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Revista Brasileira de Educação Especial

versão impressa ISSN 1413-6538versão On-line ISSN 1980-5470

Rev. bras. educ. espec. vol.30  Marília  2024  Epub 26-Set-2024

https://doi.org/10.1590/1980-54702024v30e0190 

Dossiê / Apresentação

Desafios Globais e Locais da Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva: Potencialidade de uma Cartografia em Construção

Global and Local Challenges of Special Education from the Perspective of Inclusive Education: Potentiality of a Cartography Under Construction

Márcia Denise PLETSCH2 

Professora Associada. Cientista da Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro (Faperj) e pesquisadora do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) - nível 1D. Coordenadora do Curso de Especialização em Educação Especial e Inovação Tecnológica (UFRRJ/CECIERJ). Coordenadora geral do Observatório de Educação Especial e Inclusão Educacional (ObEE) e do Centro de Inovação Tecnológica e Educação Inclusiva (CITEI).


http://orcid.org/0000-0001-5906-0487

Geovana Mendonça Lunardi MENDES3 

Professora Titular. Pesquisadora do CNPq - nível 1D. Vice-presidente da World Education Research Association. Membro do Conselho Técnico Científico da Educação Básica da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes). Membro do Fórum Nacional de Educação. Conselheira da Área das Ciências Humanas na Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC).


http://orcid.org/0000-0002-8848-7436

Liesel EBERSÖHN4 

Diretora. Psicóloga educacional, especialista em dimensões sociais da resiliência, baseia-se em evidências da África Subsariana para contribuir de forma crítica para a compreensão, a partir de uma perspectiva afrocêntrica, das respostas que permitem a resiliência e que promovem o bem-estar coletivo face ao sofrimento coletivo. Atual presidente da World Education Research Association (WERA).


http://orcid.org/0000-0002-2616-4973

2Departamento Educação e Sociedade e do Programa de Pós-Graduação em Educação, Contextos Contemporâneos e Demandas Populares (PPGEduc) da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ). E-mail: marciadenisepletsch@gmail.com

3Departamento de Pedagogia, do Centro de Ciências Humanas e da Educação (FAED) e do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade do Estado de Santa Catarina (Udesc). E-mail: geovana.mendes@udesc.br

4Centro de Estudos sobre Resiliência e Professora Catedrática do Departamento de Psicologia Educacional da Universidade de Pretória, África do Sul. E-mail: liesel.ebersohn@up.ac.za


RESUMO

Apresentamos, aqui, uma discussão a partir dos textos que compõem o Dossiê intitulado: DESAFIOS GLOBAIS E LOCAIS DA EDUCAÇÃO ESPECIAL NA PERSPECTIVA DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA: POTENCIALIDADE DE UMA CARTOGRAFIA EM CONSTRUÇÃO. O objetivo é construir uma cartografia internacional e nacional de como, na área da Educação Especial, a Educação Inclusiva tem sido recontextualizada nas políticas e nas práticas de diferentes estados brasileiros e diferentes países. Conseguimos unir, nesse material, uma entrevista internacional, cinco artigos internacionais e quatro textos nacionais, tecendo um panorama de arranjos locais muito distintos e que nos brindam com miríades complexas sobre a inclusão educacional. Do ponto de vista temático, o Dossiê discute temas emergentes, centrando-se em políticas e práticas de Educação Inclusiva no campo da Educação Especial, a saber: formação de professores, escolarização de pessoas com deficiências e políticas de Educação Inclusiva na Educação Especial contemporânea.

PALAVRAS-CHAVE: Políticas de Educação Inclusiva; Deficiência; Educação Especial

ABSTRACT

We present, here, a discussion based on the texts that make up the Dossier entitled: GLOBAL AND LOCAL CHALLENGES OF SPECIAL EDUCATION FROM THE PERSPECTIVE OF INCLUSIVE EDUCATION: POTENTIALITY OF A CARTOGRAPHY UNDER CONSTRUCTION. The objective is to build an international and national cartography of how, in the area of Special Education, Inclusive Education has been recontextualized in the policies and practices of different Brazilian states and different countries. In this material, we managed to bring together an international interview, five international papers and four national texts, creating a panorama of very distinct local arrangements that provide us with myriad complexities about educational inclusion. From a thematic point of view, the Dossier discusses emerging themes, focusing on Inclusive Education policies and practices in the field of Special Education, namely: teacher training, schooling of people with disabilities and Inclusive Education policies in contemporary Special Education.

