1 Introdução
As exigências sociais e o controle têm ampliado as discussões sobre a necessidade de realização de planos estratégicos voltados a uma administração pública comprometida com os interesses da população (ULTRAMARI; REZENDE, 2008). Ademais, os cortes orçamentários vêm afetando diretamente a produção de conhecimento, a formação de profissionais e pesquisadores, além de infraestrutura necessária para a realização de pesquisas e a sobrevivência das instituições de pesquisa (SERAFIM; DIAS; ETULAIN, 2021).
Alguns autores fazem críticas aos modelos de planejamento estratégico e indicam que tais ferramentas não podem ser tratadas como simples análise de variáveis pré-determinadas e que precisam se adequar às novas necessidades. Por exemplo, Souza (2011) questiona se o nível de formalização da prática de planejamento estratégico nas organizações não pode ser definido pela estruturação da prática na sua dinâmica social.
Para outros pesquisadores, as organizações concentram muitos esforços na elaboração do plano e acabam falhando em sua implementação. Os motivos que levam a essas falhas são: “falta de disciplina, a baixa motivação para realizar as atividades, as dificuldades em aglutinar pessoas, fazer reuniões e cumprir as etapas e, principalmente, a necessidade de entregar resultados na complexa rotina” (NEVES; GRAY, 2020). Entretanto, esses apontamentos não diminuem a necessidade de as organizações públicas buscarem antecipar cenários e estabelecerem objetivos de longo prazo de forma coletiva, garantindo a participação da comunidade. Isso se aplica às Universidades Públicas – haja vista as complexidades que permeiam essas organizações (OLIVEIRA; PINTO; MENDONÇA, 2020).
Welsha et al. (2006 apudBARBOSA; LÖBLER, 2020), ao contextualizarem o ambiente universitário, reforçam a dificuldade em garantir o envolvimento da comunidade acadêmica nos processos de tomada de decisão. Os autores indicam que o envolvimento em nível razoável é um dos aspectos que podem influenciar o apoio organizacional ao processo de planejamento. Meyer (2007) também aponta a dificuldade de se encontrar consenso nas universidades. Por outro caminho, Staci et al. (2021) pesquisaram a vinculação das estratégias às questões orçamentárias em universidades públicas.
Já Christopher, Morphew and Stensaker (2018) associaram a atuação universitária e os objetivos estratégicos de algumas instituições norte-americanas e do norte da Europa. Mais: Clark (2004) argumenta que as universidades que buscam caminhos mais orientados para o mercado e as trajetórias empreendedoras tendem a se distanciar das missões vinculadas as suas funções públicas.
Os argumentos acima reforçam a ideia que os planos estratégicos das universidades expressam como os líderes universitários, estudantes, acadêmicos e pessoal administrativo devem almejar e cumprir seus papeis sociais – inclusive considerando a declaração dos seus valores e meios pedagógicos (MOLLY; TONE; CIARAN, 2019).
Por considerar a importância do tema, alguns trabalhos procuraram entender como essas instituições têm formulado suas declarações institucionais. Por exemplo, Reyder (2011) realizou análise sobre universidades sediadas apenas no Estado de Santa Catarina, bem como Mizael et al. (2012) que estudaram os Planos de Desenvolvimento Institucional (PDI) de quatro Universidades Federais de Minas Gerais e Silva et al. (2013a) que ampliaram a análise para oito universidades. Já Freitas et al. (2019) usaram os elementos propostos por Pearce e David (1987) e ampliaram o banco de dados, mas se omitiram ao não debater sobre as visões e valores institucionais. Griboski, Peixoto e Hora (2018) estudaram a importância do PDI e a relação com a avaliação externa e a autoavaliação.
Ademais, como aborda Barbosa e Löbler (2020), a respeito da participação e do envolvimento da comunidade acadêmica, percebe-se a necessidade de se verificar as metodologias e ferramentas administrativas utilizadas nas construções dos PDI. Assim, esse artigo visa identificar, a partir dos PDIs, quais são as formas de participação coletiva, ferramentas administrativas e questões priorizadas e reveladas expressamente pelas universidades federais das regiões Nordeste e Sudeste do Brasil nas suas declarações institucionais.
