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Educação e Pesquisa

versión impresa ISSN 1517-9702versión On-line ISSN 1678-4634

Educ. Pesqui. vol.45  São Paulo  2019  Epub 26-Jul-2019

https://doi.org/10.1590/s1678-463420194519091 

Artigos

A expansão do neoconservadorismo na educação brasileira

Iana Gomes de Lima1 
http://orcid.org/0000-0002-6386-7248

Álvaro Moreira Hypolito2 
http://orcid.org/0000-0003-1487-0413

1- Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Porto Alegre, Rio Grande do Sul, Brasil. Contato: iana_glima@yahoo.com.br.

2- Universidade Federal de Pelotas (UFPEL), Pelotas, Rio Grande do Sul, Brasil. Contato: alvaro.hypolito@gmail.com.


Resumo

Tendo em vista que, nos últimos anos, vive-se no Brasil uma onda conservadora que acompanha movimentos conservadores ao redor do mundo, torna-se importante estudar de forma mais aprofundada o movimento neoconservador no cenário educacional brasileiro. Este é o objetivo principal deste artigo. Para tanto, inicialmente, faz-se uma caracterização do neoconservadorismo, a partir de estudos de autores que tratam do contexto estadunidense. Nessa primeira seção apresenta-se, ainda, um breve histórico sobre o surgimento deste movimento. Logo após, apontam-se algumas razões que justificam a necessidade de análises sobre os neoconservadores no Brasil. O artigo ainda conta com exemplos de algumas ações no campo educacional que podem ser caracterizadas como neoconservadoras. Analisam-se o movimento Escola sem Partido (ESP), suas principais pautas em relação à educação e as discussões acerca da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), especialmente as questões ligadas ao que tem sido denominado ideologia de gênero. Examinam-se o ESP e a BNCC a partir da conceituação teórica desenvolvida ao longo do artigo, em articulação com as pautas e características do movimento neoconservador brasileiro. Conclui-se que, nos últimos anos, há um significativo avanço das articulações neoconservadoras no campo político e no campo educacional. Constata-se uma atuação insistente e intensa dos neoconservadores na elaboração de importantes documentos da legislação educacional brasileira.

Palavras-Chave: Neoconservadorismo; Modernização conservadora; Escola sem Partido; Base Nacional Comum Curricular

Abstract

Considering that, in recent years, a conservative wave is being observed in Brazil that accompanies conservative movements around the world, it becomes important to study in a deeper way the neoconservative movement in the Brazilian educational scenario. This is the main purpose of this article. To do so, initially, a characterization of neoconservatism is made, based on studies by authors dealing with the US context. This first section also presents a brief history about the emergence of this movement. Soon after, some reasons are pointed out that justify the need for analyses on neoconservatives in Brazil. The article also has examples of some actions in the educational field that can be characterized as neoconservatives. We analyze the Non-Partisan School (ESP) movement, its main guidelines in relation to education, and the discussions about the National Curricular Common Base (BNCC), especially the issues related to what has been called gender ideology. The ESP and the BNCC are examined based on the theoretical conceptualization developed throughout the article, in articulation with the patterns and characteristics of the Brazilian neoconservative movement. It is concluded that, in the last years, there is a significant advance of neoconservative articulations in the political field and in the educational field. There is an insistent and intense action of neoconservatives in the elaboration of important documents of the Brazilian educational legislation.

Key words: Neoconservatism; Conservative modernization; Non-partisan school; National curricular common base

Nos últimos anos, vive-se no Brasil uma onda conservadora, presente em diferentes áreas. Alguns autores publicaram estudos que indicam a presença de ações de grupos neoconservadores no cenário brasileiro (BARROCO, 2011, 2015; MOLL, 2015a). É crescente o movimento de grupos de direita no Brasil, entre os quais movimentos conectados ao neoliberalismo e ao neoconservadorismo. Em relação ao neoconservadorismo, Moll (2015a) afirma que é possível verificar a força desse movimento quando grupos de direita atacam, por exemplo, jornais e emissoras de televisão por apresentar “algumas posições progressistas, ainda que limitadas, acerca de questões de gênero, descriminalização das drogas, aborto, ecumenismo religioso, racismo e defesa do meio ambiente”. Outro exemplo trazido pelo autor, que demonstra a existência de um movimento neoconservador no Brasil, é relacionado a políticos representantes no Congresso Nacional. Mesmo que poucos políticos se apresentem como neoconservadores no Congresso brasileiro, é notório que as posições de muitos políticos se aproximam de ideias neoconservadoras. Como exemplo de políticos neoconservadores, Moll (2015a) cita Eduardo Cunha (PMDB-RJ)3 e Jair Bolsonaro (PSL-RJ). Mostra como defendem uma política de austeridade e adotam, nas palavras de Moll (2015a), “um discurso moralista baseado, inclusive em pressupostos cristãos estritos (para não dizer fundamentalistas)”. Finaliza seu texto com a afirmação de que é necessário ampliar os estudos sobre “o neoconservadorismo e o neoliberalismo no Brasil, inclusive, como resultado de processos transnacionais, para analisar a fundo as divergências e convergências a fim de compreendê-los como percepções de mundo que buscam se tornar hegemônicas”4.