KEYWORDS: Inclusive Education policies; Disability; Special Education

1 Introdução

A questão do enfrentamento às desigualdades educacionais, por meio de políticas para a promoção da equidade e de políticas de Educação Inclusiva, tem sido um desafio, nos últimos 30 anos, especialmente para os países do Sul Global. Inúmeros documentos internacionais pautaram propostas para uma Educação Inclusiva como princípio global que deveria ser assumida pelos diferentes países. Nesse sentido, a Educação Inclusiva como uma política global viajante (Verger, 2019) tem “viajado” por diferentes países e nos próprios estados nações, orientando planos e programas locais. Conforme apontam Artiles e Kozleski (2016) e Artiles, Kozleski e Gonzalez (2011), a transferência indiscriminada de políticas traz consequências únicas, principalmente quando as realidades educacionais são tão distintas.

Além disso, do ponto de vista da produção científica, estamos diante de conceitos “escorregadios” (Artiles & Kozleski, 2016) que incorporam diferentes significados. Artiles, Kozleski e Gonzalez (2011) destacam que a ideia de Educação Inclusiva foi apropriada por diferentes tipos políticos, de conservadores a liberais, e tem sido usada, simultaneamente, para promover a globalização, “apagar” as múltiplas identidades, em favor de um bem comum, tornar processos de exclusão toleráveis, entre outros aspectos. Tais estudos nos ajudam a compreender que estamos diante de um constructo complexo com múltiplas escalas: global, nacional e local.

Derivado dessa compreensão, surgiu o desejo de ajudarmos a construir uma cartografia internacional e nacional de como na área da Educação Especial a Educação Inclusiva tem sido recontextualizada nas políticas e nas práticas de diferentes estados brasileiros e países. Destacamos, no caso internacional, que intencionalmente, além de parceiros e realidades mais conhecidas como Estados Unidos e Argentina, buscamos, do Norte Global, as contribuições da Alemanha e, do Sul Global, as perspectivas da África do Sul e da Rússia, além de contribuições das cinco regiões do Brasil: Norte, Sul, Centro-Oeste, Nordeste e Sudeste. Interessa-nos especialmente compreender que estratégias emergentes os países têm construído para colocar em prática perspectivas de Educação Inclusiva para o público da Educação Especial, identificar dados e exemplos de políticas, práticas e pesquisas envolvendo a temática, bem como mapear os progressos e as dificuldades da Educação Especial nos níveis locais, regionais e globais.

Desse modo, falar de cartografias pareceu-nos o caminho para tentar compreender as geografias estabelecidas em realidades tão diversas.

2 Cartografias da Educação Inclusiva na Educação Especial: mapeando possibilidades

As formas como os países têm construído alternativas para estruturar políticas de Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva é bastante diversa. Do mesmo modo, no mesmo país, encontramos práticas e arranjos locais completamente distintos para oferecer a Educação Especial nas redes de ensino. Assim, é muito importante para os pesquisadores que cada vez mais sejamos capazes de identificar sentidos comuns, avanços no campo, exemplos positivos, problemáticas semelhantes e soluções possíveis.

Entendemos que a perspectiva de construir cartografias pode ser extremamente útil para a Educação Especial. Advinda da geografia física, o conceito de cartografia, para além de mapear territórios, assumiu outro caráter quando a cartografia começou a ser utilizada nas Ciências Sociais e Humanas. Passos et al. (2015) apontam que, nas Ciências Humanas, cartografar tem o sentido de acompanhar processos; com isso, o mapeamento tem relação com os movimentos, mais do que com aquilo que os olhos captam, gerando registros sobre o que está se transformando. Seguindo as pistas de Deleuze e Guattari e de Bruno Latour, os autores destacam que a cartografia não é uma simples reprodução do real, mas uma criação que acompanha as mutações e as emergências de novos territórios. Tal ideia se torna extremamente potente quando falamos de políticas e práticas: é possível por ela perceber a fluidez, a dinâmica e a inteireza dos processos e suas transformações.

