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Ciência & Educação

Print version ISSN 1516-7313On-line version ISSN 1980-850X

Ciência educ. vol.28  Bauru  2022  Epub Oct 13, 2022

https://doi.org/10.1590/1516-731320220041 

Artigo Original

Eu fiquei horrorizada...”: mudanças na atividade de trabalho de professoras que ensinam Matemática frente à realidade local do trabalho infantil

I was terrified...”: changes in Mathematics teachers’ work when faced with the local reality of child labor

Luciana Pereira de Sousa1 
http://orcid.org/0000-0002-4498-9047

Vanessa Sena Tomaz2 
http://orcid.org/0000-0002-4903-6405

1Universidade Federal do Tocantins (UFT), Arraias, TO, Brasil

2Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Faculdade de Educação, Belo Horizonte, MG, Brasil


Resumo

Este artigo analisa mudanças na Atividade de trabalho de professoras dos anos iniciais de uma escola na cidade de Palmas, estado do Tocantins, quando ensinam matemática em um projeto sobre trabalho infantil. A pesquisa foi desenvolvida por meio de observação participante de reuniões pedagógicas e de aulas, além de entrevistas. A análise, baseada na Teoria da Atividade Histórico-Cultural, revelou tensões na Atividade quando as professoras redirecionaram suas ações no andamento do Projeto Escravo Nunca Mais, para conscientizar as crianças sobre o problema do trabalho infantil na região. No enfrentamento das tensões, percebem-se mudanças na Atividade, sendo uma delas o uso de conteúdos de matemática, fazendo a mediação das ações das professoras. No âmbito do projeto, o foco do ensino de matemática muda, passando a conciliar dimensões socioculturais e políticas dos conteúdos com a preparação para as avaliações externas.

Palavras-chave Ensino de matemática; Ensino das séries iniciais; Teoria da atividade histórico-cultural; Trabalho infantil

Abstract

This article analyzes changes in teachers' work in an elementary school in Palmas, Tocantins, Brazil, while using mathematics contents to develop a project on child labor. The research was developed through participant observation of lessons and pedagogical planning meetings, and interviews with teachers. The analysis, based on the Cultural-historical Activity Theory, highlighted the tensions in the Activity when teachers focused their actions on the development of the Project Escravo Nunca Mais (No longer a slave) to raise awareness of child labor in the region. We noticed changes in teachers' Activity, using mathematics contents as tools to mediate their actions, directed towards children’s awareness of child labor in the region. In the scope of the project, the focus on mathematics teaching changes as it accommodates the sociocultural and political dimensions with the teaching for external assessment.

Keywords Mathematics teaching; Elementary school teaching; Cultural-historical activity theory; Child labor

Introdução

Este artigo analisa mudanças na atividade de trabalho de professoras dos anos iniciais de uma escola comunitária, conveniada com a rede de educação do estado do Tocantins, Brasil, quando desenvolvem um projeto com a temática trabalho infantil. A Atividade dessas professoras, neste artigo, é entendida no sentido amplo preconizado pela Teoria da Atividade Histórico-Cultural, ou seja, vai além da ideia de tarefas, exercícios ou problemas escolares. Sendo assim, diz respeito ao trabalho docente, à medida que se caracteriza por "[...] atividades e relações presentes nas instituições educativas, extrapolando a regência de classe" (OLIVEIRA; ASSUNÇÃO, 2010, p. 1), e é atravessada por condições de emprego - contratação, remuneração, carreira e estabilidade. Elas ensinam diferentes conteúdos disciplinares do currículo, fazem tarefas rotineiras de acompanhamento dos alunos, desenvolvem projetos, alguns não previstos no Projeto Político-Pedagógico da escola, entre outras tarefas. Os projetos externos, assim nomeados neste artigo, são fruto de parcerias do Governo de Tocantins com instituições públicas e privadas. Como a maioria dos projetos são formulados sem a participação das professoras, eles sobrecarregam a rotina de trabalho delas; por outro lado, também geram possibilidades para novas abordagens de conteúdos curriculares. Nosso foco neste artigo são as mudanças na abordagem de conteúdos de matemática no âmbito de um projeto em particular.

O estado do Tocantins é o mais jovem do país, criado em 1988, adotando, desde então, uma política educacional que se ordena na lógica neoliberal contemporânea (TOCANTINS, 2015). Essa lógica, segundo Pereira (2019), está estruturada por tríplice governança composta por: Estado, organismos internacionais e setores privados, com e sem fins lucrativos. Sob a bandeira de que as ações educativas são voltadas para resolver demandas complexas da vida cotidiana, do pleno exercício da cidadania e do mundo do trabalho, na prática, a política educacional se alinha às diretrizes nacionais que, por sua vez, compartilham das orientações da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). Nessa perspectiva, alguns eixos de atuação se evidenciam no projeto de educação de Tocantins: o alinhamento dos currículos e projetos pedagógicos para alcançar a excelência, segundo os indicadores de avaliação da educação; e a realização de parcerias pela Secretaria de Educação do Estado (Seduc). Esses dois eixos são atravessados pela ênfase na meritocracia, dando destaque aos que apresentam melhores índices, o que alimenta a competição (SOUSA, 2020).

Essas parcerias são efetivadas por meio dos convênios e programas, delineando metas e objetivos da Secretaria de Educação que regulam e definem as escolhas dos conteúdos e os métodos de ensino adotados pelas professoras. A investigação realizada por Sousa (2020) mostra que a política de educação neoliberal adotada pelo Estado afeta a organização do tempo e do trabalho pedagógico, tendo mais espaço no currículo conteúdos de português e matemática que são mais cobrados nos testes de avaliação de larga escala e nas Olimpíadas de Matemática da Escola Pública (OBMEP) . Dada a pressão sobre as professoras para manter um bom índice nessas avaliações, nos períodos que se aproximam dos testes, mais espaço ainda é destinado aos conteúdos dessas duas disciplinas. Por outro lado, como analisa Sousa (2020), as professoras se ressentem de espaço para trabalhar outros conteúdos e temáticas ligados à vivência, à participação política e à formação humanística das crianças, o que pode ser feito dentro do projeto nomeado na escola como Projeto Escravo Nunca Mais.

Portanto, interessa-nos discutir neste artigo como o engajamento das professoras em um projeto fruto de parcerias da Seduc com outros órgãos, pelo menos durante seu desenvolvimento, contraditoriamente, criou oportunidades de resistência ao modelo neoliberal hegemônico, adotando uma abordagem que enfatiza as dimensões sociais e políticas da matemática em detrimento do foco do ensino para o domínio de procedimentos para resolução de problemas nos testes. Essas dimensões se abrigam nas correntes de pesquisa sociopolítica, segundo a qual a educação matemática é uma prática social e política, porque é "[...] historicamente constituída em sistemas complexos de ação e significado e no entrelaçamento de múltiplos contextos tais como a sala de aula, a escola, a comunidade, a nação e até mesmo o mundo globalizado" (VALERO; ZEVENBERGEN, 2004, p. 2).

