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Educação e Pesquisa

versão impressa ISSN 1517-9702versão On-line ISSN 1678-4634

Educ. Pesqui. vol.48  São Paulo  2022  Epub 04-Nov-2022

https://doi.org/10.1590/s1678-4634202248244193 

Artigos

Trabalhando todo o tempo: sobrecarga e intensificação no trabalho de professoras da educação básica

Working all the time: overload and intensification in the work of primary education teachers

Moacir Fernando Viegas1 
http://orcid.org/0000-0003-0261-1334

1- Universidade de Santa Cruz do Sul, RS, Brasil. Contato: moacirfviegas@gmail.com


Resumo

O objetivo do presente artigo é descrever, analisar e explicar as propriedades e características da intensificação e da sobrecarga de trabalho de professoras e professores da educação básica de 18 municípios da região do Vale do Rio Pardo, Rio Grande do Sul, nos anos de 2018 e 2019. Para tanto, apoia-se em dados originados da aplicação de questionário realizado com uma amostra de 204 docentes de escolas públicas da educação infantil, do ensino fundamental e do ensino médio, além de entrevistas e grupo de discussão. O estudo é apoiado em referências teóricas que possuem como base a sociologia do trabalho e que tratam das principais categorias da discussão realizada no artigo, especialmente intensificação e sobrecarga, além de condições de trabalho e divisão e organização do trabalho. O artigo se justifica pela necessidade de aprofundamento de pesquisas que abordem as problemáticas da intensificação e da sobrecarga no trabalho docente em tempos de aumento da precarização e de novas e complexas responsabilidades das professoras e professores decorrentes das reformas neoliberais e das mudanças na produção econômica. O estudo revela que as docentes e os docentes dos municípios abrangidos estão envolvidos permanentemente com o trabalho, em jornadas intensas e de sobrecarga que exigem uma constante dedicação ao trabalho, estendendo-se a jornada ao espaço doméstico e produzindo condições que frequentemente levam ao adoecimento.

Palavras-Chave: Trabalho docente; Trabalho e educação; Intensificação do trabalho; Sobrecarga de trabalho; Adoecimento

Abstract

The article aims to describe, analyze and explain the properties and characteristics of the intensification and work overload of teachers of primary education in 18 counties in the region of Vale do Rio Pardo, Rio Grande do Sul, in the years 2018 and 2019. For that, this article is based on data originating from a questionnaire application carried out with a sample of 204 public school teachers in primary, elementary, and high school, in addition to interviews and group discussions. The study is supported by theoretical references that are based on the sociology of work that deals with the main categories of the discussion carried out in this article, especially intensification and work overload, in addition to work conditions and work division and organization. The article is justified by the need to deepen research that addresses teachers’ problems of intensification and work overload at times of increasing precariousness and of new and complex responsibilities of teachers resulting from neoliberal reforms and economic production changes. The study discloses that teachers from covered counties are permanently involved with work, intense and overload journeys that require constant dedication to work, extending the journey to the domestic field and producing conditions that often lead to illness.

Key words: Teaching work; Work and education; Intensification of work; Work overload; Illness

Introdução

O trabalho docente se caracteriza como uma atividade profissional em que a grande maioria das professoras2 trabalha em condições de sobrecarga e de intensificação. Isso por pelo menos dois motivos: primeiro, porque a jornada de trabalho das professoras é insuficiente para que elas deem conta de todas as tarefas que compreendem sua atividade, sendo necessário estender o tempo de trabalho à esfera doméstica, onde as tarefas são desenvolvidas em meio a outras atividades ligadas ao cuidado da casa, dos filhos e frequentemente de outros familiares, assim intensificando também o trabalho doméstico. Segundo porque, no decorrer da jornada, a quantidade de tarefas que as professoras precisam dar conta está além das capacidades físicas e intelectuais de sua força de trabalho, exigindo-lhes esforços que frequentemente resultam em adoecimento físico e psíquico. Como afirma Cau-Bareille (2014, p. 65, grifo da autora), “seja qual for o nível de ensino, o estudo do trabalho docente revela um trabalho exigente, difícil, uma atividade multifuncional que implica uma mobilização física, afetiva e subjetiva permanente”. Ferreira (2019), em estudo realizado com 200 professoras, conclui que a atividade docente é um trabalho sem limites, que invade toda a vida.

Dadas as muitas e variáveis formas que assume, não é uma tarefa simples definir o que é um trabalho intensificado e onde ocorre sobrecarga, em específico no trabalho docente. Uma jovem professora que possui jornada de trabalho de 20h, por exemplo, em início de carreira, pode acumular, além do trabalho extra-jornada, as muitas horas de estudo de graduação ou pós-graduação, além das tarefas em uma família que ela começa a construir. A mesma jornada de 20h pode ser por demais intensa para professoras em final de carreira, pelo acúmulo do desgaste sofrido ao longo do tempo e os problemas característicos do envelhecimento.