A articulação, a fusão e, muitas vezes, a “confusão” entre a Educação Especial e a Educação Inclusiva expressam a importância de buscarmos as cartografias possíveis do nosso campo. No caso de políticas educacionais globais, se analisarmos como a agenda da Educação Inclusiva tornou-se prioridade no mundo ocidental, impulsionada por tratados internacionais e agendas de desenvolvimento sustentável, como a Agenda 2030, das Nações Unidas (2015), ao conseguirmos traçar os caminhos dessas políticas e seus impactos nos contextos globais e locais, conseguiremos identificar várias das problemáticas que esse tipo de agenda global carrega.

Verger et al. (2017) argumentam como, em seus diferentes estudos sobre políticas educacionais globais, os discursos transnacionais são incorporados de diferentes formas nos territórios e como essas políticas são reinterpretadas e implementadas em diferentes contextos para avaliar sua eficácia e impacto real. As políticas de Educação Inclusiva não são exceção, e a cartografia dessas políticas pode revelar as variações e as adaptações que ocorrem em diferentes países. Vale destacarmos que, conforme apontam esses autores, a globalização e os organismos internacionais têm modificado a forma como os estados nação desenvolvem suas políticas, tornando-os, muitas vezes, consumidores de um “mercado global de políticas”, no qual inúmeras “soluções” estão à venda.

Além dessas questões, ainda temos as disparidades entre Norte e Sul Global. Conforme destacam Artiles et al. (2011), por exemplo, a agenda “Educação para Todos”, criada no sistema das Nações Unidas e em suas organizações, tende a direcionar-se aos países em desenvolvimento, enquanto o conceito de Educação Inclusiva emergiu de reformas nos sistemas educacionais dos países desenvolvidos. O Marco de Ação de Dakar enfatiza que a “Educação para Todos” só pode ser alcançada através da educação inclusiva (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura [UNESCO], 2000, p. 14). Portanto, a agenda “Educação para Todos” transfere o conceito de Educação Inclusiva (baseada em experiências de países desenvolvidos) para as metas e os requisitos dos países em desenvolvimento.

Da mesma forma, os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) acordados pelas Nações Unidas, em 2015, visam todos os países do mundo e incluem o objetivo de “educação inclusiva, de qualidade e equitativa, e promover oportunidades de aprendizagem ao longo da vida para todos” (Nações Unidas, 2015, ODS 4). A transferência direta e a aplicação de experiências e conhecimentos gerados nos contextos das nações desenvolvidas para o resto do mundo em desenvolvimento é problemático, particularmente se essas aplicações não foram adaptadas aos contextos históricos e culturais locais. Assim como Verger (2019), temos argumentado sobre os perigos de discursos hegemônicos com respostas estandartizadas para problemas educacionais que são contingenciais e que necessariamente dependem da compreensão sobre o contexto em que ocorrem, como é o caso das práticas na Educação Especial.

Nós queremos crer que a Educação Especial na perspectiva da Educação Inclusiva é um sistema em constante desenvolvimento e que contribui significativamente para o enfrentamento das desigualdades educacionais. Nessa acepção, cartografar as pesquisas que estão sendo desenvolvidas em nossa área pode nos dar diferentes visões sobre o “ritmo” desse sistema, as imaginações e as criatividades colocadas em prática pelos Estados-nação, pelos estados e municípios, bem como os processos socioculturais e políticos que podem apoiar ou restringir o avanço em direção a ideais mais inclusivos e sustentáveis.

Colocar em prática e em conexão os conceitos de Educação Especial em uma perspectiva inclusiva é um trabalho complexo, que envolve a ampliação dos nossos repertórios e compreensão das particularidades locais. Nesse sentido, esperamos que os textos apresentados neste Dossiê contribuam com essa tarefa.

