1 Introdução
As recomendações legais emergentes na década de 1990, as quais estimulam a implementação de políticas que asseguram o acesso de todos os estudantes à escola (Ministério da Educação [MEC], 2008; Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura [UNESCO], 1998a, 1998b), provocaram uma expansão jamais vista no número de matrículas de estudantes público da Educação Especial nos sistemas regulares de ensino. A esse respeito, as estatísticas apontam que “o número de matrículas da educação especial chegou a 1,8 milhão em 2023, um aumento de 41,6% em relação a 2019” (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira [INEP], 2023, p. 50). Ainda segundo o documento, o percentual de estudantes público da Educação Especial com idade entre 4 e 17 anos que frequentam a Educação Básica é de 95% com acréscimo de 2,3% se comparado ao ano de 2019 (INEP, 2023).
Tais constatações indicam que os inúmeros desafios que dificultam as condições de permanência, participação e aprendizagem desses estudantes sejam urgentemente colocados em pauta, dentre os quais destacamos a falta de estrutura para recebê-los em grande parte de nossas escolas e, sobretudo, as lacunas no processo de formação docente, questão central do presente estudo.
Sobre essa matéria, torna-se necessário destacarmos uma série de entraves, se considerarmos que, no tocante à formação inicial, apenas três universidades públicas brasileiras possuem cursos de licenciatura em Educação Especial, a saber: Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) e Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ). Esse é um aspecto que também se faz recorrente no processo de formação continuada, posto que há uma oferta em larga escala de cursos de aperfeiçoamento, assim como de pós-graduação lato sensu ofertadas na modalidade a distância, os quais, em sua grande maioria, são promovidos por universidades privadas (Michels, 2021).
Como resultado desse processo, o país parece já haver se acostumado a repetir, nas cinco regiões, o discurso de professores e outros profissionais que atuam no cenário educacional acerca de sua falta de capacitação para receber esse público, o que, segundo eles, constituiria a causa maior para o fracasso escolar dos estudantes público da Educação Especial. Nessa direção, a Política Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva - PNEEPEI (MEC, 2008), reafirmada pelo Governo Federal em novembro de 2023, foi consolidada por meio da Lei n°13.146, de 6 de julho de 2015, a qual ratifica o compromisso do Estado Brasileiro com a educação dos estudantes público da Educação Especial, ao afirmar, em seu art. 27, que: “É dever do Estado, da família, da comunidade escolar e da sociedade assegurar educação de qualidade à pessoa com deficiência, colocando-a a salvo de toda forma de violência, negligência e discriminação” (Lei n° 13.146, 2015).
Ademais, uma das metas destacadas no Plano Nacional de Educação (PNE) - Lei nº 13.005, de 25 de junho de 2014 - diz respeito à pós-graduação e à formação continuada dos docentes. A Meta 16 busca formar, em nível de pós-graduação, 50% dos professores de Educação Básica até o último ano de vigência do Plano e garantir a todos os profissionais da Educação Básica a formação continuada em sua área de atuação (Lei nº 13.005, 2014).
Partindo de tais desafios, o presente estudo tem como objetivo identificar as contribuições de um curso de especialização lato sensu na perspectiva da atuação docente junto aos estudantes público da Educação Especial no estado da Paraíba. Esta pesquisa possui natureza qualitativa e foi feita a partir da aplicação de um questionário com 64 estudantes do curso de pós-graduação em análise.
Em observância à meta 4 do (PNE) (Lei nº 13.005, 2014), a Paraíba, por meio do Plano Estadual de Educação, em vigor até o ano de 2025, assume o compromisso de “fomentar a formação continuada de professores (as) para o Atendimento Educacional Especializado (AEE) nas escolas urbanas, do campo, população moradora de rua, indígenas e de comunidades quilombola e cigana” (Lei no 10.488, de 23 de junho de 2015).
Nesse tocante, as universidades públicas têm adotado medidas relevantes no propósito de expandir a formação continuada para professores do AEE, estimulando também a participação de docentes do ensino regular, os quais precisam estar efetivamente envolvidos no processo de inclusão escolar.
Em consulta aos documentos oficiais da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e da Universidade Estadual da Paraíba (UEPB), é possível visualizar a oferta de cursos de aperfeiçoamento, assim como cursos de especialização Lato e Stricto sensu. Nesse sentido, apresentamos, a seguir, uma lista dos cursos com seus respectivos nomes, seguido da instituição proponente e vigência.
Cursos de aperfeiçoamento:
Atendimento Educacional Especializado: FORMA/AÇÃO Docente na Área da Deficiência Visual - UFPB - 2018 a 2019.
Educação Especial Inclusiva com Ênfase em Deficiência Visual: concepções, políticas públicas e práticas pedagógicas: UFPB - 2021 a 2022.
A formação continuada dos professores paraibanos para a atuação numa perspectiva inclusiva: fundamentos teóricos e estratégias metodológicas: UFPB - 2023 a 2024.
Pós-graduação stricto sensu:
Mestrado Profissional em Educação Inclusiva (PROFEI): UEPB - 2022 a 2024.