Devemos considerar igualmente que o trabalho docente é realizado, em geral, em condições de precarização, no sentido apontado por Barbosa (2018), que apresenta como características do trabalho nessas condições a incerteza, a insegurança, a instabilidade e a impotência, o que contribui para a intensificação.

Nosso objetivo no presente artigo é descrever, analisar e explicar as propriedades e características da intensificação e da sobrecarga de trabalho de professoras de uma realidade específica, qual seja, a das docentes de 18 municípios da região do Vale do Rio Pardo e de suas cercanias, no estado do Rio Grande do Sul. Para tanto, apoiamo-nos em dados originados da aplicação de questionário realizado com uma amostra de 204 docentes de escolas públicas da educação infantil, do ensino fundamental e do ensino médio, além de entrevistas e grupo de discussão.

Alguns pressupostos justificam e ancoram teoricamente a discussão que realizamos no artigo. A começar pelas mudanças originadas pela reestruturação produtiva e a flexibilização do trabalho, as quais, ao longo das duas primeiras décadas do século XXI, têm acarretado crescente aumento de docentes trabalhando em contratos precários (JACOMINI; PENNA, 2016; OLIVEIRA, D., 2004) amparados em reformas trabalhistas (KUENZER, 2021), ou mesmo sem contratos, “uberizados” (SILVA, 2019), os impactos do gerencialismo e da meritocracia (HYPÓLITO, 2020) e a crescente implementação de mecanismos de avaliação de desempenho (ZATTI; MINHOTO, 2019) tudo isso se concretizando em elevadas jornadas de trabalho (ALVES; PINTO, 2011).

Com efeito, a intensificação derivada dessas mudanças, ao exigir das professoras enorme esforço físico e psíquico, expõe as docentes a problemas de saúde. Analisando resultados de pesquisas no âmbito da Análise Coletiva do Trabalho com foco nos efeitos do trabalho docente, Ferreira (2019, p. 6) destaca a ênfase em relatos de “sintomas de mal-estar e de sofrimento mental, ou mesmo de distúrbios psicológicos (referidos pelos professores como nervosismo, estresse, ansiedade, angústia, depressão, medo, esgotamento mental, loucura) [...] relacionados a sentimentos de frustração, culpa, desânimo, baixa autoestima e/ou excesso de trabalho”. O acúmulo de constrangimentos e exigências constantes no decorrer da carreira profissional, a longo prazo provocam desgaste (CAU-BAREILLE, 2014) e envelhecimento precoce.

É fundamental levar em conta também o fato de que as condições sociais de realização do trabalho das mulheres, que são a grande maioria das docentes na educação básica, reúnem a jornada de trabalho laboral e o trabalho doméstico, por sua vez inseridos na divisão sexual do trabalho, caracterizada por “desequilíbrios na distribuição dos tipos de tarefas, recursos e poder – com os homens ocupando setores mais valorizados e melhor remunerados” (ARAÚJO; PINHO; MASSON, 2019, p. 6). Importante salientar que o trabalho das professoras tem muito das características do cuidado, especialmente na educação infantil, carregando as propriedades de naturalização e desvalorização dos trabalhos femininos. Assim, é um trabalho onde o cuidado sai da esfera doméstica (CONTATORE; MALFITANO; BARROS, 2019), levando consigo sua desvalorização social.

Desse modo, a discussão que apresentamos sobre o trabalho docente apoia-se numa perspectiva em que o trabalho no mercado e o trabalho na esfera doméstica não podem ser analisados separadamente. Seguindo a perspectiva de Kergoat (2002, 2009), entendemos que é necessário ter em conta relações sociais que se entrelaçam, que têm propriedades específicas e que coexistem no trânsito entre o trabalho no espaço laboral e no espaço doméstico, e que envolvem relações de classe, de gênero e de produção do cuidado.

Método

A pesquisa que deu origem a este artigo é de tipo qualiquantitativa e foi desenvolvida nos anos de 2018 e 2019 em dezoito municípios da região do Vale do Rio Pardo, quase todos pertencentes a 6ª Coordenadoria Regional de Educação. A parte quantitativa envolveu uma amostra de 204 sujeitos que trabalham em escolas públicas, entre eles 177 do gênero feminino e 27 do gênero masculino, e levou em consideração também os níveis de ensino educação infantil (n=17), ensino fundamental (n=135) e ensino médio (n=52), atuação em escola estadual (n=125) e municipal (n=79), trabalho na área urbana e rural e turnos de trabalho manhã (n=83), tarde (n=86) e noite (n=35). Os municípios envolvidos foram Santa Cruz do Sul, Venâncio Aires, Vera Cruz, Rio Pardo, Pantano Grande, Passo do Sobrado, Boqueirão do Leão, Vale Verde, Candelária, Gramado Xavier, Mato Leitão, Sinimbu, Vale do Sol, Herveiras, todos esses do Vale do Rio Pardo; e Encruzilhada do Sul, Sobradinho, Passa Sete e Lagoa Bonita do Sul, cidades próximas a mesma região.