2 Referencial Teórico
2.1 Planejamento estratégico e declarações institucionais: missão, visão e valores
O planejamento se tornou uma ferramenta essencial para oportunizar uma visão abrangente aos gestores, contribuindo para o alcance dos objetivos organizacionais. Para Mintzberg (2004), Planejamento é um procedimento formal para produzir resultado articulado, na forma de sistema integrado de decisões.
Sobre o planejamento estratégico, uma visão clássica sobre o tema e que tem grande destaque é apresentada por Drucker (1998 apudSILVA et al., 2013b), que define planejamento estratégico como processo contínuo de tomar decisões atuais que envolvam riscos, organizar sistematicamente as atividades necessárias à execução dessas decisões e medir o resultado dessas decisões com as expectativas almejadas. Nesse sentido, seria um grande desafio à administração pública atender a essas etapas para que seja possível utilizar os indicadores de desempenho apropriados para a sua realidade.
Diante de um cenário dinâmico, o planejamento estratégico torna-se indispensável à organização, inclusive às universidades públicas, pois possibilita o seu autoconhecimento, observa as mudanças em seu ambiente interno e externo e define a direção a seguir para alcançar seus objetivos (PINTO; NOGUEIRA; SILVA, 2019). Do ponto de vista dos autores, para que seja possível implementar o planejamento estratégico é preciso alinhar a atuação dos gestores, definindo os objetivos e metas, proporcionando o envolvimento de toda a comunidade acadêmica com a finalidade de colaborar com a tomada de decisão.
Para Pascuci et al. (2016), a adoção do planejamento estratégico na gestão pública exalta uma complexidade ainda maior que na iniciativa privada, os autores evidenciaram limitações importantes para a implementação do planejamento estratégico nas universidades públicas, tais como, ausência de cultura de planejamento e avaliação, forte viés político, diversidade de interesses, falta de integração entre as áreas administrativas e unidades acadêmicas, autonomia profissional, poder compartilhado e resistência às mudanças. Por outro lado, também ficou constatado que, na visão dos gestores, a contribuição acadêmica com relação ao planejamento estratégico, estimula a persistência na sua adoção.
Com uma linha de pesquisa direcionada para a educação, Dias, P., Souza e Dias, J. (2018) indicam que a implementação eficiente do planejamento estratégico, em instituições de ensino, contribui para eficácia da gestão e, por conseguinte, proporciona uma prestação de serviços educacionais de qualidade, que tanto necessita o sistema educacional brasileiro. Ademais, os autores constataram que o PDI é o instrumento norteador do planejamento estratégico, por isso, necessita ser mais bem compreendido pelos gestores e servidores que executam a estratégia da organização de forma a responder à dinâmica e realidade institucional.
Quanto às declarações, Freitas et al. (2019), ao tratar sobre a efetividade das declarações de missão institucional das Instituições Federais de Ensino Superior (IFES), esclarecem que as declarações de missão evidenciam um conjunto de objetivos, interesses e cultura da organização, a fim de que a gestão estratégica da organização possa se nortear para a condução das ações e atendimento de metas previamente definidas no planejamento estratégico. Para os autores, a missão deve possuir enunciado realista, de forma a permitir o estabelecimento de estratégias e políticas para que as atividades organizacionais possam ser devidamente conduzidas. Ainda segundo Freitas et al. (2019), a missão institucional da organização reflete a cultura da organização, expressando seus valores, crenças e objetivos que norteiam a sua forma de se posicionar perante a sociedade e demais stakeholders.
No mesmo sentido, a Escola Nacional de Administração Pública (ENAP, 2019) destaca a importância da missão como etapa fundamental dentro do Planejamento Estratégico, uma vez que representa o alicerce para a construção estratégica do futuro, presente na visão, bem como da estratégia composta pelos objetivos estratégicos, das metas, dos indicadores e das iniciativas estratégicas.
