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Ciência & Educação

Print version ISSN 1516-7313On-line version ISSN 1980-850X

Ciência educ. vol.26  Bauru  2020  Epub Nov 03, 2020

https://doi.org/10.1590/1516-731320200057 

Artigo Original

Tarefas Investigativas Relacionadas à Educação Financeira: possibilidades de conjecturas e estratégias de resolução

Investigative Tasks Related to Financial Education: possible conjectures and resolution strategies

Patricia Franzoni1 
http://orcid.org/0000-0001-7323-0964

Marli Teresinha Quartieri2 
http://orcid.org/0000-0002-9621-3830

1Universidade Federal do Rio Grande (FURG), Instituto de Ciências Econômicas, Rio Grande, RS, Brasil.

2Universidade do Vale do Taquari (UNIVATES), Centro de Ciências Exatas e Tecnológicas, Lajeado, RS, Brasil.


Resumo:

Este artigo caracteriza-se como pesquisa qualitativa e tem como objetivo analisar as possibilidades de conjecturas e estratégias de resolução de duas tarefas investigativas resolvidas pelos licenciandos em Matemática de uma universidade no estado do Rio Grande do Sul. Foram utilizadas as resoluções das tarefas investigativas e gravação/filmagem do debate em aula como instrumentos de coleta de dados. Os dados produzidos foram analisados mediante a análise textual discursiva, surgindo três categorias: (a) Conjecturas e estratégias de resolução; (b) Manifestações de aprendizagem; e, (c) Análise das dificuldades durante a resolução da tarefa. Por meio deste estudo, conclui-se que os alunos, envolvidos na pesquisa, conseguiram formular, testar e validar conjecturas. As reflexões, análise das dificuldades e discussões com a turma foi importante para refinar conjecturas, repensar variáveis que não foram consideradas na atividade, o que ampliou o conhecimento de educação financeira, fortalecendo o aprendizado e o desenvolvimento do espírito crítico e colaborativo.

Palavras-chave: Educação matemática; Educação financeira; Resolução de problemas; Ensino superior

Abstract:

This article is characterized as qualitative research and aims to analyze the possible conjectures and resolution strategies in two investigative tasks solved by Math graduates from a university in Rio Grande do Sul. The resolution of investigative tasks and the recording of discussions in the classroom were used as data collection tools. The data were subjected to discursive textual analysis, with three categories showing up: (a) Conjectures and solution strategies; (b) Learning manifestations; and, (c) Analysis of the difficulties while performing the task. With this study we conclude that the students involved in the research managed to create, test and validate the conjectures. The reflections, analysis of the difficulties, and discussions with the class were important to refine conjectures and rethink the variables that had not been considered in the activity, which increased the financial education knowledge, strengthening learning and the development of critical and collaborative thinking.

Keywords: Mathematics education; Financial education; Problem solving; Higher education

Contextualizando o Estudo

A Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e diversos outros órgãos e pesquisadores do mundo apontam como justificativas para ensinar educação financeira o envolvimento dos jovens cada vez mais cedo em decisões financeiras, bem como o aumento de produtos financeiros nos bancos, tornando cada vez mais complexas as decisões financeiras na hora de escolher o melhor investimento, financiamento, forma de pagamento, tipo de previdência, entre outros. Além disso, o Banco Mundial (WORLD BANK, 2018) e a Organisation for Economic Cooperation and Development (2012) têm mostrado preocupação com o grau de endividamento das famílias. O consumismo em excesso levou muitas famílias ao endividamento, aumentando a intervenção do Banco Central do Brasil (ARAÚJO, 2015) tanto na economia para reduzir o consumo, como nas escolas para ensinar educação financeira.

De acordo com Bauman (2008), a busca incessante de felicidade associada à compra de novos objetos vem tornando-se, de certa forma, um problema para um número significativo da população, a qual passou a ser inadimplente. Portanto, a proposta da educação financeira nas salas de aula, segundo Santos, Menezes e Rodrigues (2016), nasce na expectativa de mudança de um cenário de consumo irresponsável pelo qual a sociedade está passando. Kistemann Junior (2011) enfatiza a necessidade de incluir educação financeira em diversos contextos de formação dos estudantes, desde a educação elementar até o ensino superior, com o objetivo de fornecer noções básicas sobre economia e consumo aos indivíduos-consumidores. Além disso, existe a necessidade de proporcionar-lhes estratégias que auxiliem na tomada de decisões e condução de situações cotidianas, e se posicionarem como indivíduos críticos.

Contudo, segundo Teixeira (2015), os conteúdos de Matemática Financeira estão sendo transmitidos aos estudantes de maneira descontextualizada, existindo uma preocupação excessiva em ensinar por meio de fórmulas e tabelas, sem fazer referência ao cotidiano, o que dificulta o aprendizado, acarretando o desinteresse do estudante. De acordo com o autor é preciso unir teoria e prática, objetivando conectar essa disciplina com a educação financeira.

Para a maior parte dos alunos, o conhecimento adquirido em sala de aula está alheio às suas experiências cotidianas, não existindo conexão entre o que se aprende na escola e o mundo ao seu redor. Segundo Franzoni, Del Pino e Oliveira (2018), na maioria das escolas, o professor ministra aulas no quadro negro, o qual é visto pelos alunos como transmissor da informação, desestimulando a criatividade, o pensamento crítico e o envolvimento dos alunos, que acabam memorizando conceitos somente para serem aprovados na disciplina.

De acordo com Santos (2007), as crescentes transformações sociais impõem às instituições de ensino a repensarem sobre os processos de ensino e de aprendizagem tendo em vista a formação de um cidadão com um novo perfil, em que habilidades como proatividade, cooperação e criticidade se sobressaem em detrimento à simples memorização e repetição. O que faz inferir que essa atual configuração tem como prioridade o desenvolvimento do pensamento do aluno como uma dimensão fundamental da cognição.

