SciELO - Scientific Electronic Library Online

 
vol.20 número04A estrutura composicional dos textos de estudantes sobre ciclos de materiais: evidências de uso e apropriação da linguagem científicaA problemática dos organismos geneticamente modificados e a formação científica do cidadão comum: um estudo com manuais escolares de Ciências Naturais do 9º ano adotados em Portugal índice de autoresíndice de materiabúsqueda de artículos
Home Pagelista alfabética de revistas  

Servicios Personalizados

Revista

Articulo

Compartir


Ciência & Educação

versión impresa ISSN 1516-7313

Ciência educ. vol.20 no.04 Bauru oct./dic. 2014

https://doi.org/10.1590/1516-73132014000400004 

Artigos

Da pedagogia à política e da política à pedagogia: uma abordagem sobre a construção de políticas públicas em educação ambiental no Brasil

From pedagogy to policy and from policy to pedagogy: an approach on the construction of environmental education public policies in Brazil

Daniel Fonseca de Andrade I   II  

Andrea Quirino de Luca II  

Maria Castellano II  

Cintia Guntzel Rissato II  

Marcos Sorrentino II  

1Centro Universitário Barão de Mauá, Rua Ramos de Azevedo, 423, Jardim Paulista, CEP 14090-180, Ribeirão Preto, SP, Brasil

2Laboratório de Educação e Política Ambiental (OCA), Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, Universidade de São Paulo (USP), Piracicaba, SP, Brasil


RESUMO

A educação ambiental brasileira demonstra uma evolução que se reflete no nível de organização da mesma dentro do país, passando de um contexto de ações pontuais espacial e temporalmente, para o estabelecimento de parcerias não formais (redes) e organização de projetos e programas. Considera-se aqui, no entanto, que é necessário que se produza um novo momento, no qual as diversas iniciativas desenvolvidas consigam instigar, em seu território, a consolidação de políticas públicas de educação ambiental. O presente trabalho aproxima a educação ambiental das teorias de políticas públicas e propõe um modelo que visa colaborar com a construção de políticas públicas em educação ambiental a partir do viés da participação e do diálogo, conforme sugerem vários documentos da educação ambiental brasileira e internacional.

Palavras-Chave: Educação Ambiental; Diálogo; Comunidade Interpretativa; Política Pública; Modelo de Análise

ABSTRACT

Brazilian environmental education demonstrates an evolution which is reflected in its level of organization within the country, from spatially and temporally limited actions to the development of informal partnerships (networks) and the organization of environmental education projects and programs. It is considered in this paper that there is the need for a new level of action, in which such several initiatives are able to prompt the consolidation of public environmental education policies. This paper approaches environmental education through public policy theories and proposes a model that aims to collaborate with the construction of environmental education public policies from the viewpoint of participation and dialogue, as suggested by several Brazilian and international environmental education documents.

Key words: Environmental Education; Dialogue; Interpretative Community; Public Policy; Model of Analysis

Introdução

A idéia moderna da racionalidade global da vida social e pessoal acabou por se desintegrar numa miríade de mini-racionalidades ao serviço de uma irracionalidade global, inabarcável e incontrolável. É possível reinventar as mini-racionalidades da vida de modo a que elas deixem de ser partes de um todo e passem a ser totalidades presentes em múltiplas partes. É esta a lógica de uma possível pós-modernidade de resistência. (SANTOS, 1999, p. 102)

As grandes questões com as quais a humanidade precisa lidar no mundo contemporâneo passam, de alguma forma, pela ideia explicitada por Santos (1999) sobre essa miríade de minirracionalidades a serviço de uma irracionalidade global. O individualismo; o consumismo; a sensação de falta de tempo; o sentimento de não-identidade e não-pertencimento a um grupo, comunidade ou lugar; a impotência frente às dimensões dos problemas em um mundo globalizado; são questões que se inter-relacionam como decorrência das transformações socioculturais ocorridas nos séculos XX e XXI. Essas, por sua vez, impactam e são impactadas pela economia, o meio ambiente, a política e a ética. As transformações de modos de vida e de valores em velocidade e escalas sem precedentes causam crises que vão dos níveis mais pessoais ao planetário.