Em síntese, para a ENAP (2019), os principais componentes para a estruturação da missão da organização são: a) competências; b) valores; c) stakeholders (ou grupo de direção) e; d) impacto, traduzindo-se como o pilar essencial e o ponto de partida para todo o Planejamento Estratégico. Ainda para a ENAP (2019), a Visão tem como objetivo expressar a forma que a organização deseja ser reconhecida, ou seja, apresenta a declaração de futuro revelada pela organização num horizonte de tempo. A ENAP (2019) também indica as variáveis para a visão: a) meta ambiciosa, b) definição do nicho e o c) horizonte temporal.
Em sintonia com as duas primeiras declarações institucionais, segundo Vergara (2004), os Valores são um conjunto de sentimentos que estruturam, ou pretendem estruturar, a cultura e a prática da organização. Os valores surgem agregados à missão, como uma simples relação ou de forma mais elaborada, como crenças ou políticas organizacionais. Para o autor, os valores representam um conjunto de crenças essenciais ou princípios morais que informam as pessoas como devem reger os seus comportamentos na organização.
A ENAP (2014) ressalta que os valores procuram transmitir sentido comum a todos os membros nas organizações, sendo fundamental para inspirar o comportamento das pessoas que nela atuam.
2.2 O PDI e o Planejamento Estratégico nas Universidades Federais Brasileiras
Idealizado para ser o modelo de planejamento estratégico para as universidades públicas federais, o PDI tem sua origem ligada à própria Lei de Diretrizes e Bases da Educação - LDB (1996). Porém, apenas com a aprovação da Lei Federal nº 10.861/2004 (BRASIL, 2004) é que a avaliação do ensino superior foi regulamentada com a implementação do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior (SINAES). Dentre outros pontos, o SINAES torna obrigatória a elaboração do PDI como ferramenta estratégica e que possibilite a avaliação da gestão das universidades federais (SILVA et al., 2013a).
O PDI passou a ser fator estruturante da gestão estratégica, com a explicitação de indicadores de acompanhamento e base de um processo de avaliação institucional sistemático (MONTICELLI et al., 2021). Previsto para ser um planejamento de médio e longo prazo, o PDI é legalmente definido como documento que identifica a universidade e apresenta para a comunidade interna e externa suas escolhas e pensamentos em relação à forma de trabalho, a missão a que se propõe, as diretrizes pedagógicas que orientam suas ações, a sua estrutura organizacional e as atividades acadêmicas que desenvolve ou que pretende desenvolver no âmbito do ensino, pesquisa, extensão e inovação (BRASIL, 2004).
Sendo parte da administração pública federal, as universidades também devem ser regidas pelos princípios legais da administração pública, tais como: legalidade, impessoalidade, moralidade, eficiência e publicidade. Além disso, elas também são afetadas pelo modelo de administração pública vigente. No caso brasileiro, na década de 90, foi delegado às universidades federais o papel de serviço público não exclusivo, concorrendo com as organizações privadas (MIZAEL et al., 2013).
Em análise às normas legais, em conjunto com a prerrogativa gerencial da administração pública, pode-se inferir que o processo de planejamento estratégico materializado na forma do PDI nas universidades federais assume papel fundamental para a gestão de uma organização pública. O PDI é uma ferramenta chave para a gestão participativa e possibilita a avaliação dos resultados alcançados a partir dos objetivos planejados, além de poder contribuir para identificação de potencialidades e desafios no ambiente organizacional interno e externo e as formas para superá-los ou aproveitá-los para atender as demandas cada vez maiores de cidadãos e atores sociais diversos que estão entre as partes interessadas (MIZAEL et al., 2013; SILVA, 2013).
O PDI ainda se apresenta como um mecanismo que permite aumentar a participação do público externo nos objetivos institucionais, caso sua metodologia permita essa estratégia. Essa é uma crítica de Balbachevsky, Sampaio e Andrade (2019) quando afirmam que as universidades públicas tem um modelo de governança desenhado para priorizar as demandas e visões sustentadas pelo público interno, que são responsáveis por eleger os reitores e membros dos seus conselhos.
3 Metodologia
Esta pesquisa se caracteriza como de natureza quali-quanti, descritiva, através de pesquisa documental. A população deste estudo compreende Universidades Federais (UF) sediadas nas regiões Nordeste e Sudeste do Brasil.