Assim, parece ficar evidente a necessidade de se estudar de forma mais aprofundada o que é o movimento neoconservador, quais são suas características e que formas assume no contexto atual brasileiro. Para tanto, na primeira parte deste artigo, busca-se caracterizar os neoconservadores a partir de contribuições de autores que estudam o contexto estadunidense, a fim de dar um sentido histórico para o seu surgimento. A segunda parte aponta algumas razões que justificam a necessidade de análises sobre os neoconservadores – especificamente em relação ao contexto educacional brasileiro. Nessa mesma seção, apresentamos alguns exemplos de ações que podem ser caracterizadas como neoconservadoras e apontamos o quão complexo é definir esse grupo no Brasil.

Quando surge o neoconservadorismo?

Vários autores apontam que o movimento neoconservador surgiu no período após a Segunda Guerra Mundial, mais precisamente em torno dos anos de 1960 e 1970 (MOLL, 2010, 2015b; APPLE, 2000; CLARKE; NEWMAN, 1997; AFONSO, 1998; BARROCO, 2015). Neoconservadores são um dos grupos que compõem a Nova Direita, um conceito que passou a ser utilizado na literatura estadunidense5 e europeia para designar um movimento que teve início por volta dos anos de 1960 (CLARKE; NEWMAN, 1997; AFONSO, 1998; APPLE, 2000, 2003). A Nova Direita constitui uma aliança, principalmente, entre neoconservadores e neoliberais, central para o desmantelamento do Estado de Bem-Estar e para a criação de uma nova forma de administrar o Estado quando da crise de 1970 nos países centrais ao capitalismo – período em que tal aliança efetivamente começou a se consolidar. Apple (2000) traz à cena quatro grupos que, para ele, constituem a aliança da Nova Direita nos EUA: os neoliberais, os neoconservadores, os populistas autoritários e a nova classe média profissional. Os neoliberais constituem a liderança da Nova Direita e representam o grupo que se preocupa com a orientação político-econômica atrelada à noção de mercado. Os neoconservadores são aqueles que definem os valores do passado como melhores que os atuais e lutam pelas tradições culturais. Os populistas autoritários são, em geral, grupos de classe média e de classe trabalhadora que desconfiam do Estado e se preocupam com a segurança, a família, o conhecimento e os valores tradicionais. Em um trabalho mais recente, Apple (2013) afirma que os populistas autoritários são formados, de forma significativa, por grupos evangélicos. Por fim, o grupo constituído pela nova classe média profissional está preocupado com a mobilidade social e tal segmento “pode não concordar totalmente com esses outros grupos, mas [...] [seus] interesses profissionais e progresso dependem da expansão de sistemas de prestação de contas, da busca da eficiência e de procedimentos gerenciais” (APPLE, 2000, p. 32).6

Quando da crise de 1970, a Nova Direita realizou duras críticas ao Estado de Bem-Estar Social. Para alguns grupos (como os neoconservadores, os neoliberais e a nova classe média), esse modelo administrativo de Estado privilegiava apenas grupos minoritários, visto que tais grupos haviam feito conquistas importantes em termos de igualdade e direitos sociais, em vez de favorecer os grupos que eram realmente merecedores de tais benefícios e que constituem a verdadeira população de uma determinada nação (APPLE, 1999). Moll (2010, p. 76) corrobora esta análise ao afirmar que:

Muitos americanos viram a crise econômica dos anos de 1970 como consequência da “degeneração social” resultante da corrupção de Watergate, do New Deal, da Grande Sociedade, dos movimentos sociais e das transformações dos anos de 1960. [...] Muitos americanos responderam ao momento de crise afirmando a necessidade de restaurar a sociedade em busca de cumprir seu destino de redenção. Assim, valores como a liberdade, a autonomia, o progresso, a moral, o individualismo e as oportunidades ilimitadas foram tomados como características naturais, em contraposição ao humanismo, ao multiculturalismo, ao coletivismo, ao ambientalismo, ao liberalismo, em suma, às transformações e às questões sociais da década de 1960. No imaginário de muitos estadunidenses, portanto era necessário superar a crise restaurando os “verdadeiros valores” dos Estados Unidos.

O que fica bastante evidente na citação acima é a ideia de restauração dos verdadeiros valores. Com a crise de 1970, houve um entendimento, por parte de grupos conservadores, de que os movimentos pelos direitos civis e sociais – marcantes nos anos de 1960 – haviam provocado uma degeneração social e era preciso retomar valores que tinham como base, centralmente, a família, a moral e o indivíduo7. Assim, “os intelectuais que construíram as bases ideológicas do neoconservadorismo resgataram do tradicionalismo a ênfase moral que, a partir da década de 1960, serviu para atacar moralmente o Estado de Bem-Estar Social e os movimentos sociais liberais” (MOLL, 2010, p. 67).

O diagnóstico dos neoconservadores em relação à crise de 1970 era que se fazia necessário organizar a sociedade a partir de outros valores e que o “maior perigo do século XX era o crescente papel do Estado como organizador da vida social” (MOLL, 2010, p. 68). Neoconservadores criticavam, dessa forma, as intervenções estatais na vida das pessoas, ao afirmar que a presença do Estado representava um perigo em termos morais e econômicos, pois menosprezava o que sempre foi visto como um dos grandes valores americanos: a liberdade individual. Para os neoconservadores, “a liberdade individual era um valor americano fundamental e moral, responsável pela produção e pela riqueza da nação” (MOLL, 2010, p. 68).