O questionário foi organizado em três eixos: a) perfil socioeconômico dos sujeitos; b) condições de trabalho; e c) saúde e aspectos psicossociais3. A aplicação foi realizada por meio da visita e da interação direta com as docentes de 60 escolas públicas desses municípios, o que proporcionou que tivéssemos breves, mas valiosos contatos com o ambiente escolar e, do mesmo modo, com as professoras, possibilitando importantes diálogos e anotações de campo. Para a sistematização, os dados foram organizados por meio do software Statistical Package for the Social Sciences (SPSS). A parte qualitativa contou com a realização de 15 entrevistas realizadas4 com 10 professoras e dois professores dos municípios da área de abrangência da pesquisa. A escolha dos participantes foi aleatória e deu-se a partir das visitas às escolas e disponibilidade das docentes. Entre as participantes dessa etapa, quatro trabalham na educação infantil, seis no ensino fundamental, duas no ensino fundamental e ensino médio, uma na educação infantil e no ensino médio e uma no ensino médio.

A idade das entrevistadas variou entre 25 e 59 anos, a grande maioria (n=9) possuindo mais de 40 anos. Quanto à formação, 10 das 12 entrevistadas possuem curso de pedagogia e duas possuem licenciaturas em outras áreas do conhecimento. Todas concluíram ou estão cursando pelo menos uma pós-graduação e uma possui mestrado. Oito são professoras concursadas e quatro possuem contrato temporário.

Além das entrevistas, realizamos um grupo de discussão que contou com a participação de duas professoras e um professor, todos concursados em um dos mesmos dois municípios. Foram realizadas três sessões de aproximadamente duas horas cada uma. Uma das professoras trabalha no ensino fundamental e a outra na educação infantil e no ensino médio. O professor trabalha no Ensino Médio.

Os dados dos questionários e entrevistas foram submetidos à análise de conteúdo (BARDIN, 2011), com base na qual as informações foram organizadas e interpretadas, chegando-se a um processo de categorização que, pensamos, melhor expressa a realidade investigada.

Todos os sujeitos, tanto os que participaram do questionário quanto os que participaram das entrevistas, concordaram em participar da pesquisa, formalizando-o por meio da assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido5.

Carga, sobrecarga e intensidade de trabalho

Por abranger diversos elementos objetivos e subjetivos, o conceito de carga de trabalho é de difícil definição, aparecendo na teoria frequentemente associado à sobrecarga. Seligmann-Silva (1994) conceitua carga de trabalho como o “conjunto de esforços empreendidos para atender as exigências das tarefas, incluindo esforços físicos, cognitivos e emocionais”. Já para Lima (2010, p. 2), a carga de trabalho é “uma complexa função de: duração da atividade, ritmo e intensidade do esforço, tipo de tarefa, estratégias de regulação [...], ciclos e pausas” e que se relaciona a um desgaste maior ou menor do trabalhador.

Para Blanch (2012), na discussão sobre o conceito de carga de trabalho entram elementos objetivos como quantidade ou volume de trabalho prescrito e de tempo disponível, e

[...] percepções subjetivas ancoradas em marcos de referência e critérios pessoais, sociais e culturais acerca do que na carga imposta se estima razoável, justo, equitativo, saudável, legal, viável ou sustentável, do que carrega de ‘pressão’ psicológica aceitável de ser assumida e dos limites mais além dos quais aquela carga deve ser considerada ‘excessiva’ e ‘insuportável’. (BLANCH, 2012, p. 73).

Para o mesmo autor, a sobrecarga de trabalho pode ser expressa em termos quantitativos, como na ampliação da jornada de trabalho, e qualitativos, como no aumento da intensidade e da densidade da tarefa, “mediante o procedimento de compactar sua carga e sua complexidade”. Em síntese, Blanch (2012, p. 73) define sobrecarga de trabalho como um estado no qual um trabalhador “se sente incapaz de satisfazer eficaz e pontualmente às demandas quantitativas e qualitativas de sua tarefa”.

Para Lima (2010), é muito difícil avaliar a carga de trabalho, visto que suas manifestações subjetivas implicam considerar as interações entre corpo, cognição e emoções. Ainda, para este autor, há aspectos como o grau de implicação subjetiva do trabalhador e do sentido mesmo que tem o trabalho para ele. Um trabalho tende a ser mais penoso, por exemplo, se o trabalhador tem que se dedicar “de corpo e alma” a algo que parece ter pouco sentido e significado.