O Projeto Escravo Nunca Mais foi desenvolvido na escola, tendo origem no projeto Escravo, nem pensar! (REPÓRTER BRASIL, 2019), por uma demanda da Secretaria de Educação (Seduc) do Estado do Tocantins (TO) e do Ministério do Trabalho e Emprego (MTE), por meio da Superintendência Regional do Trabalho e Emprego no estado de Tocantins, para desenvolver ações educativas com a finalidade de combater o trabalho infantil no Estado. Esse projeto nos chamou a atenção porque, apesar de ter chegado à escola sem consulta prévia às professoras, configurou-se como um espaço importante de diferentes aprendizagens para as crianças e para as próprias professoras, pois lhes possibilitou romper, ainda que pontualmente, com o modelo de educação para resultados, no qual são pressionadas a trabalhar.

O trabalho infantil é definido no Plano Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil (PNAETI) como:

[...] atividades econômicas e/ou de sobrevivência, com ou sem finalidade de lucro, remuneradas ou não, realizadas por crianças ou adolescentes em idade inferior a 16 (dezesseis) anos, ressalvada a condição de aprendiz a partir dos 14 (quatorze) anos, independentemente da sua condição ocupacional (BRASIL, 2019, p. 6).

Em relação ao trabalho infantil, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios 2015 (PNAD) revelou que 2,7 milhões de pessoas, de 5 a 17 anos, encontravam-se em situação de trabalho no Brasil (IBGE, 2016). Dessa população, 15,4% correspondem às pessoas (5 a 13 anos) em situação de trabalho infantil. No que tange ao estado do Tocantins, o Mapa do Trabalho Infantil, com referência na PNAD 2015, indicou 21.278 crianças e adolescentes em situação de trabalho infantil, com idade entre 5 e 17 anos. Destas, 31,4% atuam em comércios, reparação de serviços (oficinas, lava a jatos) e serviços domésticos (IBGE, 2016).

Diante desse cenário, a proposição de ações de combate ao trabalho infantil por meio de projetos governamentais é mais do que urgente e esperada - fato ocorrido em 2018 com o Projeto Escravo Nunca Mais, desenvolvido pelas professoras da escola.

Em sua pesquisa, Sousa (2020) acompanhou o trabalho de quatro professoras que desenvolveram o projeto e pôde caracterizar as ações de ensino nessa escola em dois grandes eixos: preparação das crianças para as avaliações externas e desenvolvimento dos projetos da Seduc/TO com parceiros externos. Tendo como referência a Teoria da Atividade Histórico-Cultural, esses dois eixos de atuação foram estruturados por meio de sistemas de atividades direcionadas ao ensino na escola e conectados aos movimentos históricos na educação por meio das políticas educacionais implementadas no Estado.

Um dos focos da análise empreendida em Sousa (2020) foi a introdução do Projeto Escravo Nunca Mais na escola, mostrando como as questões que perpassam as parcerias estabelecidas pela Seduc/TO trazem desdobramentos no trabalho das professoras e deixam à mostra formas de exploração e precarização do trabalho docente. Por outro lado, também mostrou o potencial desses projetos para gerar fortes movimentos de resistência das professoras à lógica de uma educação voltada para resultados. É nesse contexto - de uma rede de ensino que implementa um projeto de educação neoliberal - que as professoras, individual ou coletivamente, desenvolvem a Atividade de trabalho com vistas à aprendizagem de crianças que vivem em uma região de vulnerabilidade socioeconômica para obter aprendizagens que não se separam do desenvolvimento humano, pois este é "[...] mediado pela cultura e constituído pelas relações sociais entre os sujeitos" (VIGOTSKI, 1987, p. 33).

Frente a esse contexto, neste artigo, aprofundamos a análise micro do sistema de atividades circunscrito ao Projeto Escravo Nunca Mais, redirecionando nosso olhar para as ações das professoras que fazem uso de conteúdos curriculares de matemática, de modo a descrever mudanças na atividade em sala de aula (SOUSA, 2020). Por entendermos essa Atividade como um fenômeno coletivo em uma comunidade, cujas ações são direcionadas a um objeto - no caso em estudo, a conscientização em situação de vulnerabilidade socioeconômica -, mantemos como lente de análise a Teoria da Atividade Histórico-Cultural (ENGESTRÖM, 2015), que nos possibilitou analisar os sujeitos-em-ação (professoras), quando usam conteúdos de matemática no desenvolvimento de um projeto com a temática trabalho infantil.

Em sintonia com a perspectiva teórica adotada, analisamos as mudanças que ocorrem na Atividade no que diz respeito ao papel dos conteúdos de matemática no andamento do projeto. Para tanto, traçamos como objetivos específicos: (a) analisar as tensões que surgem na Atividade das professoras, quando elas redirecionam o uso da matemática no Projeto Escravo Nunca Mais; (b) analisar as mudanças que ocorrem na atividade, decorrentes das tensões, no que diz respeito à abordagem dos conteúdos de matemática dentro do projeto, com vistas ao desenvolvimento humano das crianças.

Para tanto, organizamos a discussão proposta neste estudo em três seções, além da introdução e das considerações finais. Na primeira, situamos alguns aspectos da Teoria da Atividade Histórico-Cultural que compõem nossa caixa de ferramentas para a análise da Atividade de trabalho das professoras. Na segunda, apresentamos o contexto da pesquisa e o material empírico selecionado para este artigo, bem como os procedimentos de análise. Na terceira, analisamos as tensões que surgem na Atividade face ao desenvolvimento do projeto e as mudanças no uso da matemática, a partir do engajamento das professoras no projeto. Por último, nas considerações finais, apresentamos os resultados e as contribuições teóricas e metodológicas deste estudo.

Situando a teoria da atividade histórico-cultural no trabalho docente

Fundamentamos nossa análise na Teoria da Atividade Histórico-Cultural (Cultural-Historical Activity Theory, CHAT) no horizonte dos estudos desenvolvidos pelo grupo de Teoria da Atividade Histórico-Cultural na Pesquisa em Educação (CHATER), sediado na Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais, particularmente nos trabalhos que focam no micro da sala de aula (DAVID; TOMAZ, 2015). A CHAT tem sua gênese na Psicologia Histórico-Cultural, embasada nas ideias de Vigotski, com contribuições de colaboradores, influenciados pelos estudos de Marx e Engels sobre Atividade humana. Esta se diferencia da atividade animal por ser uma atividade consciente, aspecto que também influenciou os estudos de Leontiev no século XX. Para Leontiev (1978), a Atividade é uma forma específica de existência social que inclui mudanças cruciais da realidade social. Ela emerge de uma necessidade que direciona motivos para um objeto relacionado que a distingue de outra. Para satisfazer os motivos, ações são necessárias; estas, por sua vez, são realizadas de acordo com as condições que determinam as operações relacionadas a cada ação.