Se nossas sociedades estão em crise; e se - mesmo estando cientes de que estamos imersos em modos de vida que, em escala global, se configuram como um todo irracional - não conseguimos mudar os rumos de nossas vidas de modo a fazê-las convergir para uma racionalidade global; o que deve ser revisto? Como poderíamos nos reestruturar para viver, como indivíduos e como sociedade, de modo diferente?

Certamente, existem respostas individuais ou pontuais para as perguntas acima. Entretanto, elas, provavelmente, se encontram no plano de minirracionalidades que, isoladamente, têm pouco poder de promover a transição para uma "pós-modernidade de resistência" - que resista a essa irracionalidade global, que a enfrente e conduza as sociedades para uma racionalidade global. E, nesse sentido, muitas outras minirracionalidades, provavelmente, precisam, de fato, ser reinventadas. Considerando ambas as possibilidades, tomamos aqui, como hipótese, que parte das respostas às questões colocadas acima passa pelo processo de se buscar o redescobrimento e a reinvenção de minirracionalidades locais orientadas para sociedades que sejam sustentáveis nas diversas dimensões da vida; e de potencializar sua convergência para uma racionalidade global.

Esse redescobrimento e reinvenção de minirracionalidades podem emergir pela reflexão crítica das transformações sociais, culturais e ambientais, por meio de processos educadores que instiguem os movimentos de resistência a se articular e a construir políticas públicas (PP) que sinalizem respostas às inquietações sociais decorrentes dessas transformações abruptas de nossas sociedades. A construção de políticas públicas pode, portanto, ser uma forma de ampliar a escala de esforços e respostas individuais ou pontuais, fazendo convergir novas ideias, culturas e modos de vida para racionalidades (e não para irracionalidades) em escalas maiores que as de seu local de origem.

Para o universo da Educação Ambiental (EA), que é o foco do presente trabalho, a aproximação com processos de políticas públicas se justifica pela constatação de que uma somatória de iniciativas educativas, predominantemente desenvolvidas no âmbito privado, não será capaz de reverter o quadro grave de insustentabilidade existente atualmente (ANDRADE; SORRENTINO, 2013). Faz-se necessária, portanto, a "incorporação da ação política para a formação de responsabilidade pelo planeta" (ANDRADE; SORRENTINO, 2013, p. 215).

No entanto, o envolvimento de educadores e educadoras ambientais com políticas públicas descortina uma série de novos desafios, uma vez que, em geral, esse tema não está incorporado em seus processos de formação (SORRENTINO; NASCIMENTO, 2009-2010).

Dentro desse contexto, os objetivos do presente artigo são: (a) propor que os processos de construção de PP de EA tenham um caráter cíclico e incorporem práticas pedagógicas pautadas na participação e no diálogo; e (b) sugerir um modelo que facilite a visualização das possíveis formas de apropriação teórica e prática dessa proposta.

Texto na íntegra em PDF

REFERÊNCIAS

ANDRADE, D. F.; SORRENTINO, M. Aproximando educadores ambientais de políticas públicas. In: SORRENTINO, M. et al. Educação ambiental e políticas públicas: conceitos, fundamentos e vivências. Curitiba: Appris, 2013. p. 215-223. [ Links ]

ANDRADE, D. F. de; LUCA, A. Q. de; SORRENTINO, M. O diálogo em processos de políticas públicas de educação ambiental no Brasil. Educação & Sociedade, Campinas, v. 33, n. 119, p. 613-630, 2012. [ Links ]