Mestrado Profissional em Educação Inclusiva (PROFEI): UEPB - 2023 a 2025.
Mestrado Profissional em Educação Inclusiva (PROFEI): UEPB - 2024 a 2026.
O referencial teórico utilizado para embasar o presente estudo, o qual será mais bem explicitado na seção que trata dos resultados e das discussões, discorre acerca do capacitismo, o qual consiste em todo e qualquer discurso e/ou atitude discriminatória, que coloca em xeque as potencialidades de uma pessoa em razão da deficiência (Farias, 2023). Tais experiências, quando vivenciadas no chão da escola, por estudantes público da Educação Especial, evidenciam o quanto a ausência de formação docente em uma perspectiva inclusiva reverbera nesse cenário, contribuindo para a reprodução de discursos e atitudes capacitistas.
Ao apresentarmos as percepções de docentes egressos de um curso de especialização lato sensu ofertado por uma universidade pública situada no estado da Paraíba, esperamos que esta pesquisa auxilie na construção de novos caminhos para a oferta de uma formação que, de fato, subsidie os docentes na adoção de práticas pedagógicas acolhedoras.
2 Método
Em estudo documental realizado no ano de 2020, Massaro e Farias apontam que as mudanças realizadas nos Projetos Pedagógicos de Cursos (PPCs) das Universidades públicas do estado da Paraíba não parecem suficientes para consolidar a formação inicial em Educação Especial em uma perspectiva inclusiva.
Diante do exposto, e ainda considerando que, a partir do ano de 2018, foi possível observar, por parte de universidades públicas, a exemplo da UFPB e da UEPB, a oferta de uma série de cursos de formação destinados aos professores das Redes Municipais e Estadual de Ensino, julgamos relevante ouvir as percepções de docentes egressos do curso de formação lato sensu intitulado “Serviço de Atendimento Educacional Especializado: ampliando a pesquisa, fortalecendo a prática”, ofertado pela UFPB no período de novembro de 2022 a novembro de 2023.
O referido curso, o qual teve a duração de 360 horas, contou com componentes curriculares teóricos pensados com o propósito de auxiliar e subsidiar a prática docente e ainda com disciplinas específicas voltadas aos diversos públicos da Educação Especial, a fim de propor estratégias que viessem fortalecer a inclusão escolar desses estudantes, a saber:
Disciplinas teóricas:
Caminhos introdutórios: concepções de pesquisa científica em articulação com os estudos da deficiência.
Aspectos sócio-históricos e políticos da Educação Especial.
Processos de ensino e aprendizagem e educandos público-alvo da Educação Especial.
Princípios da Acessibilidade e Desenho Universal da Aprendizagem (DUA).
Atendimento Educacional Especializado: organização, estrutura, funcionamento e articulação com o Ensino Regular.
Metodologia do Trabalho Científico e elaboração do Trabalho de Conclusão de Curso
Disciplinas práticas:
O AEE e a Deficiência Intelectual.
O AEE e a Deficiência Física.
O AEE e a Deficiência Visual.
O AEE e a Surdez ou Deficiência Auditiva.
O AEE e o Transtorno do Espectro Autista.
O AEE e Altas Habilidades/Superdotação.
Vale ressaltarmos, ainda, que a execução da referida especialização só foi possível em razão do financiamento oriundo da Rede Nacional de Formação Continuada de Professores na Educação Básica (RENAFOR), a qual é uma iniciativa do MEC que objetiva promover a formação continuada de profissionais da Educação Básica, incluindo professores, gestores escolares, entre outros profissionais.
A fim de identificarmos como esse curso contribuiu para a atuação docente junto aos estudantes público da Educação Especial, realizamos uma pesquisa com base na abordagem qualitativa, a qual se caracteriza pela obtenção de dados descritivos cujo intuito é “compreender os fenômenos segundo a perspectiva dos sujeitos, ou seja, dos participantes da situação em estudo” (Godoy, 1995, p. 58).
Seguindo essa metodologia, utilizamos um questionário online como instrumento de coleta de dados, o qual foi disponibilizado aos egressos do curso por um período de 15 dias e divulgado por e-mail e grupos do WhatsApp das seis turmas participantes da formação, nos polos localizados em João Pessoa, Campina Grande e Patos. Composto por 13 perguntas, além de informações acerca do perfil dos sujeitos da pesquisa, indagamos, por meio de questões discursivas, a respeito de elementos que envolvessem o aprendizado construído no decorrer do curso em articulação com práticas cotidianamente experienciadas por eles no contexto escolar.
As questões contidas no instrumento foram elaboradas exclusivamente para a realização do estudo, sendo produzidas por uma das pesquisadoras e posteriormente seu conteúdo, linguagem e forma reavaliados e validados pelas demais integrantes da equipe. Além de embasar-se nos diversos módulos abordados durante a formação (mencionados anteriormente), a escolha das questões foi definida a partir de cinco critérios, a saber: 1. Obtenção de dados que possibilitassem a definição de um perfil dos egressos; 2. Percepção acerca das condições para sua permanência no curso; 3. Dificuldades encontradas no decorrer de sua prática docente; 4. Principais conhecimentos consolidados ao longo da formação; 5. Possibilidades de aplicabilidade desses conteúdos em sua prática docente.
