0 | 0,7 | 0 |
Nota. ‘ = minutos; ” = segundos; P = professora. O traço (-) corresponde à ausência da criança PAEE.
Ao todo, foram analisadas 5 horas, 13 minutos e 38 segundos de filmagem. O número de filmagens e a sua duração, para cada turma, variou em função da disponibilidade de cada professora. Em quatro das cinco turmas, não foi possível filmar em todos os quatro dias inicialmente planejados por dificuldades operacionais da escola.
Em média, as professoras utilizaram 8,4 (DP = 3,5) tipos diferentes de práticas com a turma como um todo (incluindo as crianças PAEE) e 2,3 (DP = 2,5) práticas especificamente dirigidas às crianças PAEE. Apenas para P2 e P4 a média de práticas especificamente utilizadas com C3 e C6 ultrapassou a metade da média de práticas direcionadas às suas respectivas turmas. Nas demais turmas, a média de práticas dirigidas às crianças PAEE se manteve bem abaixo da média de práticas dirigidas à turma. Quanto maior o número de crianças PAEE na classe, menor o número de práticas especificamente direcionadas a elas. Para quatro das crianças PAEE, não foram direcionadas quaisquer práticas específicas, em nenhuma das atividades nas quais elas estavam presentes.
A Figura 1 apresenta o número de professoras que utilizaram, ao menos uma vez, cada uma das práticas analisadas, com a turma e com alguma das crianças PAEE, durante as filmagens. Uma mesma participante pode ter realizado mais de uma prática dentro de cada seção; portanto, a soma das utilizações dos itens não deve ser confundida com o número de professoras que realizaram aquelas práticas.

Figura 1 Número de professoras que utilizaram, ao menos uma vez, cada prática com a turma e com alguma das crianças PAEE presentes durante as atividades (N=5)
Observa-se, na Figura 1, que as práticas mais utilizadas pelas professoras foram direcionadas à turma como um todo. Por um lado, todas as professoras utilizaram as seguintes práticas: 1 - “Assegurar a atenção da(s) criança(s) à tarefa”; 2 - “Oferecer orientações claras sobre a atividade”; 21 - “Feedback específico contingente ao desempenho”; e 26 - “Demonstrar consideração”. Por outro lado, os itens da Seção 4 (“Práticas durante leitura ou narração de histórias”) foram utilizados por duas participantes, que foram as professoras que realizaram esse tipo de atividade durante as filmagens. Nenhuma professora utilizou quaisquer práticas incluídas na Seção 2 (“Preparações para brincadeira estruturada”).
Por um lado, nenhuma das práticas direcionadas especificamente às crianças PAEE foi utilizada por mais de três professoras. Por outro lado, todas as práticas da Seção 3 (“Práticas realizadas durante as atividades em curso”), foram utilizadas por pelo menos uma professora em relação às crianças PAEE. Três professoras ajudaram as crianças PAEE a se engajar na atividade, chamando sua atenção à tarefa ou materiais utilizados e acompanhando-as nos primeiros passos da atividade (Prática 13). Esse mesmo número de docentes utilizou essa prática em relação à turma como um todo. Quando se analisa a Seção 5, que se refere a práticas adotadas pelas professoras diante do desempenho dos alunos nas tarefas propostas, observa-se que um número pequeno de professoras direcionou práticas especificamente para as crianças PAEE, porém duas delas ofereceram feedback específico contingente ao desempenho do aluno (21), uma professora fez correção com apoio progressivo (23) e uma considerou válida uma forma alternativa de desempenho (22).
Além do número de professoras que adotaram as práticas descritas, é importante saber o quanto elas utilizaram essas práticas nas atividades realizadas. Desse modo, a Figura 2 apresenta a percentagem média que cada prática foi utilizada pelo conjunto de professoras, considerando o total de atividades conduzidas. Por exemplo, dado o número total de atividades realizadas (e.g., 10), foi calculada a percentagem média de atividades em que cada prática foi utilizada pelo menos uma vez (e.g., a prática ocorreu em oito atividades - 80%). Para o grupo de crianças PAEE, calculou-se a percentagem média de utilização de cada prática, considerando apenas as atividades em que elas estavam presentes nos dias das filmagens (Tabela 1). Devido à ausência completa de ocorrências das práticas da Seção 2 (Práticas 6 a 10), ela foi suprimida da Figura 2.

