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Educação e Pesquisa

versão impressa ISSN 1517-9702versão On-line ISSN 1678-4634

Educ. Pesqui. vol.48  São Paulo  2022  Epub 04-Nov-2022

https://doi.org/10.1590/s1678-4634202248252897por 

SEÇÃO TEMÁTICA: Justiça e Educação: um debate necessário

Judicialização de vagas na educação infantil em tempo integral no município de Vitória (ES)

Judicialization of vacancies in full-time early childhood education in the municipality of Vitória (ES)

Franceila Auer1 
http://orcid.org/0000-0002-1913-854X

Vania Carvalho de Araújo1 
http://orcid.org/0000-0002-7453-1993

1- Universidade Federal do Espírito Santo, Vitória, ES, Brasil. Contatos: auerfranceila@gmail.com; vcaraujoufes@gmail.com


Resumo

Este artigo tem como objetivo compreender o fenômeno da judicialização decorrente da reinvindicação por vagas na educação infantil em tempo integral. Adota uma pesquisa de natureza qualitativa com análise documental de processos extrajudiciais e judiciais. Utiliza o software NVivo para auxílio e organização da análise dos dados. Como fonte de análise,2 seleciona oito processos, impetrados junto ao Ministério Público e ao Tribunal de Justiça pelas famílias que exigem vagas para seus filhos nas instituições públicas de educação infantil em tempo integral no município de Vitória (ES). Os resultados indicam que a maioria das famílias aponta o trabalho extradomiciliar e as necessidades socioeconômicas como motivações principais para a demanda de vagas. Contudo, nem sempre os pleitos são deferidos, visto que há um tensionamento no campo da educação da infância devido à não obrigatoriedade de oferta do tempo integral. Os profissionais do Sistema de Justiça fundamentam os processos utilizando argumentos legais, constitucionais e imperativos categóricos inspirados na compreensão do direito à educação como uma responsabilidade das políticas públicas. O artigo conclui que a existência de formas controversas do direito desencadeia o fenômeno da judicialização, subvertendo a dinâmica pública do direito como uma experiência que diz respeito igualmente a todos.

Palavras-Chave: Direito à educação; Educação infantil em tempo integral; Judicialização; Infância; Políticas

Abstract

The paper aims to understand the phenomenon of judicialization arising from the claim for vacancies in full-time early childhood education. It adopts qualitative research with documentary analysis of extrajudicial and judicial lawsuits. It uses the software NVivo to assist and organize data analysis. As a source of analysis, it selects eight lawsuits filed with the Public Prosecutor’s Office and the Court of Justice by families that demand vacancies for their children in public institutions of full-time early childhood education in the municipality of Vitória (ES). The results show that most of the families point to the non-home-based work and the socioeconomic needs as the main reasons to meet the demands for vacancies. However, the demands are not always accepted in favor of the vacancies, since there is a tension in the field of early childhood education due to the fact that full-time education is not compulsory. The workers of the Legal System substantiate the lawsuits using legal, constitutional arguments and categorical imperatives inspired by the understanding of the right to education as a responsibility of public policies. The paper concludes that the existence of controversial forms of law triggers the phenomenon of judicialization, subverting the public dynamics of law as an experience that concerns everyone equally.

Key words: Right to education; Full-time early childhood education; Judicialization; Childhood; Policies

Introdução

Dentre o universo de direitos declarados na Constituição da República Federativa do Brasil (BRASIL, 1988), a educação assume um papel importante, compreendida em seu art. 205 como “[...] direito de todos e dever do Estado e da família” (BRASIL, 1988), indissociável à cidadania. Assim, a educação é reconhecida como um direito humano, social, bem como um direito fundamental para a consolidação do Estado Democrático de Direito. Tendo em vista a ordem democrática, o Sistema de Justiça3 tem como um de seus objetivos resguardar os direitos que estão sendo violados. Entende-se que o Poder Judiciário tem caráter normativo e jurídico, ao qual todos os cidadãos estão submetidos, sob a forma de proteção dos seus direitos fundamentais perante as leis que os regem. Desse modo, a Constituição da República (BRASIL, 1988) é uma condição, por excelência, da garantia de tais direitos.

Ao analisarmos o direito tendo como referência à Lei Magna, a educação infantil passa a ser reconhecida como um direito de todas as crianças, um marco histórico para o campo da educação da infância. Em seu art. 208, inciso IV, assegura “atendimento em creche e pré-escola, às crianças de 0 a 5 anos de idade” (BRASIL, 1988). Complementando o texto constitucional, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional – LDB (BRASIL, 1996) reconhece a educação infantil como primeira etapa da educação básica, devendo ser oferecida em creches ou entidades equivalentes e pré-escolas públicas e gratuitas. Ainda de acordo com a LDB (BRASIL, 1996), a educação infantil deve ser organizada pelo atendimento da criança de no mínimo quatro horas diárias para o tempo parcial e de no mínimo sete horas diárias para o tempo integral.

Vale destacar que a responsabilidade do Sistema de Justiça para a oferta da educação infantil, de acordo com suas demandas, está prevista no Recurso Extraordinário nº 436.996 sancionado pelo Supremo Tribunal Federal – instância máxima do Poder Judiciário – em 2005, visto que impõe ao Estado a obrigação constitucional de “[...] criar condições objetivas que possibilitem, de maneira concreta, em favor das crianças de zero a seis anos de idade [...], o efetivo acesso e atendimento em creches e unidades de pré-escola” (BRASIL, 2005). Esse recurso também fortalece o papel do Sistema de Justiça para atuar na vigília e aplicação do direito à educação infantil. À vista disso, sempre que houver intervenção do Sistema de Justiça em questões concernentes à educação, ocorre a sua judicialização, entendida como o “[...] deslocamento da discussão dos conflitos educacionais das arenas tradicionais, legislativo e executivo, para as instituições do Sistema de Justiça” (SILVEIRA, 2015, p. 7).

Por sua vez, a Emenda Constitucional nº 59/2009 – EC 59/2009 (BRASIL, 2009) estabelece a obrigatoriedade da matrícula das crianças de quatro a cinco anos de idade na pré-escola e determina o dever da oferta por parte do Estado e a obrigação da família em realizar a matrícula de seus filhos. Embora as crianças com idade de zero a três anos tenham sido excluídas da obrigatoriedade da matrícula em creches, tal fato não exime o dever do Estado em ofertá-la, isto é, todas as famílias que desejarem matricular as crianças têm de ser amparadas em seu direito (KIM, 2006). Para Kim (2006, p. 10), “o acesso à creche e à pré-escola também, e igualmente ao ensino fundamental propriamente dito, é direito subjetivo”, o que significa que ele é passível de exigibilidade extrajudicial ou judicial.