Das definições apontadas pela teoria depreende-se que o esforço despendido para realizar as tarefas e o correspondente desgaste físico, intelectual e emocional exigido pode ou não estar adequado às capacidades dos trabalhadores. Quando está além dessas capacidades, ocorre então a sobrecarga de trabalho. O esforço “deve ser adequadamente dimensionado de forma a permitir que o trabalhador reponha suas forças físicas e psíquicas após cada jornada ou duração de trabalho” (LIMA, 2010, p. 1). Importante salientar que essa adequação não se relaciona apenas a uma jornada diária de trabalho, mas ao trabalho ao longo da semana, do ano e de toda uma vida, sendo necessário, portanto, que o esforço despendido seja globalmente considerado.

Quanto à intensidade do trabalho, ela é definida como a quantidade maior ou menor de gestos e raciocínios realizados no mesmo intervalo de tempo (BERNARDO, 1991). Já Dal Rosso (2006, p. 4) afirma que a intensidade “se refere ao grau de dispêndio de energias pessoais realizado pelos trabalhadores na atividade concreta”. Este autor define intensificação do trabalho como um conjunto de “processos que resultam em maior dispêndio das capacidades físicas, cognitivas e emotivas do trabalhador com o objetivo de elevar quantitativamente ou melhorar qualitativamente os resultados” (DAL ROSSO, 2006, p. 6).

Vemos assim como carga e intensidade do trabalho estão intimamente relacionadas, pois maior ou menor quantidade de gestos e raciocínios ou maior ou menor dispêndio de energia, aspectos que definem a intensidade, só podem ser avaliados na medida em que se considera também a carga de trabalho.

A intensidade do trabalho é um terreno de disputa que opõe capitalistas e trabalhadores (DAL ROSSO, 2006; BERNARDO, 1991). De um lado, os capitalistas buscam extrair dos trabalhadores o máximo de seu esforço, enquanto, de outro, estes buscam implementar seus próprios ritmos, adequando-os as suas necessidades e para isso se utilizando das habilidades acumuladas ao longo de sua experiência. Para Dal Rosso (2010), a busca do controle da intensidade do trabalho pela classe trabalhadora é a expressão da tentativa de viver mais anos e melhor.

No caso especialmente das mulheres, e ainda mais em trabalhos como o das professoras, a análise da carga e da intensidade deve considerar o trabalho doméstico, pois o ritmo e o grau de esforço despendido na escola e no espaço da casa têm efeitos um sobre o outro, implicando em tentativas de conciliação de tempos de trabalho entre as duas esferas. O fato das professoras realizarem atividades escolares no espaço da casa faz com que tenham menos tempo para realizar o trabalho doméstico, aumentando o ritmo desse último e, portanto, sua intensidade, fazendo com que o cansaço acumulado em atividades que não raro vão até a madrugada tornem o trabalho mais penoso. Elas ainda enfrentam a redução da porosidade do trabalho doméstico, pois o aumento da intensidade desse é historicamente maior do que a diminuição da intensidade proporcionada pelos serviços e bens consumidos pela classe trabalhadora (BERNARDO, 1991).

Sobrecarga e intensidade no trabalho docente

Da mesma forma que a carga de trabalho, a intensidade abrange aspectos quantitativos e qualitativos. Souza, Fernandes e Filgueira (2015) consideram os seguintes elementos como determinantes da intensidade do trabalho docente: duração da jornada, número de escolas, número de alunos por turma e número total de alunos. Já Piovezan e Del Ri (2019, p. 2) definem o processo de intensificação como “a expansão quantitativa do número de aulas, turmas, alunos, turnos de trabalho e escolas em que os docentes lecionam”.

Numa discussão onde articulam carga e intensidade do trabalho, Tardif e Lessard (2008) consideram que definir a carga de trabalho das professoras é uma tarefa bastante complexa, pois deve-se considerar não apenas as tarefas prescritas pela gestão, mas também o fato de que o trabalho docente implica a iniciativa das trabalhadoras. Além disso, o trabalho docente possui “limites imprecisos e variáveis de acordo com os indivíduos e as circunstâncias”, tais como “pensar em seus alunos de noite, ver um filme para adolescentes para assimilar a cultura ‘jovem’, etc.” (TARDIF; LESSARD, 2008, p. 112).