3 Desvendando problemas globais e locais: a cartografia contada em nosso Dossiê

O Dossiê, conforme já destacamos, foi composto de nove textos e uma entrevista. Ainda que não exista nenhuma hierarquização nos textos, apresentamos, aqui, de maneira bastante suscinta, com o desejo de despertar, especificamente, o interesse do leitor para cada um dos materiais, o conjunto desse material organizado, o qual nos dá bastante satisfação. Alguns deles foram, inclusive, traduzidos pela primeira vez para o português.

Em nossa cartografia imaginária, iniciamos o Dossiê com uma entrevista realizada pela Prof.ª Dra. Adriana Araújo Pereira Borges com a Prof.ª Dra. Jan Valle, uma das representantes do grupo que propôs os Estudos da Deficiência. Os Estudos da Deficiência na Educação surgiram nos Estados Unidos da América no final da década de 1990, a partir da busca por uma compreensão mais ampla da deficiência que, até aquele momento, se limitava aos aspectos médicos. Nas discussões apresentadas na entrevista, a entrevistada aponta, entre outros aspectos, a relação entre os Estudos sobre a Deficiência na Educação e a Educação Especial. É a primeira entrevista da Prof.ª Dra. Jan Valle traduzida para o português, tornando-se um destaque dessa edição da RBEE.

Também inaugurando uma primeira publicação em revista brasileira, temos a contribuição dos autores russos Sergey Kosaretsky, Ulviyya Mikayilova e Ivan Ivanov, com o texto SOVIET, GLOBAL AND LOCAL: INCLUSION POLICIES IN SCHOOL EDUCATION IN AZERBAIJAN AND RUSSIA [Soviética, global e local: Políticas de inclusão na educação escolar no Azerbaijão e na Rússia]. Neste artigo, é revelado um quadro específico da formação da Educação Inclusiva nos países da antiga União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS), utilizando o caso do Azerbaijão e da Rússia. Os processos de desmantelamento do sistema de educação especial soviético e de implementação de princípios globais de inclusão educativa foram válidos para ambos os países. Os autores destacam as tentativas atualizadas dos países de construir sistemas nacionais globais, nos quais elementos soviéticos, globais e locais estão interligados.

Da África do Sul, temos a contribuição de Liesel Ebersöhn, uma das organizadoras desse dossiê, com o texto FLOCKING TO TRANSFORM LIVES IN INEQUALITY: INCLUDING EVIDENCE-BASED INDIGENOUS KNOWLEDGE IN INCLUSIVE EDUCATION AGENDAS [Reunindo-se para transformar vidas na desigualdade: incluindo o conhecimento nativo baseado em evidências nas agendas de Educação Inclusiva]. A autora utiliza o caso do conhecimento afrocêntrico sobre resiliência para defender a presença do conhecimento nativo nas agendas de Educação Inclusiva para permitir a transformação em espaços altamente desiguais. Sua premissa é de que o conhecimento local e nativo serve como evidência de uma proteção eficaz e eficiente contra a desigualdade, que fornece informações sobre opções de transformação de baixo limiar. Ela aponta que, quando as pessoas estão em risco estrutural desproporcional, elas têm acesso limitado aos recursos, e o seu potencial para prosperar é limitado - como é o caso em contextos de economia emergente. O texto também destaca que, ironicamente, embora a necessidade de transformação seja maior em contextos extremamente desiguais, o conhecimento do Sul Global e das economias emergentes continua sub-representado nos discursos globais sobre desenvolvimento. Pelo contrário, as agendas e os mecanismos de desenvolvimento (incluindo para a Educação Inclusiva) baseiam-se em noções eurocêntricas e do Norte Global de mudança, inclusão, bem-estar, distribuição de recursos e prestação de serviços. O texto faz uma defesa de que o conhecimento nativo fornece provas de como, intergeracionalmente, as pessoas recorrem aos recursos disponíveis como forma de aproveitar recursos limitados e promover um desenvolvimento inclusivo e positivo para muitos.