Contudo, é perceptível que a Matemática aprendida pode estar limitada a repetição de registros referendados por quem a ensina, e consequentemente a criatividade estará sendo prejudicada na aprendizagem. De acordo com Gontijo (2006), a criatividade em Matemática compreende a capacidade de encontrar maneiras e caminhos para resolver problemas, inventar fórmulas e encontrar métodos originais para resolver os problemas não tradicionais. Ou seja, desenvolver a capacidade de o aluno se envolver com a própria aprendizagem, criar suas estratégias e engajar-se com tarefas que demandem exploração e investigação. Nesse sentido, os professores precisam atuar como mediadores, promovendo debates, proporcionando momentos de discussão e reflexão em sala de aula, valorizando o conhecimento dos alunos a partir de metodologias diferenciadas de ensino como, por exemplo, a investigação matemática e, dessa forma, tornar o ensino mais atrativo.

Ponte, Brocardo e Oliveira (2015, p. 23) definem a investigação matemática como uma "atividade de ensino-aprendizagem" que envolve quatro principais momentos. O primeiro momento refere-se ao conhecimento inicial, envolvendo a verificação, análise e a elaboração de questões em referência a situação-problema. O segundo momento envolve a elaboração de ideias e constatações, que se baseia em suposições elaboradas a partir de uma situação, essas hipóteses são chamadas de conjecturas. O terceiro momento implica na realização de testes das conjecturas, na qual será definida se a hipótese fundamenta-se ou não como verdadeira. Ao final, na quarta etapa, ocorre a demonstração e avaliação da situação, sendo que essa sempre deve vir acompanhada de uma argumentação que justifica o seu raciocínio.

Nesse contexto, a investigação matemática está relacionada, segundo Ponte, Brocardo e Oliveira (2015) à formulação de conjecturas que se procura testar e provar, bem como a apresentação dos resultados, discussão e argumentação com os seus colegas e professor. Goldenberg (1999, p. 37) complementa que as tarefas investigativas "[...] motivam os alunos, e ainda, desenvolvem capacidades que contribuem para um conhecimento mais amplo de conceitos e facilitam a aprendizagem". Logo, esta metodologia oportuniza aos alunos uma ambiência exploratório-investigativa, possibilitando a criação de estratégias de enfrentamento de problemas que têm por objetivo aprendizagens de assuntos do âmbito escolar.

Portanto, constata-se que é importante o professor utilizar a investigação, deixar o aluno apresentar suas próprias respostas e discutir os resultados obtidos, fomentando o desenvolvimento da criatividade e criticidade. Cabe ao professor colocar seus alunos em situações em que se mobilizem com tarefas investigativas como, por exemplo, vinculadas a educação financeira, pois segundo a Base Nacional Comum Curricular - BNCC - (BRASIL, 2017) um dos aspectos a ser considerado na disciplina de Matemática é o estudo de conceitos básicos de economia e finanças, visando justamente à educação financeira dos alunos.

Assim, "[...] podem ser discutidos assuntos como taxas de juros, inflação, aplicações financeiras (rentabilidade e liquidez de um investimento) e impostos" (BRASIL, 2017, p. 269). Ainda, segundo o BNCC (BRASIL, 2017), entre as habilidades dos alunos estão: resolver e elaborar problemas do cotidiano, da matemática financeira e de outras áreas de conhecimento; elaborar planilhas para o controle de orçamento familiar; resolver e elaborar problemas envolvendo taxa de câmbio, porcentagens em diversos contextos e juros compostos, destacando o seu crescimento exponencial. O cidadão deste século, na área da Matemática, precisa "[...] utilizar estratégias, conceitos e procedimentos matemáticos para interpretar situações em diversos contextos, sejam atividades cotidianas, sejam fatos das ciências da natureza e humanas, ou ainda questões econômicas [...]" (BRASIL, 2017, p. 523). Dessa forma, é possível preparar indivíduos para o mundo, que sejam capazes de fazer melhores escolhas, ter consciência sobre seus atos e consequências, refletir, analisar, discutir e interpretar situações diversas, se posicionando criticamente frente a algum tema e/ou problema financeiro.

Diante deste cenário, o objetivo do presente estudo, de abordagem qualitativa, foi analisar as possibilidades de conjecturas e estratégias de resolução de duas tarefas investigativas resolvidas pelos licenciandos em Matemática, de uma universidade no estado do Rio Grande do Sul. Foram utilizadas as resoluções das tarefas investigativas e gravação/filmagem do debate em sala de aula como instrumentos de coleta de dados. Salienta-se que os dados foram analisados a partir da Análise Textual Discursiva (MORAES; GALIAZZI, 2016), surgindo três categorias: (a) Conjecturas e estratégias de resolução; (b) Manifestações de aprendizagem; e (c) Análise das dificuldades durante a resolução da tarefa.

Ademais, este estudo tem a importância de contribuir para a formação inicial do futuro professor de Matemática. Para tanto, além desta introdução, a segunda seção apresenta a metodologia realizada para efetivar esta pesquisa. A terceira seção faz referência à análise dos dados, apresentando os principais resultados. Por fim, a última seção, explicita as conclusões deste estudo.

Metodologia

Para alcançar o objetivo proposto, ou seja, analisar as possibilidades de conjecturas e estratégias de resolução de duas tarefas investigativas, a pesquisa foi realizada com oito estudantes, do 6° semestre, do curso de licenciatura em Matemática, de uma Universidade no Estado do Rio Grande do Sul, no qual foram exploradas dez tarefas de investigação matemática, na disciplina de Matemática Financeira. Cabe ressaltar que o tamanho da amostra é igual ao número total de alunos matriculados na disciplina e em cada tarefa, os alunos tiveram a oportunidade de vivenciar, na prática, os quatro momentos de realização da investigação matemática, conforme citado anteriormente por Ponte, Brocardo e Oliveira (2015).