É importante ressaltar que a crítica neoconservadora em relação à intervenção estatal no âmbito econômico e a valorização dos indivíduos são aspectos que aproximam e possibilitam uma aliança entre neoconservadores e neoliberais. Moll (2015b) afirma que foi o socialista Michael Harrington quem cunhou o termo neoconservadorismo, referindo-se a um novo tipo de conservadorismo, que em alguns pontos partia de princípios similares aos neoliberais. Para o autor, os neoconservadores, “inspirados no liberalismo clássico, acreditavam que a interferência do governo na economia e os programas sociais geravam inflação, endividamento e prejuízos à produtividade” (MOLL, 2015b, p. 56). Barroco, que também faz uso do termo neoconservador, corrobora tal análise e afirma que este foi um grupo que surgiu a partir da crise mundial do capitalismo dos anos 1970, quando o “conservadorismo se reatualizou, incorporando princípios econômicos do neoliberalismo, sem abrir mão do seu ideário e do seu modo específico de compreender a realidade” (BARROCO, 2015, p. 624). Assim, para a autora, o neoconservadorismo passa, então, a apresentar-se como forma dominante de apologia conservadora da ordem capitalista, combatendo o Estado Social e os direitos sociais, almejando uma sociedade sem restrições ao mercado e reservando ao Estado a função coercitiva de reprimir violentamente todas as formas de contestação à ordem social e aos costumes tradicionais.

Ainda em relação ao Estado de Bem-Estar Social, Moll (2015b) destaca que os neoconservadores viam dois grandes problemas com a interferência do governo. O primeiro deles é que, pelo fato de os programas sociais garantirem segurança econômica, na visão neoconservadora, isso desestimulava o trabalho e a inovação, o que, por sua vez, afetava a produtividade e enfraquecia o país. Portanto, neoconservadores entendiam, assim como os neoliberais, que era preciso “reduzir os gastos governamentais; aumentar a taxa de juros; desregulamentar a economia; e instituir um sistema tributário regressivo” (MOLL, 2015b, p. 56). O segundo problema referia-se à interferência do Estado na economia e no provimento de programas sociais, o que gerava a busca por uma igualdade que, na perspectiva neoconservadora, era pervertida. Ademais, outra crítica em relação à intervenção do Estado era que, desta forma, retirava-se da família, da igreja e da comunidade a responsabilidade pelo bem-estar social, pois para os neoconservadores esses segmentos sociais devem ser os verdadeiros responsáveis pela harmonia social. Assim, em uma visão neoconservadora: “O Estado de Bem Estar Social deveria ser combatido, pois substituía os laços morais, comunitários e familiares pelo Estado e, por conta disso, promoviam o parasitismo e a preguiça” (MOLL, 2010, p. 76).

Nesse período de crise dos anos de 1970, programas destinados, por exemplo, às mães solteiras foram atacados por supostamente incentivar a irresponsabilidade por meio do estímulo à procriação independente do casamento. A partir de um discurso neoconservador religioso, passou-se a veicular a ideia de que as mulheres “deveriam ser donas de casa amáveis e obedientes; assim garantiriam a moral, a estabilidade da família, da sociedade e seriam recompensadas pela segurança e proteção de seus maridos” (MOLL, 2010, p. 76). O aborto e a homossexualidade também passaram a ser alvo de ataques constantes dos movimentos neoconservadores religiosos. Barroco (2015, p. 624) destaca que o movimento neoconservador ganhou ainda mais força no “contexto da implantação das políticas neoliberais, apresentando-se como programa político (a partir do governo Reagan) sustentado pela defesa do neoliberalismo, do militarismo e dos valores tradicionais familiares e religiosos”.

Além desses aspectos, há um nacionalismo reforçado pelo sonho americano, expressado no bordão de Trump America great again. No contexto dos anos 1960/70, os EUA enfrentaram muitos conflitos internos em razão das guerras da Coreia e do Vietnã, nas quais combatia um inimigo identificado, que era o comunismo. A derrota em ambas as guerras trouxe sequelas importantes e acirrou o enfrentamento entre pacifistas/movimentos da contracultura e as forças nacionalistas e conservadoras. A recente onda neoconservadora não deixa de ser uma convergência para resgatar uma tradição perdida que precisa urgentemente ser recuperada. A necessidade de um outro, oponente, inimigo, faz-se crucial para alimentar o sentimento neoconservador. Se não há mais o comunismo há os chicanos, latinos, islâmicos, novos imigrantes africanos.

O que foi até aqui arrolado teve como objetivo entender o contexto no qual surge o movimento neoconservador, um contexto de crise em que diferentes grupos constroem alianças e passam a criticar duramente o Estado de Bem-Estar Social. Em relação aos neoconservadores, é possível perceber que tal grupo realiza críticas, centralmente, ao intervencionismo estatal no âmbito econômico e familiar (moral). Tais críticas estão relacionadas a características específicas do referido grupo, o que será abordado na sequência.

Afinal, o que defendem os neoconservadores?