BERNARDONI, D. L.; SOUZA, M. C. de; PEIXE, B. C. S. Fortalecimento da função avaliação de políticas públicas: estudo de caso do processo de avaliação da política de emprego e renda da Secretaria do Estado do Trabalho, Emprego e Promoção Social do Paraná. In: PEIXE, B. C. S.et al. Gestão de políticas públicas no Paraná: coletânea de estudos. Curitiba: Progressiva, 2008. p. 381-393. [ Links ]

BOHM, D. Diálogo: comunicação e redes de convivência. São Paulo: Palas Athena, 2005. [ Links ]

BRASIL. Lei n. 9.795 de 27 de abril de 1999. Dispõe sobre a educação ambiental, institui a política nacional de educação ambiental e dá outras providências. Diário Oficial da União, Brasília, 28 abr. 1999. Seção I, p. 1. [ Links ]

BRASIL. Lei Ministério do Meio Ambiente. Programa nacional de educação ambiental. 3. ed. Brasília, 2005. Disponível em: <http://www.mma.gov.br/estruturas/educamb/_arquivos/pronea_3.pdf>. Acesso em: 11 ago 2014. [ Links ]

BRASIL. Lei Órgão Gestor da Política Nacional de Educação Ambiental. Programa nacional de formação de educadoras(es) ambientais: por um Brasil educado e educando ambientalmente para a sustentabilidade. Brasília, 2006. (Série Documentos técnicos, 8). Disponível em: <http://www.mma.gov.br/estruturas/educamb/_arquivos/dt_08.pdf>. Acesso em: 11 ago 2014. [ Links ]

CAMBI, F. História da pedagogia. São Paulo: UNESP, 1999. [ Links ]

COSTA, F. L. da; CASTANHAR, J. C. Avaliação de programas públicos: desafios conceituais e metodológicos. Revista de Administração Pública, Rio de Janeiro, v. 37, n. 5, p. 969-992, 2003. [ Links ]

DENHARDT, R. B.; DENHARDT, J. V. The new public service: serving rather than steering. Public Administration Review, Hoboken, v. 60, n. 6, p. 549-559, 2000. [ Links ]

FREY, K. Políticas públicas: um debate conceitual e reflexões referentes à prática da análise de políticas públicas no Brasil. Planejamento e Políticas Públicas, Brasília, n. 21, p. 211-259, jun. 2000. [ Links ]

DIAS, G. F. Educação ambiental: princípios e práticas. 5. ed. São Paulo: Global, 1998. [ Links ]

DYE, T. R. Mapeamento dos modelos de análise de políticas públicas. In: HEIDEMANN, F. G.; SALM, J. F. (Org.). Políticas públicas e desenvolvimento: bases epistemológicas e modelos de análise. Brasília: UNB, 2009. p. 99-129. [ Links ]

______. Understanding public policy. 12. ed. New Jersey: Pearson Prentice Hall, 2008. [ Links ]

FREY, K. Políticas públicas: um debate conceitual e reflexões referentes à prática da análise de políticas públicas no Brasil. Planejamento e Políticas Públicas, Brasília, n. 21, p. 211-259, jun. 2000. [ Links ]

HEIDEMANN, F. G. Do sonho do progresso às políticas de desenvolvimento. In: HEIDEMANN, F. G.; SALM, J. F. (Org.). Políticas públicas e desenvolvimento: bases epistemológicas e modelos de análise. Brasília: UNB, 2009. p. 23-39. [ Links ]

JACOBI, P. Educação ambiental, cidadania e sustentabilidade. Cadernos de Pesquisa, São Paulo, n. 118, p. 189-206, mar. 2003. [ Links ]

KEHRIG, R. T. Políticas públicas. 3. ed. Palhoça: UNISULVirtual, 2006. [ Links ]

KEINERT, T. M. M. Administração pública no Brasil: crises e mudanças de paradigmas. São Paulo: Anablume: FAPESP, 2000. [ Links ]