O objetivo principal de cada tarefa de educação financeira produzida foi analisar o comportamento do consumidor e pensamento do aluno no processo de tomada de decisão em situações-problema que fazem parte do cotidiano. Explicitar, também, as implicações dos juros compostos ao longo do tempo; a diferença entre valor à vista e a prazo; a importância de fazer pesquisa de mercado e comparar preços, de forma a minimizar custo e/ou maximizar satisfação; o quanto o entendimento de porcentagem, taxas de câmbio, conversão de moeda, taxas pré e pós-fixada de juros podem facilitar o processo de escolha; que formas de investimento, planos de previdência, regimes de capitalização, formas de financiamento (imobiliário, leasing, consórcio, crédito direto ao consumidor) são mais vantajosos, de acordo com o cenário da economia atual e suas possíveis previsões. Enfim, como o entendimento de economia e matemática financeira influenciam na tomada de decisão do consumidor e são importantes para se atingir a educação financeira.

As situações-problema elaboradas tiveram o intuito de atender, também, ao objetivo e habilidades previstas da disciplina de Matemática Financeira, contribuindo na formação inicial dos licenciandos ao estabelecer relações entre a Matemática Financeira com a educação financeira a partir de tarefas investigativas. Dessa forma, acredita-se que os futuros professores poderão se sentir mais preparados para ensinar educação financeira.

Nesse artigo serão analisadas apenas duas tarefas investigativas, conforme os Quadros 1 e 2.

Quadro 1 Tarefa Investigativa: formas de investimento 

Um indivíduo recebeu a quantia de R$500.000,00 de herança e precisa decidir a melhor forma de aplicá-la para ter o maior rendimento possível. Pense qual seria a melhor forma de alocar o dinheiro recebido, conforme as informações abaixo:
TAXA DE JUROS BÁSICA (SELIC) = i = 6,5% a.a. Taxa Referencial TR = 0,025% a.m.
REGRA DA POUPANÇA:
Taxa de Juros > 8,5% a.a. = 0,5% a.m. + TR
Taxa de Juros < 8,5% a.a. = 70% da Selic + TR
CDI (Certificado de Depósito Interbancário) - Taxa DI = 0,5% a.m.
INFLAÇÃO = 4% a.a. CRESCIMENTO DO PIB = 1,3% a.a.
POUPANÇA, CDB, LCI e LCA contam com a cobertura do FGC (Fundo Garantidor de Crédito) que garante o pagamento de determinado valor investido até R$250.000,00 caso a instituição financeira venha à falência.
  POUPANÇA, LCI E LCA = isento de imposto de renda
CDB → 17,5% de imposto de renda sobre o montante = n < 2 anos.
→ 15,0 % de imposto de renda sobre o montante = n ≥ 2 anos.
→ Se resgatar antes do prazo acordado pagará 22,5% de imposto de renda.
 
a. Complete os 4 quadros, com base nas informações da atividade e ordene as preferências;
 
POUPANÇA
N. meses Vencimento Montante após prazo Montante com desconto do imposto de renda
12 01/11/2019    
24 01/11/2020    
60 01/11/2023    
   
  LCI
N. meses Vencimento Montante após prazo - 70% DI Montante após prazo - 85% DI
12 01/11/2019    
24 01/11/2020    
60 01/11/2023    
    Montante com desconto do imposto de renda - 70% DI Montante com desconto do imposto de renda - 85% DI
12 01/11/2019    
24 01/11/2020    
60 01/11/2023    
 
  LCA
N. mensal Vencimento Montante após prazo - 90% DI Montante após prazo - 95% DI
12 01/11/2019    
24 01/11/2020    
60 01/11/2023    
    Montante com desconto do imposto de renda - 90% DI Montante com desconto do imposto de renda - 95% DI
12 01/11/2019    
24 01/11/2020    
60 01/11/2023    
   
  CDB
N. mensal Vencimento Montante após prazo - 100% DI Montante após prazo - 160% DI
12 01/11/2019    
24 01/11/2020    
60 01/11/2023    
    Montante com desconto do imposto de renda - 100% DI Montante com desconto do imposto de renda - 160% DI
12 01/11/2019    
24 01/11/2020    
60 01/11/2023    
 
b. Qual seria a opção mais vantajosa? Aplicar o dinheiro na poupança ou LCI ou LCA ou CDB? Justifique?
c. A maior diversificação é a melhor possível? Justifique a resposta;
d. Demonstre matematicamente o seu raciocínio, construindo hipóteses de acordo com as informações da atividade e do cenário da economia brasileira, de forma a ser aplicado para qualquer situação da mesma natureza. Pense nos investimentos com taxa DI pré-fixada e pós-fixada para aplicações em CDB, LCI e LCA;
e. Que fatores são considerados importantes no processo de tomada de decisão?
 

Fonte: elaborado pelas autoras.