O Plano Nacional de Educação – PNE (BRASIL, 2014) vigente no período de 2014 a 2024, instituído pela Lei nº 13.005, elabora metas e diretrizes para o sistema nacional de educação. Na Estratégia 1.17 da Meta 1, propõe “estimular o acesso à educação infantil em tempo integral para todas as crianças de 0 a 5 anos, conforme estabelecido nas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil” (BRASIL, 2014). A nosso ver, é importante reforçar a educação infantil como primeira etapa da educação independente se o atendimento for em tempo parcial ou em tempo integral, visto que a “[...] oferta em tempo integral para as crianças das creches e das pré-escolas deve ser colocada como uma questão que diz respeito à educação infantil como um direito” (ARAÚJO; AUER; NEVES, 2019, p. 9).

Apesar de existirem diversas legislações direcionadas ao cumprimento do direito à educação infantil no Brasil, ainda é perceptível a falta de vagas para um número considerável de crianças, seja em tempo parcial ou em tempo integral (ARAÚJO et al., 2019). Segundo Araújo et al. (2019), em 2017, aproximadamente, oito milhões de crianças de zero a três anos de idade não estavam frequentando a creche e cerca de 800 mil crianças entre quatro e cinco anos de idade estavam fora da pré-escola. A mesma pesquisa revela que, entre os anos de 2007 e 2017, as matrículas na educação infantil em tempo integral aumentaram consideravelmente em relação ao tempo parcial, tendo como diferença de crescimento 65,83% entre um tipo de atendimento e outro.

Pesquisa realizada por Araújo (2015) em vinte instituições de educação infantil em tempo integral de dez municípios capixabas – incluindo o município de Vitória – identificou que quando a demanda por vagas na educação infantil em tempo integral era maior do que a oferta, critérios socioeconômicos de matrícula eram elaborados concernentes ao risco e à vulnerabilidade social das crianças e de suas famílias, bem como à comprovação das mães trabalharem fora do lar. Nesse contexto investigado de descompasso entre a oferta dos municípios e a demanda por vagas, também se observaram intervenções do Sistema de Justiça que ocorriam quando, por determinação de promotores ou juízes, as instituições de educação infantil matriculavam as crianças como consequência das demandas extrajudiciais e judiciais, muitas vezes impetradas pelas famílias e pelos Conselhos Tutelares. Essas questões, sem dúvida, têm tensionado o direito à educação, principalmente em um contexto de precarização de vagas. Diante disso, questionamos: em que medida o Sistema de Justiça tem se constituído um ente fundamental para a mediação do processo de efetivação do direito à educação infantil em tempo integral na rede pública municipal de Vitória como direito público subjetivo?

Como desdobramento da pesquisa citada anteriormente (ARAÚJO, 2015) e tendo como contexto de análise o município de Vitória, este artigo tem por objetivo compreender o fenômeno da judicialização decorrente da reinvindicação por vagas na educação infantil em tempo integral. Para tanto, analisa as justificativas das famílias ao solicitarem as vagas; as decisões proferidas em relação às solicitações; os argumentos constitucionais, jurídicos e os imperativos categóricos utilizados pelos profissionais do Sistema de Justiça para fundamentarem os processos. A identificação prévia da existência de ações extrajudiciais e judiciais pleiteando vagas na educação infantil em tempo integral no município de Vitória abre caminhos para uma investigação sobre o fenômeno da judicialização. Essa escolha também se justifica por ele ser o município do estado do Espírito Santo com o maior número de matrículas nesse tipo de atendimento, responsável por aproximadamente 15,5% da quantidade total de matrículas, conforme dados do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira - INEP (2019). Cabe ressaltar que o próprio documento orientador, Política Municipal de Educação Integral (VITÓRIA, 2018), reconhece que ainda persiste o desafio de garantir o tempo integral para todas as crianças, sobretudo na creche, diferentemente da pré-escola em tempo parcial, cuja universalização é anunciada desde 2018.

Embora o fenômeno da judicialização tenha uma vasta produção acadêmica, sobretudo no campo da saúde e da educação (SILVEIRA et al., 2020), o que pretendemos é trazer uma abordagem da judicialização na perspectiva da negação do direito como uma consequência do esvaziamento do sentido público da política, conforme destaca Hannah Arendt. Arendt (1989) analisa o direito sob o ponto de vista da dignidade da política. Segundo a autora (2006, p. 3), “a política surge no intraespaço e se estabelece como relação”, nesse sentido, ela não é um lugar físico, nem se resume a nenhuma forma de governo ou regulamentação estatal, tampouco é um ajuntamento coletivo de pessoas, mas se revela enquanto uma experiência de sociabilidade pública. Assim, o que garante a asserção aos direitos, quando eles são reconhecidos reciprocamente e legitimados pelo agir humano, é a política. Contudo, quando os direitos não são assegurados na dinâmica societária, outros artifícios de interpelação aos direitos se sobressaem, como, por exemplo, a judicialização.

A partir de um levantamento bibliográfico realizado no Catálogo de Teses e Dissertações da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Capes, no banco de dados da Scientific Eletronic Library OnlineScielo e dos anais das Reuniões Nacionais da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação – Anped usando os descritores “judicialização AND educação infantil”, sem delimitarmos recorte temporal prévio, foram encontrados 24 trabalhos publicados entre os anos de 2014 e 2021, contudo, apenas um deles discorreu sobre o atendimento em tempo integral. Apesar de existirem diversos trabalhos na educação infantil, nossa discussão diz respeito especificamente ao tempo integral, um tema pouco estudado academicamente, sem desvinculá-lo aos princípios da educação infantil como primeira etapa da educação básica.