O eixo temático 1, o qual abordava elementos como idade, gênero, localidade e formação dos egressos, contemplou sete questões, enquanto o eixo temático 2, que diz respeito às condições que lhes foram oferecidas para permanência no curso, contou apenas com uma questão. Os eixos temáticos seguintes, que correspondiam as cinco questões restantes, discorreram acerca das dificuldades encontradas em sua prática docente para atender às necessidades específicas dos estudantes com deficiência, bem como aos conhecimentos consolidados pelos egressos ao longo da formação e às possibilidades efetivas de aplicá-los em sua atuação cotidiana.
Nessa perspectiva, compreendemos que a adoção de tais critérios foi relevante para elucidarmos o objetivo desta investigação, identificando, dessa forma, as contribuições oferecidas pelo curso, tendo em vista a implementação de práticas pedagógicas mais inclusivas nas diversas regiões paraibanas contempladas pela especialização.
Apontamos que, dos 150 participantes da Especialização objeto deste estudo, 64 responderam ao questionário, dentre os quais 37,5% cursaram no polo de Patos, 32,8% em Campina Grande e 29,7% em João Pessoa. No que diz respeito aos pressupostos éticos, esta pesquisa fundamenta-se nos princípios orientadores da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (ANPEd), em que fazemos uso da Autodeclaração de Princípios e Procedimentos Éticos. Segundo Mainardes e Carvalho (2019), a autodeclaração deve ser realizada quando não há uma submissão a um conselho de ética, de modo que o pesquisador ou a pesquisadora afirma conhecer e considerar as questões éticas no desenvolvimento de uma pesquisa. Declaramos que esta pesquisa considerou os variados aspectos que têm relação ética direta com os participantes, incluindo o consentimento, a transparência, o direito de retirar-se da pesquisa, a privacidade e o armazenamento dos dados, bem como a confidencialidade e o anonimato.
Nesse sentido, com o propósito de assegurar a integridade, a confiabilidade e o respeito aos participantes, todas as informações que possam identificar os sujeitos da pesquisa, como nome, características físicas e localização específica, serão preservadas em anonimato. Para isso, optamos por utilizar nomes fictícios na apresentação dos relatos dos docentes.
Devido ao grande número de respondentes, apresentaremos um breve perfil daqueles cujos discursos estão contidos neste artigo, organizados da seguinte maneira: nome fictício, seguido da faixa etária, gênero, atuação profissional e formação.
Letícia: entre 20 e 35 anos - Feminino - Psicopedagoga - Especialização.
Maria: acima de 50 anos - Feminino - Professora do AEE - Especialização.
Joana: entre 35 e 50 anos - Feminino - Professora do AEE - Graduação.
Mariana: entre 35 e 50 anos - Feminino - Professora do AEE - Especialização.
Camila: entre 35 e 50 anos - Feminino - Professora do AEE - Especialização.
Marta: entre 20 e 35 anos - Feminino - Professora do Ensino Regular - Especialização.
Leila: entre 20 e 35 anos - Feminino - Profissional de apoio escolar - Graduação.
Carla: acima de 50 anos - Feminino - Professora do AEE - Especialização.
Luna: entre 35 e 50 anos - Feminino - Professora do Ensino Regular - Especialização.
Ana: acima de 50 anos - Feminino - Professora do AEE - Especialização.
Gabriela: entre 35 e 50 anos - Feminino - Professora do AEE - Especialização.
João: entre 35 e 50 anos - Masculino - Professor do AEE - Especialização.
Paula: entre 35 e 50 anos - Feminino - Professora do Ensino Regular - Especialização.
Vitória: entre 35 e 50 anos - Feminino - Professora do AEE - Especialização.
No que tange às questões discursivas, realizamos uma leitura preliminar dos dados coletados, durante a qual identificamos a repetição de algumas ideias. Essas ideias foram então reorganizadas, o que permitiu a estruturação de eixos temáticos e categorias analíticas.
Finalmente, conforme recomenda Creswell (2014), o passo seguinte foi a realização da análise dos dados, no intuito de estabelecer relações e explicações com a literatura bem como verificar a existência ou não de elementos inovadores. Nessa perspectiva, utilizamos a Análise Dialógica do Discurso, a qual, segundo Magalhães (2019), possui um caráter social e dinâmico da linguagem, cujos significados são formulados por meio do diálogo e da interação entre diferentes pontos de vista, nos permitindo, por meio da interação entre concepções distintas contidas no estudo, observar como estas se relacionam, se complementam ou se confrontam. Para Souza, Melo e Nogueira (2023): “A metodologia dos estudos dialógicos do discurso vai na contramão de perspectivas teórico-metodológicas lineares ou fechadas em si, que tomam como base o referencial teórico estruturalista do âmbito da análise do discurso” (p. 19).
Diante dos procedimentos mencionados anteriormente, apresentamos, a seguir, os resultados e as discussões propostos neste artigo.