Especificamente, apoiamo-nos nos estudos do pesquisador finlandês Yrjö Engeström e seus colaboradores, que ampliam suas lentes de análise em relação aos trabalhos de Vigotski e Leontiev, para uma multiplicidade de vozes e contextos interculturais, evidenciando-se uma rede complexa de sistemas interativos de aprendizagem. Em suas pesquisas, uma Atividade é sempre entendida como um fenômeno coletivo em uma comunidade, onde as ações se efetivam dentro de um sistema maior, que integra múltiplos sistemas de Atividades conectados. A complexidade da relação entre ação e Atividade está intrínseca na sua natureza dialética, na qual a contradição tem um papel relevante.

Engeström e seus colaboradores utilizam o sistema de Atividade coletiva como unidade de análise e atribuem às contradições a força impulsionadora de mudança, aprendizagem e desenvolvimento. Nessa perspectiva, contradições geram o questionamento de práticas pelos sujeitos, causando rupturas que podem produzir fragmentação ou transformações expansivas da Atividade, quando as tensões e contradições são resolvidas (ENGESTRÖM, 2015).

Portanto, em um sistema de Atividades, a análise micro é centralizada no sujeito e a análise macro, focalizada no coletivo em um processo, no qual as atividades de ambos os níveis se relacionam interativamente (ENGESTRÖM, 2015). Para o autor, o objeto da atividade é sempre internamente contraditório e é um convite à interpretação, formação do sentido pessoal e transformação social. O objeto é transformado em resultado com a ajuda dos artefatos que medeiam as ações sobre o objeto.

Um sistema de atividade pode ser descrito por componentes - sujeito, objeto, artefatos, comunidade, regras e divisão do trabalho - de tal modo que qualquer componente está intrinsicamente conectado com os demais, indicando uma relação dialética entre eles. Assim, se um componente muda, outras mudanças devem ocorrer para equilibrar o sistema como um todo. Nesse sistema, sujeito pode ser um indivíduo ou grupo de pessoas engajadas em um único propósito, e o poder de ação do sujeito é o foco da análise; objeto é o espaço problema na direção do qual a Atividade se desenvolve; artefatos mediadores são ferramentas e signos; comunidade refere-se às pessoas que, mesmo não diretamente envolvidas nas ações dessa Atividade, de alguma forma partilham o mesmo objeto; divisão do trabalho diz respeito ao status e à divisão das tarefas entre os sujeitos da Atividade; e as regras se referem às normas e convenções explícitas e implícitas que regulam as ações e interações dentro do sistema de Atividades.

Segundo Engeström e Saninno (2010), cabe ao pesquisador definir a posição e ponto de vista que será adotado como perspectiva de análise, observando-se as relações dinâmicas internas e as mudanças históricas do sistema de Atividades e dos seus componentes. Essas mudanças podem ser maiores ou menores, restritas a poucos ou a diversos componentes do sistema, podendo chegar até a uma mudança do objeto e, portanto, da própria Atividade.

Engeström (2015) desenvolve a Teoria da Aprendizagem Expansiva, na qual destaca os processos de aprendizado em que o próprio sujeito da aprendizagem é transformado de indivíduo isolado em coletivos e em redes e começa a questionar a lógica e a ordem das suas atividades. Para o autor, os processos de ensino e aprendizagem nunca coincidem, ao contrário, as "[...] lacunas, lutas, negociações e a fusão ocasional entre os dois necessitam ser tomadas como recurso-chave para entender o processo de aprendizagem expansiva como processos de formação de agência" (ENGESTRÖM, 2015, p. xix, tradução nossa). Nessa perspectiva, a agência promove nos sujeitos/grupos a possibilidade de alterar determinados contextos e a si mesmos. Do ponto de vista da CHAT, a agência não é uma especificidade de um determinado sujeito, ela é construída em uma relação dialética e negociada entre o sujeito, o contexto e a comunidade envolvida. A aprendizagem, nesse sentido, é resultado das relações sociais de que os sujeitos participam e, portanto, aprendizagem não se separa do desenvolvimento humano (VIGOTSKI, 1987).

Sendo assim, neste estudo, utilizamos ferramentas teóricas da CHAT para analisar como professoras dos anos iniciais de uma escola conveniada do estado de Tocantins rompem "[...] com a sequência de ação e toma[m] a iniciativa de transformá-la" (VIRKKUNEN, 2006, p. 49, tradução nossa), ao ser introduzido um artefato cultural - um projeto para conscientizar os estudantes sobre o trabalho infantil na sua região, rumo ao desenvolvimento das crianças.

Considerando que o foco da nossa investigação são as mudanças que ocorrem na Atividade ao longo do desenvolvimento do Projeto Escravo Nunca Mais, quando as ações são mediadas por conteúdos de matemática, temos de considerar como as ações das professoras são construídas e negociadas entre sujeitos, contexto e sociedade, reguladas por agentes internos e/ou externos.

Ressaltamos ainda que nossa análise tem foco nas mudanças no micro da sala de aula durante o desenvolvimento do projeto. Para tanto, recorremos a Engeström e Sannino (2010), que fornecem uma ferramenta analítica denominada miniciclos de ações de aprendizagem, para analisar as mudanças na Atividade. Segundo esses autores, todos os ciclos expansivos de ações de aprendizagem de larga escala envolvem numerosos ciclos menores que podem ser identificados em poucos dias ou em horas e que podem ser considerados potencialmente expansivos. A lógica de funcionamento desses miniciclos reproduz o movimento do ciclo expansivo, de tal modo que um novo miniciclo só começa quando um outro já alcançou momentaneamente um padrão de atividade relativamente estável e começou a ser questionado. Para essa análise, é necessário compreender dialeticamente os processos de mudança que envolvem demandas de ensino e de trabalho como um todo, por meio das ações empreendidas pelas professoras na sala de aula, quando confrontadas com as da Seduc/TO, comparadas e contrastadas na Atividade nas quais estão inseridas.