Os procedimentos de coleta de dados se deram pela busca, em do sítio da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), visando identificar Universidades Federais (UF) sediadas nos estados das regiões Nordeste e Sudeste do Brasil. Uma vez identificada a população a ser estudada, buscou-se localizar os PDI destas instituições, nos seus sítios na internet.
Após a coleta dos PDI, aplicou-se uma lista de conferência para identificar as formas de participação coletiva, ferramentas administrativas e questões priorizadas e reveladas expressamente pelas universidades federais das regiões Nordeste e Sudeste do Brasil nas suas declarações institucionais.
Os dados foram tabulados e tratados em planilha eletrônica Excel, seguindo os critérios de análise previamente estabelecidos, conforme Figura 01. Destaca-se que os critérios utilizados na análise das missões institucionais fazem parte do modelo teórico da ENAP (2019): competências, valores, stakeholders (ou grupo de direção) e impacto. A ENAP (2019) também indica as variáveis para a visão: a) meta ambiciosa, b) definição do nicho e o c) horizonte temporal. Os Temas Estratégicos foram analisados na investigação sobre a estrutura dos planos.
Quanto à análise sobre a participação, a pesquisa foi além da identificação quantitativa e buscou analisar quais são as formas de mobilização interna. Já na tabulação sobre os mecanismos de controle, limitou-se a verificar a existência de ferramentas. A respeito das ferramentas de auxílio ao processo de planejamento, os dados trazem resultados quantitativos e a descrição das ferramentas utilizadas. Os dados ainda foram tratados buscando identificar a estrutura dos planos de metas, observando seu horizonte temporal.
Quando se verificou alguma situação de não vigência do PDI, foram coletados os dados do PDI anterior. Ademais, o software Wordart foi utilizado para construir as nuvens de palavras com base nas declarações institucionais das universidades.
4 Discussão e Resultados
Foram estudadas 18 universidades federais sediadas na região Nordeste, sendo 4 no Estado da Bahia, 3 no Ceará, 2 em Pernambuco, 2 na Paraíba, 2 no Rio Grande do Norte, 1 no Piauí, 1 em Alagoas, 1 em Sergipe, 1 no Maranhão e 1 sediada em Pernambuco, mas com Campi na Bahia e Piauí. Na região Sudeste do Brasil, foram estudadas 19 Universidades Federais, sendo 3 no Estado de São Paulo, 1 no Espírito Santo, 4 no Rio de Janeiro e 11 no Estado de Minas Gerais (Quadro 1).
UNIVERSIDADE FEDERAL – REGIÃO SUDESTE | UNIVERSIDADE FEDERAL – REGIÃO NORDESTE |
---|---|
Universidade Federal de São Paulo - UNIFESP | Universidade Federal do Vale do São Francisco – UNIVASF |
Universidade Federal do ABC - UFABC | Universidade Federal do Ceará – UFC |
Universidade Federal de São Carlos - UFSCAR | Universidade Federal do Cariri – UFCA |
Universidade Federal do Espírito Santo - UFES | Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-Brasileira – UNILAB |
Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ | Universidade Federal do Piauí – UFPI |
Universidade Federal Fluminense – UFF | Universidade Federal de Pernambuco – UFPE |
Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro - UFRRJ | Universidade Federal Rural de Pernambuco – UFRPE |
Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro - UNIRIO | Universidade Federal da Paraíba – UFPB |
Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG | Universidade Federal de Campina Grande – UFCG |
Universidade Federal de Juiz de Fora - UFJF | Universidade Federal do Maranhão – UFMA |
Universidade Federal de Lavras - UFLA | Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN |
Universidade Federal de Viçosa - UFV | Universidade Federal Rural do Semiárido - UFERSA |
Universidade Federal de São João Del-Rei - UFSJ | Universidade Federal de Alagoas – UFAL |
Universidade Federal de Ouro Preto - UFOP | Universidade Federal de Sergipe – UFS |
Universidade Federal de Uberlândia - UFU | Universidade Federal da Bahia – UFBA |
Universidade Federal de Itajubá - UNIFEI | Universidade Federal do Oeste da Bahia – UFOB |
Universidade Federal de Alfenas - UNIFAL | Universidade Federal do Recôncavo da Bahia – UFRB |
Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri | Universidade Federal do Sul da Bahia – UFSB |
Universidade Federal do Triângulo Mineiro - UFTM |
Fonte: Elaboração própria.