3 Resultados e discussões
A partir da natureza qualitativa da pesquisa, a qual se constituiu em uma análise textual discursiva, buscamos descrever e interpretar as falas dos participantes, com base nas experiências obtidas no curso de especialização lato sensu na perspectiva da atuação docente junto aos estudantes público da Educação Especial no estado da Paraíba.
Por meio da decodificação dos dados, realizada pela identificação e pelo agrupamento em categorias/temas comuns que surgiram frequentemente nos discursos dos participantes da pesquisa, foram estabelecidas quatro categorias de análise, as quais serão apresentadas a seguir.
3.1 O curso de especialização em educação especial na Paraíba: principais demandas e perfil dos participantes
Dentre os 150 estudantes egressos do curso de especialização, cujas aulas ocorriam semanalmente aos sábados, nos turnos manhã e tarde, 43% participaram desta pesquisa. A grande maioria, totalizada em 60,7%, possui entre 35 e 50 anos. Esse dado aponta que os professores do estado da Paraíba têm conseguido conciliar as demandas de suas vidas pessoais, alinhando a necessidade do cuidado da família e/ou outros interesses com a disponibilidade para investir em sua carreira profissional.
Dos 64 participantes da pesquisa, 21,9% representam a população com idade superior a 50 anos e uma vasta carreira no magistério e docência, refletindo que, mesmo com todas as dificuldades e desgastes no caminho docente vivenciado no sistema educacional brasileiro, há um número razoável de professores interessados em se aperfeiçoar academicamente na área da Educação Especial. Geralmente são os professores que já atuavam na Educação Especial e/ou educação regular que adentram essa atividade com novas atribuições, cuja preparação se efetiva por meio da formação continuada (Rossetto, 2015).
A respeito do gênero dos participantes da pesquisa, identificamos uma prevalência do gênero feminino, que totaliza 90,6%, em discrepância ao gênero masculino, cujos respondentes se resumiram a 9,4%. Ao longo dos anos, a docência foi assumindo um caráter eminentemente feminino, e, atualmente, mesmo com todos os discursos e (des)construções sobre gênero, ainda é grande a presença de mulheres no exercício do magistério, especialmente na Educação Infantil e Educação Especial. Sciotti et al. (2019) afirmam que, quando pensamos na docência, espontaneamente remetemos o nosso pensamento à imagem feminina. Essa associação está vinculada a um fenômeno construído historicamente e influenciado pela cultura e pelas práticas sociais.
Sobre o local de realização do curso, 29,7% dos respondentes cursaram em João Pessoa, capital do estado da Paraíba; 32,8% em Campina Grande, maior município do interior do estado, e os demais, 37,5% na cidade de Patos, sendo eles oriundos de regiões adjacentes do sertão paraibano, incluindo localidades rurais. Sobre essa questão, destacamos a importância de descentralizar a formação, expandindo-a ao interior do estado, posto que oportunidades formativas presenciais dificilmente contemplam esse público, que, pelas mais diversas razões, encontram dificuldades para deslocar-se até a capital, onde se concentra a maior oferta de cursos na modalidade presencial.
Mesmo com tantas dificuldades enfrentadas na carreira docente e vida pessoal, há um reconhecimento por parte dos docentes da necessidade de se atualizarem e buscarem novos conhecimentos. As aulas aconteceram de forma presencial, e muitos desses alunos viajaram por horas para assistir aos 48 encontros do curso de especialização durante o período de um ano. Atendendo aos objetivos do curso, 42,2% dos participantes eram professores do AEE, seguido de professores do ensino regular, gestores, auxiliares de sala, psicopedagogas, tradutores intérpretes dentre outros profissionais.
Embora a Resolução nº 4, de 2 de outubro de 2009, estabeleça uma intensa carga de responsabilidade direcionada ao profissional do AEE, que é conduzido a desempenhar diferentes tarefas com públicos tão diversos, torna-se importante sinalizarmos a considerável procura pela formação por parte de uma série de outros atores presentes na escola regular, dentre os quais, destacamos os professores da Educação Básica, o que, seguramente, representa avanços no processo de inclusão, que, segundo a Lei nº 13.146/2015, passa a ser tarefa de todos os segmentos que integram a comunidade escolar (Rossetto, 2015).
A Resolução nº 4/2009 estabelece, em seu art. 12: “Para atuação no AEE, o professor deve ter formação inicial que o habilite para o exercício da docência e formação específica para a educação especial”. Mesmo com tantas atribuições, não há na Paraíba uma previsão de formação inicial específica para o professor do AEE, e sua formação consiste nos cursos de formação continuada e especialização em AEE (Rossetto, 2015). Nesse contexto, há uma ênfase na formação continuada desses profissionais para a intensificação da aprendizagem dos princípios da educação inclusiva a serem aplicados.
Esta pesquisa reflete tal realidade, pois, além da grande procura dos professores do AEE pelo curso de especialização em questão, 73,4% afirmaram já terem participado de outros cursos de especialização em Educação Especial ofertados gratuitamente, e 65,6% discorrem a respeito da sua satisfação pelo apoio recebido da universidade e secretarias, a fim de viabilizar a participação deles em mais um curso de formação continuada.