O contexto de pesquisa e os procedimentos metodológicos

A pesquisa foi desenvolvida em uma escola comunitária confessional católica, mantida por meio de um convênio celebrado entre a comunidade, o governo estadual e o municipal. Está localizada na área Norte da cidade de Palmas, capital do estado do Tocantins, na região Norte do Brasil. A escola atende crianças com idade entre 4 e 11 anos, oferecendo gratuitamente desde a educação infantil até os anos iniciais do ensino fundamental, em dois turnos. Conforme o Projeto Político-Pedagógico (PPP), as crianças e os adolescentes matriculados nessa escola são oriundos da classe trabalhadora, muitos vivem apenas com a mãe, alguns só com o pai ou com os avós. Por estar localizada em uma região de vulnerabilidade social, a escola enfrenta vários problemas socioeconômicos, dependendo, portanto, dos convênios com as redes públicas para se manter economicamente.

As participantes da pesquisa são professoras licenciadas em Pedagogia que atuam no 4º e no 5º ano, ministrando todas as disciplinas previstas no currículo escolar. Têm experiência na docência e foram selecionadas para o recorte que fazemos neste artigo pelo seu engajamento nos trabalhos que realizam na escola, particularmente no Projeto Escravo Nunca Mais, e o interesse pela própria pesquisa. Adiciona-se a isso terem demonstrado conhecer bem os alunos, a realidade de suas famílias e as necessidades da comunidade no entorno da escola.

A pesquisa adotou uma abordagem qualitativa, na perspectiva da Etnografia na Educação (GREEN; DIXON; ZAHARLICK, 2003). O material de pesquisa selecionado para análise neste artigo foi retirado de Sousa (2020), por sua vez, produzido por meio de observação participante de aulas e de duas reuniões de professoras, sendo que a primeira tratou do anúncio do projeto pela escola e a segunda da definição pelas professoras das atividades que seriam realizadas por elas nesse projeto. Todas as observações foram registradas em diário de campo e gravadas em áudio. Incluem-se também entrevistas com as professoras. Após a transcrição de todo o material e o registro do acompanhamento da rotina das professoras, referenciadas com nomes fictícios, foi possível analisar a trajetória de ações delas, capturando as tensões que surgiam no andamento do Projeto Escravo Nunca Mais face à complexidade do trabalho na escola.

Retomamos o sistema de Atividades Projeto Escravo Nunca Mais, destacando seus componentes como proposto por Engeström (2015), e a apreciação feita em Sousa (2020), que o tomou como unidade de análise. A partir da análise da historicidade da Atividade, seguimos o curso das ações das professoras ao longo do desenvolvimento do projeto, conectadas às ações dos outros participantes da atividade - alunos, representantes da Seduc/TO e outros professores - e identificamos tensões que surgem entre os componentes do sistema. Detectadas as tensões, analisamos as ações agentivas das professoras, o que nos possibilitou perceber mudanças no sistema de Atividades no que tange à abordagem dos conteúdos de matemática no âmbito do projeto.

Projeto Escravo nunca mais

O projeto foi apresentado pela orientadora educacional da escola, Carolina, em uma reunião de planejamento coletivo que aconteceu no dia 12 de setembro de 2018, com a participação das professoras do 2º ao 5º ano do período vespertino, entre elas, Elza (4º ano) e Jeanne (5º ano). A orientadora Carolina comunicou a demanda de desenvolver o projeto, esclarecendo que se tratava de uma parceria da Seduc/TO com o Ministério do Trabalho/DRT/TO. Como uma porta-voz da Seduc/TO, ela leu o ofício recebido desse órgão e detalhou sobre o objetivo, as atividades previstas e o período de realização do projeto - de 25 de setembro a 31 de outubro de 2018, acrescentando a exigência de produzir um portfólio que seria o produto a ser encaminhado ao órgão parceiro.

Ao final do comunicado, as professoras questionaram a orientadora sobre a maneira como a decisão de acolher o projeto foi tomada - sem consultá-las -, a exigência de produzir um portfólio para comprovação do trabalho e o prazo de execução dele. Nesse momento, elas argumentaram que desenvolver aquele projeto significava mudar o cronograma de trabalho, já tão sobrecarregado com a pressão de preparar as crianças para as avaliações externas. Isso implicaria ainda em ter de renunciar a outras atividades com as crianças, que, na avaliação delas, eram prioritárias naquele momento.

Jeanne: Eu não entendo por que as coisas acontecem dessa forma, nós temos projetos para desenvolver do PPP, ações planejadas de acordo com as nossas demandas e ainda chega esse assim, para executar. O problema não é o projeto, sei que vamos fazer, pois a escola foi 'selecionada', o problema é que as coisas acontecem sem a nossa participação. [Primeira reunião de planejamento, 12 set. 2018].

É preciso ter em mente que a região onde se localiza a escola é caracterizada pela precariedade socioeconômica das famílias, não podendo descartar a existência de exploração de trabalho infantil. Assim, percebendo que não havia espaço para recusar o projeto, as professoras resolveram que todas (inclusive as que não estavam no momento) iriam pesquisar sobre o tema para fazer um planejamento coletivo que nortearia o desenvolvimento do projeto. Como o planejamento de trabalho é coletivo, as duas professoras que participaram da reunião compartilharam a demanda do projeto com as professoras do contraturno que estavam em regência, e todas passaram a organizar as atividades conjuntamente.

Jeanne: Já que não temos opção mesmo e o tema é importante pra nossos alunos, vamos fazer nosso melhor. Vamos fazer o seguinte: cada uma vai pesquisar sobre esse assunto de acordo com a faixa etária da sua turma, na semana que vem a gente senta e define as ações de cada turma e fazemos um projetão da escola toda. O que acham? [Primeira reunião de planejamento, 12 set. 2018].

Apesar de se mobilizarem para a temática do projeto para conscientização sobre trabalho infantil, as professoras não abandonam a preocupação com a preparação das crianças para as avaliações externas, como percebemos na fala da professora Elza (4º ano).

Elza: Entendo a importância do projeto e da temática, mas eu sinto um descaso em relação a nossa participação nas tomadas de decisões, sendo que os projetos serão desenvolvidos por nós. Além disso, temos esse semestre as avaliações externas das OBMEP e as provinhas do Circuito Campeão. São provas que demandam de muito tempo para preparar os alunos, pois o desempenho da escola não pode cair. Temos que tentar adequar o projeto que chegou nas atividades já planejadas, para não perder o foco das avaliações que são provas de português e matemática. [Segunda reunião de planejamento, 19 set. 2018].

Na segunda reunião, a professora Jeanne explicou à orientadora que seriam apresentadas as pesquisas que cada uma havia feito e as propostas de ações para desenvolver o projeto, incluindo aquelas que ficariam sob a responsabilidade da própria orientadora. Ao apresentar suas pesquisas, as professoras demonstraram estar sensibilizadas para a gravidade do problema do trabalho infantil na região, dispondo as reportagens de jornais, vídeos, música e livros, à medida que explicavam o que planejavam para as crianças.