Metodologia: algumas considerações

Em relação aos procedimentos metodológicos, optamos por uma pesquisa de natureza qualitativa com análise documental de processos judiciais e extrajudiciais impetrados pelas famílias junto ao Sistema de Justiça, pois esse movimento de exigibilidade pela garantia do direito à educação das crianças, uma vez que ele foi negado, tem como consequência a judicialização. Os processos são constituídos desde o momento em que as famílias demandam vagas para seus filhos nas instituições de educação infantil, até o momento em que a Secretaria Municipal de Educação de Vitória (SEME) executa, ou não, aquilo que foi solicitado pelos promotores de justiça ou decretado pelos desembargadores4/juízes. Utilizamos a definição de processo extrajudicial ou judicial como “a forma pela qual se faz atuar a lei na solução dos conflitos ou na declaração dos direitos [...] é o instrumento da jurisdição” (ACQUAVIVA, 2011, p. 390).

Em um primeiro momento da pesquisa, selecionamos os processos extrajudiciais no Departamento de Protocolos da SEME, precedida de autorização prévia e do cadastro da pesquisa no portal eletrônico Protocolo Virtual do site da Prefeitura Municipal de Vitória. Solicitamos processos referentes ao período de 2016 a 2020, o que se justifica em função do presente estudo ser um desdobramento dos resultados da pesquisa de Araújo (2015), interessando-nos realizar uma análise posterior a ela. Não encontramos nenhum processo em 2020, ano em que encerramos a investigação. Na coleta de dados realizada na SEME, dentre os arquivos físicos disponibilizados, selecionamos seis processos extrajudiciais distribuídos nos anos de 2019, 2018 e 2016, que tiveram o Ministério Público como principal ente jurídico. Desde março de 2020, em função da pandemia Covid-19 e das medidas de isolamento social, foi implantado um sistema virtual no município, visando maior agilidade às tramitações dos processos. Assim, as famílias que buscam vagas na educação infantil junto ao Ministério Público precisam realizar a solicitação on-line, diferente dos anos anteriores em que tudo era feito presencialmente. Isso pode justificar a ausência de processos em 2020, dada as dificuldades que podem ser encontradas com a realização do procedimento on-line e as condições de acesso à internet que não alcançam a todos da mesma maneira.

Considerando que os processos de âmbito judicial não são arquivados na SEME, em um segundo momento da pesquisa, realizamos uma busca inicial dos dados referentes aos processos judiciais no portal eletrônico do TJES,5 através da aba jurisprudência, a partir da utilização do descritor: “educação infantil E tempo integral” no recorte temporal de 01/01/2016 a 31/12/2019, atendendo ao período dos processos encontrados na SEME. Desse modo, surgiram seis decisões judiciais de segunda instância publicadas, incluindo acórdãos e decisões monocráticas.6 Feita essa busca, as decisões foram preliminarmente analisadas por suas ementas com o objetivo de selecionar apenas aquelas que tinham relação com o tema da pesquisa e estavam no contexto do município de Vitória. Assim sendo, selecionamos apenas duas decisões dos anos de 2018 e 2019. Com o intuito de investigar os processos circunscritos nessas decisões, acessamos a aba consulta processual dos autos ainda no site do TJES e com os números dos processos identificados nas decisões, foi possível analisar seus respectivos trâmites.

Os dados encontrados não necessariamente correspondem ao número real de processos extrajudiciais e judiciais impetrados pelas famílias que acionam as instituições do Sistema de Justiça para pleitear vagas para seus filhos na educação infantil em tempo integral no município de Vitória. Isso se justifica em função dos empecilhos encontrados na coleta de dados: a) as fortes chuvas ocorridas em meados de 2018 no estado do Espírito Santo afetaram o espaço físico da SEME, acarretando perda de alguns processos extrajudiciais que estavam arquivados em caixas na época, pois não tinham versões digitalizadas; b) no portal eletrônico do TJES, só é possível o acesso digital aos processos judiciais em segunda instância, pois só conseguiríamos encontrar aqueles de primeira instância na aba Projudi, se tivéssemos dados específicos (número do processo, nomes do requerente/requerido e juiz/desembargador), informações que não são públicas; c) alguns processos são classificados como segredo de justiça, impossibilitando seu acesso.

Realizamos a análise do texto dos processos mediante uso do software NVivo como ferramenta de auxílio e de organização dos dados. Contudo, a utilização do software, que serviu para o refinamento das discussões, não dispensou a leitura preliminar e a análise criteriosa na íntegra de todos os processos. Criamos um projeto NVivo (Figura 1) para o qual importamos os arquivos de dados, isto é, os processos extrajudiciais e judiciais que são os nossos códigos matriz. Posteriormente, na etapa de codificação, geramos os códigos hierárquicos no programa que representam as categorias pré-definidas conforme as principais variáveis da pesquisa, a saber: identificação dos diferentes entes vinculados ao Sistema de Justiça, dos quais decorrem os processos apreciados; justificativas das famílias em demandar as vagas para seus filhos na educação infantil em tempo integral; formulações dos pedidos e decisões proferidas a favor ou contra as vagas solicitadas. Para o código hierárquico sobre as decisões proferidas e as formulações dos pedidos, geramos códigos hierárquicos subjacentes a este, relativos aos argumentos legais, argumentos constitucionais e imperativos categóricos7 utilizados pelos promotores de justiça, conselheiros tutelares, desembargadores/ou juízes na fundamentação dos processos.

Fonte: Elaboração própria.

Figura 1 Organização do Projeto NVivo 

Dessa maneira, organizamos as categorias de análise em mapas de árvore e nuvens de palavras para facilitar a sistematização dos processos. Os mapas de árvore permitem visualizar hierarquicamente as palavras mais frequentes, de modo que quanto maior for a área representada por cada palavra nos mapas, maior será a sua recorrência nos arquivos de dados analisados. De forma semelhante, a criação da nuvem de palavras evidencia aquelas que aparecem com maior proporção nos processos extrajudiciais e judiciais, de modo que quanto maior é o tamanho das palavras, mais frequentes elas são. Vale ressaltar que essas palavras não são isoladas, mas fazem parte de textos recortados dos processos extrajudiciais e judiciais que são mais enfatizados nas análises realizadas pelo software NVivo, o que consideramos relevante por ilustrar os dados que se sobressaem nos arquivos através de um recurso visual simples e de fácil compreensão. Também desenvolvemos a análise dos resultados encontrados a partir da literatura base do estudo para que os dados apresentados fossem interpretados e fundamentados sob o ponto de vista teórico.