Quadro 2 Tarefa Investigativa: decisão de compra com porcentagem 

Suponha que você tenha sido escolhido pela sua família para fazer uma pesquisa de preço e efetuar a compra de uma televisão Smart TV Led 60 polegadas, entre hoje e amanhã. Só existem 3 lojas próximas à sua residência e, por praticidade, você decidiu escolher comprar a televisão em uma delas. Após a pesquisa fez as seguintes anotações:
LOJA A → TELEVISÃO - R$3.500,00 HOJE → AMANHÃ sofrerá um acréscimo de 11,5%, mas o gerente garantiu um desconto de 10% no novo preço (amanhã) se o pagamento for em dinheiro.
LOJA B → TELEVISÃO de R$3.300,00 teve um acréscimo HOJE de 7,5%. O gerente decidiu dar um desconto de 4,4% se eu levar no mesmo dia. Caso apareça AMANHÃ o desconto será entre 6% a 10% em função da loja entrar em liquidação.
LOJA C → TELEVISÃO de R$3.448,00 sofre reajuste hoje de 2%. Até amanhã pela manhã, o gerente decidiu dar um desconto sucessivo de 2% e mais 2%. À tarde o desconto será de 4%.
Pergunta-se:
  a. Qual o significado do símbolo “%” presente nas suas anotações?
  b. Encontre o valor da televisão após o acréscimo nas 3 opções. Como foi pensado?
  c. Encontre o valor da televisão após o(s) desconto(s) estipulado(s) nas 3 opções. Justifique.
  d. Se você tivesse que formalizar o cálculo realizado nos itens “b” e “c”, para ser aplicado a qualquer situação da mesma natureza, como ficaria? Qual(is) formalizações são possíveis?
  e. Se a televisão da loja C sofresse acréscimos sucessivos de 1% e 1% seria mais benéfico para você do que o acréscimo de 2% presentes em suas anotações? Justifique a sua resposta com base na taxa total de acréscimo (i) praticada nas duas situações.
  f. Calcule o valor total do desconto sucessivo da loja C, assim como o valor final da televisão. É melhor comprar nesta loja em qual turno do dia? Encontre a taxa total de desconto (i) e justifique a sua resposta.
  g. Qual(is) formalizações são possíveis a partir dos cálculos dos itens “e” e “f” para que se possa aplicar a qualquer situação da mesma natureza?
  h. É possível identificar qual a proposta é mais vantajosa? Qual loja e dia você deve efetuar a compra? Justifique as respostas.
  i. Existem outros fatores que poderiam ter feito parte da análise no processo de decisão entre uma loja e outra que não foram levados em consideração nos cálculos realizados? Se sim, quais?
  j. É possível associar essa questão a algum conteúdo da Matemática? Qual?
  k. Essa situação-problema está relacionada com Educação Financeira? Justifique.

Fonte: elaborado pelas autoras.

Em função do tamanho da turma, foram formadas quatro duplas para trabalharem em conjunto. Os pequenos grupos foram montados a partir da escolha de uma palavra por cada aluno: Investigação, Matemática, Finanças e Ensino. Por questões éticas, não são divulgados os nomes dos participantes, identificados de A1 a A8. Cabe destacar que todas as tarefas investigativas foram pensadas para o ensino médio, mas podem ser adaptadas para o ensino fundamental. Após o desenvolvimento de cada tarefa investigativa nos pequenos grupos, em um período de duas horas, os alunos socializaram as respostas para a turma (grande grupo), dando início ao debate, que teve duração de, aproximadamente, uma hora.

Diante disso e com base no objetivo proposto, este estudo se caracteriza como uma pesquisa qualitativa. Esta, segundo Gerhardt e Silveira (2009, p. 31-32), "[...] não se preocupa com representatividade numérica, mas com a compreensão de um grupo social, com aspectos da realidade que não podem ser quantificados, centrando-se na compreensão e explicação da dinâmica das relações sociais".

Os dados emergentes foram analisados mediante a aplicação da Análise Textual Discursiva (ATD) que, conforme Moraes e Galiazzi (2016), configura-se como uma metodologia de etapas extremamente minuciosa, requerendo do pesquisador a atenção e a rigorosidade em cada etapa do processo. A ATD visa, inicialmente, à desmontagem dos textos e seu exame nos mínimos detalhes. Na sequência, desenvolve-se o estabelecimento de relações entre cada unidade, procurando-se a identidade entre elas para, em seguida, captar o que emerge da totalidade do texto em direção a uma nova compreensão desse todo.

A ATD, de acordo com Moraes e Galiazzi (2016), é composta por três etapas, sendo a primeira delas o processo de unitarização, em que é desconstruído o texto, fragmentando-o em unidades de significado. O processo de unitarização é, portanto, a etapa essencial no desenvolvimento da ATD, pois, nesta unidade, estão contidas as mensagens mais significativas dos textos analisados. A segunda se constitui na organização de categorias, a qual pode ser constantemente reagrupada. Por fim, na terceira, produz-se um metatexto com as novas compreensões obtidas.

Dessa forma, na primeira etapa, os dados das tarefas investigativas foram organizados - por grupo/ dupla de alunos - e expostos separadamente em um quadro, em que cada coluna corresponde a uma pergunta da questão. Os dados da gravação/ filmagem (grande grupo) das tarefas investigativas complementam o quadro dos dados, que segue dividido em grupo, de cada atividade de investigação matemática, no qual foi acrescentada mais uma coluna relativa aos dados da filmagem.

Na segunda etapa foram estabelecidas as categorias para posteriormente, na última etapa da ATD, produzir os metatextos por categoria, ligando o aporte teórico deste estudo às respostas dos alunos.

Análise e Resultados

Ponte, Brocardo e Oliveira (2015) destacam que ao resolvermos um problema de investigação matemática, temos um caminho de descobertas e esse processo pode se tornar mais significativo que a sua solução. Diante disso, os alunos tiveram a oportunidade de vivenciar na prática, na resolução de cada tarefa, os quatro momentos da investigação matemática, descritos anteriormente, analisando melhor cada situação e refletindo sobre o problema, antes de aceitar um único resultado como verdadeiro.

Assim sendo, os dados coletados dos oito alunos, a partir da resolução de cada tarefa investigativa e gravação/filmagem do debate foram agrupados em três categorias, a saber: (a) Conjecturas e estratégias de resolução; (b) Manifestações de aprendizagem; e, (c) Análise das dificuldades durante a resolução da tarefa. A seguir, as categorias emergentes são apresentadas com declarações dos alunos, bem como a referida discussão e imbricação com alguns autores.