Figura 2 Percentagem de atividades em que houve registro de ocorrência das práticas, em relação à turma (painel superior) e às crianças PAEE (painel inferior)Nota. S = Seção
Observa-se, na Figura 2, que, de modo geral, houve maior percentagem de atividades em que as práticas analisadas foram realizadas com a turma como um todo, do que atividades em que essas práticas foram dirigidas especificamente às crianças PAEE. Ao todo, nove práticas não tiveram nenhuma ocorrência registrada em nenhuma das atividades analisadas, quando considerada a interação da professora com as crianças PAEE, mas todas as práticas tiveram ocorrência maior que zero quando analisada sua emissão em relação à turma.
As cinco práticas com ocorrência em mais de 75% das atividades em relação à turma foram: 1, 2, 21, 23 (“Correção com apoio progressivo”) e 26, acompanhando o maior número de professoras que as adotaram em suas atividades (Figura 1). Em especial, a Prática 21 foi direcionada à turma como um todo ao menos uma vez em 100% das atividades. A Prática 26, que foi realizada em praticamente todas as atividades, representou uma prática de escuta às crianças, que foi uma exceção em meio às baixas frequências das demais práticas da Seção 6, referente a participações “espontâneas” das crianças (“Práticas direcionadas a comportamentos não solicitados das crianças”). A despeito das maiores percentagens de utilização das práticas ter ocorrido em relação às turmas, em torno de 70% das práticas (17) tiveram ocorrência registrada em menos de 50% das atividades analisadas.
A Figura 2 também evidencia diferenças no uso das práticas das diferentes seções. Práticas das Seções 1, 5 e 6 ocorreram em percentagem maior de atividades do que as práticas das Seções 3 e 4, quando direcionadas à turma como um todo, mesmo que com maior variabilidade interna. As práticas da Seção 3 foram empregadas em percentagens mais semelhantes, ainda que com variações (entre 23% e 73%).
Seria esperado que, para as crianças PAEE, houvesse maiores percentagens de ocorrências de práticas nas Seções 1, 3 e 5, que se referem, respectivamente, a “Práticas de engajamento e orientações iniciais para atividades em geral”, “Práticas durante as atividades em geral” e “Práticas após a resposta da criança referente à atividade proposta”. Contudo, foram registradas ocorrências de todas as práticas apenas da Seção 3 (apresentadas em mais de 10% das atividades). Além disso, a Prática 13 foi a mais emitida em relação às crianças PAEE entre todas as práticas (31%), percentagem semelhante à sua emissão em relação à turma como um todo. Isso sugere que as professoras se empenhavam em apoiar as crianças PAEE para que começassem a fazer a atividade, mas pareciam menos atentas para a forma como a tarefa seria realizada e/ou o seu resultado.
Além da Prática 13, as práticas que as professoras mais utilizaram com as crianças PAEE, em ordem decrescente, foram: 21, 26, 11 (“Oferecer oportunidade para as crianças realizarem a tarefa proposta”), 14 (“Repetir pergunta/solicitação da tarefa”), 18 (“Fazer pergunta não retórica”) e 19 (“Promover o engajamento coordenado [durante leitura]”). A prática 22 (“Considerar válidas formas alternativas de resposta”) foi observada mais frequentemente com as crianças PAEE do que com crianças da turma em geral (11,1%).
4 Discussão
O objetivo desta pesquisa foi verificar se as práticas cotidianas de professoras de Educação Infantil incluem práticas descritas pela literatura como promotoras de acesso de crianças PAEE às atividades desenvolvidas em sala de aula, analisando, também, se essas práticas são dirigidas à turma como um todo. Os resultados demonstraram que as professoras participantes conheciam a maioria das práticas analisadas, uma vez que todas as práticas listadas foram realizadas em pelo menos uma atividade, com exceção daquelas referentes à brincadeira estruturada. No entanto, a despeito dessas práticas serem elencadas pela literatura como efetivas para o ensino de crianças PAEE, elas foram dirigidas mais frequentemente às turmas como um todo do que às crianças PAEE.