A judicialização da educação infantil em tempo integral: uma discussão a partir de processos extrajudiciais e judiciais (2016 - 2019)

Foram analisados três processos do ano de 2019, quatro de 2018 e um de 2016, totalizando oito processos referentes às ações extrajudiciais e judiciais impetradas por famílias para obtenção de vagas para seus filhos na educação infantil em tempo integral, principalmente junto ao Ministério Público, mas nos casos mais complexos, via Tribunal de Justiça. Há situações em que o Ministério Público formula os processos em companhia da Defensoria Pública e do Conselho Tutelar. Todos esses são entes vinculados ao Sistema de Justiça e exercem papel de jurisdição no âmbito do Estado Democrático de Direito. As mães são impetrantes na maioria dos processos, apenas um foi impetrado pelo pai das crianças e um pela avó, que tinha a guarda legal do neto. Em dois processos a família solicita vagas para mais de um filho, por isso, não necessariamente, o número de processos corresponde ao número de crianças mencionadas.

Depreendemos, por meio dos dados obtidos, que três crianças envolvidas em tais processos têm três anos de idade, três têm dois anos e apenas uma criança tem quatro anos. Isso permite-nos afirmar que a maior parte das famílias recorre às instituições do Sistema de Justiça pleiteando vagas em creches. Há ainda três processos que não especificam a idade das crianças, somente mencionam o desejo de matriculá-las em Centros Municipais de Educação Infantil (Cmeis) que tenham atendimento em tempo integral. Ao analisarem políticas educacionais brasileiras, Araújo, Freguete e Nascimento (2019, p. 15) chamam atenção para a oferta da creche e afirmam que esse tipo de atendimento pode ser “[...] considerado o grande gargalo na educação básica do Brasil”.

Os fatores que motivam as famílias a demandarem vagas na educação infantil em tempo integral fundamentam o código justificativas, conforme Figura 2. Há que se destacar que a palavra filho aparece com maior recorrência na nuvem de palavras abaixo, uma vez que parte das famílias, ao exporem suas justificativas, aponta necessito da vaga para meu filho ou os próprios promotores de justiça alegam considerando tais fatores, a mãe solicita vaga para seu filho, e assim completam suas demandas.

Fonte: Elaboração própria.

Figura 2 Nuvem de palavras com as justificativas das famílias 

A análise dos dados coletados nos processos leva-nos a afirmar que a obtenção de vagas na educação infantil em tempo integral é algo que afeta a organização das famílias, visto que a principal justificativa delas em realizar a demanda deve-se ao trabalho extradomiciliar dos responsáveis, principalmente das mães, que os impede de permanecer o dia inteiro com os filhos em casa. Como podemos observar na Figura 2, as palavras mãe e genitora têm grande destaque, associadas a depoente, também presente na nuvem acima, pois há uma ênfase na atividade profissional feminina, o que nos faz ressaltar que a necessidade pelo tempo integral “[...] continua a se constituir como um dispositivo da mãe trabalhadora e uma estratégia recriada para atender as demandas do mercado” (ARAÚJO, 2017b, p. 196).

No Processo Judicial 1, o promotor de justiça formula a justificativa pela demanda “tendo em vista que a genitora [da criança] e representante [...], trabalha em período integral e não tem com quem deixar o menor” (PROCESSO JUDICIAL 1, grifo nosso), o que se assemelha a outros processos, tais como, “O noticiante e a genitora dos menores em comentário trabalham durante o dia, e assim, justificam a necessidade de contemplação de tais vagas para seus filhos” (PROCESSO EXTRAJUDICIAL 2, grifo nosso) e “Necessita de uma vaga [...], pois precisa trabalhar e não tem com quem deixá-lo” (PROCESSO EXTRAJUDICIAL 6, grifo nosso). Já no Processo Extrajudicial 5, segundo o promotor de justiça, a mãe anuncia que “cuida do filho sozinha e não tem condições de pagar aproximadamente 800 reais para babá, pois não tem um bom salário e necessita da vaga” (PROCESSO EXTRAJUDICIAL 5, grifo nosso).

Somam-se a essas justificativas em torno do trabalho dos pais a falta de condições financeiras das famílias para pagar babás para cuidarem de seus filhos enquanto estão ausentes em função da atividade extradomiciliar, mostrando-nos que os deixar em casa seria uma opção, desde que eles não ficassem sozinhos e estivessem sob companhia de um adulto. Por isso, as palavras dinheiro, valor, comprar e aluguel são evidenciadas na Figura 2, todas presentes nos processos citados anteriormente. A esse respeito, Sierra (2011, p. 2) entende a judicialização como “[...] o aumento desmesurado de ações judiciais movidas por cidadãos que cobram o direito à proteção social” e no que diz respeito à nossa pesquisa, caberia acrescentar também ações extrajudiciais que não chegam a ser julgadas pelo Poder Judiciário, pois são resolvidas através de procedimentos internos do Ministério Público ou por algum motivo não identificado não são levadas adiante. No Processo Extrajudicial 1, uma mãe destaca “Me ajudaria bastante, porque pago aluguel. Assim já diminuiria o valor e o tempo que a pessoa passaria com ele”, semelhante a fala de outra mãe que afirma “Estou pagando quase o valor do meu salário para que meu filho seja cuidado no momento do meu trabalho. Esse dinheiro que estou gastando está me faltando para comprar coisas básicas para meu filho” (PROCESSO EXTRAJUDICIAL 5, grifo nosso).

Tendo em vista essas colocações escritas nos processos, entendemos que as famílias podem até conseguir a vaga pleiteada, mas isso não se dá necessariamente pelo reconhecimento público do direito à educação e sim pelo “mérito da necessidade”8 (TELLES, 1999) ao exporem isoladamente os problemas socioeconômicos de sua vida privada. Dessa forma, “[...] uma vez assegurado o estado de autopreservação dos pobres, suas vidas ficam sem consequência, e eles continuam excluídos do domínio público” (ARENDT, 1963, p. 55).

Nessa ótica de análise, mesmo que as vagas sejam obtidas, entendemos que não houve um agir conjunto entre as famílias demandantes e outros atores sociais. Como bem afirma Arendt (1989, p. 335), “não nascemos iguais; tornamo-nos iguais, como membros de um grupo por força da nossa decisão de nos garantirmos direitos reciprocamente iguais”, ou seja, se trata de cada ser humano assumir a corresponsabilidade por si e pelo outro no seio de uma comunidade, o que pressupõe a deliberação conjunta e o exercício de pensar, de se conectar ao outro, debater, refletir e decidir, tendo em vista o bem comum. Contudo, ao serem reconhecidas apenas como receptáculos dos direitos, como no caso da pesquisa realizada, as famílias acabam não participando realmente de uma experiência política, pois as suas demandas são apenas reconhecidas em função da necessidade da vida e não na sua dignidade de “direito a ter direitos” (ARENDT, 1989).