Quanto aos mecanismos e possibilidades de participação da comunidade na construção dos PDI, constata-se que das dezoito universidades federais do Nordeste, dezessete delas utilizaram mecanismos de colaboração, conforme Figura 02. O modelo participativo alcançou todas as universidades do Sudeste, indo ao encontro do que estabelece a discussão teórica: os objetivos de longo prazo devem ser elaborados de forma coletiva, garantindo a participação da comunidade – o que inclui as universidades públicas, haja vista as complexidades que permeiam essas organizações (OLIVEIRA; PINTO; MENDONÇA, 2020).
Os dados indicam os mecanismos utilizados para possibilitar a construção coletiva do PDI são diversificados. A maioria das universidades utiliza mais de um meio para estimular a colaboração. Dentre os mais frequentes estão: a consulta pública e instituição de comissões temáticas. Na região Sudeste, 10 universidades utilizaram a consulta pública; já no Nordeste, foram 7. Quanto às comissões, 8 e 7 foram as universidades do Sudeste e nordestinas, respectivamente, que escolheram o mecanismo. Outras maneiras de mobilizar as comunidades encontradas foram: eventos de compartilhamento de experiências; grupos de trabalho; correios e sítios eletrônicos; além da apreciação e deliberação junto aos Conselhos Superiores.
Por outro lado, não há, nos documentos analisados, registro de esforços deliberadamente realizados a fim de se equilibrar a participação dos atores internos e externos das universidades estudadas, conforme sugerem Balbachevsky, Sampaio e Andrade (2019).
Na análise sobre os mecanismos de monitoramento do PDI, os dados indicam que apenas duas universidades por região não declararam os formatos ou mecanismos de monitoramento dos seus planos (Figura 02). Os resultados coadunam com a literatura, uma vez que a construção dos objetivos estratégicos precisa de metas claramente específicas, determinando prazos específicos para cada uma delas, ao mesmo tempo em que se estabeleçam os responsáveis pelo monitoramento, com o intuito de simplificar e dinamizar o acompanhamento estratégico (MACHADO; KALNIN; MORAES, 2020).
A Figura 01 também resume a frequência de utilização de ferramentas de planejamento estratégico nos PDI analisados. Neste aspecto, apenas metade das universidades nordestinas declarou expressamente em seus PDI que utiliza ferramentas de auxílio ao Planejamento. Embora ainda distante de um resultado esperado, cerca de 70% as universidades federais da região Sudeste indicaram a utilização de alguma ferramenta, tais como: Balanced ScoreCard, ForPDI, 5W2H, Sistema de Gestão de Projetos, PMBOK.
Outra análise desse estudo se refere ao horizonte temporal dos PDI (Figura 03). As universidades dessas regiões apresentaram médias próximas, em anos: 5,42 e 6,22 para as UF do sudeste e para as nordestinas, nessa ordem. Trata-se de médias altas – que podem dificultar a flexibilidade e ajustes às constantes mudanças de cenários. McGrath (2013), por exemplo, questiona sobre os prazos para o alcance de vantagens competitivas sustentáveis. Para a autora, as organizações necessitam de novo roteiro, no qual, oportunidades são aproveitadas rapidamente, explorando-as de forma decisiva e seguindo em frente antes mesmo que se esgotem. Assim, planejamentos com horizontes temporais longos podem se apresentar como obstáculos para o aproveitamento de vantagens transitórias, especialmente em ambientes tão instáveis.
Quanto à organização dos planos de metas, percebe-se muita similaridade nas escolhas das UF analisadas, conforme Figura 04. A maneira de estruturar os planos nos PDI a partir de “eixos temáticos” foi escolhida por 12 das 37 universidades, sendo 6 no Sudeste e 6 no Nordeste. A escolha pelo método de eixos temáticos por parte das universidades estudadas se deve ao fato de que as instruções normativas do Ministério da Educação obrigam as universidades a incluir os eixos temáticos no processo de avaliação (MIZAEL, 2013).
