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Educação e Pesquisa

versão impressa ISSN 1517-9702versão On-line ISSN 1678-4634

Educ. Pesqui. vol.46  São Paulo  2020  Epub 09-Out-2020

https://doi.org/10.1590/s1678-4634202046237291 

SEÇÃO TEMÁTICA: Infância, Política e Educação

Direitos geracionais e ação política: os secundaristas ocupam as escolas

Generational rights and political action: secondary school students occupy the schools

1- Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil. Contatos: lrcastro@infolink.com.br; retsg.ufrj@gmail.com


Resumo

A construção democrática apoia-se na participação política de crianças e jovens, não circunscrita às normatizações legais que estabeleceram a posição de sujeitos de direitos para as crianças. Neste trabalho, discutimos como a ação política dos estudantes secundaristas, ao ocuparem as escolas públicas ao longo de 2015 e 2016 no Brasil, politizam as relações intergeracionais em torno do bem educação e fazem emergir lutas para garantir interesses e prerrogativas da geração mais nova. Enquanto a educação sempre foi colocada como um direito das crianças e dos jovens, a análise que desenvolvemos aqui evidencia que esse direito se qualifica como um direito geracional que empurra para lados opostos, por vezes antagônicos, adultos e crianças. Metodologicamente, ao longo dos meses de abril a julho de 2016, acompanharam-se as ocupações secundaristas em diferentes cidades do Estado do Rio de Janeiro em 12 escolas públicas do estado. Esse acompanhamento, de cunho etnográfico, compreendeu visitas às escolas ocupadas, em algumas delas, mais de uma vez, agendadas de antemão com os comitês de comunicação de cada escola. Discute-se, a partir dos dados produzidos, como a luta pelos direitos geracionais parece se colocar como instrumento que visibiliza as contradições geracionais que o direito à educação comporta.

Palavras-Chave: Direitos geracionais; Ocupações nas escolas secundárias; Democracia; Politização; Relações geracionais

Abstract

Democratic construction relies on the political participation of children and youth, and is not limited to the legal norms that have established the position of subjects of rights for children. In this paper we discuss how the political action of secondary school students, through their occupation of state schools in 2015 and 2016 in Brazil, has politicized intergenerational relationships regarding education and has brought about struggles that aim to secure interests and prerogatives of the younger generation. Even though education has always been deemed a right for the younger generation, our analysis here shows that this right must be qualified as a generational right that places adults and children in opposite and often antagonistic sides. The methodological approach consisted in accompanying different occupations in the state of Rio de Janeiro, in 12 state schools, from April to July 2016. This ethnographic project included visits to the schools, sometimes twice to the same school, visits that had previously been arranged with the communication committees of the occupied schools. The obtained data is discussed here with regard to how the struggle for generational rights can be considered a tool which gives visibility to the generational contradictions implied in people’s rights to education.

Key words: Generational rights; Secondary school occupations; Democracy; Politicisation; Intergenerational relationships

Introdução

A formulação legal sobre a participação de crianças e adolescentes no ECA - Estatuto da Criança e do Adolescente (BRASIL, 1990) pode ser considerada evasiva. Embora o ECA tenha posicionado a criança como sujeito de direitos, e com isso propulsionado um significativo e enorme avanço na democratização das relações entre gerações, ele permaneceu lacônico no que diz respeito ao delineamento das prerrogativas de participação das crianças na construção da sociedade em que vivem. Assim, ao avanço nas garantias de proteção e cuidado não correspondeu a afirmação da relevância de que crianças e adolescentes pudessem assumir posições mais ativas como sujeitos e cidadãos, aspecto que já fora anunciado timidamente pela Convenção Internacional dos Direitos da Criança de 1989. Por outro lado, parece inegável que a própria ideia de se ver como alguém com direitos desatou nas crianças uma miríade de processos subjetivos e relacionais em que esses novos atores vão buscar operacionalizar, nas práticas sociais, como entendem os ganhos de sua nova posição frente aos adultos (CASTRO, 2012; REYNOLDS; NIEUWENHUYS; HANSON, 2006).

Esse novo cenário trouxe mudanças significativas nas bases normativas das relações intergeracionais e novos desafios a serem enfrentados. Nas escolas, por exemplo, tem-se observado um clima de tensões crescentes e conflitos abertos entre educadores e estudantes (CHIAPARINI, 2018; OLIVEIRA, 2014) em que a suposição de autoridade da figura do professor parece posta em questão (TORRES, 2014; SOARES, 2012; CALZAVARA, 2016). Para os docentes, essa situação só acrescenta mais desgaste a um pacto intergeracional já frágil (PAIME, 2009; PEREIRA, 2009), dada a precarização crescente das condições de ensino no sistema de educação pública do país.

Desde os anos 1990, as políticas governamentais neoliberais estabeleceram metas de expansão da oferta educacional, ainda que não acompanhadas por ações programáticas em relação à sua qualidade. As enormes desigualdades sociais e econômicas do país já há muito impactam a distribuição dos direitos à educação, reservando às camadas empobrecidas um sistema público de educação de qualidade questionável. Na ponta dessa cadeia, na sala de aula das escolas públicas, estão estudantes e professores que frequentemente se enfrentam em disputas, em um contexto crivado de problemas como evasão e abandono escolar, violência, apatia e dificuldades para aprender (BURGOS, 2014; OLIVEIRA, 2016; MEJIA-HERNANDEZ, 2017; SILVA; TEIXEIRA, 2019).