No contexto analisado, as demandas se dão de modo individual como uma espécie de Reclame Aqui, já que sob o ponto de vista constitucional, exigir de forma extrajudicial ou judicial um direito significa constranger o Estado a executar o que deve ao requerente, conforme aponta Duarte (2004). De um lado, a judicialização é entendida pelos clássicos autores do campo jurídico e político, Tate e Vallinder (1995), como um fenômeno próprio da democracia. De outro lado, a judicialização exprime um Sistema de Justiça intervencionista que existe em função de direitos que “[...] não se efetivaram, não se realizaram, permaneceram como uma promessa não cumprida da democracia” (FELÍCIO, 2000, p. 90). A nosso ver, essa forte atuação do Sistema de Justiça nos tempos atuais é fruto de uma sociedade individualizada que não viu a concretização de um projeto republicano pensado por todos e para todos, e que ainda vive uma “democracia inconclusa” (BRAYNER, 2008).

No Processo Extrajudicial 3, o promotor de justiça formula a demanda “Devido à situação de risco e de vulnerabilidade social do contexto familiar”. Já em outro processo, argumenta “Considerando a extrema situação de vulnerabilidade social em que as crianças duas crianças se encontram [...] A genitora se encontra em estabelecimento prisional e as crianças fora da rede de ensino” (PROCESSO EXTRAJUDICIAL 4, grifo nosso). Nesse sentido, reiteramos que o motivo principal alegado para as demandas de vagas na educação infantil decorre de uma questão social, principalmente devido às desigualdades sociais e econômicas em um contexto de vida complexo onde as famílias precisam lutar pela sobrevivência, o que faz com que elas fiquem submetidas “ao império absoluto de seus corpos, isto é, ao império absoluto da necessidade” (ARENDT, 1963, p. 48) e enxerguem somente isso como justificativa para ir ao Sistema de Justiça. Espera-se que os entes jurídicos atuem em função da manutenção da vida, das necessidades vitais e do jogo de interesses individuais, conforme observado por Wacheleski (2007).

Para além das justificativas associadas às necessidades de vida das famílias, em um processo judicial específico, a mãe anuncia o reconhecimento do seu filho como um sujeito que tem direito à matrícula na educação infantil e isso fundamenta a sua demanda pela vaga. Ela questiona “Gostaria de saber se meu filho não tem o direito de estar matriculado no CMEI” (PROCESSO JUDICIAL 2). Para Feinberg (1974, p. 91), “quando aquilo a que se tem direito não está à mão, a reação apropriada é a indignação; quando é devidamente entregue, não há razão para gratidão uma vez que simplesmente se recebeu o que próprio e devido”. Tendo em vista essa reflexão, entendemos que a fala dessa mãe no Processo Judicial 2 deixa transparecer a indignação de quem tem consciência de que está tendo um direito negado e exige que ele seja garantido, não em função de um privilégio ou de uma justificativa que proclama uma ação paternalista, mas de fato por reconhecer o direito à educação do seu filho, ainda que sua demanda ocorra de modo individual.

No que diz respeito às decisões proferidas em relação às demandas por vagas na educação infantil em tempo integral analisadas, no mapa de árvore abaixo (Figura 3), a palavra crianças se destaca, visto que elas são os sujeitos principais dos processos e são sempre citadas ao ser tomada a decisão quanto às vagas solicitadas. Por isso, também, a palavra vagas aparece com certa recorrência no mapa, associada às palavras falta, matrícula e direito, esta última em menor destaque, visto que a demanda pelo direito à educação infantil por meio da judicialização vem sendo discutida pela via do acesso nos processos e o acesso depende da disponibilidade de vagas para a realização da matrícula. Em algumas decisões dos processos, o atendimento em tempo integral e a educação integral9 são tratados como sinônimos, em vista disso as palavras atendimento, educação e integral têm evidência no mapa.

Fonte: Elaboração própria.

Figura 3 Mapa de árvore das decisões proferidas 

Os dados analisados mostram que a SEME nega os pedidos na maioria das solicitações extrajudiciais por vagas na educação infantil em tempo integral, mesmo que a Promotoria de Justiça do Ministério Público tenha utilizado formulações coerentes dentro dos trâmites legais. Em um processo extrajudicial que solicita vagas para duas crianças, irmãs com, respectivamente, três e quatro anos de idade, a profissional responsável da SEME responde ao promotor de justiça:

Para que as crianças do Grupo 4 matutino e do Grupo 3 matutino possam frequentar a turma de educação integral será necessário que elas sejam remanejadas para o ensino regular no turno vespertino, porém, essas turmas não têm vagas disponíveis. Solicitamos que o responsável procure o CMEI para inserir os nomes das crianças na lista do turno vespertino. (PROCESSO EXTRAJUDICIAL 2, grifo nosso).

A resposta da SEME está ancorada em uma legislação municipal ao estabelecer que para as crianças frequentarem a educação infantil em tempo integral, elas precisam estar matriculadas regularmente em algum CMEI no turno vespertino. Por isso, a palavra vespertino tem destaque na Figura 3. Todavia, em outro processo analisado, os filhos da genitora requerente já frequentam o turno vespertino do CMEI, e mesmo assim, o pedido da matrícula no tempo integral é negado sob a justificativa de que “o atendimento em educação integral não é obrigatório” (PROCESSO EXTRAJUDICIAL 3).

Ainda que a vaga tenha sido negada, é alegado que o ofício do Ministério Público envolvendo o pedido da família “será anexado à ficha de cadastro das duas crianças, a fim de utilizá-lo na pontuação da seleção para a educação integral em jornada ampliada em 2019” (PROCESSO EXTRAJUDICIAL 3). No ano seguinte ao da solicitação, a ação extrajudicial é utilizada como acréscimo de pontuação para a família, assim, esse conhecimento sobre a possibilidade de recorrer ao Sistema de Justiça não garante a vaga imediatamente, mas aumenta as chances de vir a consegui-la posteriormente, em relação às outras famílias que têm o mesmo interesse, mas nem sequer sabem sobre esse movimento, “[...] o que é possível definir como uma relação de ‘desigualdade de armas’ [e a] desigualdade de informações, inclusive gera uma desigualdade da garantia de direito” (OLIVEIRA, 2015, p. 200).