Jeanne: [...] eu resolvi pesquisar notícias sobre o trabalho infantil aqui no Tocantins, pra ter uma noção dos casos mais comuns. Eu fiquei horrorizada com o tanto de notícias encontradas no Google, é só colocar ‘trabalho infantil do TO notícias’. Eu selecionei algumas matérias que eu achei importante e que se aproximam do contexto aqui da nossa escola. Separei matérias de 2015 pra cá.

Elza: Gente! eu me surpreendi com duas dessas matérias, na verdade não tinha pensado que nas cidades da região do Jalapão poderia acontecer a exploração do trabalho infantil com a confecção do ‘artesanato’, o trabalho doméstico, infelizmente a gente sabe que é algo muito comum aqui, principalmente nessas cidades mais carentes. Acho interessante fazer esse trabalho com os alunos, trazendo essas informações do Tocantins, porque assim os alunos se sentirão mais próximos do tema por ser dados da região ou do estado que moram [...].

Elza: Apesar da gente ser obrigada a fazer esse projeto que, no fim, as evidências serão de outro órgão, será muito rico para nossos alunos.

Jeanne: Vai ser ótimo, vamos cuidar logo de fazer isso pra depois focar nas provinhas (Brasil e OBMEP). [Segunda reunião de planejamento, 19 set. 2018].

Na organização do trabalho coletivo, por iniciativa das professoras, ficou definido que caberia à orientadora educacional providenciar os materiais (cartolina, tinta, papel, etc.), registrar os trabalhos feitos em sala e montar o portfólio para enviar à Seduc/TO. As professoras do 5º ano (Jeanne e Catarina) iam utilizar as reportagens selecionadas com os dados do trabalho infantil na região, realizar leitura de livros sob a temática e trabalhar na produção de diferentes gêneros textuais.

Diante da pressão pelos índices de avaliação da escola, elas, intencionalmente, articularam o tema do projeto com a abordagem dos conteúdos de português e matemática, prioritários nos testes padronizados de avaliação externa. Percebemos que, ao fazer essa articulação, as professoras não trabalharam os conteúdos disciplinarmente, como faziam nas aulas que foram acompanhadas antes do projeto e que tinham foco nos conteúdos e procedimentos que garantiriam o bom desempenho nas provas. Selecionamos trechos de duas aulas do 5º ano, ministradas pelas professoras Jeanne e Catarina, do conjunto de aulas analisadas em Sousa (2020), para um refinamento da análise neste artigo.

As duas professoras introduziram o tema do projeto questionando as crianças sobre o que seria, para elas, trabalho infantil. As tarefas domésticas foram apontadas por elas como um tipo de trabalho infantil, exigindo que as professoras problematizassem quando essas tarefas realmente se configuravam como exploração de crianças. Enquanto as crianças expunham suas principais ideias, as professoras escreviam as manchetes no quadro, registrando os números com uma fonte maior e mostrando para elas a cópia impressa da reportagem.

  • Tocantins tem mais de 20 mil crianças em situação de trabalho escravo infantil (SATURNINO, 2017).

  • Trabalho infantil no TO: maioria trabalha na zona rural e ganha pouco mais de 200 (COTRIM, 2017).

  • Governo e sociedade civil discutem o combate ao trabalho infantil na região do Jalapão (GOVERNO..., 2016).

  • 69,71% do trabalho infantil no Tocantins é feito por meninos contra 30,29% feito por meninas (FERNANDES, 2017).

  • A escravidão ainda existe no Brasil? (SOUZA, 2017).

Durante a discussão das manchetes, as professoras enfatizavam a ordem de grandeza dos números. Jeanne exaltou o número de crianças na situação de trabalho infantil no Estado.

Jeanne: Gente, são mais de 20 MIL crianças só no nosso estado, vocês imaginam no nosso país? [Aula 25 set., 5º ano].

Quando Jeanne leu a notícia (69,71% do trabalho infantil no Tocantins é feito por meninos...), ela provocou as crianças a refletir, enfatizando o dado e chamando atenção para a comparação entre percentuais de meninos e meninas em situação de trabalho infantil no Estado.

Jeanne: Vocês acham que esse número, 69,71%, é um número alto ou um número pequeno?

Aluno: É alto, mais da metade, professora. [Aula 25 set., 5º ano].

A professora Catarina aproveitou a manchete (Maioria trabalha na zona rural e ganha pouco mais de 200) para situar os alunos sobre o local onde se concentra o trabalho infantil no estado do Tocantins.

Catarina: Aqui diz que a maioria das crianças em situação de trabalho infantil trabalha na zona rural, nas fazendas no interior do estado e que essas crianças ganham um pouco mais de R$ 200 reais pelo trabalho.

Aluna: Professora! com esse dinheiro não dá pra comprar nem um celular baratinho. [Aula 27 set., 5º ano].

Seguindo o comentário da aluna, a professora chamou a atenção das crianças para que, hoje em dia, há outras configurações de trabalho escravo, aprofundando seu comentário com um texto que aborda o tema "a escravidão moderna" (SOUZA, 2017). Na discussão do texto, ela contextualizou historicamente a escravidão no Brasil, explicando para as crianças que, no período imperial, havia uma lei que permitia que uma pessoa fosse propriedade da outra, como se fosse um objeto, podendo até ser vendida ou trocada. O texto continha um conjunto de informações sobre a escravidão do trabalho moderno em atividades que também empregam crianças, como: o tráfico de drogas; aliciamento de crianças que são obrigadas a pedir esmolas nas ruas; e a exploração sexual de menores.

A professora aprofundou o tema da exploração sexual de crianças, pois, segundo a reportagem, uma das principais razões desse tipo de exploração infantil é a pobreza e a violência doméstica, a que muitas crianças e adolescentes estão submetidos.

Catarina: Galerinha, prestem atenção aqui, silêncio, por favor. Escutem essa informação. Nessa reportagem diz que a maioria das vítimas são meninas e meninos. Gente, isso é muito sério! [Aula 27 set., 5º ano].

As próprias crianças estavam agitadas com a leitura da reportagem sobre a exploração sexual infantil. É importante registrar que, quando a professora levanta a discussão dessa temática, ano 2018, havia uma forte frente conservadora no país que defendia um projeto de lei chamado 'Escola Sem Partido' que, entre outras questões, veta a discussão de gênero e sexualidade na escola. Decidida, a professora Catarina chamava a atenção das crianças para o problema, orientando-as sobre como acessar os canais de denúncia.

Catarina: Vocês sabiam que existem números de telefones para fazer denúncias sobre essas explorações que nós estudamos aqui?

Aluno: É o 190, né, professora, o número da polícia.