Prosseguem os autores afirmando que muitos dos fenômenos envolvidos nesse processo não são quantificáveis, além de se influenciarem reciprocamente. Para eles (TARDIF; LESSARD, 2008), entre os muitos aspectos que influenciam na intensidade do trabalho entram as condições de trabalho, recursos disponíveis, localização da escola, a diversidade e a situação socioeconômica dos alunos e de suas famílias, a violência, a presença ou não do tráfico, o tamanho das turmas, o número de disciplinas, o tipo de vínculo empregatício, as atividades de avaliação, as reuniões e as tarefas administrativas. Estes aspectos não são apenas externos aos trabalhadores, envolvendo também a forma como estes lidam com eles, o que inclui questões pessoais como idade, experiência na profissão e gênero.

O planejamento, a organização e a preparação das aulas constituem um dos mais exigentes aspectos da carga de trabalho docente, envolvendo uma série de atividades a serem organizadas de modo a contemplar o curto, médio e o longo prazo. É necessário fazer a adaptação aos interesses e à diversidade de características pessoais dos alunos. Especialmente na educação infantil e nos anos iniciais, muito tempo também é gasto na confecção dos materiais pedagógicos.

A intensidade do trabalho docente se relaciona também com o que Tardif e Lessard (2008) definem como caráter de imediatez das atividades, pois a aula é uma sucessão de eventos imprevisíveis que demandam reações instantâneas da professora. A carga de trabalho também inclui fortemente as emoções, por ser um trabalho interativo e envolver relações sociais afetivas. É necessário levar em consideração as emoções dos alunos e as próprias docentes têm que gerir as suas (OLIVEIRA, J., 2014).

Garcia e Anadon (2009) entendem a intensificação do trabalho docente na atualidade como um processo de ampliação de responsabilidades e atribuições no mesmo tempo de trabalho, as quais envolvem, além das tarefas instrucionais e pedagógicas, questões relacionadas à administração e gestão, assim como atividades de formação. Já Hargreaves (1995) relaciona a intensificação do trabalho das professoras ao grau de controle que elas possuem com relação às horas de sua carga horária para planejamento, aspecto também realçado por Tardif e Lessard (2008). Quando as professoras têm maior liberdade para definir o que e quando farão, tais horas constituem um momento de relaxamento que alivia as pressões do trabalho, o contrário ocorrendo quando há um excessivo controle por parte da gestão. Para o autor (HARGREAVES, 1995, p. 49), existe na escola uma “vigilância administrativa cada vez mais restrita” que ele designa como uma colonização do tempo e do espaço da professora.

Apoiado em Larson6, Hargreaves (2005) aponta como expressão da intensificação do trabalho a redução do tempo de descanso, a carência de tempo para atualização profissional, a sobrecarga persistente, a escassez de tempo para planejamento e a redução da qualidade do trabalho. Segundo suas pesquisas (HARGREAVES, 2005, p. 152), a intensificação do trabalho docente nos dias atuais se caracteriza por “expectativas maiores, exigências mais amplas, uma crescente demanda de prestação de contas, mais responsabilidades de ‘trabalho social’, múltiplas inovações e o importante incremento de trabalho administrativo”.

A crescente sobrecarga e intensificação presentes no trabalho docente têm sido associadas, em inúmeras pesquisas, ao aumento do estresse e ao adoecimento das professoras. Para citar apenas um exemplo, estudo do Centro de Professores do Estado do Rio Grande do Sul desenvolvido com apoio do Laboratório de Psicodinâmica do Trabalho da UFRGS (CNTE, 2012) constatou que quase 50% das professoras poderia estar evidenciando algum tipo de transtorno psíquico. A grande maioria das docentes, mais de 70%, disse sentir-se nervosas, tensas ou preocupadas. A pesquisa mostrou um alto índice de problemas físicos e emocionais das trabalhadoras, como insônia, dores nas costas e cansaço.

Resultados

Condições, organização e divisão do trabalho

Iniciamos a análise apresentando alguns dos resultados quantitativos do estudo7. Primeiramente, as informações relativas à renda revelam uma realidade comum no trabalho docente, qual seja, a baixa remuneração: 60,2% das professoras que responderam ao questionário recebem de um a três salários mínimos por suas atividades de ensino. São trabalhadoras precárias, o que é evidenciado, nesse caso, especialmente pelos baixos salários recebidos e/ou pela crescente falta de proteção e de direitos ligados ao emprego (HIRATA, H., 2011). No conjunto, como sabemos, essa situação salarial e contratual leva as professoras a terem que trabalhar em várias escolas e turmas.

Mesmo recebendo baixos salários, um percentual importante das docentes participa significativamente na renda familiar: 49,5% delas contribui com mais de 50% na renda da família, sendo que, entre estas, 23,5% arca com 100%, indicando que uma parte importante das suas famílias vive com uma renda bastante baixa.