Em parte dos processos extrajudiciais, ao receber o pedido das famílias por vagas na educação infantil em tempo integral, a SEME responde ao promotor de justiça do Ministério Público que as crianças já se encontram matriculadas e então encaminha a ficha de matrícula delas e outros comprovantes para confirmar que o acesso já está sendo garantido. Em um desses processos acatados, que demanda vaga para uma criança com quatro anos de idade, portanto, dentro da idade obrigatória de frequentar a pré-escola, a ementa formulada pelo promotor tem o caráter apelativo “Com vistas a assegurar os direitos dos menores, valho-me do presente para requisitar, com urgência, que os infantes sejam matriculados na Rede Municipal de Vitória” (PROCESSO EXTRAJUDICIAL 4, grifo nosso). Sobre a natureza de urgência atribuída ao Processo Judicial 4, vale aqui recobrar as reflexões de Feldman e Silveira (2018, p. 1037) ao afirmarem que a judicialização “[...] se insere em uma teia complexa de relações que advém da multiplicidade de fatores envolvidos [no diagnóstico e planejamento das] políticas educacionais”. Além disso, caberia acrescentar nessa teia complexa de relações os sujeitos que são afetados diretamente quando as políticas não se efetivam, como no caso da pesquisa realizada, as crianças e suas famílias.

Cabe salientar que nem em todos os processos são utilizados argumentos constitucionais, legais e imperativos categóricos para fundamentá-los. Em alguns casos, o promotor de justiça do Ministério Público apenas faz o pedido pela vaga, mas não utiliza nenhum argumento para embasar as demandas. No que diz respeito às decisões judiciais, os desembargadores do Tribunal de Justiça têm um cuidado em justificá-las, não apenas com argumentos jurídicos, mas, sobretudo, com imperativos categóricos, pois praticamente todos encontrados nos processos são oriundos dessas decisões. A análise dos dados evidencia que o maior destaque para fundamentar os processos judiciais e extrajudiciais está nos argumentos legais, em seguida os argumentos constitucionais, apontando-se também imperativos categóricos de natureza diversa.

Quadro 1 Argumentos jurídicos que fundamentam os processos 

Argumentos Jurídicos
Argumentos constitucionais Argumentos legais
Art. 6º Art. 53, inciso I e V – ECA
Art. 24, inciso IX Art. 54, inciso I, II, III e IV, § 1º, § 2º – ECA
Art. 208, inciso IV, § 1º, § 2º Art. 136, inciso X – ECA
Art. 225 Art. 4º – LDB
Art. 227 Art. 29 – LDB
  Art. 29 – LDB
  Art. 30 – LDB
  Meta 1 e 6 do PNE

Fonte: Elaboração própria.

Um dos argumentos mais utilizados é o art. 208 da Constituição da República (BRASIL, 1988), sobretudo em seus parágrafos 1º e 2º que destacam o dever do Estado com a educação e indicam que “o acesso ao ensino obrigatório e gratuito é direito público subjetivo” e “o não-oferecimento do ensino obrigatório pelo Poder Público, ou sua oferta irregular, importa responsabilidade de autoridade competente”. Outra argumentação constitucional frequente está relacionada à prioridade absoluta do direito à educação que se faz presente no art. 227 da Constituição da República (BRASIL, 1988). Os artigos 4º e 11 da LDB (BRASIL, 1996) são empregados para apontar as incumbências dos municípios com a oferta de vagas nas creches e pré-escolas públicas e para reafirmar que a educação é dever do Estado.

No que se refere aos argumentos legais, principalmente nas formulações das demandas, é comum nos processos o uso do inciso I do art. 53 do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECAD (BRASIL, 1990) que trata da “I – igualdade de condições para o acesso e permanência na escola” para referir-se ao direito da criança à educação infantil em tempo integral. Identificamos que grande parte das famílias exige que a vaga seja disponibilizada em CMEI próximo ao trabalho da família, mas, sobretudo perto de suas casas, o que está ancorado no inciso V do art. 54 do ECAD (BRASIL, 1990), visto que a criança tem direito ao “[...] acesso à escola pública e gratuita próxima de sua residência”. Contudo, no contexto investigado, onde nem sempre há vagas para todos, torna-se complexo até a família escolher em qual instituição o filho deve estudar. Inclusive, observamos que há fila de espera em bairros específicos do município de Vitória e uma das justificativas disso é justamente a exigência das famílias por instituições nos arredores de seus locais de trabalho. Vale destacar que o PNE (BRASIL, 2014), ao incentivar diretamente a ampliação das matrículas na educação infantil em tempo integral, é a única legislação que trata especificamente desse tipo de atendimento, utilizada pelos desembargadores na fundamentação dos processos.

Para além dos argumentos estritamente jurídicos, identificamos a presença dos imperativos categóricos. A nosso ver, eles são objetivos na medida em que são mandamentos incondicionados, válidos e legítimos para serem cumpridos. Contudo, também são subjetivos na medida em que expõem demandas e/ou decisões tomadas pelos profissionais do Sistema de Justiça pautadas naquilo que eles consideram justo e correto a partir de suas formulações de juízos. É no âmbito do processo, mais precisamente, na exposição desses imperativos “[...] que o ato de julgar recapitula todos os significados usuais; opinar, avaliar, considerar verdadeiro ou justo, por fim, tomar posição”, como esclarece Ricoeur (2008, p. 176).

Desse modo, consideramos importante compreender o fenômeno da judicialização em sua interioridade a partir desses argumentos dos profissionais de justiça. Dentre esses argumentos que evidenciam juízos de valor, é perceptível que a palavra direito atravessa a maioria deles, conforme mostra a nuvem de palavras (Figura 4) referente ao código imperativos categóricos. Relacionando-se ao direito, podemos ver a palavra subjetivo na nuvem abaixo, mostrando que essa categoria está ligada aos argumentos constitucionais e legais já analisados anteriormente, nos quais ficou evidente o reconhecimento do direito como público subjetivo pelos profissionais do Sistema de Justiça. Por meio da análise das palavras mais recorrentes e de seus respectivos trechos nos processos, é possível observar que os desembargadores identificam que o problema da insuficiência de vagas se localiza, sobretudo, nas creches que funcionam em período integral, palavras essas que se destacam na Figura 4.