O presente trabalho propõe-se a analisar como a insatisfação dos estudantes, no âmbito de seu questionamento sobre a educação que recebem, tem inflexionado respostas crescentemente políticas, ao invés de permanecerem como queixumes (CASTRO et al., 2018), em um movimento que poderíamos chamar de “politização das relações geracionais” (CASTRO, 2018; CASTRO; NASCIMENTO, 2013).

Nessa direção, os estudantes têm reivindicado sua participação nos destinos da escola e nas decisões sobre a educação pública, assumindo uma fala e uma posição nos espaços públicos, onde defendem seus direitos à educação de qualidade. Trazemos como material de análise a pesquisa etnográfica acerca das ocupações das escolas públicas pelos secundaristas no Rio de Janeiro em 2016. Enquanto a educação sempre foi colocada como um direito das crianças e dos jovens, a análise que desenvolvemos, aqui, evidencia que esse direito se qualifica como um direito geracional que empurra para lados opostos, por vezes antagônicos, adultos e crianças. Significa que, ao afirmarmos a luta dos estudantes por direitos geracionais, estamos indicando o litígio entre as duas gerações sobre interesses geracionais diversos e antagônicos que se explicitam nesta luta. A educação coloca a geração mais jovem frente à importância inconteste de ver assegurados seus direitos à educação, algo que não parece tão claro para os adultos ou alguns deles.

Considerar a educação como direito geracional vai além da afirmação do direito geral à educação de todas as crianças, cujo dispositivo legal não tem sido suficientemente eficaz para promover o acesso de todas as crianças a uma educação pública de qualidade. A luta política dos estudantes nas ocupações viabilizou alargar a compreensão da norma do direito positivo – o direito geral à educação das crianças – qualificando-a como uma prerrogativa específica e geracional dos mais novos. Pela ação política dos estudantes nas ocupações, puderam aparecer no espaço público os atravessamentos de diferentes interesses que o direito à educação comporta, assim como os conflitos e as contradições das posicionalidades das duas gerações frente à demanda e à oferta da educação.

Quando evocamos o direito à educação, há distintos interesses que são mobilizados para cada uma das gerações, conduzindo a um campo de disputas e antagonismos – ou seja, ao campo político. Ao evidenciar qual a importância que a educação assume para os jovens e como eles avaliam a atual sociedade dos adultos em termos de seu desempenho de deveres geracionais, este trabalho discute como, em países como o Brasil, no seu atual estágio de construção democrática, a educação torna-se um bem em disputa no campo político, dando lugar a antagonismos intergeracionais acerca desse bem no âmbito de condições crescentes de desigualdades sociais.

A educação como demanda geracional e a participação política dos estudantes

O objetivo nesta seção do trabalho é explorar como a educação torna-se uma questão política para a geração mais nova, levando à construção de um campo de antagonismos (MOUFFE, 1993) entre as duas gerações. A partir da sua vivência de insatisfação com o status quo da educação pública nas escolas, os mais novos vão construir demandas sobre o que lhes é devido, como grupo geracional, por meio da coletivização de narrativas e pontos de vista. Além disso, a quem essas demandas devem ser endereçadas e como implica a construção de símbolos, identificações e estratégias de ações coletivas.

Compreendemos a participação política de crianças e jovens diferentemente de um enquadramento via “socialização política” (FENDRICH; TURNER, 1989; FLANAGAN; SHERROD, 1998), no qual pesa o enquadramento pedagógico (CASTRO, 2009) que concebe procedimentos eficazes de preparar e ensinar as crianças, principalmente no âmbito da família e da escola, na direção de determinados comportamentos, disposições e valores políticos e cívicos.

Rancière (1995; 1996) ajuda-nos a perspectivar o político sob uma compreensão diferente, tomando-o como um ato de desclassificação da ordem social, ensejando um movimento de litígio sobre o que é visto, dito e escutado. Disputa-se, portanto, sobre o que deve ser levado em consideração para além do que está dado e estabelecido. Com isso, introduz-se o dissenso e a desordem no que consiste a realidade. Nessa veia, a política, como ação e processo de subjetivação, pode incluir crianças e jovens, não apenas se preparando para um estágio ulterior, mas como aqueles cujas possibilidades identificatórias na vida presente põem em curso reenquadramentos na ordem das coisas (RANCIÈRE, 2004). Nesse momento, esses sujeitos, que são geralmente considerados indivíduos ainda não aptos para a vida política, se fazem visíveis e se lançam no mundo da enunciação.

No Brasil, e em outras partes do mundo, a participação social e política dos jovens não se circunscreve às expressões mais convencionais da vida política. Os próprios jovens têm questionado de que se trata fazer, ou ser político, ou de que modos os jovens gostariam de participar da vida política (KOVACHEVA, 2005). Por exemplo, para os hip hoppers brasileiros entrevistados durante o Seminário sobre Juventude e Política (MAYORGA; CASTRO; PRADO, 2012), a política não é exatamente a conquista do poder, mas, principalmente, mobilizar-se e mobilizar os outros acerca de causas de transformação pessoal e social.

A participação política tornou-se visível na cena pública, em um primeiro momento, para a categoria juvenil por meio do seu ativismo como estudantes universitários. Esse engajamento data das primeiras décadas do século XX no Brasil (RODRIGUES, 1966) e esteve atravessada pelas demandas do movimento dos trabalhadores. A União Nacional dos Estudantes (UNE) foi fundada em 1937 no Brasil. Em que pesem as enormes dificuldades de organização política ao longo da ditadura de Getúlio Vargas, os estudantes conseguiram formar os primeiros comitês juvenis nos partidos políticos nacionalmente (POERNER, 2004; MENDES JR., 1982). O movimento estudantil universitário reivindicou e se engajou nas lutas nacionais por um leque diverso de demandas – desde a luta contra o nazismo e o fascismo, pela nacionalização do petróleo e da indústria siderúrgica até a luta contra o analfabetismo.