Catarina: Sim, pode ligar no 190, mas tem telefones somente para esse tipo de denúncia. Tem o disque 100, para denunciar os crimes contra os direitos humanos e o disque 180 para denunciar violência contra a mulher. [Aula 27 set., 5º ano].

Em sua abordagem, a professora Catarina fez uma contextualização histórica da escravidão e também utilizou as manchetes, enfatizando parâmetros quantitativos (a maioria; um pouco mais) para discutir formas contemporâneas de violações que afetam as crianças e situá-las sobre o problema do trabalho infantil na região.

Nas duas turmas, as professoras trabalharam o tema do projeto de forma transversal e interdisciplinar. Enquanto discutiam as reportagens, os alunos levantavam tipos de trabalho (doméstica, babá, vendas nos semáforos, venda de artesanato) que consideravam abusivos para as crianças. Já as professoras utilizavam os dados para detalhar a configuração do trabalho infantil no estado, os quais permitiam entender onde ele estava concentrado, se na zona rural ou urbana, e como afetava diferentemente meninos e meninas. Elas faziam leitura e análise de dados para conscientizar os alunos da gravidade do problema na região e alertá-los dos riscos.

Após essa discussão, as professoras organizaram grupos de alunos e propuseram a produção do gênero textual 'cartaz', com interpretação de gráficos e tabelas que apresentavam os índices de trabalho infantil no estado. A outra parte da turma produziu textos com análises das informações contidas nas reportagens discutidas na aula.

O sistema de atividades Projeto Escravo nunca mais

Estruturamos nossa unidade de análise seguindo as ações individual ou coletiva das professoras no desenvolvimento da Atividade de trabalho. Em consonância com a CHAT, pela historicidade das ações no andamento do projeto, em cada turma e no conjunto delas, configuramos o Projeto Escravo Nunca Mais como um Sistema de Atividades, dispondo seus componentes, assim como feito em Sousa (2020). Nesse Sistema, as professoras (sujeitos), inicialmente, são instruídas a desenvolver o projeto como proposto pela Seduc/MTE-TO, mas não veem necessidade dele, de modo que o motivo da Atividade seria cumprir uma ordem superior ("Já que não temos opção, mesmo"). Porém, a partir do momento em que tomam conhecimento do grave problema local, elas reagem, se engajam no projeto e o reposiciona para os objetivos que consideram realmente relevantes. Com esse reposicionamento, sua execução se torna, para elas, uma idealização daquilo que se deseja alcançar: conscientizar as crianças sobre a existência e os riscos da exploração do trabalho infantil.

Dessa forma, de acordo com Leontiev (1978), necessidade e objeto tornam-se unidade constitutiva do motivo (conscientizar as crianças) e passam a determinar a orientação concreta da Atividade. As ações das professoras (sujeitos) passam a ser direcionadas ao objeto ensino, ao qual a Atividade está direcionada. As ações (levantar dados numéricos e interpretá-los em sala de aula; ler e interpretar textos; assistir a vídeos; confeccionar cartazes; levantar tipos de trabalhos em que as crianças estão envolvidas) são mediadas por artefatos culturais, que se apresentam em forma de manchetes de jornais locais, documentos oficiais da Seduc, cartilha do MT/DRT-TO, vídeo documentário, livros infantis, livros didáticos, conteúdos disciplinares, manuais de descritores das avaliações externas, Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), música, textos sobre a temática, entre outros. Existem regras que controlam as ações das professoras determinadas pelas políticas educacionais adotadas pela Seduc/TO. Essas regras dizem respeito à definição do período de realização do projeto e ao formato da entrega do portfólio, como comprovação de sua execução. Mesmo dedicando-se ao projeto, não se podia perder o foco das metas de desempenho para as avaliações Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) e Olimpíadas Brasileiras de Matemática das Escolas Públicas (OBMEP). Em vista disso, outras regras são estabelecidas pelas próprias professoras, após se conscientizarem sobre o problema que aflige seus alunos: utilizar dados da região para discutir com os alunos; trabalhar as habilidades de linguagem, rompendo com a divisão disciplinar; e manter o foco no ensino de matemática e português, para garantir os bons índices de desempenho nas avaliações. Por trás dessas regras, existe uma comunidade que compartilha o mesmo objeto ensino, cujos membros são de diferentes origens: professores da escola, servidores, pais, mídias locais, Seduc/TO, o MTE/TO, desenvolvedores de currículo, órgãos de avaliação, etc. Esse conjunto de membros da comunidade alterna as relações de poder e a autoridade, repercutindo na divisão de trabalho na Atividade, uma vez que realça os papéis e as hierarquias entre os diferentes atores na atividade e desses com os sujeitos (professoras). Não se pode ignorar a relação de poder assimétrica entre as professoras e o sistema de ensino (Seduc/TO), marcada, historicamente, pelo pouco poder de decisão das professoras - "eu sinto um descaso em relação a nossa participação nas tomadas de decisões". Engajar-se em um projeto imposto a elas, ressignificando os motivos e as ações para seu desenvolvimento, é uma maneira de "[...] questionar as relações de poder que dificultam a conquista coletiva do poder" (LÉMONIE; GROSSTEPHAN; TOMÁS, 2021, p. 6). O resultado da atividade é a conscientização das crianças sobre o trabalho infantil na região.

Porém, no andamento da Atividade, surgem tensões, porque, para a realização das ações como idealizadas pelas professoras, os conteúdos disciplinares, cujas ações eram direcionadas a eles para atingir as metas de desempenho nas avaliações, neste sistema de Atividades, passam a configurar-se como artefatos mediadores do ensino dentro do projeto, rompendo com a organização disciplinar no currículo. Assim, elas estão diante de forças opostas que se alternam entre ensinar para a conscientização das crianças sobre o trabalho infantil - risco a que elas estão sujeitas -, desviando o foco dos conteúdos na preparação para as avaliações, versus ensinar mantendo o foco nos conteúdos disciplinares, utilizando o tema do projeto somente como cenário para a sua abordagem, o que garante o cumprimento do projeto, mas mantém o risco social para as crianças. Movendo-se dentro dessa rígida estrutura, tendo em vista a relação de trabalho com um sistema de ensino guiado pela política de educação neoliberal, as professoras enfrentam as tensões encontrando brechas para desenvolver o projeto. Elas rompem com a organização disciplinar, redirecionando o ensino para a perspectiva do desenvolvimento humano das crianças, sem abandonar as habilidades avaliadas nos testes. No caso dos conteúdos de matemática, percebemos novas formas de abordagem, que passam a ser o meio pelo qual as professoras mobilizam as crianças para discutir a temática e conscientizá-los sobre o trabalho infantil na região.