3.2 Dificuldades para a atuação junto aos estudantes público da educação especial: o que relatam os docentes
Pesquisas no Brasil (Bassani & Viégas, 2020; Collares & Moysés, 2015; Collares et al., 2013; Souza, 2000; Viégas et al., 2014) apontam o aumento considerável no número de estudantes com deficiência matriculados nas escolas regulares. Como condição sine qua non a partir da Resolução nº 4/2009, esses estudantes precisam de um laudo médico para terem acesso às Salas de Recursos Multifuncionais (SRM). Por tal razão, em escolas públicas brasileiras, muitos alunos são encaminhados para profissionais de saúde e, a partir dos diagnósticos médicos produzidos, geralmente em consultas que duram poucos minutos, tais discentes passam a fazer parte da estatística da Educação Especial (Bassani et al., 2024).
Esse dado elucida uma demanda emergente ao governo brasileiro, nas esferas federal e local, no sentido de constituir uma equipe multidisciplinar tendo em vista a avaliação da deficiência em uma perspectiva biopsicossocial, conforme estabelecido no art. 2º da Lei Brasileira de Inclusão (Lei n° 13.146, 2015). Devido à ausência dessa avaliação, torna-se comum encontrarmos, nas escolas públicas, discursos de docentes e gestores tomando por base o processo de aprendizagem a partir do laudo, antes mesmo de obter um conhecimento sobre as especificidades do estudante com deficiência e suas potencialidades de aprendizagem.
Nesta pesquisa, quando questionados sobre as principais dificuldades encontradas em sua prática pedagógica ao receber um estudante público da Educação Especial, uma parcela considerável dos respondentes elencou a ausência do laudo médico e do diagnóstico exato do discente. Isso evidencia uma prática pedagógica fundamentada no modelo médico, alicerçado em crenças errôneas a respeito dos limites de aprendizagem desses estudantes. Em oposição ao modelo social da deficiência, essa concepção desconsidera as inúmeras barreiras presentes no ambiente escolar que, quando experienciadas, constituem indubitavelmente a maior causadora do “insucesso” dos estudantes (Diniz, 2007).
Outra dificuldade relatada está centrada na falta de recursos monetários e de uma equipe multidisciplinar que realize um trabalho colaborativo, incluindo o professor da sala de aula regular, conforme sinalizam algumas respondentes do estudo:
Existem várias dificuldades e, dentre elas, estão a dificuldade que os professores de sala regular têm em abordar o conteúdo de sala de aula para o aluno da educação especial bem como potencializar suas habilidades. Nos sentimos trabalhando sozinhos neste caminho. (Letícia)
O desafio é enorme, pois é necessário o envolvimento de toda equipe escolar nesse processo. (Maria)
Os desafios são imensos, pela falta de recursos. (Joana)
Falta de investimento do setor público tanto na parte estrutural como equipe multidisciplinar, falta de recursos pedagógicos muitas vezes gastamos do nosso bolso, falta de interesse em uma minoria dos pais ou responsáveis na questão do incentivo e comprometimento com relação ao ensino e aprendizagem, entre outros. (Mariana)
Um sistema educacional inclusivo se concretiza não apenas no acesso, mas na permanência, na participação e na aprendizagem de todos os estudantes (Lei n° 13.146, 2015). Sob o paradigma da Educação para Todos (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura [UNESCO], 1998a, 1998b), as escolas inclusivas devem ser capazes de implantar práticas que removam barreiras à aprendizagem de todos os alunos com ou sem deficiência (Correa, 2006; Marchesi et al., 2004). Para tanto, um sistema de apoio formado por serviços, recursos e profissionais é considerado essencial nesse processo, e a sala de aula regular, os professores e as SRM constituem o ponto de partida nesse percurso (Silva, 2016).
Carvalho (2004), Marchesi et al. (2004) e Mitler (2010) apontam caminhos possíveis para alcançar um ensino de qualidade para todos os estudantes, quais sejam:
Práticas de apoio mútuo entre os professores da sala de aula regular e professores do Atendimento Educacional Especializado (AEE).
Compartilhamento e análise das experiências aplicadas em sala de aula.
Apoio entre alunos.
Estímulo às parcerias colaborativas.
Auxílio de outros profissionais, como o de psicólogos escolares.
Formação continuada para professores, gestores e demais integrantes da equipe multidisciplinar.
A fim de sanar as dificuldades elencadas pelos professores participantes, o curso de especialização, objeto desta investigação, buscou, por meio dos diversos módulos, abordar fundamentos teóricos da Educação Especial, visando a conscientização do profissional a respeito do paradigma da inclusão, além de aulas mais práticas voltadas a metodologias inovadoras, especificidades dos estudantes público da Educação Especial e diretrizes para a constituição de uma equipe multidisciplinar eficiente e que coloque em prática os princípios da atividade colaborativa.