Os fundamentos ideológicos da militância estudantil foi propiciada pela presença dos partidos políticos nos movimentos universitários. Foracchi (1965) lembra-nos da associação entre a formação da categoria de estudante universitário e a dinâmica das classes sociais no Brasil da segunda metade do século XX. Basicamente recrutados de famílias da pequeno-burguesia, os jovens universitários engajados nos movimentos estudantis eram, na sua grande maioria, homens e brancos, em um país cuja população jovem era (e ainda é) de jovens negros. Naquele momento, a visibilidade da categoria da juventude na cena pública até a redemocratização do país em 1984 não esteve imbuída de interesses e reivindicações geracionais, visando especificamente a prerrogativas geracionais como a educação. Vai ser somente quando da escalada das reformas neoliberais no sistema educacional, a partir dos anos 90, que se desenvolve uma conscientização juvenil emergente sobre a educação, como aquilo que os jovens deveriam receber dos adultos, ou seja, a dívida geracional dos adultos para com eles. Dois aspectos notáveis, nesse momento, devem ser destacados: em primeiro lugar, são os estudantes mais novos, secundaristas, das escolas públicas que tomam a cena pública; em segundo, o fato de que o movimento secundarista compreende principalmente os e as jovens negras das classes populares.

Os estudantes secundaristas das escolas públicas ocuparam cerca de 800 escolas de diferentes estados brasileiros ao longo de 2015 e 2016. Esse fenômeno – não apenas por sua magnitude, mas também pela sua novidade – deve ser contextualizado no espaço político mais amplo e na sequência das medidas educacionais tomadas pelo Estado que o antecederam. Em 2013, uma conflagração de manifestações de rua tomou o Brasil. Foi a primeira vez, desde o período da redemocratização, que tantas pessoas expressaram abertamente sua indignação. A despeito das controvérsias que explicam esse fenômeno (SCHERER-WARREN, 2014; PINTO, 2017), essas manifestações revigoraram politicamente a cena pública. Em 2014, Dilma Rousseff foi reeleita como presidenta depois de uma campanha eleitoral turbulenta, cujos efeitos culminaram no golpe parlamentar e midiático que a destituiu em maio de 2016. Michel Temer, o vice-presidente que a substituiu, promulgou logo depois uma Emenda Constitucional (PEC 241/55) que congelou os gastos públicos com educação e saúde.

Naquele momento, os governos estaduais criavam mecanismos de solucionar sua insolvência financeira por meio da redução de gastos com a educação: no estado de Goiás, com projetos de cessão de escolas públicas para particulares e sua militarização; no estado de São Paulo, com projetos de fechamento de escolas e seu redimensionamento; no estado do Rio de Janeiro, com o não pagamento e o congelamento dos salários dos professores. A educação nas mãos dos governos estaduais sofria sérios ataques. Ao longo de 2015, os estudantes ocuparam mais de 200 escolas no estado de São Paulo. A onda das ocupações dos secundaristas rapidamente propagou-se no país, espelhando os acontecimentos memoráveis de ocupações de escolas que tinham acontecido no Chile em 2006, envolvendo mais de 600 mil estudantes (ZIBA, 2008). Em março de 2016, os professores das escolas estaduais públicas do Rio de Janeiro iniciaram uma greve, porque não estavam recebendo seus salários. Um mês depois, explodiu o movimento de ocupações de escolas pelos secundaristas no Rio de Janeiro.

Esse movimento de ocupações tem recebido atenção considerável por parte dos pesquisadores a partir de uma gama de perspectivas que indicam a emergência desse novo ator na cena pública: os estudantes secundaristas que, até então, só tinham participado de lutas políticas com outros atores, como os estudantes universitários e os trabalhadores. As pesquisas sobre o movimento secundarista tem enfatizado o poder provisório e a força virtuosa desse processo (CROCHIK; CORTI, 2018) como uma oportunidade valiosa do exercício da inteligência coletiva (COSTA; SANTOS, 2017), da aprendizagem comunitária (CARVALHO; MEDAETS; MEZIÈ, 2019) e de relações democráticas e horizontais (GAGEIRO; POLI, 2019). O poder criativo e combativo da resistência estudantil foi louvado e saudado (ALVIM; RODRIGUES, 2017) como uma forma de educação política autônoma (CATINI; MELLO, 2016), de defesa da cidadania juvenil e seus direitos educacionais (OLIVEIRA, 2019; RIBEIRO; PULINO, 2019), de expansão de repertórios de ação política sob relações de poder repressoras (BARRETO, 2016), de conscientização e práxis políticas (ROSA; SANDOVAL, 2019) e do exercício da descolonização da escola e sua democratização (CORSINO; ZAN, 2017).

Tem sido argumentado que as ocupações das escolas pelos secundaristas revelaram o fracasso de um modelo burocratizado da educação que não leva em conta as expectativas e as demandas dos jovens das classes populares (CORTI; CORROCHANO; SILVA, 2016). Os estudos sobre as ocupações parecem convergir em uma avaliação louvável das ações políticas dos secundaristas quem, pelo país afora, desafiaram seus pais, a polícia, os próprios colegas e o governo em prol de suas reivindicações de uma educação de qualidade. No entanto, há também estudos que vão em uma direção mais crítica ao apontar que o viés político do movimento fez valer ganhos subjetivistas, respaldados na vivência pessoal e na aprendizagem, no empoderamento e na identidade (GOMES, 2017).