Na perspectiva da CHAT, as tensões na Atividade são enfrentadas com o uso da leitura e interpretação de gráficos e tabelas que expressam os índices de trabalho infantil no estado, o que inclui a produção do gênero textual 'cartaz', ou seja, com o uso de práticas de numeramento, vistas como práticas sociais (YASUKAWA, 2018). Essa perspectiva se alinha com Fonseca (2010), para quem práticas de numeramento são assim caracterizadas porque envolvem quantificação, medição, orientação no espaço, ordenação e classificação e apresentam relações entre pessoas, grupos e o conhecimento associado à matemática.

Assim, no sistema de Atividades Projeto Escravo Nunca Mais, as práticas de numeramento compõem a instrumentalidade (ENGESTRÖM, 2015), isto é, a caixa de ferramentas necessária na Atividade das professoras. Elas são acionadas como artefatos de mediação para negociar demandas, resolver conflitos e produzir uma compreensão mais profunda do problema social que representa o trabalho infantil, alertando as crianças. Dessa forma, o numeramento não pode ser visto apenas como uma competência demonstrada pelas professoras para fazer as crianças se engajarem em práticas sociais, porque se alinha a uma perspectiva sociopolítica da pesquisa em educação matemática, em que numeramento é a disposição para usar a matemática para expor injustiças e promover justiça social (JURDAK, 2020). Tal disposição pode ser percebida no modo como as professoras direcionaram a discussão das manchetes de jornais com as crianças.

Pelo menos no espaço-tempo do projeto, as crianças encontram espaço para expor suas próprias percepções sobre o problema, explorando a linguagem numérica (ordem de grandeza dos números, porcentagem, análise e interpretação de dados numéricos contidos nos textos e tabelas, etc.), o que contribui para dar significado à discussão dos riscos que o trabalho infantil no estado do Tocantins traz para a vida delas. Já as professoras, que foram mobilizadas pelas manchetes de jornais e por outros materiais pesquisados, percebendo que o problema poderia estar próximo delas, encontram na discussão com as crianças brechas para explorar conteúdos que são cobrados nas avaliações externas, sem renunciar à conscientização sobre o grave problema social. Nesse uso dos conteúdos, também são desenvolvidas habilidades previstas nos descritores (INEP, 2020) relativos ao item Tratamento da Informação, avaliadas na Prova Brasil, que é um teste padronizado para diagnóstico da educação básica.

No desenvolvimento do Sistema de Atividade do projeto, examinando a trajetória de ações das professoras, sistemática e historicamente, percebemos que as tensões que surgem no curso da Atividade se avolumam pela manifestação de uma contradição neste Sistema em particular. As professoras se veem diante de: desenvolver o Projeto Escravo Nunca Mais para cumprir seu contrato de trabalho na instituição, reproduzindo a formulação dada pela parceria entre o MTE e a Seduc/TO que as ignoram, versus desenvolver o projeto para conscientizar as crianças e intervir em um grave problema social que as afeta por viverem naquela região, em particular. Essa é a forma como entendemos que a contradição primária do capitalismo do valor de uso versus valor de troca se manifesta nesta Atividade de Educação, irradiando para outros componentes do Sistema de Atividades.

Retomando as aulas de matemática da professora Catarina, que focam na preparação para os testes padronizados para avaliação, ela ensina os procedimentos da divisão de dois números, não havendo espaço para que ela ou as crianças introduzam suas próprias formas de operar com os números ou mesmo façam questionamentos sobre o uso desses procedimentos em contextos da vida delas, como observamos que a professora fez nas aulas do projeto.

Catarina: Então, 23 dividido por 15 é igual a 1. Um vezes 15 é igual a 15, para 23 falta quanto?

Alunos: [Silêncio].

Aluno: Falta 6.

Aluno: Falta 8.

Catarina: Eita, que vamos pensar, gente, vamos fazer a continha aqui, se não conseguimos fazer de cabeça. Vinte e três menos 15. O 3 menos 5 pode?

Alunos: Nããoooo.

Catarina: Então vamos pegar 1 emprestado do 2, né! Que fica 13, ok? Treze menos 5. Vamos contar do 5 para o 13 falta quanto, conta nos dedinhos. [Aula 20 set., 5º ano].

Durante a entrevista, a professora Catarina mostrou estar consciente da pressão vivida pela política de avaliação e seu incômodo em relação a ter de preparar os alunos para os exames específicos. Ela defende que outras habilidades dos estudantes poderiam ser desenvolvidas se trabalhasse com outras áreas do conhecimento que não são avaliadas nesse tipo de teste. Ela se contrapõe à visão restrita que parece imperar na implementação da política educacional do estado, de modo que, pelo menos dentro do Projeto Escravo Nunca Mais, se evidenciam as mudanças de abordagem do conteúdo e da interação com as crianças.

Catarina: De certa forma a gente é manipulada pra isso, esses índices, eles não condizem com o desenvolvimento como um todo da criança, eu olho pra isso [ter de preparar os alunos para a prova], vou treinar esses meninos pra fazer Prova Brasil [fala irritada sobre a cobrança de treinar os alunos], a vida deles é isso? [indignada]1.

A professora Catarina demonstra ter clareza da sua participação nessa engrenagem, revelando conflitos que afligem quem trabalha nessa estrutura de gestão educacional, arquitetada a partir dos pilares de uma sociedade do conhecimento, com agenda econômica neoliberal. É necessário lidar com os medos do fracasso, caso o índice de desempenho não atinja a meta esperada.

Assim, nas aulas em que desenvolve o projeto e em sua entrevista, percebe-se que Catarina questiona sua própria prática, rompendo, ainda que momentaneamente, com o ciclo de ações de aprendizagem direcionadas aos procedimentos de resolução de problemas numéricos para a preparação para testes. Identificamos miniciclos de ações de aprendizagem que se iniciam no desenvolvimento do projeto para alcançar o objetivo de conscientizar as crianças sobre o trabalho infantil, em que a mediação é feita por dados numéricos e gráficos. Na aula da professora Jeanne, uma criança reage à provocação: "é mais da metade, professora!", em resposta à pergunta se o percentual (69,71%) de meninos em situação de trabalho infantil, entre os que são afetados por esse problema no estado, é 'alto' ou 'pequeno'. Além de comparar dados, essa reflexão feita a partir dos dados possibilitou levantar tipos de trabalhos que são concentrados em meninos e meninas. As duas professoras, Jeanne e Catarina, já mobilizadas pelos alarmantes índices desde a segunda reunião de planejamento, também passam a usar os dados numéricos para fazer comparação entre números e subsidiar a discussão sobre a realidade do trabalho infantil na região, o que é uma mudança em relação à prática adotada. Nesse sentido, de acordo com Engeström e Saninno (2010), esses miniciclos deveriam ser vistos como potencialmente expansivos, revelando-se como uma rica rota para ações de aprendizagem, no caso em estudo de matemática, no âmbito do Projeto Escravo Nunca Mais.