Outras maneiras de estruturas encontradas foram os mapas estratégicos, os desafios estratégicos, macro objetivo, plano de gestão, dentre outras. Entretanto, a análise dos dados não permitiu identificar como 6 universidades organizaram seus planos de metas no respectivos PDI, a exemplo da UFAL e UNILAB no Nordeste e da UFMG, UFSJ e a UFRRJ, na região Sudeste.
Em relação aos critérios utilizados na construção da missão institucional das universidades federais, conforme orientado pela ENAP (2019): a) competências; b) valores; c) stakeholders (grupo de direção) e; d) impacto, cerca de 70% das universidades do Nordeste atingiram a totalidade dos aspectos requeridos, exceto a UFOB, UFCA, UFRN, UFPB, UFS e UFCG – que não contemplaram o grupo de direção. A UFS não fez menção ao impacto e a UFCG desconsiderou seus valores, conforme quadro 02.
MISSÃO | VISÃO | ||||||
---|---|---|---|---|---|---|---|
NORDESTE | Competência | Valores | Impacto | Grupo de Direção | Meta ambiciosa | Definição do nicho | Horizonte temporal |
UNIVASF | X | X | X | X | X | X | - |
UFBA | X | X | X | X | X | X | X |
UFOB | X | X | X | - | - | X | - |
UFRB | X | X | X | X | X | X | - |
UFSB | X | X | X | X | - | X | - |
UFPE | X | X | X | X | X | X | - |
UFRPE | X | X | X | X | X | X | - |
UFC | X | X | X | X | X | X | - |
UFCA | X | X | X | - | X | X | - |
UNILAB | X | X | X | X | - | - | - |
UFERSA | X | X | X | X | - | - | - |
UFRN | X | X | X | - | X | X | - |
UFAL | X | X | X | X | X | X | - |
UFS | X | X | - | - | X | - | - |
UFPB | X | X | X | - | X | X | - |
UFPI | X | X | X | X | X | X | - |
UFMA | X | X | X | X | - | - | - |
UFCG | X | - | X | - | X | X | - |
SUDESTE | Competência | Valores | Impacto | Grupo de Direção | Meta ambiciosa | Definição do nicho | Horizonte temporal |
UFSCAR | X | X | X | X | X | X | - |
UNIFESP | X | X | X | X | X | X | - |
UFABC | X | X | - | - | - | - | - |
UFJF | X | X | X | X | - | - | - |
UFLA | X | X | X | X | X | X | - |
UFVJM | X | X | X | X | X | X | - |
UFMG | X | X | X | - | - | - | - |
UFOP | X | X | X | X | X | X | - |
UFSJ | X | X | X | X | - | - | - |
UFU | X | X | X | - | X | X | - |
UFV | X | X | X | X | X | X | - |
UFTM | X | X | X | X | X | X | - |
UNIFAL | X | X | X | X | X | X | - |
UNIFEI | X | X | X | X | X | X | - |
UNIRIO | X | X | X | - | X | X | - |
UFF | X | X | X | - | X | X | - |
UFRRJ | X | X | X | - | X | X | - |
UFRJ | X | X | X | - | X | X | - |
UFES | X | X | X | - | X | X | - |
Fonte: Elaboração própria.
Quanto às Universidades do Sudeste, aproximadamente 56% delas atingiram a totalidade das variáveis sugeridas pela ENAP e apenas a UFABC não declarou, na sua missão, “[...] a finalidade da atuação da organização [...]” (ENAP, 2019, p. 14). Os dados evidenciam a necessidade de, em caso de revisão dessas declarações, que se busque definir todos e todas “[...] aqueles que afetam, são afetados ou possam vir a ser afetados pela organização [...]” (ENAP, 2019, p. 10). Isso inclui atores externos e internos.
Cristopher et al. (2018), em estudo sobre como os planos estratégicos das universidades do Norte da Europa e da América do Norte equilibram identidades competitivas, registram que críticos das reformas de governança não estão otimistas sobre a natureza das ambições das universidades públicas. Eles argumentam que as universidades que estão mais voltadas aos caminhos orientados ao mercado e às trajetórias empreendedoras estão mais aptas a se desviarem de missões conectadas as suas funções públicas. Entretanto, ao analisar a tabulação de dados elaborada no tocante às missões das instituições do Nordeste e Sudeste brasileiro, ao menos neste ponto, é possível observar que todas elas estão mais alinhadas as suas funções essenciais.