Há, portanto, interpretações em disputa acerca do movimento e de como os estudantes, por eles, avaliam os ganhos que o movimento proporcionou. Groppo; Rossato; Costa (2018), em um artigo interessante, mostram como as memórias de muitos secundaristas do estado de Minas Gerais evocam um grande mal-estar e ansiedades, similares àquelas causadas por um evento traumático. Os autores consideram que outras pesquisas acerca das trajetórias desses estudantes são necessárias, de modo que interpretações negativizadas, ou idealizadas, possam ser mais aprofundadas.

No que se segue, apresentamos uma análise das conversas e da experiência de convivência com os estudantes secundários no estado do Rio de Janeiro que ocuparam as escolas ao longo de 2016. Nosso objetivo é analisar como a educação é considerada pelos estudantes como aquilo que lhes é devido pelos adultos, abrindo assim um campo de antagonismos com aqueles que se opõem, negam ou ridicularizam essas demandas. Estamos interessadas nas narrativas dos secundaristas sobre as ocupações, visando a compreender como a educação politiza as relações intergeracionais e se reveste de um direito geracional.

O campo empírico de pesquisa das escolas ocupadas

Ao longo dos meses de abril a julho de 2016, o grupo de pesquisadores, sob a coordenação da primeira autora, acompanhou as ocupações secundaristas em diferentes cidades do Estado do Rio de Janeiro em 12 escolas públicas do estado. Esse acompanhamento compreendeu visitas às escolas ocupadas, em algumas delas mais de uma vez, agendadas de antemão com os comitês de comunicação de cada escola. As visitas duravam o dia inteiro, quando os pesquisadores puderam conversar com os estudantes, individualmente ou em grupo, acompanhar as atividades daquele dia na escola – aulões, saraus, jogos ou, simplesmente, as atividades de cozinhar e limpar.

As conversas foram, algumas delas, gravadas com a permissão dos estudantes, ou registradas posteriormente pelos pesquisadores. Estabeleceu-se com os estudantes ocupados uma relação de convivialidade em que os pesquisadores participaram das atividades em curso, quando convidados, e escutaram suas narrativas e testemunhos. Não havia, portanto, um roteiro prévio do que iríamos fazer nas escolas, mas, apenas, um estar junto com os estudantes e acompanhá-los no que surgisse. Quase sempre os estudantes estavam preparados e dispostos para acolher todos e todas que quisessem conhecer as escolas ocupadas, bastando que se agendassem as visitas. Em muitas escolas, houve convite para que voltássemos, o que o fizemos, aprofundando, portanto, as relações já estabelecidas.

No final do mês de junho, um grupo de pesquisadores de diferentes universidades do Rio de Janeiro, dentre os quais a primeira autora deste trabalho, organizou um colóquio regional chamado Ocupa Ensino Médio, que aconteceu na Associação Brasileira de Imprensa, no Rio de Janeiro. Nele, doze estudantes de diferentes escolas secundárias foram convidados a discutir suas perspectivas sobre o movimento da ocupação numa sessão conjunta, que foi gravada, e também constitui objeto da análise que se segue. Assim, as falas e os depoimentos dos estudantes ao longo das visitas, assim como a discussão gravada no evento supracitado constituem o material empírico analisado em seguida.

A análise buscou identificar três dimensões principais extraídas das próprias falas dos estudantes: a) como os estudantes avaliam a educação que lhes é ofertada: suas frustrações, críticas e expectativas; b) o movimento de coletivização da luta estudantil; c) como os adversários foram construídos e a quem as demandas estudantis e reivindicações são endereçadas.

I – O que os estudantes pensam da educação?

Nesta dimensão analítica, examinamos como os alunos avaliam o processo educacional: quais são suas concepções de educação, que propostas eles têm para a educação que desejam receber. Um dos aspectos mais reafirmado refere-se ao desconforto com o modelo de transmissão de conhecimento norteado por uma relação hierárquica entre professores e alunos. O professor adulto é visto como proprietário do conhecimento que é repassado ao aluno receptor, que deve ouvir silenciosamente o conteúdo. Os alunos afirmaram que a escola deveria ser um local onde o conhecimento da vida está incluído. Um deles diz:

A gente quer participar do plano pedagógico, nós não queremos voltar pra sala de aula e ter o professor como detentor do conhecimento e a gente como um depósito. Tem que haver uma troca de experiências e vivências, uma troca de saber. (Ocupa Ensino Médio, M.).2

Segundo os alunos entrevistados, o modelo de transmissão reproduzido na maioria das escolas estaduais do Rio de Janeiro não favorece o pensamento autônomo. De acordo com uma aluna “a educação pública não faz a gente pensar, é só aquele negócio de decorar e fazer a prova” (L. R.; M.). Muitos deles qualificaram esse modelo como baseado em conteúdo, impróprio para suas realidades:

Eu acho que a educação do Rio de Janeiro e do Brasil é muito conteudista. Só pensa em cuspir conteúdo pra gente e pronto. Se você tirar zero, você é burro. Se você tirar dez, você é inteligente. Não é isso! (H.; F.).

Eles enfatizam o conflito entre memorizar o conteúdo e aprendê-lo por meio da participação crítica na sua construção. Ser inteligente, de acordo com as falas dos alunos, não está relacionado ao ato de memorizar, mas ao desenvolvimento da capacidade de participar da construção coletiva de um determinado conhecimento. Eles se sentem subestimados, porque servem apenas como quem precisa memorizar, fazer testes para se formar e sair da escola supostamente capazes de desempenhar seu papel no mercado de trabalho. O modelo baseado em conteúdo, do ponto de vista deles, é definido de acordo com as demandas do mercado de trabalho, como se a escola visasse apenas a preparar a força de trabalho para ser absorvida e não preparar para a vida. Em oposição ao modelo baseado em conteúdo, é possível identificar em seus discursos o desejo de outros modelos pedagógicos mais democráticos de produção de conhecimento.