Fonte: Elaboração própria.

Figura 4 Nuvem de palavras com imperativos categóricos 

Em um processo específico, o desembargador apresenta o argumento constitucional sobre o direito à educação ser público subjetivo e, posteriormente, afirma “Daí porque, em relação ao direito à vaga não haver discussão a respeito” (PROCESSO JUDICIAL 1). O profissional continua caminhando em prol da defesa do pedido da família, considerando que “os princípios de educação integral têm sido cada vez mais desprezados nas políticas municipais de educação infantil; seja pela redução da jornada como estratégia de ampliação de vagas, seja pela redução de vagas para as turmas de creche” (PROCESSO JUDICIAL 1).

Taquini e Auer (2020, p. 4) ressaltam que há um paradoxo entre as prerrogativas da legislação educacional, “[...] mobilizadas sobretudo no cumprimento da obrigatoriedade do atendimento na pré-escola e ampliação da oferta de vagas na creche em tempo parcial em detrimento da ampliação da oferta de vagas na modalidade de tempo integral nas instituições capixabas”.

Ainda no Processo Judicial 1, julga-se que “a medida de restrição das vagas a meio período na maioria das creches do município fere frontalmente os direitos do requerente garantidos pela Constituição Federal” (PROCESSO JUDICIAL 1). Essa interpretação do desembargador se dá, pois “[...] os ‘fatos’ de um caso não são fatos brutos, mas estão impregnados de sentidos, portanto interpretados” (RICOEUR, 2008, p. 170). Para Maia (2006, p. 393), a judicialização parece exigir que os profissionais do Sistema de Justiça “[...] ao se depararem cada vez mais com ‘casos difíceis’, se tornem filósofos e, além disso, dominem complexas técnicas de ponderação de bens e valores”, sendo atribuído a eles o poder de dizer quem tem ou não tem direito, decidindo o que é justo ou não em determinadas situações com as quais se deparam.

A nuvem aponta a recorrência das palavras públicas e Estado, o que também está ligado ao Processo Judicial 1, ainda que o desembargador reconheça que o Sistema de Justiça “poderá interferir no ato administrativo, principalmente porque se trata de garantir os fins do Estado” (PROCESSO JUDICIAL 1), ele apresenta como possível solução para o problema enfrentado no município “a adoção de políticas públicas a fim de assegurar a disponibilização das vagas necessárias para atender a população” (PROCESSO JUDICIAL 1). Embora o problema da falta de vagas na educação infantil em tempo integral esteja sendo levado à autoridade jurídica, o próprio desembargador deixa subentendido que o direito à educação se trata de uma questão política. Em consonância com essa afirmação, segundo Carvalho (2014, p. 816), “decisões como as relativas à amplitude do direito de acesso à educação [...] são de natureza ética e política”.

Para Arendt (1989), o direito enquanto fenômeno da política ocorre por meio do exercício efetivo de direitos, não se resumindo apenas às normativas jurídicas abstratas, mas a uma participação conjunta e uma convivência plural. Embora os direitos sejam pré-escritos em leis, o que é uma conquista, eles não são materializados apenas por seu reconhecimento legal, pois dependem de uma organização política para serem garantidos. Afirmar que o direito à educação se trata de uma responsabilidade política significa dizer que juízes/desembargadores e promotores de justiça não são os únicos com esse compromisso, visto que:

[...] alguém é responsável pelas consequências de seus atos, mas também é responsável pelos outros, na medida em que estes são postos sob seu encargo ou seus cuidados e, eventualmente, bem além dessa medida. Em última instância, somos responsáveis por tudo e por todos. (RICOEUR, 2008, p. 34, grifo nosso).

Essa responsabilidade de todos os agentes da sociedade ilustra que “os direitos da criança são algo que compete [...] observar, da mesma maneira como nós, adultos, observamos, requisitamos ou exigimos quando eles são atingidos: os direitos da criança são uma questão dos adultos” (BRAYNER, 2008, p. 105). O autor afirma que não podemos prejudicar as crianças, nem as sobrecarregar “[...] de uma responsabilidade de agir em um mundo de resolver problemas que fomos nós, adultos, que criamos” (BRAYNER, 2008, p. 105), assim, aqueles que chegaram primeiro ao mundo podem compartilhar esse compromisso pelo direito à educação das novas gerações.

À guisa de conclusão

O nosso objetivo ao longo da pesquisa foi compreender o fenômeno da judicialização decorrente da reinvindicação por vagas na educação infantil em tempo integral, tomando por referência o direito como fenômeno público. Diante disso, podemos reiterar que por mais que o ordenamento jurídico seja fundamental, ele não dá conta de garantir os direitos para todos, nem de criar formas igualitárias de democracia e de cidadania, embora seja uma orientação importante para a vida em sociedade. Essa negação de direitos e destituição do sentido público da política tem como consequência a judicialização. Contudo, para além da normatização legal, Arendt (2006, p. 66) ensina-nos que os seres humanos: “[...] na medida em que podem agir, são capazes de levar a cabo o improvável e o imprevisível e de levá-lo a cabo continuamente mesmo sem saber disso”, o que nos faz pensar que eles podem transpor os direitos do status da lei para a experiência em comunidade em virtude das possibilidades do agir humano.

Araújo (2017a, p. 409) afirma que “[...] quando os direitos são reduzidos à formalidade da lei, práticas hierarquizadas e excludentes de acesso e permanência na escola se processam”. Tal assertiva provoca-nos a pensar que a judicialização conduz o direito de forma discriminada – ao ser uma via de acesso à educação apenas para algumas crianças, cujas famílias têm conhecimento sobre a possibilidade de acionar o Sistema de Justiça, enquanto outras crianças continuam tendo o acesso à educação negado – o que se dá em função do não reconhecimento do direito como uma experiência que decorre da ação política, como se ele se restringisse somente a um fenômeno jurídico. Isso pode desencadear uma faceta da privatização do direito à educação, ao torná-lo restrito àqueles que têm conhecimento sobre as normas legais.