O Quadro 02 ainda traz informações sobre a Visão das Universidades Federais. Dentre as 18 universidades federais do Nordeste, apenas a UFBA aplicou os três critérios estudados: a) meta ambiciosa; b) definição do nicho e; c) horizonte temporal –, sendo que a UNILAB, a UFERSA e a UFMA não declararam sua visão no PDI. Nenhuma outra universidade, além da UFBA, estabeleceu horizonte temporal para seu principal objetivo de longo prazo. 72% delas apresentaram alguma definição de nicho e sua meta ambiciosa, sendo que a UFOB e a UFSB não delimitaram esta meta e a UFS e a UFPB não definiram explicitamente seu nicho de atuação.
Na região Sudeste, nenhuma das universidades tornou explícito seu horizonte temporal para realizar o que estabelece sua visão. A UFABC, UFJF, UFMG e a UFSI não estabeleceram explicitamente a declaração da visão institucional no PDI, conforme é possível observar no quadro 02. Lembra-se que a visão “[...] ilustra aquilo pelo qual uma organização deseja ser reconhecida, ou a transformação que pretende produzir ao longo de determinado período de tempo [...]” (ENAP, 2019, p. 12). Assim, em futuras revisões dessa declaração, essas UF devem observar os demais critérios.
Em análise ampla quanto à missão, observa-se que as universidades do Nordeste e do Sudeste do Brasil compõem essa declaração com a presença de bons elementos, em oposição às argumentações levantadas pelos estudiosos das reformas de governança. Quanto à visão, percebe-se a mesma linha do que foi apontado com relação às universidades do Norte da Europa, conforme mencionado por Christopher, Morphew and Stensaker (2018), quando demonstraram que em contraste (com as Universidades do Norte dos Estados Unidos), muitas das universidades do Norte Europeu incluem declarações de missão institucional genéricas, acompanhadas por narrativas mais abstratas elaboradas com ideias-chave e visões que carecem de entregas facilmente mensuráveis.
De maneira a complementar a análise, considerando as disposições, buscou-se contabilizar a frequência de uso dos conceitos na construção das missões, visões e valores. Os dados a seguir serão expostos em forma de nuvens de palavras para melhor visualização gráfica. Ademais, listam-se os primeiros 10 (dez) conceitos utilizados. Para elaborar as nuvens, aplicou-se o seguinte critério: palavras com maior frequência, com peso acima de valor 5 (cinco).
Os dados da pesquisa apontam que os três conceitos mais usados pelas IES pesquisadas para declarar sua missão institucional são os conceitos de Desenvolvimento (peso 15), Formação (peso 15) e Conhecimento (peso 14). O peso do conceito de Desenvolvimento na região Nordeste influenciou o peso do conceito na análise geral dos principais conceitos, conforme exposto acima.
Quando analisada por região os três principais conceitos que mais têm peso das declarações institucionais das IES do Nordeste foram: Desenvolvimento (peso 12), Conhecimento (peso 11) e Difundir (peso 6). Percebe-se que pela inserção regional, a razão de ser das UF deve ser influenciada pela busca por auxiliar a construir e difundir conhecimento dando forte importância para o desenvolvimento regional.
Por outro lado, no Sudeste, os principais conceitos foram: Sociedade (peso 11), Ensino (peso 8), Extensão (peso 8), Pesquisa (peso 8). Observa-se que as UF da região dão peso maior ao reconhecimento e envolvimento da sociedade nas suas declarações de razão de ser, além de reforçar o tripé acadêmico com pesos equivalentes: Ensino, Pesquisa e Extensão.
Analisando as visões institucionais, destaca-se que o principal conceito utilizado, tanto no geral quanto por região, foi o conceito de Excelência (peso 17). O que pode ser interpretado como a principal meta ambiciosa definida para ser alcançada pelas UF estudadas.