Da Alemanha temos a contribuição do autor Michael Urban, com o texto OBSTÁCULOS ESTRUTURAIS E FUNCIONAIS NA CRIAÇÃO DE ESCOLAS INCLUSIVAS: O CASO DO SISTEMA ALEMÃO. O autor buscou identificar estruturas e obstáculos funcionais que se opõem à criação de um sistema escolar inclusivo. Essas reflexões são tecidas tendo como exemplo o sistema alemão. Sua relevância, porém, se estende para além do contexto da Alemanha, já que desdobramentos e problemáticas parecidos podem ser encontrados em todos os sistemas escolares. O texto nos brinda com reflexões profundas sobre várias questões emergentes que envolvem a temática.

Dos Estados Unidos temos a contribuição de Marta Z. Caballeiros, Alfredo J. Artiles e Daniela Gamboa-Zapatel, com o texto DILEMMAS OF CLASSIFYING DIFFERENCE: THE PROMISES AND DISRUPTIONS OF INCLUSIVE EDUCATION ACROSS CULTURAL CONTEXTS [Dilemas da Classificação da diferença: as promessas e as rupturas da Educação Inclusiva em contextos culturais]. Conforme destacam os autores, a chamada pela expansão das oportunidades educativas para todos (incluindo os grupos mais vulneráveis) tem sido ao mesmo tempo promissor e perturbador, especialmente na medida em que as políticas de Educação Inclusiva se espalham por todo o mundo. No entanto, diferentes perspectivas sobre a categorização de grupos vulneráveis estão surgindo em todo o mundo, o que influencia a forma como a Educação Inclusiva é concebida e implementada. No texto, os autores discutem sobre as diferenças entre os países na sua abordagem à implementação da Educação Inclusiva, as hierarquias de diferenças que são criadas e estabelecem uma discussão inicial para promover a análise das categorias de diferença e as suas implicações para a Educação Inclusiva em pesquisas futuras.

Finalizando as contribuições internacionais, temos o texto das colegas argentinas Cintia Schwamberger e Silvia Grinberg, com o artigo intitulado HACIA UNA CARTOGRAFÍA DE LA INCLUSIÓN. DEBATES, DESCONTENTOS, Y PERSPECTIVAS DESDE EL SUR GLOBAL [Rumo a uma cartografia da inclusão: debates, descontentamentos e perspectivas do Sul Global]. As autoras realizaram uma cartografia da inclusão nas escolas públicas da Região Metropolitana de Buenos Aires, Argentina. Segundo elas, a perspectiva cartográfica, adotada do ponto de vista interseccional, permite uma abordagem às dinâmicas de inclusão que não se apresentam como homogêneas, mas, sim, multilineares e justapostas. No texto, as autoras trabalham com a hipótese de que a dinâmica da inclusão envolve forças centrífugas associadas à sedimentação da exclusão e forças centrípetas que impulsionam o acesso ao conhecimento e à escolaridade.

Inaugurando as contribuições brasileiras para o Dossiê, temos o artigo intitulado CARTOGRAFIAS DA EDUCAÇÃO INCLUSIVA NA EDUCAÇÃO ESPECIAL: PRODUÇÃO CIENTÍFICA, POLÍTICAS E PRÁTICAS, de Marcia Denise Pletsch e Geovana Mendonça Lunardi Mendes, que são oriundas das regiões Sul e Sudeste do país e também organizadoras do Dossiê. As autoras apresentam um retrato sobre as políticas de Educação Inclusiva na Educação Especial. Para tanto, as autoras analisam a produção científica, políticas educacionais e a realidade educacional atual, considerando os 16 anos da Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva. Na discussão que apresentam, as pesquisadoras indicam um conjunto de desafios na garantia da educação inclusiva para o público que integra a Educação Especial, como percalços no oferecimento dos apoios educacionais, nas fragilidades de políticas/programas intersetoriais, na iniquidade educacional e nos problemas teóricos e práticos da concepção de Educação Inclusiva e sobre a área de Educação Especial.