Os alunos consideram importante que a aprendizagem escolar possa dialogar com o seu cotidiano. Os alunos também reclamam sobre como a interação pedagógica reforça a passividade e uma atitude não crítica por parte dos alunos.

O aluno tem mente, tem pensamento e às vezes isso deveria ser mais exposto durante as aulas normais. Por exemplo, aula de história, às vezes o professor chega, fala de ditadura, fala de política e muito aluno não entende política. (B.; F.).

Durante as ocupações, e com a parceria de alguns professores, os alunos puderam experimentar outra maneira de aprender. Os alunos disseram que aprenderam muito com a ocupação, significando que era possível refletir acerca da realidade do mundo, por meio dos chamados aulões e palestras.

As críticas ao modelo pedagógico predominante na escola pública estão ligadas, do ponto de vista dos alunos, à absoluta precariedade da educação pública. Eles avaliam as condições em que estudam como muito ruins.

A situação é tão ruim que os professores precisam usar seu próprio dinheiro para fazer cópias dos exames, porque não há papel na escola. Eles precisam trazer tinta para os marcadores. (H.; M.).

As escolas estaduais são vistas como não recebendo investimentos suficientes do governo, possuem infraestrutura precária e mal preservada, comida ruim, não possuem equipamentos nem materiais básicos para as aulas, porque, acima de tudo, a escola é voltada para os jovens de classe social menos privilegiada. Para muitos estudantes, essa precariedade é o cerne da comparação entre escolas estaduais e privadas em detrimento da primeira. Essa comparação é experimentada pelos estudantes das escolas estatais como segregação e discriminação.

A comida – lanche e almoço oferecidos nas escolas – foi uma demanda importante mencionada pelos alunos, pois, em muitos casos, a grande maioria não tem muito o que comer em casa.

Comida, professores, papel, não há papel... o lanche é muito escasso. O professor não come um lanche. Não tem papel toalha no banheiro... (M. M.; F.).

Durante as ocupações, os estudantes começaram a questionar os critérios de distribuição de fundos entre as escolas pelo governo. Eles acreditam que sua participação deva influenciar as decisões que lhes dizem respeito.

O aluno quer ter voz e a gente tem uma lei na base de diretrizes do ensino... Se tem o artigo 14 que deixa muito bem claro que um colégio tem que ter uma gestão democrática e isso não ocorre, então chega a ser vergonhoso você colocar uma reivindicação, uma lei, você cobrar que seu governo obedeça a uma lei. (M. M.; F.).

Nas entrevistas, há grande insatisfação com a maneira como os funcionários da escola são indicados pela Secretaria de Educação do Estado, quando as disposições legais dizem que o diretor da escola deve ser eleito pelos membros da comunidade educacional:

Queremos a participação dos alunos nesse processo. Essa participação compreende a eleição para diretor e queremos que ele se concentre em nós, uma gestão escolar que representa os alunos e não uma que é imposta. (C. A.; M.).

A experiência vivida de processos democráticos ao longo das ocupações aumentou a demanda para mais esclarecimentos acerca do financiamento das escolas e da gestão das decisões que lhes estão relacionadas.

II – O movimento de coletivização para a luta e para a ocupação: a construção de um ‘nós’ estudantil

Ocupar as escolas exigiu dos estudantes o esforço de coletivizar suas insatisfações e frustrações em torno da construção de demandas e propostas sobre a educação. Exigiu, também, o esforço de coletivizar ações, desde as relacionadas a como ocupar a escola e organizar o dia a dia na ocupação, como também aquelas direcionadas ao público externo – os pais, os professores, a vizinhança. Nesse processo, destaca-se a relevância da construção de um sentido coletivo das ações e dos discursos e de uma identidade e imagem pública do movimento estudantil secundarista: o que querem, como e por que justificam suas ações ao ocuparem as escolas.

Os estudantes relataram que o processo coletivo da ocupação não foi construído de forma harmoniosa. Foi um processo marcado por conflitos e divergências. Mais que isso, as divergências foram entendidas, frequentemente, como parte de um processo com múltiplas perspectivas. Muitos alunos não apoiaram as ocupações, seja porque temiam as consequências negativas de não poder frequentar as aulas, seja porque se identificaram com os discursos de que as ocupações não iriam levar a nada ou eram simplesmente baderna estudantil. No intuito de fortalecer o movimento de ocupação, os estudantes tiveram de criar estratégias para lidar com o dissenso. Eles relataram que receberam muito apoio, mas também tiveram de enfrentar ou contra-argumentar com muitos outros alunos, pais, professores, diretores e vizinhos da comunidade que eram contra o movimento de ocupação nas escolas.

Algumas pessoas de fora não concordam com o movimento, porque acham que ele pode atrapalhar os estudos e o curso pré-estabelecido de se formar e prestar ENEM e vestibular. (C.; M.).

Alguns grupos contrários à ocupação uniram-se para criar o movimento Desocupa. Muitos alunos, principalmente do último ano do ensino médio, sentiram-se prejudicados supondo que o ano letivo pudesse ser anulado, de maneira a impedi-los no processo de entrada no ensino superior.