Conjecturas e estratégias de resolução

Com relação à primeira tarefa (Quadro 1) sobre formas de investimento, todos os grupos apresentaram dificuldades, inicialmente, em função da quantidade de informações da tarefa investigativa. Investigar, de acordo com Ponte (2003) não significa lidar com problemas de grande dificuldade, os alunos podem ficar confusos em um primeiro momento, mas a situação se torna mais clara ao analisar detalhadamente o problema. Macalli (2017) complementa que o trabalho em grupo nas tarefas investigativas possibilita momentos de discussão em que um colega auxilia o outro, interage de forma cooperativa.

Sendo assim, com a organização dos dados e colaboração dos colegas (pequenos grupos), os alunos conseguiram desenvolver a atividade e constataram no momento da socialização que a escolha do investimento depende de vários fatores como, por exemplo, prazo, variação da Selic, variação na taxa de depósito interbancário, imposto de renda e taxa de risco, conforme ressaltam os alunos A1, A2 e A6:

A1 Eu pensei igualmente a vocês em relação ao CDB ser mais vantajoso com 160% do DI, porém devemos levar em consideração que no CDB não se deve retirar o dinheiro fora do prazo, porque o consumidor pagaria um imposto alto de 22,5%. Em caso de emergência, essa transação precisa ser evitada, em função de causar grande prejuízo para o investidor. A partir disso, ter um dinheiro na poupança é um jeito bom de investir, porque você poderá sacar quando surgir necessidades, diferente do CDB, LCI e LCA.
A2 O legal é que os números não são os únicos que devemos levar em consideração na resposta final, devemos repensar as possibilidades de investimento a partir de diversos outros fatores, como prazo, imposto de renda, inflação, necessidade de tirar o dinheiro antes, falência do banco, entre outros. Nós como matemáticos só pensamos nos números. Esse tipo de problema nos faz abrir a mente.
A6 Conseguimos encontrar os mesmo valores e chegamos à conclusão que ter um dinheiro na poupança é bom, já que em casos de imprevistos, poderemos sacá-lo com mais facilidade. Ainda tínhamos que cuidar as variações das taxas como a SELIC, DI e TR, fazer uma análise de mercado para considerarmos nos resultados. Por fim, ocorreu tudo bem e compreendemos as várias formas de investir e saber qual delas é o modelo que terá uma rentabilidade melhor para o indivíduo.

Segundo Abrantes (1999), uma contribuição das tarefas investigativas que envolvem os alunos em problemas abertos é o fato de perceber que existem vários caminhos e possibilidades de conjecturas, exatamente como observa-se nas falas dos alunos.

Portanto, a opção mais vantajosa, em termos financeiros, segundo os alunos, é o CDB com maior taxa de DI, desde que o consumidor respeite o prazo de aplicação de 60 meses (sem necessidade de resgate antecipado), independentemente de ter que pagar imposto de renda de 15%. No entanto, para 100% da taxa de DI, a aplicação em LCA é mais atrativa para todos os prazos. A poupança passa a ser mais rentável que a LCI quando a taxa de DI for igual à 70%. Ainda, segundo os alunos, deve-se pensar também nas necessidades de resgate antecipado, nas preferências do consumidor, no cenário da economia brasileira e nas suas possíveis previsões, na possibilidade de falência dos bancos, no crescimento do PIB e na inflação, o que pode alterar os juros, as negociações interbancárias e a TR. A diversificação entre os vários tipos de investimento e entre os bancos seria uma alternativa que pode minimizar prejuízos para o consumidor segundo o diálogo entre os alunos A8 e A3:

A8 As informações da atividade deram ênfase para análise de diversas possibilidades, estimularam os alunos a investigação, a explorarem ao máximo a situação-problema apresentada. As tabelas foram muito úteis para organização, análise dos dados e comparação dos resultados. A diversificação dos investimentos e entre os bancos seria uma alternativa interessante para diminuir perdas.
A3 Verdade A8! Eu fiquei bem curiosa sobre o banco falir, isso não é uma coisa de conhecimento público ou pelo menos eu e as pessoas ao meu redor não tínhamos conhecimento sobre o quanto o consumidor pode ser prejudicado, dependendo do seu volume de negócios.

Por fim, as generalizações encontradas pelos grupos, a partir dos cálculos realizados, para serem aplicadas a qualquer situação da mesma natureza podem ser visualizadas no Quadro 3:

Quadro 3 Generalizações: Montante e Imposto de Renda 

M=C.1+1nMIR=M1iIR
Notação:
M = montante
C = capitali = taxa n = prazo
MIR = montante com imposto de renda descontado
iIR = taxa imposto de renda

Fonte: dados de pesquisa (Resolução dos Grupos, Tarefa Investigativa e Formas de Investimento).

Com relação à tarefa investigativa decisão de compra com porcentagem, cabe destacar que dois grupos não conseguiram encontrar as generalizações para descontos e acréscimos sucessivos. No Quadro 4 pode-se observar as formalizações encontradas pelo Grupo B para encontrar o valor da televisão e responder às perguntas de b a h:

Quadro 4 Generalizações para Acréscimos e Descontos 

P (porcentagem) = C (capital) . i (taxa percentual); i = P/ C
  Generalizações para Acréscimos:
M (montante) ou VF (valor futuro) = C (capital) + P (porcentagem)
VF = C + (C . i) (C . i) = P
VF = C (1 + i)
VF = C (1 + i1) . (1 + i2) . (...) Para acréscimos sucessivos
P = VF - C
P = C (1 + i1) . (1 + i2) - C
P = C [ (1 + i1) . (1 + i2) - 1]; i = (P/ C) . 100
  Generalizações para Descontos:
M (montante) ou VF (valor futuro) = C (capital) - P (porcentagem)
VF = C - (C . i); (C . i) = P; VF = C (1 - i)
VF = C (1 - i1) . (1 - i2) . (...) Para descontos sucessivos
P = VF - C
P = C (1 - i1) . (1 - i2) - C ; P = C [ (1 - i1) . (1 - i2) - 1]; i = (P/ C) . 100

Fonte: dados de pesquisa (Resolução Grupo B - Tarefa Investigativa Decisão de Compra com Porcentagem).