Do Norte do país, temos a contribuição de Ivanilde Apoluceno de Oliveira, com o texto A FORMAÇÃO EM EDUCAÇÃO ESPECIAL NA REGIÃO NORTE: UM OLHAR PARA OS CURSOS DE PEDAGOGIA. A autora analisou a formação de professores em Educação Especial na região Norte do Brasil a partir de um estudo documental, envolvendo o levantamento e a análise de 15 Projetos Pedagógicos de Cursos de Pedagogia de universidades públicas da região Norte, que formam o pedagogo para atuar na docência em Educação Infantil e nos anos iniciais do Ensino Fundamental. Entre os resultados, destaca-se que o desenho curricular é reduzido a um número mínimo de disciplinas que discute temas envolvendo a Educação Especial.

Do Centro-Oeste, temos a contribuição de Fabiany de Cássia Tavares Silva, com o texto intitulado: SENTIDOS DE POLÍTICA, PRÁTICAS E INCLUSÃO NA EDUCAÇÃO ESPECIAL. O texto apresenta análises endereçadas aos sentidos de política, práticas e inclusão na constituição de uma hipótese como Educação Especial Moderna, captados na Declaração de Incheon, de 2015, no Marco de Ação da Educação 2030, de 2016, e, no caso brasileiro, na Base Nacional Comum Curricular, de 2018. Conforme aponta a autora, a composição da subjetivação alicerça-se no indivíduo como ser criativo em potencial, possuidor da subjetividade; trata-se, assim, de um conjunto de características individuais e singulares que, apesar de construídas socialmente, subsidiam certa capacidade singular de julgamento, orientadora das suas escolhas, da sua racionalidade e das tomadas de posições.

O artigo representativo do Nordeste brasileiro é de autoria de Taísa Caldas Dantas e Adenize Queiroz de Farias, da Universidade Federal da Paraíba, em parceria com Andreza Vidal Bezerra, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. No artigo INCLUSÃO ESCOLAR E FORMAÇÃO DE PROFESSORES NO ESTADO DA PARAÍBA: PERCEPÇÕES DOS EGRESSOS DE UMA FORMAÇÃO LATO SENSU EM ATENDIMENTO EDUCACIONAL ESPECIALIZADO, as autoras discutem a formação continuada a partir da análise de um Curso de Especialização em Atendimento Educacional Especializado (AEE) realizado no ano de 2023 com finamento do Ministério da Educação. Os dados indicam, entre outros aspectos, que a formação contribuiu no enfretamento dos desafios cotidianamente experenciados em sala de aula comum com alunos públicos da Educação Especial. Um dos achados diz respeito ao uso de metodologias colaborativas, inovadoras, acolhedoras e inclusivas, além de um processo de autoafirmação e valorização da identidade do professor do AEE, também emergem como benefícios resultantes da especialização.

Não temos dúvida da riqueza do conjunto de textos aqui apresentados. Esperamos, com eles, a sua ampla disseminação e produção de novos conhecimentos sobre o impacto da Educação Inclusiva na arena global, ao mesmo tempo, ajudar no compartilhamento e na construção de conhecimentos entre o Norte e o Sul do mundo, pensando, local, regional e globalmente.

Os textos nos provocam e apresentam tensões e dilemas emergentes, outros persistentes, que nos mostram diferentes miríades para continuarmos a estudar, compreender e construir futuros educacionais globais mais justos e inclusivos.

Referências

Artiles, A. J., & Kozleski, E. B. (2016). Inclusive education’s promises and trajectories: Critical notes about future research on a venerable idea. Education Policy Analysis Archives, 24, 1-29. https://doi.org/10.14507/epaa.24.1919Links ]

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Verger, A., Steiner-Khamsi, G., & Ball, S. J. (2017). World Yearbook of Education 2017: Education and the Global Governance of the ‘Good’ Teacher. Routledge. [ Links ]

Recebido: 25 de Julho de 2024; Revisado: 28 de Julho de 2024; Aceito: 30 de Julho de 2024

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