Portanto, defendemos que, no andamento do Sistema de Atividade Projeto Escravo Nunca Mais, as professoras começam a questionar seu próprio conhecimento sobre o contexto em que trabalham, a organização disciplinar e suas práticas de ensino, concluindo pela urgência de abordar o tema. Há uma mudança no papel dos conteúdos de matemática, antes como objeto de ensino, mais focado nos algorítmicos e em outros procedimentos que garantem a preparação das crianças para os testes padronizados, passando, no âmbito do projeto, a configurar a instrumentalidade da Atividade, capaz de mobilizar as crianças para o problema social. Com essa mudança, a abordagem pedagógica para o ensino parece se mover de uma noção de "[...] mathematical literacy que é conceituada como competências matemáticas que são independentes do contexto social e são ideologicamente neutras" (JURDAK, 2020, p. 515, tradução nossa) para o enfrentamento do problema do trabalho infantil na região para a promoção de justiça social. No andamento da Atividade, as professoras quebram o ciclo de ações, que antes privilegiava a abordagem procedimental dos conteúdos, criando outro modelo para a Atividade de ensino. Este é mediado pela leitura e análise de dados contidos nas manchetes de jornais locais, expressos em porcentagem, mobilizando práticas de numeramento, em que se destacam as dimensões socioculturais e sociopolíticas da educação matemática. Tal abordagem de ensino faz da sala de aula um espaço de experiências coletivas, produzidas em contextos históricos, sociais e dinâmicos.

Dessa forma, podemos dizer que as professoras aprendem sobre/acerca das suas próprias aprendizagens, criando "[...] novos padrões culturais de atividade, com ferramentas típicas e ações próprias, das quais a atividade em questão passa a fazer parte" (DAVID; TOMAZ, 2015, p. 1.292). A compreensão da história do próprio contexto social em que atuam possibilita mudanças mais profundas na Atividade de ensino, conectando a escola com o cotidiano das crianças e relativizando o foco na preparação para os testes. Os conteúdos matemáticos curriculares são usados como ferramentas para ressaltar valores éticos e sociais que elas acreditam ser relevantes para a mudança da condição da exploração do trabalho infantil na região, ou seja, o redirecionamento do objeto da Atividade - conscientização das crianças - para um "espaço-problema", com poder de gerar agência nas professoras para mudar sua prática pedagógica, e a expansão de um conjunto de capacidades de aprendizagem (ENGESTRÖM; SANNINO, 2010), ainda que essa mudança esteja circunscrita a um projeto, no conjunto de demandas de trabalho.

Considerações finais

Na perspectiva da CHAT adotada por nós, percebemos que a gestão do sistema de ensino do estado do Tocantins, que opera segundo uma lógica de educação neoliberal, impõe às professoras a execução de projetos por ele idealizados, o que pode levar a um trabalho docente alienado (LEONTIEV, 1978). No entanto, o sistema de Atividade Projeto Escravo Nunca Mais, apesar de também ter sido imposto às professoras, contou com um conjunto de ações encadeadas e articuladas entre si, mobilizadas pelo profundo conhecimento que elas têm da realidade das crianças e da necessidade de intervir nela (motivo). Contudo, o processo de satisfação de motivos por meio de uma Atividade cria novas necessidades, hierarquizando motivos. Essa hierarquização de motivos, que mobiliza e prioriza ações, determina a direção da Atividade, o que não é livre de tensões, dada a estrutura de poder sistêmica cristalizada na relação de trabalho entre as professoras e a Seduc/TO. No caso em estudo, promover o desenvolvimento humano das crianças por meio da conscientização da existência de trabalho infantil na região e das formas de denunciá-lo, torna-se o foco da Atividade dentro do projeto, passando os conteúdos disciplinares a atuarem como ferramentas de mediação das ações.

Pelo enfrentamento das tensões, elas priorizam atividades dentro do projeto que dialogam com a realidade das crianças e realizam mudanças práticas em suas ações. Desse modo, elas se contrapõem a um ensino de conteúdos disciplinares voltado para os procedimentos de cálculo para atender as exigências dos testes de avaliação externa, como o estabelecido pelo sistema educativo neoliberal, resistindo a promover um ensino que pode aprofundar ainda mais as desigualdades sociais da região.

Ao nosso ver, as professoras enfatizam práticas de numeramento no âmbito do projeto, porém dentro de uma perspectiva de ensino mais crítica, envolvendo práticas, valores e o contexto social. Desse modo, elas desenvolvem novas formas de Atividade de trabalho (SANNINO; ENGESTRÖM, 2017) em relação ao que faziam para a preparação para os testes de avaliação externa. Elas ainda mobilizam conhecimentos que lhes permitem conciliar a preparação dos alunos para os testes avaliativos, demonstrando ganho de poder de ação (agência). Nessa nova forma de Atividade, a realidade das crianças que as coloca em situação vulnerável à exploração por trabalho infantil potencializa uma nova abordagem de conteúdos, por parte das professoras, ressaltando o modo de explorar aspectos socioculturais e sociopolíticos por meio da matemática, visíveis e significativos para quem experimenta tal vulnerabilidade.

No trabalho coletivo empreendido no projeto, as professoras se "unem alcançando mais poder de ação em conjunto" (SPINOZA, 2004, p. 296, tradução nossa) e estabelecem um pacto político-afetivo quando traçam um novo plano de ações para desenvolvê-lo, ainda que a autonomia pedagógica delas seja restrita. É importante destacar que, de dentro de suas salas de aula, as professoras questionam a hierarquia de poder sistêmico (LÉMONIE; GROSSTEPHAN; TOMÁS, 2021) que historicamente opera em diferentes níveis hierárquicos do trabalho docente para produzir um tipo de trabalho que é qualitativamente diferente daquele que é defendido pelas políticas de educação neoliberal, adotadas no estado do Tocantins, ancoradas em índices de excelência como padrão de educação de qualidade.

1Entrevista gravada em áudio em 13 dez. 2018.

Agradecimentos

Às professoras da escola pela acolhida à pesquisa e o compartilhamento do trabalho. À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) pela concessão da bolsa de pesquisa de doutoramento da primeira autora e ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e à Fundação de Amparo à Pesquisa de Minas Gerais (FAPEMIG), PPM X, pelo financiamento da pesquisa.

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Recebido: 29 de Maio de 2021; Aceito: 09 de Abril de 2022

Autora Correspondente: lucianap@uft.edu.br

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