O segundo conceito mais utilizado foi o de Universidade (peso 12) e o próximo, o de Desenvolvimento (peso 10). Novamente se tem um conceito voltado para futuro e o impacto desejado pelas UF para seu médio e longo prazo. No tocante à análise regional, não foram identificadas maiores diferenças entre as duas regiões analisadas.
A Excelência tem sido o principal objetivo a ser alcançado por essas universidades, conforme Figura 06.
No quesito Valores, as declarações institucionais das UF analisadas apresentam uma diversidade de conceitos utilizados para demonstrar as motivações e maneiras de gerir as organizações. Destaca-se o conceito de Responsabilidade Social (peso 21) como um dos principais valores mencionados.
Outros conceitos que podem ser destacados são os de Diversidade, Sustentabilidade, Responsabilidade, Transparência, Inovação e Democracia. Esses termos parecem ser concepções caras às UF. Fruto da diversidade de atores que compõe a comunidade acadêmica, os valores destacados podem e devem ser inseridos para dar maior voz aos mesmos e declarar para a sociedade como as gestões estão comprometidas com as novas demandas sociais e inserir novos temas no debate público.
5 Considerações Finais
O artigo identificou, a partir dos PDI, quais as formas de participação coletiva, ferramentas administrativas e questões priorizadas e reveladas expressamente pelas universidades federais das regiões Nordeste e Sudeste do Brasil nas suas declarações institucionais.
Por meio de uma investigação descritiva, de natureza qualitativa e quantitativa, e utilizando pesquisa documental, o estudo abrangeu 37 UF sediadas nas regiões Nordeste e Sudeste do Brasil, sendo 18 e 19 na distribuição regional, respectivamente. Antecederam à comparação dos dados presentes nos PDI dessas universidades, a busca nos sítios eletrônicos do referido documento, bem como a elaboração da lista de conferência para identificar os critérios pré-estabelecidos.
Os dados apontam para os seguintes resultados: a) o modelo participativo de construção dos PDI, utilizando, diversos meios, alcançou quase que a totalidade universidades – apesar de não haver esforços para equilibrar a participação dos atores internos e externos; b) apenas duas universidades por região não declararam os formatos ou mecanismos de monitoramento dos seus planos; c) as universidades da região Sudeste, em comparação às nordestinas, registraram com mais frequência, em seus PDI, a disposição de utilização de ferramentas de planejamento estratégico, tais como: Balanced ScoreCard, ForPDI, 5W2H, Sistema de Gestão de Projeto; d) as universidades pesquisadas apresentaram médias próximas de horizonte temporal para seus respectivos PDI, em anos: 5,42 e 6,22 para as UF do sudeste e para as nordestinas, nessa ordem. Esse intervalo – com médias altas – que podem dificultar a flexibilidade e ajustes às constantes mudanças de cenários; e) identificou-se muita similaridade nas escolhas das UF quanto à maneira de estruturar os planos nos PDI. Os eixos temáticos foram escolhidos por 32% das universidades, sendo 6 no Sudeste e 6 no Nordeste; f) em futuras revisões das suas declarações institucionais, as UF precisam observar e garantir a presença de outros elementos que contribuem para mobilização e execução dos seus planos. Nesse estudo, apenas a Universidade Federal da Bahia atendeu aos elementos estudados.
Por fim, nuvens de palavras foram produzidas para que emergissem conceitos caros para essas universidades. Os resultados, de maneira geral, demonstraram que as missões estão voltadas para a inserção e desenvolvimento regional – com foco na sociedade, as visões elegeram o conceito Excelência como meta ambiciosa e o conceito de Responsabilidade Social é o mais frequente nos valores organizacionais.
Como limitação da pesquisa, registra-se o fato de algumas UF não estarem com seus PDI vigentes, bem como o tamanho da população estar limitada às regiões Nordeste e Sudeste. Essa última limitação, torna-se, inclusive, uma oportunidade de pesquisa futura, ampliando a investigação e reforçando as comparações com universidades de outras regiões. Ademais, o levantamento atual pode permitir que pesquisas sejam desenvolvidas com o intuito de analisar possível correlação entre o processo de construção do PDI e o seu nível de execução.