Moll (2010) destaca que a ideologia neoconservadora passou a ser construída a partir de ideias provenientes, centralmente, de duas correntes já existentes: velho conservadorismo e libertarianismo. Tais pressupostos foram resgatados e passaram a ser reconstruídos, sendo que a novidade se estabeleceu pela fusão dessas correntes tão distintas (MOLL, 2010). Segundo Moll (2010, p. 67), existem diferenças profundas entre libertários e velhos conservadores:

Os libertários entendem que o problema do mundo é a falta de liberdade individual, enquanto os velhos conservadores argumentam que o totalitarismo é fruto do excesso de individualismo. Para os libertários os indivíduos são os únicos que podem definir seus objetivos próprios, enquanto para os velhos conservadores a definição de qualquer objetivo requer a aceitação de crenças e laços sociais. As duas posições diferem também sobre a noção de sociedade. Para os libertários a sociedade é uma relação contratual entre os indivíduos que pode ser desfeita e não tem nada transcendente que a garanta, enquanto os velhos conservadores acreditam que a sociedade é uma comunidade que compartilha uma série de valores morais comuns e instituições que ligam os indivíduos uns aos outros. Acima de tudo, do ponto de vista da economia, os libertários defendiam as virtudes do capitalismo fundado em um livre mercado, mas para os velhos conservadores isto representava justamente a degeneração do capitalismo tradicional.

O que se pode perceber, por meio da citação acima, é que libertários e velhos conservadores possuem pressupostos bastante distintos. Assim, conforme destaca Moll (2010), o neoconservadorismo forma-se a partir desses elementos contraditórios, de modo que a principal novidade do movimento em relação ao velho conservadorismo é a incorporação de ideias libertárias, pois estas se aproximavam muito de pressupostos neoliberais, principalmente pelo foco no indivíduo e na livre economia. Portanto, ao mesmo tempo em que neoconservadores incorporam princípios dos velhos conservadores – afirmam a centralidade da sociedade como um lugar de crenças e laços sociais, baseados em uma série de valores morais comuns –, passam a defender, também, um foco no indivíduo e na sua capacidade de escolha.

Cabe destacar que, apesar de velhos conservadores e neoconservadores divergirem em vários aspectos – os primeiros criticavam os segundos pela pouca preocupação com princípios e tradições; neoconservadores não aceitavam a prevalência da tradição moral, nem a rejeição a modernidades, aspectos defendidos pelos conservadores –, ambos os grupos “nutriam um sentimento anti-revolucionário e se opunham aos movimentos de contracultura e aos programas sociais liberais da década de 1960” (MOLL, 2010, p. 68). O autor destaca que três intelectuais – William Buckley Jr., Frank Meyer e M. Stanton Evans – foram os responsáveis por fundir a linguagem libertária e a linguagem conservadora tradicional. Afirma que, segundo esses três intelectuais, “a liberdade, no sentido libertário, era impossível sem uma prerrogativa moral e um objetivo transcendental, bem como a virtude moral era impossível sem a liberdade, pois sem a possibilidade de escolha, o Estado imporia suas virtudes e seus objetivos” (MOLL, 2010, p. 67).

Apple (2003) aponta aspectos característicos dos neoconservadores. Para ele, neoconservadores baseiam-se

[...] numa visão romântica do passado, um passado em que o “verdadeiro saber” e a moralidade reinavam supremos, onde as pessoas “conheciam o seu lugar” e em que as comunidades estáveis, guiadas por uma ordem natural, protegiam-nos dos estragos da sociedade. (APPLE, 2003, p. 57).

O autor cita algumas políticas educacionais propostas pelo grupo nos Estados Unidos: currículos obrigatórios, avaliações nacionais, retorno a uma tradição ocidental, patriotismo e perspectivas conservadoras da educação moral do caráter. Ademais, os neoconservadores realizam ataques ao multiculturalismo, pois entendem o outro como um perigo aos valores tradicionais (APPLE, 2003). Michael Apple ainda destaca que uma das exigências dos neoconservadores tem sido um Estado cada vez mais forte, no sentido de regular a ação docente, passando de uma “‘autonomia permitida’ para uma ‘autonomia regulamentada’ à medida que o trabalho dos professores torna-se extremamente padronizado, racionalizado e ‘policiado’” (APPLE, 2003, p. 62).

É importante salientar que os neoconservadores, no contexto dos Estados Unidos, estabelecem alianças com os neoliberais, assim como com os fundamentalistas religiosos populistas-autoritários e os evangélicos conservadores (APPLE, 2003). Cabe ressaltar que esses grupos, embora realizem movimentações particulares, não atuam de forma isolada. Estabelecem alianças, mesmo que muitas vezes alguns de seus interesses sejam contraditórios.

Os populistas autoritários baseiam suas posições sobre educação e política social em certas visões da autoridade bíblica, como a moralidade cristã, os papéis de gênero e da família. Afirma Apple (2003) que a plataforma dos populistas autoritários inclui questões relativas a gênero, sexualidade, família e sobre o que deve ser o saber legítimo e o currículo nas escolas. Nos Estados Unidos, segundo o autor, esse grupo tem feito pressão sobre as editoras que produzem livros didáticos, para mudar conteúdos e aspectos importantes da política educacional. Um exemplo da pauta educacional dos populistas-autoritários é a educação de seus filhos em casa (APPLE, 2013). O ensino domiciliar (homeschooling) é baseado na premissa de que a interferência do Estado na vida da família representa um perigo. Está relacionado com o medo do multiculturalismo, que, na perspectiva dos populistas autoritários, representa outro perigo, já que seus filhos são obrigados a conviver com o diferente e, muitas vezes, imoral.

Há interesses comuns entre os neoconservadores e os populistas autoritários: a ideia é recolocar no centro do currículo questões referentes à autoridade, à moralidade, à família, à igreja e à decência, pois somente tais aspectos poderiam superar a decadência moral tão evidente para eles nos dias atuais. Nas palavras de Apple (2003, p. 61): “A liderança da ‘reforma’ do ensino está cada vez mais sob o domínio dos discursos conservadores em torno de um ‘bom padrão de qualidade’, ‘excelência’, ‘avaliação’ e assim por diante”.