Teve o desocupa... teve uns 6 alunos daqui da escola e uns 15 ou 20 alunos de outras escolas a mando da direção daqui e com o consentimento da escola deles. Vieram pra porta da escola com pedaços de caixotes falando que era pra desocupar... Eles não sabiam nem o que estava fazendo aqui. A única movimentação do Desocupa foi essa. Teve só essa e depois mais nada, só algumas pequenas ofensas na internet, mas nada nos abala, nada contra isso, e a gente segue de boa, firme. (R. P.; M.).

A existência de posturas contrárias ao movimento foi tomada como um desafio, pois os estudantes que ocuparam as escolas acreditavam que poderiam convencer todos que se posicionavam de forma contrária às ocupações. Seguindo as deliberações das assembleias, os alunos pareciam dispostos a desconstruir uma imagem preconceituosa das ocupações e dos jovens. Alguns entrevistados relataram “a gente tá tentando fazer bastante coisa pra população. Sábado a gente vai fazer reunião de pais, uma feijoada para eles para mostrar a ocupação” (B.; F).

Muitos entrevistados relataram que houve pais (responsáveis) que achavam que a ocupação não seria eficiente e que seria apenas baderna, então não apoiaram a participação de seus filhos. Mas, quando os pais tinham a oportunidade de conhecer o movimento, passavam a apoiar:

Os pais não apareceram no dia. Mas todo mundo que vem aqui, os pais que procuram aqui eles não vêm dizendo que são contra, eles vêm sem informação. Aí depois que entram e veem o estado da escola, saem tirando foto, querendo denunciar e apoiando a causa. Isso tem acontecido direto. (L. R.; M.).

Além disso, disseram que receberam o apoio da comunidade do entorno e atribuem isso às ações de organização criadas e gestadas em espaços coletivos de decisão. A partir do momento em que decidiram ocupar, os jovens organizaram-se coletivamente e deliberaram sobre questões concernentes à ocupação. Dessa forma criaram as comissões encarregadas de funções específicas.

As redes sociais tiveram um papel imprescindível no fortalecimento e ampliação do movimento de ocupação. Por meio dos grupos Comando Ocupa Tudo no Facebook e no WhatsApp podiam relatar problemas e soluções, contribuindo com a vivência de outras escolas ocupadas. De forma geral, as comissões eram organizadas de forma semelhante em todas as escolas ocupadas: comissões de comunicação, atividades, limpeza, comida, segurança, monitoria e arrecadação.

Teve uma estudante que veio aqui pegar informação pra ver como funcionava… Então, assim, tá um pegando do outro, das outras escolas ocupadas. (A. C.; M.).

Em todas as ocupações, era comum os jovens afirmarem a forma de organização coletiva das ações. O modus operandi da ocupação, decidido diariamente através de assembleias, era afirmado com veemência nas entrevistas, no sentido de contrapor o modo como a sociedade e a mídia definiam o comportamento negativo atribuído ao jovem. Os ocupantes queriam provar a todo momento que não estavam brincando, nem fazendo balbúrdia.

Tudo o que a gente faz aqui eles falam que é bagunça. A gente botar um som aqui para poder fazer uma limpeza, falam que a gente tá fazendo bagunça. A gente liberar a piscina num domingo, como recreação, eles falam que é bagunça e isso acaba sendo um pouco chato. (B.; M.).

Mostrar com afinco a forma operacional como funcionavam as ocupações significou dizer que aqueles coletivos de jovens podiam atuar com responsabilidade, eficiência, discernimento.

Os jovens entrevistados falaram sobre as regras de convivência construídas para proibir práticas como fumar tabaco ou maconha, fazer sexo no contexto das ocupações:

É uma coisa que a gente determinou na assembleia de ontem, não fumar (maconha) dentro do colégio porque não é legal e vai enfraquecer o movimento. Nem no lado de fora do colégio (C.; F.).

Acho que a melhor resposta que a gente pode dar é organização. Se eles falam mentiras, calúnias, a gente se organiza mais ainda pra mostrar que não é assim. (H. S.; F.).

Sabendo da situação de outras escolas, seja indo até elas para oferecer ajuda, ou pelas redes sociais, os alunos apropriaram-se de um sentimento de coletividade, no sentido de que estavam lutando não só por sua escola, mas sim por todas do estado. A partir da convivência, os alunos criaram um sentimento de coletivo e de união entre eles, o que não era sentido anteriormente.

III - A politização das relações entre jovens e adultos e os direitos geracionais

A insatisfação dos alunos com a educação pública continua sendo uma característica fundamental de seus relatos. Um sentimento crescente de ser desconsiderado, de não ser ouvido e não receber o suficiente em termos de educação é revelado:

Nós, estudantes, estamos lutando pelo aprimoramento da infraestrutura de nossas escolas - os laboratórios, nosso ginásio, nossas salas de aula -, a melhoria na qualidade dos alimentos que temos aqui, para ter eleições diretas para o diretor e o direito de associação gratuita de alunos... Os professores devem receber seus salários para vir ao trabalho e o que temos agora é o abatimento de tudo. (C.; F.).

Por muito tempo, a insatisfação dos alunos foi relatada em estudos acerca do tema como um sintoma de mal-estar na escola, explicitado pela apatia, alta porcentagem de evasão dos alunos e, com bastante frequência, surtos localizados de hostilidade e comportamento violento dos alunos. Curiosamente, no cenário atual, a insatisfação dos alunos alimentou ações coletivas em prol da rebeldia e rejeição do atual sistema de educacional estatal. Ao ocupar escolas, os estudantes estavam colocando, em primeiro plano, uma recusa direta da educação que estavam recebendo. Como colocado por um aluno: “nós, alunos, percebemos: ‘minha escola é uma merda’... não posso ocupar também?” (L. R.; M.).