O grupo A percorreu caminhos diferentes: encontrou expressões semelhantes, porém acrescentou outra generalização para o valor total da taxa (i), aprofundou o raciocínio para as equações de acréscimo e desconto sucessivo e incluiu mais duas equações ao considerar i1 = i2. Conforme resolução do Quadro 5 a seguir, pode-se perceber que as formalizações também estão corretas:

Quadro 5 Generalizações Valor Final e Taxa Total - Acréscimos e Descontos Sucessivos 

Para acréscimos xi = x0 + (x0 . i) = x0 . (1 + i1); x = xi + (xi . i2) = xi . (1 + i2) = x0 . (1 + i1) . (1 + i2)
Para descontos: xi = x0 - (x0 . i) = x0 . (1 - i1); x = xi - (xi . i2) = xi . (1 - i2) = x0 . (1 - i1) . (1 - i2)
No caso de i1 = i2 para acréscimos sucessivos: x = x0 . (1 + i1)2 = x0 . (1 + i2)2
No caso de i1 = i2 para descontos sucessivos: x = x0 . (1 - i1)2 = x0 . (1 - i2)2
Taxa total para desconto: i = (1 - x/x0 ) . 100
Taxa total para acréscimo: i = (x/x0 - 1) . 100
  Notação:
x0 - valor inicial;
xi - valor intermediário;
x - valor final;
i1 - primeira taxa;
i2 - segunda taxa;

Fonte: dados de pesquisa (Resolução do Grupo A - Tarefa Investigativa Decisão de Compra com Porcentagem).

Ponte, Brocardo e Oliveira (2015, p. 23) salientam que na investigação matemática "[...] o aluno é chamado a agir como um matemático, não só na formulação de questões e conjecturas e na realização de provas e refutações, mas também na representação de resultados e na discussão e argumentação com seus colegas e o professor". Os alunos A3, A2 e A1 ressaltam que foi possível avaliar o raciocínio e compreender a atividade de modo geral no momento em que as descobertas foram socializadas e discutidas pela turma:

A3 Vi as questões que fizeram e por mais que tenham usado terminologias diferentes, o modo de fazer foi o mesmo. Também chegamos na mesma conclusão, fato interessante, pois por mais que os grupos não tenham feito a atividade junto, ambos tiveram a mesma linha de raciocínio lógico. A observação da mesma atividade com outro olhar é algo que nos faz pensar, por isso muitas vezes a socialização dos métodos apresentados para resolver as atividades é muito importante para podermos aprender a ter outra visão referente ao mesmo assunto.
A2 A maioria dos cálculos estão iguais ao nosso, destaco, ainda, que as tuas generalizações estão muito bem elaboradas, bem semelhante a um material didático, cheio de considerações. Show!
A1 Obrigado A2! Nós procuramos sistematizar alguns conceitos simples e depois avançar um pouco para alguns mais complexos para futuras atividades e aprimorar o conhecimento de financeira, visto que nunca tinha feito uma generalização das fórmulas da matemática financeira. [Diálogo entre A2 e A1]

Neste contexto, investigar relaciona-se a fazer descobertas, explorar problemas e hipóteses, construir argumentos e justificativas que apoiam a ideia. Segundo a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) (BRASIL, 2017, p. 519):

É necessário que os estudantes possam, em interação com seus colegas e professores, investigar, explicar e justificar os problemas resolvidos, com ênfase nos processos de argumentação matemática. [...] A identificação de regularidades e padrões exige, além de raciocínio, a representação e a comunicação para expressar as generalizações, bem como a construção de uma argumentação consistente para justificar o raciocínio utilizado. [...] Com relação à competência de argumentar, seu desenvolvimento pressupõe também a formulação e a testagem de conjecturas, com a apresentação de justificativas.

Ponte (2003) complementa que investigar é descobrir relações, padrões procurando identificar e comprovar as propriedades levantadas pelo investigador, como salienta o aluno A1:

A1 É interessante trabalhar com todas as hipóteses que podem influenciar nas escolhas da compra de um produto de qualidade, que esteja em bom estado para a utilização. Penso que no momento em que o estudante ganha liberdade de pensar/elaborar suposições para o problema tornando-o mais complexo, acaba tendo de procurar outros meios para resolvê-lo. Nessa atividade foi constatado essa visão de liberdade e gostei muito de pensar em estruturas que influenciavam na compra da televisão tanto na Loja A, B ou C.

Para que uma atividade seja considerada como investigação, conforme Oliveira, Segurado e Ponte (1998) é fundamental que a situação seja motivadora e desafiadora, não sendo imediatamente acessíveis, ao aluno, o processo de resolução e a solução ou soluções da questão, como destacam os alunos A1 e A3:

A1 Achei muito boa a atividade, apesar de trabalhosa, porque traz um assunto que molda todo estudo de matemática financeira, que é a questão da porcentagem e que muitas vezes não analisamos a situação com a devida atenção. Todo o local que olhamos, notamos placas expondo descontos ou juros, e saber usar estas informações é necessário para não cair em golpes, evitando que o indivíduo fique pagando por algo que não deveria.
A3 O mais interessante é que antes dessa atividade, eu pensei que iria ver muitas fórmulas e me apavoraria. Agora elas parecem ser fáceis, quando somos nós que a encontramos, só depois é que temos que nos preocupar com a solução ou soluções, diante de vários fatores que podem influenciar no processo de escolha!