3.3 O curso de especialização e suas contribuições no fazer docente
Ao serem questionados sobre em que medida a especialização lato sensu em Educação Especial contribuiu para minimizar os entraves para a inclusão e melhorar suas práticas pedagógicas, os respondentes afirmaram:
No trato com os alunos, nos documentos da sala de recursos, na forma de me posicionar com os demais profissionais. (Camila)
A parte teórica foi fundamental, mas os exemplos de adaptações trazidos pelos colegas e professores foram de grande valia para colocarmos em prática algumas ações no contexto da sala regular. (Marta)
Orientação do papel do professor da sala de recursos. (Carla)
Por meio das falas das professoras, podemos perceber a importância de uma formação continuada de forma presencial, uma vez que a discussão dos conteúdos acontece de forma mais aprofundada e a troca de experiências é enriquecida por meio de resultados concretos.
Foi-se cogitada a possibilidade de realizar o curso de forma remota, mas um olhar mais crítico revela que os cursos de Educação a Distância (EAD), on-line, mesmo abrangendo uma grande quantidade de profissionais e parecendo ser uma estratégia convidativa e confortável, escondem uma formação docente limitada e aligeirada que, supostamente, é justificada pela urgência de formar o profissional para uma tarefa imediata (Rossetto, 2015).
Nesse contexto, optou-se pela formação continuada para professores da Educação Especial de forma presencial. Apesar dos inúmeros entraves sociais e financeiros, principalmente pelo fato de a maioria dos estudantes morarem afastados dos polos, o curso de especialização em Educação Especial mostrou-se eficaz e uma alternativa para a melhoria das práticas pedagógicas cotidianas com alunos com deficiência em diversas regiões do estado paraibano.
Outra contribuição elencada pelas docentes sobre os benefícios da especialização lato sensu para suas práticas pedagógicas diz respeito à adoção de metodologias inovadoras, acolhedoras e inclusivas:
Os conteúdos contribuíram para a construção de um processo inclusivo efetivo para todos, pensado a partir do Desenho Universal para a Aprendizagem. (Luna)
Os conteúdos abordados na formação foram extremamente valiosos para minha prática cotidiana, especialmente em relação à adoção de metodologias acolhedoras e inclusivas. Por exemplo, conhecimento das necessidades dos alunos: aprendi sobre as diferentes formas em que os alunos podem aprender e as diversas necessidades que podem ter. Isso me ajudou a adaptar minha abordagem de ensino, garantindo que todos tenham a oportunidade de ter sucesso. (Leila)
As falas das professoras expressam um dos pilares abordados na grade curricular do curso: as metodologias de ensino inclusivas, fundamentadas no Desenho Universal da Aprendizagem (DUA). Perante a discrepância da diversidade de estudantes que frequentam a escola e a padronização do currículo único para todos, independentemente de suas particularidades, surge a necessidade de se idealizar outro processo de organização e gestão do currículo, associando-se ao aparecimento do conceito Universal Design for Learning (UDL), o DUA, nos anos de 1990 (Nunes & Madureira, 2015).
O Center for Applied Special Technology ([CAST], 2014) conceitua o DUA como um conjunto de princípios e estratégias relacionadas ao desenvolvimento curricular que procura reduzir as barreiras ao ensino e à aprendizagem. Especificando, esses princípios e essas estratégias permitem ao docente planejar uma aula que tenha objetivos de ensino, materiais e formas de avaliação que se adequem a todos os estudantes, de forma que as expectativas de aprendizagem para todos os alunos com ou sem deficiência sejam altas e viáveis para serem aplicadas no sistema regular de educação.
O DUA tem se apresentado como um caminho para tornar a educação inclusiva possível, uma vez que essa abordagem curricular traz metodologias que abarcam os vários ritmos e estilos de aprendizagem. No curso de especialização em questão, ofertou-se um módulo específico sobre o DUA e nos demais módulos também havia momentos de vivências, onde o professor podia agregar a fundamentação teórica aos caminhos de aplicabilidade metodológica do que estava sendo abordado.
O processo de autoafirmação e de valorização enquanto professor do AEE e o fortalecimento de sua identidade foram alguns elementos apontados como benefícios trazidos pelo curso de especialização aos docentes:
Essa formação me fez sentir valorizada, trouxe segurança por saber o meu papel na minha prática profissional na abordagem com os alunos, pais e os profissionais. (Camila)
Assim como a educação, o professor tem sofrido as contradições da sociedade capitalista. Como discorre Martins (2010), o professor, no século XX, teve de atender às demandas hegemônicas do capital, e a expropriação do professor em relação ao conhecimento científico é um dos problemas para a educação, situação que resulta no esvaziamento da atividade docente. O professor, como toda a classe trabalhadora, está exposto às condições degradantes de trabalho que inviabilizam o seu valor como profissional.
Dentro desse contexto, a formação direcionada ao professor também é afetada, tornando-se superficial por duas razões: de um lado, a substituição da Educação Especial pelo AEE; do outro, a padronização dos cursos de EAD como forma de capacitação desse profissional (Rossetto, 2015). Diante dessa conjuntura, os resultados desta pesquisa apontam a necessidade de uma maior valorização do profissional do AEE que, por vezes, afirmam sentir-se solitários, relegados a uma posição de esquecimento dentro da educação brasileira pela falta de recursos e apoio.