Aparentemente, o maior desafio para o uso das práticas analisadas, que podem ser empregadas com relativa facilidade nas atividades cotidianas das salas de aula, está em saber quando e com quem utilizá-las, visando atender às necessidades educacionais específicas de diferentes crianças. Nesse sentido, a formação inicial e continuada dos professores ocupa um papel essencial, tanto para o desenvolvimento de competências técnicas, quanto para mudanças nos paradigmas conceituais que orientam a atuação (Martins et al., 2020). Algumas pesquisas verificaram que existe a tendência, por parte de profissionais de educação, de subestimar as habilidades de crianças que consideram ter NEE, atribuindo suas dificuldades a uma suposta incapacidade inerente aos estudantes ou ao seu ambiente extraescolar, o que impossibilitaria avanços nas suas aprendizagens, independentemente da intervenção educacional (Conti et al., 2021; De Vitta et al., 2010; Oliveira et al., 2015).
É certo que algumas crianças necessitam de serviços adicionais para atingir seu potencial máximo, incluindo serviços da saúde e o AEE no contraturno, o que representa o contínuo de serviços de apoio previsto na legislação brasileira sobre inclusão (Ministério da Educação, 2008). Uma das dificuldades para o acesso a esse apoio na Educação Infantil, porém, é a própria dificuldade em se conseguir um diagnóstico precoce correto. Além da dificuldade em diferenciar, entre pré-escolares, o que seria uma variabilidade de desempenhos esperada entre as crianças e o que representaria sinais de atenção que levariam a um diagnóstico, há a dificuldade de se conseguir relatos fidedignos de pais e professores sobre os padrões de comportamento das crianças (Seabra-Santos & Gaspar, 2012).
Também por esse motivo, as intervenções de serviços de apoio são complementares e devem se somar à organização pedagógica feita pelos professores regulares da turma, amparados por avaliações contínuas das aprendizagens dentro de um Plano Educacional Especializado (Silva & Camargo, 2021). Isso significa que crianças com dificuldades específicas necessitam de apoios específicos, para além de práticas inclusivas implementadas para a turma como um todo. Entretanto, o que se observou nas filmagens deste estudo é que as professoras dirigem poucas práticas especificamente às crianças PAEE, preferindo alocar tais práticas para a turma como um todo - não houve, por exemplo, nenhuma prática específica dirigida a cinco das nove crianças PAEE analisadas. Mais ainda, observou-se que, quanto maior o número de crianças PAEE na sala de aula, menor o número de práticas dirigidas especificamente a elas durante as atividades.
Seria possível argumentar que, ao direcionar práticas inclusivas à turma como um todo, as crianças PAEE seriam ao menos indiretamente beneficiadas. As situações verificadas nas filmagens, no entanto, não corroboram esse tipo de afirmação. Por exemplo, em uma das atividades analisadas, P4 realizava a chamada em conjunto na sala. Após alguns alunos terem realizado a atividade solicitada, P4 solicitou que C6 selecionasse o seu nome escrito dentre um conjunto de fichas com o nome impresso de todos os alunos (Prática 11). Nesse caso, C6 escolheu um nome (incorreto) e P4 perguntou se aquele era o seu nome; C6 disse que sim. P4 pegou o nome correto, mostrou para C6 e perguntou se aquele era o seu nome, e C4 disse que sim (resposta correta). P4 perguntou se o nome dela tinha a letra A. Ela não respondeu, e P4 ofereceu outra dica; C6, então, identificou a letra A no seu nome, corretamente. No entanto, quando as solicitações eram dirigidas ao conjunto da turma, raramente C6 respondia às solicitações (frequentemente estava distraída) e, quando respondia, o fazia de forma incorreta (o feedback era frequentemente dirigido à turma, o que poderia gerar confusão em C6 sobre a correção ou não do seu desempenho). Esse exemplo ilustra a necessidade da criança de dicas adicionais e de feedback contingente ao seu comportamento (Práticas 14, 21 e 23), e que, quando isso não ocorre, ela tem menos oportunidade de se desenvolver na atividade proposta.