Portanto, após a análise dos resultados encontrados, os grupos chegaram à conclusão que a loja C é a opção mais vantajosa, caso seja necessário comprar no mesmo dia a televisão (hoje), porém se o consumidor quiser economizar e minimizar custo deve comprar na loja B a partir do outro dia (amanhã), pois a liquidação com descontos entre 6% e 10% garante o menor preço em comparação às outras lojas. Logo, a escolha entre uma loja e outra depende do % de desconto concedido e da data da compra. Entre os demais fatores que podem influenciar na compra, os alunos destacaram: marca, garantia, qualidade do produto, concorrência (vendas virtuais e lojas mais distantes da casa da família), consumo de energia, tamanho da televisão, frete, taxa de instalação, etc.

Relativamente à primeira pergunta, significado do símbolo %, o grupo B respondeu que é uma unidade de medida que representa uma parte de um total de 100, o grupo A respondeu que o termo significa a parte centésima de um todo e os demais grupos responderam que é um número dividido por 100 (a % = a / 100; a ≥ 0).

Por fim, os alunos concluíram que é possível associar a tarefa investigativa sobre porcentagem com conteúdo da Matemática (álgebra, funções). No caso de acréscimos, ou descontos sucessivos de porcentagem fixa, tem-se uma progressão geométrica, identificada pelo Grupo A. Também foi constatado que o problema está relacionado com educação financeira por todos os grupos ao apresentar várias opções em uma situação, na qual o consumidor precisa escolher qual delas economiza mais recursos financeiros.

Manifestações de aprendizagem

Ponte, Brocardo e Oliveira (2015, p. 23) salientam que o "[...] envolvimento ativo do aluno é a condição fundamental da aprendizagem". Portanto, é preciso desenvolver a capacidade do aluno em se envolver com a própria aprendizagem, elaborar suas estratégias e oportunizar o engajamento com atividades que demandem exploração. Goldenberg (1999, p. 37) complementa que as tarefas investigativas "[...] motivam os alunos, e ainda, desenvolvem capacidades que contribuem para um conhecimento mais amplo de conceitos e facilitam a aprendizagem" como ressaltam os alunos deste estudo:

A1 Houve grande aprendizado com a atividade investigativa, porque através das generalizações desenvolvidas por meio das resoluções dos problemas chegamos em fórmulas do conteúdo de Matemática Financeira. Além disso, as discussões em sala de aula proporcionaram a visualização de um consumidor consciente, por conta de analisar os preços e verificar a loja mais em conta. A mesma coisa aconteceu com a tarefa relacionada às formas de investimento, matematicamente parecia simples de resolver, com a aplicação da fórmula de juros compostos que deduzimos. Por outro lado, no conhecimento financeiro foi de grande aprendizagem e tivemos bastante coisa para analisar, sem jamais imaginarmos.
A2 Encontrando as generalizações, estamos aprendendo muito mais, entendendo o que de fato acontece e podemos aplicar tais fórmulas em outros acontecimentos de mesma natureza.
A3 Existiu aprendizagem por conta do pensamento de como fazer os cálculos, já que era uma atividade com situações simuladas, porém próximas da nossa realidade. Mesmo ainda não tendo aprendido as fórmulas, acabamos as deduzindo com nossas terminologias, pelo pensamento lógico e isso é muito mais significativo do que decorá-las, pois precisamos pensar o porquê de cada elemento das fórmulas. A aprendizagem se dá de forma dedutiva e instigada.

Dessa forma, de acordo com Ponte, Brocardo e Oliveira (2015), as atividades de investigação matemática incentivam o aluno a desenvolver a criatividade e autonomia, definindo objetivos e conduzindo a investigação, formulando estratégias, testando suas conjecturas e analisando criticamente os resultados obtidos nos grupos. Deaquino (2008, p. 37) complementa que "[...] uma discussão em pequenos grupos é uma técnica de implementação de aprendizagem que permite aos aprendizes compartilhar experiências e ideias na busca de solução de problemas". Logo, o trabalho em grupo é fundamental nas tarefas que exigem raciocínio e atenção como, por exemplo, na investigação matemática, em que o aluno pode auxiliar o outro a encontrar a solução de um problema, enfrentar as dificuldades em conjunto, bem como aprender com os colegas.

Sendo assim, a cooperação e interação que os estudos em pequenos grupos proporcionam são fundamentais para os alunos adquirirem confiança, saberem enfrentar as suas dificuldades, discutir o problema com os colegas e aprender com eles. Os alunos A4, A5 e A6 evidenciam a importância da atividade ser realizada em grupo. A aluna A7 também destaca como a cooperação, o estímulo da professora e as discussões foram importantes para o aprendizado:

A4 A atividade investigativa gerou um aprendizado diferenciado, pois aprendemos entre nós mesmos e vencemos as dificuldades através de um diálogo em conjunto. O nosso grupo é bastante colaborativo, interativo e participativo, facilitando a realização dos cálculos e a compreensão das questões.
A5 Existiu aprendizado com a atividade, pois aprendemos cada vez mais a trabalhar em equipe e que a opinião do colega pode ser diferente, chegar aos mesmos resultados ou a resultados mais completos, melhor analisados. Todos nós devemos aprender a trabalhar em grupos, pois a aprendizagem não se constrói sozinha e sim com a colaboração de cada um. Aprendemos, também, com alguns erros e ajustes e principalmente discutindo cada resolução com o pequeno e grande grupo.
A6 A aprendizagem em pequenos grupos se é dada de forma mais significativa, já que o estudante tem seus colegas para poderem tirar suas dúvidas e se ajudarem nesse processo.
A7 A cooperação que as atividades de investigação proporcionaram e a professora nos instigando favoreceu o aprendizado do conteúdo e estimulou a turma a participar das discussões, proporcionando uma maior reflexão e compreensão sobre cada situação, estou muito satisfeita com as aulas, o ensino deveria ser dessa forma.