No início de março de 2016, professores do estado do Rio de Janeiro entraram em greve, o que afetou profundamente o moral dos alunos. Como colocado por esses alunos: “os professores das escolas públicas estão nos ensinando sobre como lutar... como temos que agir em nossa vida diária para enfrentar a injustiça social.” (A. C.; M.).

Aproveitamos a greve deles (professores) porque eles estão realmente lutando não apenas por conta própria, mas por nossa conta. Por uma educação melhor e tudo isso. (H.; F.).

Nesse contexto, como reconhecido pela maioria dos estudantes nas ocupações, os professores tornaram-se um aliado claro dos alunos que viram uma convergência de interesses entre a luta deles e a de seus professores:

Vimos que, se não fosse a greve dos professores, se eles não parassem de trabalhar, estaríamos na sala de aula como sempre... não estaríamos pensando nas condições de nossa educação... (M. M.; M.).

À medida que os alunos ocupavam as escolas, muitos professores procuraram apoiá-los e se ofereceram para realizar oficinas acerca de assuntos que normalmente não são discutidos nas aulas diárias. Parecia que os professores passaram a ser vistos como parte do grupo oprimido tanto quanto os próprios alunos.

Nós, estudantes, apoiamos a greve dos professores incondicionalmente porque é impossível estudar, entrar em uma sala de aula muito precária e não receber um salário no final do mês. (A. C.; F.).

Portanto, a configuração de um campo antagônico, na luta dos estudantes ao longo das ocupações das escolas, preservou os professores que, compartilhando com os alunos os efeitos negativos de um sistema educacional estadual precário, foram incluídos no mesmo grupo oprimido dos alunos. Os inimigos dos estudantes eram os que estavam no governo – os políticos – que, deliberadamente, conduzem políticas educacionais em detrimento dos jovens, especialmente aqueles de classe baixa.

De fato, descobrimos que nosso verdadeiro inimigo é Pezão (o governador do estado), Dornelles (o vice-governador) e toda essa burguesia que trabalha e vive o dia todo para pensar em maneiras de subtrair nossos direitos para que eles acumulam mais dinheiro… (A. C.; F.).

Como esse jovem coloca, os políticos servem a uma elite econômica cujos interesses residem na acumulação de capital, desconsiderando quaisquer ideais republicanos de equidade e justiça social. A oposição política dos estudantes é direcionada àqueles que detêm o poder político e que negligenciam seu cargo sendo cooptados pelas elites econômicas. À medida que os estudantes justificam o porquê de ocupar as escolas, eles dizem que as ocupações escolares consistem em um meio estratégico para chamar a atenção para a questão educacional, para a degradação das escolas, de modo a pressionar o governo a mudar as políticas educacionais. Para eles, há ali uma crise na educação, demonstrada pelo fato de que nem os salários dos professores são pagos, mesmo que o estado possa desperdiçar dinheiro reformando edifícios, como o estádio de futebol.

As narrativas dos jovens apontam para os diferentes atores que se apresentam como adversários no presente contexto: “Para o bem ou para o mal, o Estado quer que desocupemos as escolas... nossas preocupações - nossas reivindicações - não os interessam” (H.; F.). Para alguns jovens, são os políticos, em geral, que desempenham um papel negativo; para outros, são os representantes educacionais estaduais (o SEEDUC). Os relatos dos alunos indicam um campo abrangente de antagonismos. Por um lado, os políticos, especialmente o Executivo, se tornaram seu principal alvo de oposição política; mas também, como vimos, a elite econômica e os representantes da Secretaria Estadual de Educação (SEEDUC). Além disso, na maioria das vezes, os diretores das escolas foram acusados de defender os interesses do governo do estado, impedindo os estudantes de constituírem livremente seus conselhos e de ocupar as escolas.

No Rio de Janeiro, o projeto de lei estadual 3067/1998 legislou sobre a autonomia das escolas estaduais, deixando em branco a questão de como os diretores deveriam ser nomeados. Frequentemente, a indicação política ainda acontecia nas escolas estaduais. Em muitos outros estados, a provisão do cargo de direção já havia sido estabelecida por consulta à comunidade, combinada ou não com outros mecanismos, como mérito acadêmico e avaliação pública. Portanto, o protesto dos estudantes foi direcionado ao autoritarismo dos diretores, juntamente com a demanda de eleição direta desse cargo. Conforme mostrado por um aluno que diz: “se conseguirmos expulsar essa diretora, isso será ótimo... ela é o horror desta escola.” (L. R.; M.) ou “em muitas ocupações, os diretores proibiram as assembleias e as manifestações dos estudantes. Mentiram para nós, fizeram de tudo para impedir que ocupássemos as escolas...” (R. P.; M.).

Nesse contexto, os diretores das escolas consistiram em um inimigo direto das ações dos estudantes, apesar de esses reconhecerem que alguns diretores/diretoras apoiaram suas ações, ainda que não tivessem conseguido assumir publicamente essa postura política. Para os estudantes, a maioria dos diretores havia se transformado em pessoas passivas que apenas obedeciam às regras vindas de cima (Estado).

Os estudantes estavam preocupados que sua ação política na ocupação fosse corretamente interpretada pelos pais, pela comunidade onde a escola estava e pela população em geral. Nesse sentido, havia uma preocupação em construir um discurso legitimador das ocupações, considerada uma ação radical e urgente, contra a condição difamada da educação estatal e a profunda negligência em relação à necessidade de melhorias educacionais para os jovens menos abastados economicamente.