A pesquisa também evidencia um tensionamento no campo da educação da infância devido à não obrigatoriedade de oferta do tempo integral e a constante prioridade de universalizar a pré-escola em tempo parcial, o que traz dificuldades para o atendimento na creche que ainda conta com uma fila de espera de famílias aguardando vagas para seus filhos no município de Vitória. Apesar de todas as crianças de zero a cinco anos de idade terem o direito à educação infantil, em um contexto de precarização de vagas, privilegiam-se as crianças de quatro e cinco anos para atender a normativa legal da obrigatoriedade. Assim, mais uma vez o direito recai sobretudo em uma burocratização, como se isso prevalecesse sobre o reconhecimento da dignidade humana de todas as crianças, independentemente das suas idades e do tipo de atendimento.

Cabe aqui afirmar que o Sistema de Justiça não deveria ser visto como a única instância de mediação societária, visto que, pelo que observamos, vem sendo demandada, quase exclusivamente dele, uma responsabilidade diante da negação de direitos, como se essa fosse a única maneira de requerer direitos na sociedade. Contudo, tendo em vista que a maioria das justificativas das famílias, ao demandarem as vagas na educação infantil em tempo integral, está relacionada ao trabalho dos pais e às suas necessidades socioeconômicas, entendemos que quando as pessoas são privadas da asserção aos seus direitos e precisam suprir suas necessidades elementares da vida, recorrer ao Sistema de Justiça parece ser a melhor saída.

Ainda que a judicialização seja um fenômeno legitimado pelo Estado Democrático de Direito e previsto pela Constituição da República (BRASIL, 1988), sendo um instrumento importante de interpelação ao direito, para além desse fenômeno, vislumbramos como inspiração a organização de movimentos coletivos que exijam vagas na educação infantil em tempo integral com vistas à asserção do direito à educação em sua dimensão pública. Tais movimentos podem representar uma ação política, desde que envolvam o debate, o reconhecimento recíproco da dignidade humana e do “direito a ter direitos” (ARENDT, 1989) como experiência conjunta e não individualizada. Para Felício (2000, p. 96), inspirada em Hannah Arendt, “é pela ação política, não há outro meio, que se conquistam direitos iguais”. Segundo a autora, isso se dá na prática e na expansão da noção de cidadania, “[...] reapropriando-se da política, por meio de atos e palavras, contestando, resistindo, dissentindo, divergindo, exercitando plenamente a condição cidadã” (FELÍCIO, 2000, p. 97), ultrapassando somente o status legal de ser cidadão.

A constituição de políticas públicas articuladas com planejamento coletivo, a experiência de fóruns e de conselhos podem “[...] estabelecer novos consensos em torno das políticas educacionais, deixando entrever novos modos de participação e deliberação conjunta” (ARAÚJO; NATAL, 2017, p. 260). Partimos do pressuposto de que a discussão sobre a ausência de vagas na educação infantil em tempo integral poderia ser oportunizada a todos e até mesmo o (re)pensar sobre as legislações que orientam essa política educacional, pois o debate circunscrito ao direito à educação está implicado ao bem público. De acordo com Innerarity (2017, p. 122), “quem é que deve, então, ocupar-se da política? À pergunta sobre quem faz a política, quem pode e deve se dedicar a ela, há apenas uma resposta democrática: todos”. Logo, esses são caminhos possíveis na luta pela oferta de vagas na educação infantil em tempo integral para todas as crianças com até cinco anos de idade, vislumbrando a vida em sociedade pautada em uma cultura política que assegure o direito à educação igualmente para todos.

Nosso estudo não pretende generalizar aspectos concernentes à judicialização de vagas na educação infantil em tempo integral, mas problematizar os dados encontrados na pesquisa a partir do contexto investigado e à luz da perspectiva teórica que nos inspira. As possibilidades de pesquisa não se exaurem aqui, pois abrem caminhos para futuros estudos dedicados a investigar se para além das ações individuais já analisadas, há movimentos coletivos atuando junto ao Sistema de Justiça, organizados com vistas às vagas na educação infantil em tempo integral. Por fim, cabe destacar que se trata de um tema pouco estudado academicamente,10 cujos desdobramentos podem ser aprofundados.

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2- Disponibilidade de dados: todo o conjunto de dados que dá suporte aos resultados deste estudo foi publicado no próprio artigo.

3- Há que se destacar que Poder Judiciário e Sistema de Justiça não são sinônimos. Contudo, o Poder Judiciário faz parte do Sistema de Justiça junto ao Ministério Público, a Advocacia Pública, a Advocacia e a Defensoria Pública (BRASIL, 1988).

4- Desembargadores são juízes de tribunais superiores que atuam na segunda instância da Justiça Estadual.

5- Disponível em: https://www.tjes.jus.br/. Acesso em: 30 set. 2020.

6- Nos Tribunais de Justiça, as decisões monocráticas são tomadas individualmente por cada desembargador. Já os acordãos são decisões tomadas por no mínimo três profissionais juntos.

7- Segundo Acquaviva, autor do Dicionário Acadêmico de Direito (2011, p. 270), o imperativo categórico é um “mandamento incondicionado [...] que vale por si só, sendo objetivamente válido. Expressa-se pela fórmula: ‘deve ser A!’ [...] cuja realização atualiza as obrigações que impõem”.

8- Expressão utilizada por Telles (1999) ao reportar-se à reflexão de Sposati (1988) sobre determinados sujeitos precisarem comprovar suas necessidades para terem possibilidade de acessarem um direito.

9- De acordo com Cardoso (2018), o debate sobre “tempo integral” vem sendo objeto de diversas interpretações onde são utilizados termos como “jornada ampliada”; “ampliação do tempo na escola”; “educação integral” como se fossem sinônimos e se referissem a uma mesma realidade, quando, na verdade, assumem diferentes perspectivas, concepções e intenções.

10- Chamamos atenção para a importância de uma pesquisa futura em bancos de dados de outros países, para que seja investigada a intervenção do Sistema de Justiça na educação, considerando as diferentes democracias.

Recebido: 02 de Junho de 2021; Revisado: 17 de Março de 2022; Aceito: 22 de Abril de 2022

Franceila Auer é mestre em educação e doutoranda em educação da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES); bolsista de doutorado da Fundação de Amparo à Pesquisa e Inovação do Espírito Santo (Fapes).

Vania Carvalho de Araújo é professora do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal do Espírito Santo (UFES); pós-doutora e doutora em educação pela Universidade de São Paulo (USP).

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