Quando questionados a respeito da aplicabilidade dos aprendizados consolidados na formação, obtivemos resultados bem positivos, como estão explicitados nas falas a seguir:
As possibilidades de aplicação são inúmeras, já estou aplicando com ótimos resultados. Estou aplicando sobretudo na elaboração e organização de recursos pedagógicos e de acessibilidade que considerem as necessidades específicas de cada sujeito, pensando na sua subjetividade para a eliminação de barreiras que impedem sua plena participação na escola e na sociedade. (Ana)
Após o conhecimento adquirido durante as aulas, podemos transferir todo o nosso conhecimento para as pessoas, incluindo a equipe escolar, os estudantes e as famílias, pois são peças importantes para que aconteça a inclusão de fato no ambiente escolar. (Gabriela)
Compartilhar com os demais colegas, para que eles possam assim melhorar suas práticas. Utilizando estratégias de diferenciação curricular para garantir que o currículo seja acessível a todos os alunos, independentemente de suas habilidades, necessidades ou estilos de aprendizagem e criando um ambiente acolhedor e inclusivo, onde todos os alunos se sintam valorizados e respeitados. (Camila)
A construção de estratégias visando a remoção de barreiras bem como o compartilhamento dos conhecimentos com seus pares no ambiente escolar são evidências de que os objetivos dessa especialização foram paulatinamente alcançados, como podemos observar nas falas supracitadas, o que, a nosso ver, caracteriza indícios de mudanças no ambiente escolar de cada um dos cursistas.
A colaboração entre os profissionais do AEE e da sala regular emerge como uma contribuição a mais suscitada pela formação, como é possível visualizar nas falas a seguir:
Através do curso, descobri o quanto é importante a relação entre o professor de AEE e o professor do ensino regular para o melhor equacionamento da Aprendizagem do Aluno com deficiência. (João)
Esta formação trouxe grandes contribuições no que se refere ao papel de cada profissional no contexto da educação inclusiva, pois sabemos que a inclusão se dá a partir das colaborações de todos e que, quando falamos no público da educação especial, estes precisam ser reconhecidos como sujeitos protagonistas, atuantes em qualquer espaço, mas, para que isso ocorra, é necessário ofertar, garantir e criar oportunidades para eles. (Marta)
Uma situação recorrente no ambiente escolar trata-se das incumbências fortemente delegadas aos professores das SRM, bem como aos profissionais de apoio escolar. Isso implica a desresponsabilização por parte dos professores do ensino regular que, por acreditarem que estudantes público da Educação Especial estariam impossibilitados de progredir, se omitem desse processo, alegando dificuldades para contribuir com a aprendizagem desses estudantes, considerando que sua formação inicial e/ou continuada não contemplou tais questões.
O trabalho colaborativo entre professores do AEE e do Ensino Regular pode constituir uma alternativa viável para o enfrentamento de tal desafio e, por essa razão, este também foi um tópico abordado no curso de especialização lato sensu. Nesse contexto, os professores de ambos os espaços devem cultivar uma relação de interdependência positiva, colaborando de forma recíproca e estabelecendo relações não-hierárquicas.
Para Mendes, Viralonga e Zerbato (2014), à medida que os professores compartilham a responsabilidade das ações no ambiente escolar, eles estabelecem parcerias e desenvolvem habilidades criativas em vista da resolução de desafios, razão pela qual o trabalho colaborativo vem sendo cada vez mais debatido no cenário escolar atual.
3.4 O curso de especialização e as mudanças nas concepções pessoais e/ou docentes acerca da pessoa com deficiência
Ao longo da história, foram construídas uma série de concepções equivocadas acerca das pessoas com deficiência, as quais se materializam por meio de discursos e atitudes pautados em ideias de fragilidade/impossibilidade, o que, mais recentemente, passou a ser denominado “capacitismo” (Mello, 2016). Nessa direção, percebe-se uma estreita articulação entre o capacitismo e o modelo médico, de acordo com o qual “a deficiência é situada como inerentemente negativa, sendo que esta deveria ser curada ou mesmo eliminada” (Lorandi & Gesser, 2023, p. 4).
É incontestável o fato de que, ainda hoje, discussões relacionadas às distintas concepções acerca da deficiência sejam negligenciadas no percurso formativo dos professores brasileiros, razão pela qual, embora presentes no ambiente escolar, os estudantes público da Educação Especial, por vezes, são relegados, seja por parte de seus colegas, ao excluí-los das mais diversas vivências, seja por parte dos professores, quando, julgando-os incapazes, lhes negam o direito à aprendizagem. Evidenciamos, portanto, que o modelo caritativo da deficiência, consolidado por meio de práticas superprotetoras, se mantém fortemente presente dentro e fora de nossas salas de aula, o que necessita ser urgentemente refutado pelos programas de formação docente.