Muito daquilo que Moll (2010) denomina neoconservador é o que Apple (2003) denomina populistas autoritários. Moll apresenta uma corrente dos neoconservadores por ele chamada de neoconservadorismo religioso e moral, que teve um crescimento na década de 1970. Afirma que isso se deu, no contexto estadunidense, principalmente por intermédio das igrejas evangélicas conservadoras. Tal crescimento ocorreu significativamente depois que os evangélicos passaram a fazer uso de meios de comunicação para difundir suas ideias e de uma efetiva participação política nos anos de 1970 (MOLL, 2010). A participação política implicava denunciar o comunismo e o que foi considerado como uma conspiração comunista nas escolas e nos programas de governo. “Os religiosos retomaram a visão do século XIX de que deveriam instalar na política os valores cristãos frente à crise e às questões sociais” (MOLL, 2010, p. 76).

O crescimento de grupos com ideias neoconservadoras no cenário brasileiro

Nesta seção, aponta-se, por meio de alguns exemplos, o crescimento de grupos com ideias neoconservadoras no cenário brasileiro. Trata-se, especialmente, do quanto tais ideias têm sido difundidas no campo educacional.8

Miguel (2016) traz importantes contribuições sobre o crescimento das ideias conservadoras no Brasil. De acordo com ele, é possível perceber, a partir de 2010, um avanço, no debate público, de vozes abertamente conservadoras. O autor defende que, atualmente,

[...] é perceptível uma significativa presença de discursos em que a desigualdade é exaltada como corolário da “meritocracia” e em que tentativas de desfazer hierarquias tradicionais são enquadradas como crime de lesa-natureza. Nestes discursos, também ganha uma nova legitimidade a velha ideia dos direitos humanos como uma fórmula que concede proteção indevida a pessoas com comportamento antissocial. (MIGUEL, 2016, p. 592).

No caso brasileiro, o autor identifica três correntes de ideias conservadoras: o libertarianismo, o fundamentalismo religioso e o antigo anticomunismo. De acordo com ele, o libertarianismo defende o menor Estado possível e entende que qualquer situação que tenha origem em mecanismos de mercado é justa por si, por mais desigual que pareça. O autor afirma que tal posição é defendida por fundações privadas, sendo este o caso do Instituto Millenium, que, conforme Miguel (2016, p. 593), é “o principal think tank da direita brasileira, criado em 2006 e financiado por empresas nacionais e transnacionais”. Ademais, essas ideias também são defendidas por parte da grande imprensa brasileira, tendo como um de seus principais defensores o jornalista Rodrigo Constantino9.

O fundamentalismo religioso, por sua vez, vem se tornando uma força no Brasil desde os anos de 1990. Miguel (2016, p. 593) faz um importante alerta ao afirmar que é equivocado, ao se tratar dessa corrente, falar apenas em “bancada evangélica”, pois “a expressão não apenas ignora diferenças entre as denominações protestantes como deixa de lado a importante presença do setor mais conservador da Igreja Católica”. De acordo com o autor, o fundamentalismo pressupõe que há uma verdade revelada, o que anula qualquer possibilidade de debate. Aqueles que se filiam às ideias fundamentalistas religiosas se opõem “ao direito ao aborto, a compreensões inclusivas da entidade familiar e a políticas de combate à homofobia, entre outros temas” (MIGUEL, 2016, p. 593). É importante destacar que os parlamentares fundamentalistas fazem alianças com diferentes forças conservadoras no Congresso, como é o caso dos latifundiários e os defensores dos armamentos. Miguel (2016) aponta como exemplo de fundamentalistas o pastor Silas Malafaia10.

Por fim, o anticomunismo, de acordo com Miguel (2016), ganhou nova roupagem na América Latina e no Brasil, sendo que a ameaça passou a ser o bolivarianismo – doutrina do falecido presidente venezuelano Hugo Chávez – e o Foro de São Paulo, conferência de partidos latino-americanos e caribenhos de centro-esquerda e de esquerda. O Foro, a partir de pressupostos anticomunistas, assumiu “a feição de uma conspiração para dominar o subcontinente” (MIGUEL, 2016, p. 593). O autor ainda ressalta que o Partido dos Trabalhadores, quando esteve no governo federal, também foi apresentado como uma encarnação do comunismo no Brasil, o que acabou “gerando uma notável sobreposição entre anticomunismo e antipetismo” (MIGUEL, 2016, p. 594). Ele destaca que Olavo de Carvalho11 é uma das vozes dessa posição.

É importante ressaltar que a divisão entre as três correntes acima citadas é meramente didática, mas é possível, na realidade brasileira, encontrar representantes que se enquadram em mais de uma corrente. Miguel (2016) exemplifica essa questão por meio de Olavo de Carvalho, que representa a corrente do anticomunismo e também é um católico fundamentalista. Olavo de Carvalho, ademais, está relacionado ao movimento Escola sem Partido (ESP)12 por ser um dos pensadores que embasa esse movimento, bem como um dos propagadores de suas ideias. Entende-se importante tratar da ESP por este ser um movimento que demonstra o crescimento das ideias neoconservadoras na educação.