Temos a preocupação de mostrar a todos que vêm aqui, à população, aos pais e assim por diante que a escola é limpa, que não estamos fazendo baderna. (B.; F.).

Em muitas ocupações, houve solidariedade dos pais, da comunidade e, até, de policiais chamados pelas autoridades estaduais. Em outras, os alunos tiveram de enfrentar um conflito aberto com os pais que queriam que seus filhos frequentassem as aulas. Um aluno coloca da seguinte maneira: “essa luta não é para causar danos a ninguém, é para parar de sermos maltratados. Portanto, temos que conquistar todos aos poucos.” (H. S.; F.).

Como os alunos tiveram de enfrentar a oposição de seus próprios pais, dos colegas que temiam não fazer os exames finais e da mídia que, muitas vezes, criminalizou as ações dos estudantes como vândalos, tiveram de criar contra-argumentos para legitimar suas reivindicações e sua posição singular como ator político no debate sobre educação. Isso acarretou a produção de narrativas que destacavam o “despertar de sua consciência sobre a realidade e de si mesmos”, “o avanço dos alunos do ensino médio”, “tornar-se conhecedor dos próprios direitos” e “construir o próprio pensamento sobre as coisas”. Contra a acusação de que ainda eram menores, eles responderam que “eles tinham cabeça, voz, não estavam sendo manipulados…”.

De fato, os alunos desprezaram e recusaram-se a aceitar a posição de invisibilidade, não autorização e não qualificação nesse debate. Essas narrativas questionaram a diferença geracional em seus fundamentos ideológicos, como falta de maturidade, falta de experiência, vulnerabilidade à manipulação e assim por diante, ressaltando o direito dos alunos de se expressarem: “se o diálogo for impossível, vamos gritar que temos o direito de dialogar” (A. C.; F.).

A construção discursiva que se adensou ao longo do movimento sobre aqueles que se constituíam como seus inimigos – quais os adultos contra os quais deveriam lutar –, levou em conta a diferença geracional como fator decisivo para reivindicar um tratamento justo entre as gerações e reivindicar, como direito, o que lhes deveria ser garantido pela geração mais velha.

Considerações finais

A legislação brasileira sobre os direitos das crianças e jovens rearranjou as relações intergeracionais colocando novos desafios e embates para as duas gerações. Neste trabalho, enfocamos a primeira grande greve de ocupação dos estudantes secundaristas que visibilizou a ação política de estudantes das classes populares que ocuparam a cena pública com demandas de uma educação de qualidade. As escolas ocupadas podem ser consideradas como a invenção de um evento politico geracional, uma vez que ele representa a construção de uma agenda política acerca da educação pelos estudantes como um direito geracional. Por um lado, estudantes e professores se tornaram, pelo menos temporariamente, aliados, mesmo se, contraditoriamente, no cotidiano da escola a hostilidade mútua tenha lugar. Nesse sentido, a aproximação política da agenda estudantil com a dos professores constitui um ganho político, na medida em que os estudantes puderam identificar claramente seus adversários no campo político.

Por outro lado, a luta dos estudantes está endereçada aos adultos que compõem o poder político e econômico, esse que solapa a construção de uma sociedade com equidade, subtraindo das crianças e jovens das classes populares o que lhes é devido em termos de direito educacional. Frequentemente, aliam-se a esses poderes os representantes dos órgãos educacionais nas instâncias de decisão – os diretores de escola, os gestores nas secretarias de educação.

A demanda por educação como um direito geracional invoca a legitimidade de participação política dos estudantes na construção democrática. É como se eles se autorizassem a demandar, por eles mesmos, e na forma como lhes parece adequada, o que é justo receber da geração anterior. Como coloca Tomizaki (2018), as relações intergeracionais são essencialmente contraditórias e a cada momento histórico novos emergentes darão o tom desse encontro, nem sempre pautado pela solidariedade intergeracional. Assim, no Brasil, o campo de antagonismos entre as gerações se dá em torno da educação, como um bem perversamente distribuído; em outros países, os direitos geracionais parecem politizar outros campos, como o do cuidado com o meio ambiente, por exemplo, o que leva ao ativismo jovens como Greta Thunberg. A perspectiva da justiça intergeracional (HISKES, 2008; WEISS, 1990) abre um campo de litígio entre as gerações. Em cada contexto histórico e político, as novas gerações parecem assumir, paulatinamente, a posição de demandar o que lhes parece justo no cuidado consigo e com o mundo. Resta saber como as gerações mais velhas enfrentarão esse novo desafio do campo político.

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2- Buscamos identificar as escolas aqui somente com suas iniciais; no caso de ser uma fala a partir do evento identificamos como Ocupa Ensino Médio. A outra inicial refere-se ao gênero, M para masculino e F para feminino.

Recebido: 28 de Abril de 2020; Revisado: 01 de Julho de 2020; Aceito: 04 de Agosto de 2020

Lucia Rabello de Castro é Ph. D. em psicologia (Univ. Londres). Professora titular do Instituto de Psicologia e do Programa de Pós-graduação em Psicologia, Universidade Federal do Rio de Janeiro. Pesquisadora do CNPQ. Presidente (2017-2020) da Associação Nacional Rede de Pesquisadores/as da Juventude REDEJUBRA.

Renata Tavares é doutoranda em psicologia, na Universidade Federal do Rio de Janeiro, mestre em psicologia pela Universidade Federal Fluminense. Pesquisadora do Núcleo Interdisciplinar de Pesquisa para Infância e Adolescência Contemporâneas (NIPIAC/UFRJ). Editora assistente do periódico Desidades - Revista Eletrônica de Divulgação Científica da Infância e Juventude.

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