Diante da importância da temática, as distintas concepções acerca da deficiência foram abordadas no curso. Como benefício na formação dos docentes, destacamos a contribuição dessas discussões para a minimização de uma perspectiva capacitista:
Hoje não vejo os estudantes com deficiência como pessoas vitimistas, que não podem chegar a lugar nenhum. (Vitória)
O curso me ajudou a entender que as pessoas com deficiência são pessoas com potencial incrível. Que apesar das suas limitações, podem se desenvolver muito bem. (Paula)
Essas falas indicam que, discutir os alargamentos do capacitismo no ambiente escolar, implica um processo contínuo que subsidie os docentes, assim como os diversos segmentos presentes nesses espaços, a fim de que possam identificar e, consequentemente, combater as mais diversas atitudes excludentes e discriminatórias, cotidianamente experienciadas por crianças, jovens e adultos com deficiência (Massaro & Farias, 2020).
Dentro desse contexto, outro resultado positivo oriundo do curso de especialização foi a mudança no olhar dos professores no que diz respeito às concepções limitantes acerca da pessoa com deficiência e o aumento de empatia e sensibilidade em relação às difíceis experiências enfrentadas por esse grupo social:
A formação contribuiu para uma mudança positiva nas minhas concepções pessoais e docentes sobre pessoas com deficiência, levando-me a adotar uma abordagem mais inclusiva, centrada na pessoa e sensível às necessidades individuais dos alunos com deficiência. Proporcionou oportunidades para desenvolver empatia e sensibilidade em relação às experiências e desafios enfrentados por pessoas com deficiência. (Camila)
A nosso ver, a eliminação ou, ao menos, o combate ao capacitismo e às concepções limitantes acerca da deficiência, assim como a vivência de práticas colaborativas no ambiente escolar, requerem uma série de mudanças no processo de formação inicial e continuada de nossos professores.
Para além de meras prescrições metodológicas, tal processo exige, antes de tudo, que os docentes ressignifiquem suas concepções acerca da deficiência e da maneira como esses estudantes estabelecem relações de proximidade na escola e na sociedade em geral, desde que oportunizados. Ademais, por meio desta pesquisa, constatamos que um dos caminhos para a eliminação dos resquícios do modelo médico que tanto interfere no processo de ensino aprendizagem pode se dar por meio da formação continuada e do compartilhamento de experiências exitosas no processo de escolarização de estudantes com deficiência.
4 Conclusões
Considerando o objetivo do presente estudo, foi possível identificarmos que, no cenário educacional paraibano, a oferta do curso de especialização lato sensu em pauta trouxe uma série de contribuições, não apenas para os profissionais participantes, mas também às comunidades escolares onde eles estão inseridos.
Nessa perspectiva, destacamos, inicialmente, que, em meio a uma disponibilização maciça de cursos no formato EAD, a formação contemplou regiões distantes da capital paraibana, como é o caso do agreste e do sertão, proporcionando também a esse público ascensão na carreira docente e, sobretudo, a oportunidade de compartilhar estratégias pedagógicas relevantes no trabalho com estudantes público da Educação Especial.
Outro aspecto que chama atenção, em uma conjuntura em que a Educação Especial em uma perspectiva inclusiva ainda é hostilizada por diversos segmentos que compõem a comunidade escolar, diz respeito ao fato de que, além de professores do AEE, docentes do ensino regular e outros profissionais da educação buscaram a formação, o que consideramos como avanço, por entendermos que o envolvimento da comunidade escolar é condição indispensável para que a inclusão seja concretizada.
Concluímos ainda que o programa formativo construído para a especialização trouxe contribuições que auxiliaram os docentes na compreensão dos desafios tão recorrentes nos sistemas escolares, a exemplo da ausência de investimentos governamentais e da pequena participação das famílias dos estudantes da Educação Especial. A esse respeito, acreditamos que uma formação eticamente comprometida com a inclusão desse público implica pensar a deficiência e outras condições específicas em uma perspectiva interseccional, compreendendo, dessa forma, uma multiplicidade de fatores que interferem no sucesso escolar desses estudantes.
A adoção de metodologias colaborativas, inovadoras, acolhedoras e inclusivas, além de ser um processo de autoafirmação e valorização da identidade do professor do AEE, também emerge como benefício resultante da especialização. Tais constatações evidenciam a necessidade de se elaborar projetos formativos que, de fato, estejam em consonância com as realidades escolares, necessidade ainda mais explícita quando se trata de professores do AEE, cujo trabalho, por vezes, ainda se realiza de maneira solitária e esquecida.
Uma última e não menos importante contribuição revelada pela pesquisa relaciona-se à compreensão dos docentes sobre as distintas concepções acerca da deficiência, ao olhar para os resquícios do modelo médico e, sobretudo, à atenção às inúmeras barreiras presentes no espaço escolar, cujas lentes teóricas advém do modelo social da deficiência. A nosso ver, esse conhecimento contribui significativamente para formar professores e, consequentemente, estudantes envolvidos/comprometidos com a construção de ambientes escolares e sociais anticapacitistas.