O ESP13, como definido em suas próprias fontes, é uma “iniciativa conjunta de estudantes e pais preocupados com o grau de contaminação político-ideológica das escolas brasileiras, em todos os níveis: do ensino básico ao superior” e “uma associação informal, independente, sem fins lucrativos e sem qualquer espécie de vinculação política, ideológica ou partidária”14. O objetivo do grupo é barrar “um exército organizado de militantes travestidos de professores [que] prevalece-se da liberdade de cátedra e da cortina de segredo das salas de aula para impingir-lhes a sua própria visão de mundo”. Tal movimento foi fundado em 2004, pelo advogado Miguel Nagib.

De acordo com Miguel (2016, p. 595), o ESP “permaneceu na obscuridade até o início da década de 2010, quando passou a ser uma voz frequente nos debates sobre educação no Brasil. Seu programa foi abraçado por todos os grupos da direita brasileira”. A principal bandeira do ESP é o combate à doutrinação ideológica, que, segundo os defensores do movimento, é constantemente realizada pelos professores nas salas de aula brasileiras. No entanto,

O crescimento da importância do MESP [o autor utiliza-se da sigla MESP para referir-se ao Movimento Escola Sem Partido] no debate público ocorre quando seu projeto conflui para o de outra vertente da agenda conservadora: o combate à chamada “ideologia de gênero”. Antes, a ideia de uma “Escola Sem Partido” focava sobretudo no temor da “doutrinação marxista”, algo que estava presente desde o período da ditadura militar. O receio da discussão sobre os papéis de gênero cresceu com iniciativas para o combate à homofobia e ao sexismo nas escolas e foi encampado como bandeira prioritária pelos grupos religiosos conservadores. Ao fundi-lo à sua pauta original, o MESP transferiu a discussão para um terreno aparentemente “moral” (em contraposição a “político”) e passou a enquadrá-la nos termos de uma disputa entre escolarização e autoridade da família sobre as crianças. (MIGUEL, 2016, p. 595-596).

A partir do excerto acima, pode-se perceber que o ESP passa a atuar, assim, centralmente, por intermédio de duas correntes: o fundamentalismo religioso e o anticomunismo. Não se pode, contudo, esquecer que o ESP também faz uso da corrente do libertarianismo quando traz como principal lema “meus filhos, minhas regras”, defendendo que os responsáveis pela educação dos filhos são os pais e que, portanto, o Estado – e, logo, as escolas – não devem educar, mas, sim, ensinar conteúdos. Há, assim, a ideia de um menor Estado possível, que não interfira na vida privada.

A questão da ideologia de gênero foi bandeira de evangélicos e católicos, que trabalharam juntos e obtiveram o banimento da temática de gênero do Plano Nacional de Educação (PNE) e de planos estaduais e municipais. “Durante a apreciação dos planos de educação, era comum ver câmaras ou assembleias tomadas por freiras, lado a lado com pastores de igrejas neopentecostais, pressionando deputados e vereadores” (MIGUEL, 2016, p. 599). Conforme já afirmado, a questão da ideologia de gênero não era a bandeira inicial do ESP, mas tal movimento viu nesta defesa uma oportunidade, o que lhe rendeu “aliados de peso, uma capilaridade com a qual nem poderia sonhar e um discurso com ressonância popular muito mais imediata”. Ainda nas palavras do autor: “A confluência foi facilitada graças ao trabalho de propagandistas da extrema-direita, em particular os alinhados a Olavo de Carvalho, para quem a dissolução da moral sexual convencional é um passo da estratégia comunista” (MIGUEL, 2016, p. 601).

O ESP é um movimento que tem estado muito presente no cenário educacional brasileiro (MIGUEL, 2016; MACEDO, 2017). Exemplo disso é a quantidade de projetos de lei que vêm tramitando no Congresso Nacional, em Assembleias Legislativas e na Câmara de Vereadores, e que têm como objetivo tornar lei a pauta do movimento. Miguel (2016) identificou, no ano de 2016, sete projetos de lei em tramitação no Congresso Nacional e mais de dez projetos em legislativos estaduais. Macedo (2017) corrobora a constatação acerca da dimensão que tem tomado o ESP no cenário educacional brasileiro ao afirmar que esses projetos que tramitam no Senado e na Câmara se propõem a alterar a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), de modo a nela inserir um programa escola sem partido. As tentativas de modificar a LDB – lei que rege a educação brasileira – configuram uma questão séria, que mostra a força que tal movimento e, logo, as ideias neoconservadoras estão tendo no Brasil.

As ideias neoconservadoras também podem ser vistas em outros cenários. Este é o caso do combate à ideologia de gênero no que se refere à Base Nacional Curricular Comum (BNCC). Uma análise sobre temas incluídos e excluídos da BNCC corrobora o entendimento de que há um crescimento das ideias neoconservadoras em relação à educação brasileira. De acordo com Macedo (2017), a partir da divulgação da segunda versão da Base, um novo conjunto de demandas, chamadas pela autora de demandas conservadoras, foi fortalecido. A autora ainda afirma que tais demandas estiveram presentes em todo o processo, “mas ganharam proeminência após o impeachment de Dilma Rousseff, quando o ESP passou a ser um dos interlocutores do MEC” (MACEDO, 2017, p. 514).15Macedo (2017) identifica quatro pautas que o ESP tem demandado em relação à BNCC: 1. separação entre espaço público e privado, transferindo a educação para o espaço privado da família, a quem caberia toda a formação moral e ética das crianças; 2. contra o viés ideológico de esquerda que sustentaria o documento apresentado à consulta pública; 3. contra a diversidade cultural nos currículos; e 4. contra a ideologia de gênero nos currículos. No entanto, não é apenas o ESP que tem proposto demandas conservadoras em relação à BNCC. De acordo com Silva, Pires e Pereira (2016, p. 12), o próprio ex-ministro da educação, Mendonça Filho, interveio no processo de produção da Base, modificando seu calendário de execução, o ritmo dos trabalhos, colocando o ensino médio em uma discussão à parte, e, “sobretudo, mudando os interlocutores, para incluir (mais) representantes do setor privado e defensores de propostas anacrônicas”. Os autores citam como exemplo de tais propostas o ESP e a banca evangélica, que se apresentam contra as discussões de gênero e os direitos das pessoas LGBT, por exemplo.