O problema, porém, não se restringe às crianças PAEE. Avaliações padronizadas em maior escala corroboram os resultados do presente estudo quanto às baixas percentagens de uso de práticas pedagógicas associadas à qualidade da Educação Infantil, mesmo com as classes como um todo. Campos et al. (2011), por exemplo, avaliaram, dentre outros indicadores, aspectos do currículo e das interações em escolas de Educação Infantil de seis capitais brasileiras com a Infant/Toddler Environment Rating Scale (ITERS) [Escala de Avaliação de Ambientes para bebês e crianças pequenas] e a Early Childhood Environment Rating Scale (ECERS) [Escala de Avaliação Ambiental de Educação Infantil]. De maneira geral, encontraram resultados insatisfatórios na maioria dos itens analisados, em creches e pré-escolas.
Mais recentemente, Cruz et al. (2021) descreveram situação semelhante em creches conveniadas em Fortaleza, utilizando instrumentos de observação e entrevistas, baseados nos Indicadores de Qualidade da Educação. Como argumenta Mendes (2017), ao falar em inclusão no Brasil, é preciso considerar que as escolas ainda estão longe de conseguir promover a aprendizagem da maioria de seus estudantes. A inclusão passa por aspectos estruturais, mais especialmente pela formação dos professores. Um exemplo encontrado na presente pesquisa pode servir de ilustração.
Nas classes observadas na presente pesquisa, não foram verificados momentos de brincadeiras estruturadas, que foram definidas como “situação lúdica em que a professora define o tema e a forma geral da interação com as crianças, monitora o desempenho delas ou participa dessa interação (e.g., oferecendo instruções no meio da tarefa, estruturando a atividade em etapas)”. Isso pode ter acontecido porque situações estruturadas normalmente são consideradas práticas associadas a menor protagonismo das crianças (Guizzo et al., 2019). No entanto, nem toda atividade estruturada significa falta de escolha por parte das crianças.
No caso da brincadeira estruturada aqui definida, propõe-se que a professora contextualize o tema da brincadeira (e.g., lendo uma história), amplie o repertório linguístico das crianças sobre ele, dialogue previamente com elas sobre os papéis que querem desempenhar e medeie a brincadeira com feedbacks e apoios. Essa estruturação dá suporte à aprendizagem das crianças, particularmente daquelas com necessidades específicas, sem renunciar à escuta e às suas vontades (Stanton-Chapman & Brown, 2015). Segundo Martins et al. (2006), os professores em geral concordam que o brincar é importante na Educação Infantil para o desenvolvimento global das crianças, mas apresentam maior heterogeneidade de opiniões ao relacioná-lo com aprendizagens específicas e ao compreender o papel mediador do docente durante a brincadeira.
Algumas pesquisas constataram ser comum entre os professores a crença de que o principal papel da educação inclusiva é de socialização (De Vitta et al., 2010; Oliveira et al., 2015). Diferentemente, os resultados obtidos mostraram que as professoras participantes priorizaram práticas que auxiliam crianças PAEE a iniciar atividades em geral (Seção 3), indicando preocupação das docentes em inclui-las nos processos de ensino-aprendizagem propostos para a turma como um todo, galgando estágios de inclusão que ultrapassam a mera integração aos espaços educacionais regulares. Entretanto, considerando suas necessidades específicas, para efetivar a participação dessas crianças, seria importante ampliar o uso de estratégias que as orientem e preparem para as propostas que lhes serão feitas (Seção 1) e que apoiem o seu desempenho de diversas formas, valorizando o que conseguem fazer e favorecendo suas aprendizagens (Seção 5).
Em relação a práticas específicas, observou-se destaque relativo para o “Feedback específico contingente ao desempenho” (21), “Considerar válidas formas alternativas de resposta” (22) e “Demonstrar consideração” (26). Essas práticas incentivam a participação das crianças PAEE e as ajudam a reconhecer desempenhos esperados, além de fortalecer os desempenhos que elas apresentam e que se aproximam do que é almejado, e valorizar os interesses, as motivações e os pontos de vista das crianças, o que também torna as atividades e as interações mais estimulantes para elas (Carvalho & Schmidt, 2021). O uso dessas práticas pelas professoras é um aspecto positivo a ser destacado e que deveria ser intensificado em relação às crianças PAEE.