Outro aspecto que expressa as difíceis condições de trabalho das professoras é a carga horária. A grande maioria (83,3%) trabalha 40h ou mais por semana, muitas vezes em mais de uma escola (43,7%) e/ou redes de ensino diferentes. Esse último dado difere significativamente da situação das docentes na realidade brasileira, considerada globalmente. Com base em informações do MEC/INEP, Guilherme Hirata, João Batista Araújo Oliveira e Talita de Moraes Mereb (2019, p. 181) constatam que, “do total de professores da educação básica brasileira, 78,5% lecionam em uma única escola”. Observamos igualmente que um importante percentual de professoras do nosso estudo (11,3%) trabalha mais de 40 horas semanais.

A sobrecarga aumenta em função do número de crianças na sala: “um problema é que as salas são muito cheias. Eu tenho uma sala. É uma sala ampla, boa, bem equipada. Mas são 25 crianças com dois anos, mais quatro atendentes8 e eu, a professora. Então são 30 pessoas dentro de uma sala. Então é muita criança, muita criança. É muita criança gritando, chorando” (Vera-EI). A mesma professora afirma que o trabalho teria muito mais qualidade se houvesse menos crianças por turma, complementando: “porque a gente faz o possível, e olha que eu me esforço muito!”.

Esses aspectos quantitativos, aliados à forma de divisão e organização do trabalho docente, resultam em um trabalho intensificado que impede que as trabalhadoras colaborem entre si na realização de suas atividades profissionais, em total contradição com o princípio da gestão democrática da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional. Por outro lado, um dos propósitos da divisão do trabalho capitalista e da hierarquia que a acompanha é justamente impedir que os trabalhadores se relacionem diretamente e tomem para si o controle da produção, reorganizando-a segundo seus próprios critérios (MARGLIN, 1980; BERNARDO, 1991). Assim, as entrevistas revelam que as professoras têm pouca disponibilidade de tempo para conversar sobre o trabalho no decorrer da jornada. Elas afirmam que estão todas muito focadas em questões do cotidiano: “cada uma tá muito preocupada com o seu assado. Assim, o dia a dia... a semana que vem, o mês que vem” (Cláudia-EF), sobrando os reduzidos espaços das janelas ou o tempo durante as refeições, onde “a gente vai trocando ideia” (Roberta-EF/EM).

Desse modo, o compartilhamento de informações, de conhecimentos e de dificuldades do cotidiano parecem ocorrer por meio de interações fugazes. Por vezes, as docentes contam com grupos informais constituídos ao acaso. É esta a situação de Rossana (EF-M), que, nas mais de duas horas que gasta para se deslocar de carro diariamente, dá carona para várias colegas. Ela conta que no trajeto entre escolas e residências falam sobre tudo e conversam bastante sobre a escola: “que nem [ao] meio dia: é quase só eu que falo, que daí eu vou de manhã pra [turma] multisseriada... Então eu sempre tenho novidade pra contar, pra dividir e pra ver o que elas vão me dizer”. Iniciando a carreira profissional numa turma multisseriada, Rossana enfrenta a naturalização da chegada das novas professoras ao mercado de trabalho (CUNHA, 2010), não recebendo qualquer tipo de apoio do sistema de ensino, o que aumenta sua sobrecarga de trabalho, na medida em que precisa aprender tudo praticamente sozinha.

No momento da realização da pesquisa, era muito recente nos municípios a obrigatoriedade da pré-escola contar com professoras. Assim, muitas das entrevistadas recém tinham iniciado o trabalho como docentes de educação infantil, algumas delas formadas há bem pouco tempo. Outras já trabalhavam como atendentes e, tendo concluído a graduação em pedagogia, passaram a trabalhar como professoras. Instituiu-se, desse modo, uma nova organização e uma nova divisão do trabalho na educação pré-escolar, envolvendo principalmente as professoras e as atendentes, cuja flexibilidade ou rigidez, segundo os depoimentos, variou de escola para escola. Maria (EI), por exemplo, diz que não é obrigada a fazer a troca das fraldas, mas que ajuda as atendentes a trocar e a alimentar. Destaca, no entanto, que “ali a gente é da parte pedagógica”. Assim, em termos de responsabilidades, as professoras ficaram mais com a parte dita pedagógica e, portanto, intelectual do trabalho, enquanto as atendentes ficaram com a parte que envolve predominantemente habilidades manuais, ou seja, alimentação e higiene, que constituem uma parte significativa do trabalho na educação infantil. Essa divisão do trabalho, como afirmam Rosa e Andrade (2018, p. 351), “expõe um nó ainda não desatado pelas políticas públicas de educação infantil mais de vinte anos após a promulgação da LDBEN”.