A questão da ideologia de gênero gerou grandes debates em relação à BNCC, sendo que, em sua terceira versão, apresentada em abril de 2017, foi retirada qualquer menção à questão de gênero. Ainda em relação à BNCC, cabe destacar que em sua terceira versão também haviam sido excluídas questões referentes ao ensino religioso. No entanto, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu, em setembro de 2017, que o ensino religioso fosse confessional, ou seja, que os professores pudessem promover as crenças nas aulas. Assim, em novembro de 2017, Eduardo Deschamps, presidente do Conselho Nacional de Educação, e Rossieli Soares da Silva, secretário de Educação Básica do MEC, declararam16 que houve consenso de que a versão final da BNCC terá menção ao ensino religioso, mas que ainda não havia sido definido como isso aconteceria.

Considerações finais

O objetivo principal deste artigo foi trazer elementos para uma melhor compreensão sobre o avanço do neoconservadorismo no Brasil, em especial na educação brasileira, assim como trazer para o debate alguns aspectos sobre as origens desse tipo de pensamento e mostrar como o neoconservadorismo se articula com a chamada aliança da nova direita.

Assim, foi demonstrado que o neoconservadorismo, em sua versão do último quarto do século passado, rapidamente se associou a interesses de outros grupos, e antes dos anos de 1990 já estava configurada a constituição da Modernização Conservadora ou Nova Direita, como denomina Apple (2003), que articula tradições culturais conservadoras a interesses econômicos neoliberais e interesses religiosos conservadores, para impor a agenda neoliberal e neoconservadora na educação e nas definições do papel do Estado.

Essa restauração conservadora se confirmou como uma articulação que se constitui em várias regiões do planeta, em países líderes, tais como EUA, Inglaterra, Austrália, entre outros. O avanço dos valores dos neoconservadores pode ser sentido atualmente de forma global.

No Brasil, sente-se esse avanço, como ficou demonstrado anteriormente, em articulações no campo político – grupos religiosos e evangélicos no parlamento – e no campo educacional, com os inúmeros projetos de leis municipais, estaduais e federais apresentados, assim como na abrangência da atuação do movimento ESP em várias esferas de interferência. Além de ações localizadas, tem havido um interesse mais amplo de atuação e definição na agenda educacional, com participação insistente e intensa dos neoconservadores na elaboração e nas definições do PNE e da BNCC. O campo do currículo é um campo em disputa. As disputas em torno da BNCC deixaram clara a importância e o interesse que os grupos conservadores e neoliberais manifestaram quanto às definições curriculares e da agenda educacional do país.

Após o primeiro turno das eleições de 2018, ficam muito evidentes o crescimento e a abrangência do neoconservadorismo em todas as esferas sociais, o que impõe uma atenção muito grande para os problemas que serão enfrentados e possíveis retrocessos que rondam nosso país. A articulação das bancadas conservadoras de diferentes partidos no parlamento brasileiro, denominadas pela mídia como bancada do boi, da bíblia e da bala, mostra que grupos ruralistas, religiosos, do agronegócio e fascistas ampliaram sua representação política e vão tentar interferir nos principais temas sociais, culturais e educacionais.

Cabe ressaltar, ao final deste artigo, que o tema é por demais crucial para o futuro recente e de longo prazo, pois implica definições que são decisivas para a constituição daquilo que as escolas e a sociedade deverão ser instigadas a produzir. O globalismo neoconservador continua a avançar e a padronizar a educação, por meio de sistemas de avaliação, de reformas curriculares e exames globais, padronização que permite uma ação mais direta das organizações neoconservadoras e neoliberais para garantir seus interesses.

Referências

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3- Este deputado federal, atualmente preso por atos de corrupção de abrangência nunca vista anteriormente, embora expresse ideias conservadoras, não resguarda qualquer valor quanto a aspectos éticos e morais, por vezes presentes em certos grupos conservadores, inclusive pelo fato de que tais neoconservadores brasileiros, diferentemente dos grupos mais originais, não desprezam o Estado e ainda fazem uso abusivo do aparelho estatal, tanto para suprir seus próprios interesses privados quanto para traçar políticas públicas conservadoras.

4- A agenda conservadora na educação foi tema central da XI Reunião Científica Regional da Anped Sul, realizada na cidade de Curitiba no período de 24 a 27 de julho de 2016. No GT-Currículo, o professor Álvaro Hypolito apresentou o trabalho intitulado Agenda conservadora e políticas de currículo, em que mencionou várias ações no âmbito educacional brasileiro que apresentam características neoconservadoras, tais como muitos dos sistemas apostilados e iniciativas do movimento Escola sem Partido, com forte expressão na formulação de um currículo nacional conservador – BNCC –, como de fato acabou resultando. A BNCC é um bom exemplo para demonstrar a convergência de interesses neoliberais e neoconservadores.