LABRA, M. E. Análise de políticas, modos de policy-making e intermediação de interesses: uma revisão. Physis: Revista de Saúde Coletiva, Rio de Janeiro v. 9, n. 2, p. 131-166, 1999. [ Links ]

MEDINA, N. M. Breve histórico da educação ambiental. In: PÁDUA, S. M.; TABANEZ, M. F. (Org.). Educação ambiental: caminhos trilhados no Brasil. Brasília: IPÊ, 1997. p. 257-269. [ Links ]

RAMOS, A. G. A modernização em nova perspectiva: em busca do modelo da possibilidade. In: HEIDEMANN, F. G.; SALM, J. F. (Org.). Políticas públicas e desenvolvimento: bases epistemológicas e modelos de análise. Brasília: UNB, 2009. p. 41-79. [ Links ]

REIGOTA, M. Educação ambiental: fragmentos de sua história no Brasil. In: NOAL, F. O.; REIGOTA, M.; BARCELOS, V. H. de. L. Tendências da educação ambiental brasileira. Santa Cruz do Sul: EDUNISC, 1998. p. 11-25. [ Links ]

REVISTA BRASILEIRA DE EDUCAÇÃO AMBIENTAL. Brasília: REBEA, v.0, nov. 2004. [ Links ]

REZENDE, U. S. Antropologia fundamental e teoria das organizações. In: HEIDEMANN, F. G.; SALM, J. F. (Org.). Políticas públicas e desenvolvimento: bases epistemológicas e modelos de análise. Brasília: UNB, 2009. p. 79-91. [ Links ]

RODRIGUES, M. M. A. Políticas públicas. São Paulo: Publifolha, 2010. [ Links ]

SALM, J. F. Comentário: teorias P e as alternativas para co-produção do bem público. In: HEIDEMANN, F. G.; SALM, J. F. (Org.). Políticas públicas e desenvolvimento: bases epistemológicas e modelos de análise. Brasília: UNB, 2009. p. 84-91. [ Links ]

SANTOS, B. S. Pela mão de Alice: o social e o político na pós-modernidade. 7. ed. Porto: Afrontamento, 1999. [ Links ]

SÃO PAULO (Estado). Lei 12.780 de 30 de novembro de 2007. Institui a política estadual de educação ambiental. Diário Oficial do Estado, São Paulo, 01 dez. 2007. Seção I, p. 1-3. [ Links ]

SORRENTINO, M.; NASCIMENTO, E. P. do. Universidade e políticas públicas de educação ambiental. Educação em Foco, Barbacena, v. 14, n. 2, set. 2009/fev. 2010. [ Links ]

SORRENTINO, M. et al. Educação ambiental como política pública. Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 31, n. 2, p. 285-299, 2005. [ Links ]

SOUZA, C. Políticas públicas: uma revisão da literatura. Sociologias, Porto Alegre, v. 8, n. 16, p. 20-45, jul.-dez. 2006. [ Links ]

SOUZA, C. "Estado do campo" da pesquisa em políticas públicas no Brasil. Revista Brasileira de Ciências Sociais, São Paulo, v. 18, n. 51, p. 15-20, 2003. [ Links ]

TREVISAN, A. P.; BELLEN, H. M. van. Avaliação de políticas públicas: uma revisão teórica de um campo em construção. Revista de Administração Pública, Rio de Janeiro, v. 42, n. 3, p. 529-550, maio/jun., 2008. [ Links ]

UNICEF. A UNICEF guide to monitoring and evaluation: making a difference? New York: UNICEF, 1990. Disponível em: <http://preval.org/documentos/00473.pdf>. Acesso em: 23 maio 2011. [ Links ]

Recebido: 26 de Dezembro de 2012; Aceito: 23 de Abril de 2013

Creative Commons License This is an Open Access article distributed under the terms of the Creative Commons Attribution Non-Commercial License, which permits unrestricted non-commercial use, distribution, and reproduction in any medium, provided the original work is properly cited.