Tal divisão não se estabeleceu sem conflitos entre as trabalhadoras, realidade que ainda persiste. Segundo seus relatos, Lilian (EI/EF) queixa-se da sobrecarga de trabalho relacionada a essa nova organização. Diz que “nas EMEIs é a profe, tudo é a profe”. A divisão do trabalho parece ser bem rígida em sua atividade profissional. Afirma que quando não vai trabalhar, as atendentes não fazem atividades que não são suas responsabilidades, mesmo que sejam necessárias, como o registro da presença das crianças: “então acaba sendo assim uma carga muito grande e ao mesmo tempo a direção não quer que elas [as atendentes] escrevam... O caderno de chamada, quando eu não vou, elas não botam nem o pontinho da presença, porque isso é da profe fazer”. A divisão instalou preconceitos entre as trabalhadoras, surgindo, segundo Lilian (EI/EF), comentários do tipo: “então elas [as professoras] têm esse monte de dinheiro e ainda têm a folga” ou “ah, elas não fazem nada, quem pega mesmo... [são as atendentes]”, da parte das auxiliares.

O planejamento, como dissemos, é uma das tarefas que mais pressiona as professoras e que, portanto, mais contribui significativamente para a sobrecarga de trabalho. Cléber (EM) reclama da exigência de que hoje o professor precisa “dar show”, afirmando que “nós, coitados né, com quatro horas de atividade pra preparar aula, nós chegar lá e fazer um show”. Rosângela (EF) fala dos diferentes planejamentos que precisa fazer em função das várias turmas: “nós trabalhamos, por exemplo, no ensino médio, primeiro, segundo e terceiro. Tu tem três planejamentos, e ainda que tu tem três turmas de primeiro ano, duas turmas de segundo e duas turmas de terceiro... e cada turma tem um andamento diferente... Hoje eu tenho três turmas de primeiro. Uma tá no início do conteúdo, a outra tá no meio e a outra tá lá, já tá adiantada. Tu não consegue. Tu tenta levar as três turmas mais ou menos parelhas no conteúdo e uma anda mais rápido que a outra...”. Além disso, existem as diversas mudanças que se dão ao longo da rotina sem aviso prévio, como palestras, união de turmas em função da ausência de colegas, oficinas, as quais exigem a alteração do planejamento e assim mais esforço extra despendido: “ ‘amanhã’, oficina da universidade. Ou seja, já não aconteceu nada como eu tinha previsto. Aí, uma turma de primeiro ano teve aula, as outras não tiveram aula comigo. Duas estão adiantadas. A outra ficou totalmente atrasada com o conteúdo” (Cléber-EM).

Trabalhando todo o tempo

Para dar conta da sobrecarga de trabalho, é bastante comum as professoras utilizarem o domingo para a preparação das aulas, avaliações de trabalhos e outras tarefas da escola, o que acaba fazendo parte de sua rotina. Rosângela (EM) conta que no domingo anterior à entrevista teve que trabalhar até as duas horas da manhã de segunda em função de um imprevisto, o que, segundo ela, “quebrou” o seu ritmo: “eu saí fora da minha rotina. Para ela, trabalhar domingo já é uma “estratégia”: “domingo é o meu dia de planejar”.

Confirmamos nas informações levantadas o que vimos na teoria, ou seja, que o trabalho escolar envolve as professoras todo o tempo: “eu vivo muito em função da escola, dos meus alunos. Eu às vezes acordo cinco horas da manhã, a hora que meu marido sai, e aí eu começo a lembrar: tenho que preparar uma prova! Bah, os slides! Aí às vezes eu penso: tá, eu vou dormir mais um pouco e depois eu levanto e faço. Não, pera aí! Por que eu vou dormir mais um pouco? Já vou levantar e fazer isso. Sabe, a gente vive muito em função disso” (Rosângela-EF). Essa pressão altera o humor das trabalhadoras: “e aí eu fico tão estressada com isso, que eu noto que eu tô descontando na minha filha, tô descontando na minha mãe, tô descontando no meu marido...” (Rosângela-EF), acrescentando que ficava “insuportável” quando tinha carga horária de quase 60h.

Dependendo da situação contratual, a precariedade das condições de trabalho pode ser maior, aumentando ainda mais a intensificação e a sobrecarga. As trabalhadoras não concursadas, segundo Rosângela (EF), têm que ir “onde tem hora”, o que tem como consequência ter que trabalhar em várias escolas e em lugares distantes uns dos outros e de suas residências. Ela diz que chegou a trabalhar em quatro escolas ao mesmo tempo: “imagina: eu tinha quatro conselhos de classe, eu tinha quatro boletins, eu tinha quatro reuniões de pais, eu tive que desfilar quatro vezes em Sete de Setembro”. No período em que trabalhou sessenta horas semanais, afirma que praticamente não via a família, porque “de noite eu tinha que estar na EJA [Educação de Jovens e Adultos]. Final de semana passava trabalhando, corrigindo prova, planejando aula, fazendo coisas do projeto”.