5- Tendo em vista que o movimento neoconservador tem uma grande importância no cenário estadunidense, optamos, neste artigo, por fazer uso, centralmente, de referenciais que apontam como tal movimento surgiu nos Estados Unidos e como suas ideias passaram a ser difundidas nesse contexto. Temos o entendimento de que é possível vislumbrar, no Brasil, muitas das características do neoconservadorismo estadunidense, como será abordado mais adiante neste artigo. Queremos, contudo, destacar que consideramos que, atualmente, as ideias neoconservadoras estão presentes em muitos países, como é o caso da França, da Inglaterra e da Espanha (centralmente, através do xenofobismo) (McCOWAN, 2006). Todavia, o escopo deste artigo, como desde o início assinalado, não pretende tratar do neoconservadorismo mundial.

6- Apple dedica suas análises ao contexto estadunidense. Sempre sugere que sua proposição não seja tomada como um modelo, pois é uma análise construída para compreender as tendências dessa aliança nos EUA. Todavia, captura elementos importantes que contribuem para análises específicas a cada contexto local, já que de fato há uma tendência global desse fenômeno.

7- Foi nesse período que surgiram as ideias de direito de escolha, que estão na base das Escolas Charter e dos Vouchers (vale-educação). Quando houve a dessegregação das escolas nos estados sulistas nos EUA, muitas famílias de brancos se negavam a levar suas crianças para frequentar as mesmas escolas que as crianças negras, como descreve Milton Friedman no texto O papel do governo na educação (cf. BROOKE, 2012).

8- Ao exemplificar as questões relativas ao neoconservadorismo no contexto educacional brasileiro, optamos, neste artigo, por centrarmo-nos nas questões relativas a gênero. Temos ciência, contudo, de que as ideias neoconservadoras também se fazem presentes no que tange às relações étnico-raciais e às questões de classe e nacionalidade, entre outras.

9- Rodrigo Constantino é presidente do Conselho do Instituto Liberal e membro-fundador do Instituto Millenium. Atua no setor financeiro desde 1997. É formado em Economia pela Pontifícia Universidade Católica (PUC-RJ), com MBA em Finanças pelo IBMEC. Constantino foi colunista da Veja e atualmente é colunista de importantes meios de comunicação brasileiros, como a revista Isto É e os jornais Valor Econômico, O Globo e Gazeta do Povo. Ele defende abertamente as ideias do movimento ESP.

10- Silas Malafaia é filiado ao Partido Social Cristão (PSC) e defende as ideias do movimento ESP.

11- Olavo de Carvalho é um escritor, conferencista, ensaísta, jornalista e filósofo brasileiro. Trabalhou em revistas e periódicos, passando por veículos como Folha de São Paulo, Planeta, Bravo!, Primeira Leitura, Jornal do Brasil, Jornal da Tarde, O Globo, Época e Zero Hora. Também defende as ideias do ESP.

12- O Escola sem Partido foi tema da mesa redonda intitulada Trabalho docente e Escola sem Partido, no IX Encontro Brasileiro da Redestrado, realizado na cidade de Campinas no período de 8 a 10 de novembro de 2017. Nessa mesa redonda, a professora Iana Gomes de Lima apresentou o trabalho A rede do Escola sem Partido, em que mostrou uma rede contendo diferentes atores relacionados ao movimento, entre eles, Olavo de Carvalho, Rodrigo Constantino e o Instituto Millenium, já citados neste artigo.

13- Destacamos dois livros importantes recentemente publicados sobre o movimento Escola sem Partido: A ideologia do movimento Escola sem Partido: 20 autores desmontam o discurso, organizado pela Ação Educativa (2016); e Escola ‘sem’ partido: esfinge que ameaça a educação e a sociedade brasileira, organizado por Gaudêncio Frigotto (2017).

14- Grande parte das informações sobre o Escola sem Partido foram retiradas do site do movimento (<http://www.escolasempartido.org/>) e de sua página oficial no Facebook (<https://www.facebook.com/escolasempartidooficial/>). Acesso em: 26 jan. 2018.

15- A interlocução entre o MEC e o ESP ocorreu, centralmente, após a nomeação de Mendonça Filho como ministro da educação (MACEDO, 2017; MIGUEL, 2016). Exemplo de tal interlocução pode ser visto com a nomeação de Adolfo Sachsida, economista do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), como assessor especial do ministro da Educação. Contudo, horas depois, o cargo foi cancelado antes que Sachsida tomasse posse. Sachsida defende abertamente nas redes sociais o movimento Escola sem Partido. Para maiores informações, verificar: <http://educacao.estadao.com.br/noticias/geral,em-um-dia-mec-nomeia-e-exonera-apoiador-do-escola-sem-partido,10000062382>. Acesso em: 2 jan. 2018.

Recebido: 30 de Janeiro de 2018; Revisado: 26 de Setembro de 2018; Aceito: 30 de Outubro de 2018

Iana Gomes de Lima é professora adjunta da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e colaboradora no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade da Região de Joinville (Univille). É graduada em Pedagogia pela UFRGS, mestra e doutora pelo Programa de Pós-Graduação em Educação da mesma universidade.

Álvaro Moreira Hypolito é professor titular do Departamento de Ensino e do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Pelotas (UFPel). É pedagogo, licenciado em Artes e mestre em Educação pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e doutor em Currículo pela Universidade de Wisconsin-Madison. Pesquisador do CNPq.

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