"O professor precisa estar em constante formação, buscando sempre contribuições e estratégias metodológicas que visem aprendizagem e a formação de cidadãos ativos e críticos, pois afinal formar cidadãos é uma das funções do professor" (MOREIRA et al., 2017, p. 8). Conforme a fala do aluno A8 pode-se constatar que a tarefa de investigação matemática contribuiu no desenvolvimento do espírito crítico em que é necessário analisar todas as possibilidades em um processo de tomada de decisão:

A8 Através da situação proposta aprendemos a analisar diferentes opções de investimento de dinheiro e decidir a partir de nossos cálculos e suposições qual seria a melhor opção de investimento. Situação muito útil para nossas vidas, a nos tornar mais críticos a respeito de situações da mesma natureza.

Moreira et al. (2017, p. 8) ressaltam que "[...] na disciplina de Matemática é necessário levar em consideração problemas que envolvem o cotidiano dos alunos, que os levem a refletir, investigar, buscar soluções e participarem criticamente no processo de ensino e aprendizagem [...]", exatamente como expõe o aluno A8. Nessa perspectiva, a tarefa investigativa torna-se mais interessante à medida que é possível estabelecer relações com situações-problema do cotidiano.

Análise das dificuldades durante a resolução da tarefa

Ponte, Brocardo e Oliveira (2015) salientam que as tarefas investigativas parecem difíceis, em função da sua estrutura aberta, com várias possibilidades de conjecturas, generalizações e estratégias de resolução. No entanto, no momento em que os dados são organizados e o problema analisado detalhadamente, a situação se torna mais clara, como ressaltam os alunos A2, A3 e A4:

A2 Foi difícil generalizar, porém conseguimos entender a lógica que seguimos e logo generalizamos. Eu nunca tinha encontrado fórmulas, acredito que a turma inteira teve dificuldade. No curso de Matemática, o professor geralmente deixa utilizar formulário ou decoramos para resolver o exercício.
A3 Sim, no início foi bem difícil começar a compreender o que tinha que ser feito, com muitos termos que nunca vi. Para mim foi a problematização mais complexa até agora.
A4 A dificuldade encontrada foi a de acertar as fórmulas e fazer a análise, precisaríamos de mais tempo para analisar, entre o próprio grupo, a resolução desse tipo de questão mais aberta, no final só ficou faltando alguns detalhes que não percebemos.

Diante dos relatos dessa categoria, pode-se perceber que as principais dificuldades encontradas, pelos alunos, nas tarefas investigativas estão relacionadas à insegurança na formulação de conjecturas e generalizações, em função da dependência da utilização de formulários (fórmulas) e ausência de prática na resolução de problemas de caráter aberto.

Considerações Finais

Este estudo, de abordagem qualitativa, teve o propósito de analisar as possibilidades de conjecturas e estratégias de resolução de duas tarefas investigativas resolvidas pelos licenciandos em Matemática, de uma universidade no estado do Rio Grande do Sul. Com a análise dos dados foi possível atingir o objetivo proposto. Os dados foram agrupados em três categorias: (a) Conjecturas e estratégias de resolução; (b) Manifestações de aprendizagem; e (c) Análise das dificuldades durante a resolução da tarefa.

Os dados representativos dessas categorias demonstram que a partir das resoluções das tarefas de investigação matemática vinculadas ao cotidiano, reflexões nos pequenos grupos, discussões no momento de socialização das atividades em sala de aula e análise das dificuldades foi possível desenvolver o pensamento crítico dos licenciandos, despertando a criatividade, a autonomia e o espírito colaborativo, contribuindo, dessa maneira, para os processos de ensino e de aprendizagem de educação financeira e economia.

Os pequenos grupos percorreram caminhos diferentes e fizeram descobertas importantes durante a resolução de cada problema. Quando compararam os resultados, no momento da socialização para o grande grupo, alguns perceberam que poderiam ter escolhido outros trajetos, outros não perceberam algum fator importante que fazia parte da análise e influenciava no processo de tomada de decisão. Os alunos demonstraram entusiasmo ao ler as atividades, questionar, levantar hipóteses, encontrar generalizações pela primeira vez (sempre as fórmulas eram dadas), testar e validar as conjecturas, perceber a partir da socialização de cada tarefa, para a turma, que existem vários caminhos e diversos fatores que fazem parte da análise para se chegar a um resultado final e não necessariamente que a resposta encontrada é a única que está correta.

Diante desse contexto, é inegável o potencial dessa metodologia na aprendizagem e no desenvolvimento do pensamento crítico. Por fim, é importante problematizar, discutir conteúdos de educação financeira e economia, além de relacioná-los com a Matemática Financeira na formação inicial dos licenciandos, de maneira contextualizada e inovadora, de modo que todos sintam prazer em aprender, sejam capazes de argumentar e desenvolver o senso crítico. Nesse sentido, foi escolhida a metodologia da investigação matemática para ensinar educação financeira e economia, com o objetivo de ligar a teoria com a prática (situações-problema do cotidiano), desenvolvendo o pensamento crítico e as habilidades dos futuros professores da educação básica e/ou ensino superior.

Agradecimentos

O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), Código de Financiamento 001.

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Recebido: 04 de Dezembro de 2019; Aceito: 22 de Junho de 2020

Autora correspondente: patriciafranzoni@furg.br

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