Verificou-se, ainda, que práticas como “Oferecer orientações claras sobre a atividade” (2), “Feedback instrutivo” (21.1) e “Revisar o aprendizado” (24) não foram realizadas pelas professoras especificamente com as crianças PAEE. A ausência de uso dessas práticas nas situações observadas pode indicar que as professoras participantes tinham dificuldades em identificar sua função junto às crianças PAEE e de que maneira elas poderiam contribuir com seus objetivos pedagógicos.
5 Conclusão
O presente estudo contribui para exemplificar a aplicabilidade e os benefícios do uso de medidas observacionais na avaliação das estratégias inclusivas que as professoras de Educação Infantil utilizam em ambientes educacionais. Os resultados incitam a reflexão de que, apesar de relatarem inseguranças quanto à atuação com crianças PAEE, as professoras conhecem e realizam práticas importantes para a aprendizagem delas, mesmo que o façam mais frequentemente com o grupo como um todo. Isso indica que o caminho pedagógico para melhorar a inclusão não está fora do alcance dessas profissionais, ou depende de uma formação especializada; é necessário, no entanto, que as professoras sejam apoiadas na identificação da importância dessas e de outras estratégias para os processos de aprendizagem das crianças e a planejar sua prática conforme as necessidades específicas com as quais se deparam.
Das práticas analisadas no estudo, as mais utilizadas com a turma foram “Assegurar a atenção da criança à tarefa”, “Oferecer orientações claras sobre a atividade”, “Feedback específico contingente ao desempenho”, “Correção com apoio progressivo” e “Demonstrar consideração”. Com exceção das duas primeiras, as demais práticas citadas não necessitam de um planejamento anterior e são emitidas quando o comportamento da professora está sob controle dos comportamentos emitidos pelas crianças, no momento da aplicação da atividade. De forma semelhante, com relação às crianças PAEE, a prática mais utilizada foi “Ajudar a criança a se engajar na tarefa”, outra prática que não necessita de um planejamento específico, uma vez que está mais voltada a auxiliar a criança a iniciar a atividade. Talvez seja possível dizer que, em relação aos alunos PAEE, as professoras se preocupam bastante em auxiliá-los a iniciar e se manter nas atividades, mas menos em garantir que as crianças completem com sucesso essas tarefas, gerando ampliação da sua aprendizagem.
O presente estudo apresenta limitações, como o número reduzido de participantes e a especificidade do local onde os dados foram coletados. Não é possível generalizar os resultados aqui encontrados, mas é possível entender que eles são uma amostra das dificuldades encontradas por inúmeras professoras da Educação Infantil. É desejável, pois, que as medidas observacionais possam ser direcionadas a um maior número de participantes, assim como maior tempo de observação por professora. Do ponto de vista social, a falta de devolutiva sobre os resultados do estudo também se mostrou como uma limitação, uma vez que as professoras não tiveram a oportunidade, naquele momento, de identificar quais práticas eram emitidas por elas e quais práticas ainda não faziam parte de seu repertório profissional. É preciso, também, lembrar que a instrução inicial dada às professoras pode tê-las induzido a fazer um “planejamento” que não é comum na sua rotina, excluindo atividades cotidianas e de interesse para a presente análise.
Para pesquisas futuras, sugere-se que a lista de práticas seja ampliada, por exemplo:
avaliar a qualidade das perguntas feitas às crianças, como sugere brevemente o estudo de Gerde e Powell (2009); incluir estratégias propostas pelo Desenho Universal para a Aprendizagem (Bettio et al., 2021; Orsati, 2013); e estruturar a lista em níveis de intervenção com intensidades crescentes (Hemmeter et al., 2006). Por fim, seria interessante registrar também as consequências imediatas das práticas educativas na interação com as crianças (e.g., se elas são efetivas para melhorar o engajamento e o desempenho das crianças), com vistas a evidenciar a função das práticas e constituir-se como feedback para os professores sobre seu próprio desempenho.
Para além dessas limitações, é importante registrar que pesquisas como esta aqui apresentada têm uma função importante para se pensar o papel da Educação Infantil na Educação Básica como um todo e as necessidades específicas de aprimoramento desse nível de educação, ainda pouco valorizado no quadro geral da educação no país.