O envolvimento constante com as questões da escola também aparece na fala de Vera (EI), que diz que “todo dia a gente tem o que fazer em casa, tem o que planejar, o que levar”, e que o trabalho, segundo ela, não é “sair daqui [da escola], aquelas quatro horas, bate o cartão e não tem mais nada pra fazer”. A preparação de materiais, um importante aspecto que diferencia o trabalho docente de outras atividades profissionais, sendo o próprio trabalhador quem tem que fabricar boa parte dos instrumentos (TARDIF; LESSARD, 2008), é uma tarefa que lhe toma muito tempo no planejamento: “eu sempre tenho que estar procurando coisas. Então assim, não tem como a gente fazer só naquelas quatro horas de planejamento que a gente tem naquela manhã [hora-atividade]. É impossível. Por isso que eu digo: todo dia a gente tem trabalho em casa, todo dia” (Vera-EI). Comentando sobre o período em que trabalhava 40 horas9, Vera (EI) revela como a jornada se estende ao espaço da casa, intensificando o trabalho doméstico. Ela diz que o trabalho não cessa quando sai da escola, pois, ao chegar em casa, afirma que “era coisa pra organizar, era tema, era casa, era as minhas coisas, então assim ó, era bem puxado mesmo, sabe!? Era uma exaustão enorme”.

A situação de Jéssica (EF) é semelhante. Conforme ela, professor não vive sem levar trabalho para casa: “eu sempre tenho alguma coisa pra fazer, sempre levo... Às vezes não na prática, né... A gente tá sempre pensando [no trabalho]”, indicando o envolvimento contínuo com a atividade profissional. Acrescenta que, “enfim, a rotina é essa: trabalho e trabalho”.

Com a jornada estendida ao espaço doméstico, algumas docentes afirmam que buscam conciliar os horários de trabalho com as horas em que estão mais despertas. Outras, porém, não conseguem. É o caso de Jéssica (EF), que faz as tarefas de planejamento após as 21h, depois que o filho vai dormir, quando, então, “eu sento, já meio cansada... que eu não sou um bicho noturno, meu rendimento é de manhã, de noite eu vou apagando, né!?”.

A dedicação permanente ao trabalho fica evidente também na fala de Maria (EI), que diz que “eu tô sempre fazendo alguma coisa, sempre em função da EMEI, da escola. Ou atividades, ou planejamento ou relatório. Tu trabalha só quatro horas, mas é só quatro horas ali dentro, né!? Tu trabalha toda hora. Que nem agora, que é final de semestre, é quase todo o tempo pra escola. Que nem se eu tô aqui10, eu tô fazendo relatório. Se eu tô lá em casa, eu tô corrigindo alguma coisa”. Como diz Roberta (EF/EM), “a professora sai da escola, daí tu tem que pensar: ‘o que que eu vou fazer amanhã’? Eu tenho que digitar uma prova, eu tenho que procurar um trabalho”. Conta que às vezes fica até tarde da noite pensando no que vai fazer, que vai dormir pensando nisso e que acorda no meio da noite quando tem um “clique”: “aí eu tenho que levantar e anotar ou ir procurar”.

Nestas falas das professoras percebemos sinais dos condicionamentos de gênero no trabalho docente. Para Federici (2019, p. 60), em todos os lugares para onde vão, as mulheres carregam, juntamente com a histórica construção como amas de casa, as habilidades domésticas que a elas são delegadas desde o nascimento: “esta é a razão porque o tipo de emprego feminino é habitualmente uma extensão do trabalho reprodutivo e que o caminho até o trabalho assalariado frequentemente nos leve a desempenhar mais trabalho doméstico”. Boris (2014) chama a atenção para a aparente independência entre trabalho e espaço doméstico, a qual assume a forma de uma cisão ideológica, impedindo que se perceba que em sua constituição tais órbitas conformam uma à outra, aspecto também destacado por Cau-Bareille (2014) em seu estudo com professoras da França.

Voltando às entrevistas, Bruno (EI/EF-M) diz que o momento de maior intensificação do seu trabalho foi no período de estudos da faculdade, chegando inclusive a ter que trancar o curso, “porque eu não aguentava mais”. Conta que não tinha tempo de planejar “ou de ‘juntar ideia’ durante a aula, mesmo [de] fazer um projeto”, pois “trabalhava em dois lugares e toda a noite [vinha] pra cá [para a universidade]”.

Outra tarefa que intensifica muito o trabalho são os pareceres de avaliação dos alunos, produzidos geralmente ao final dos semestres: “então aí te consome o final de semana… são noites, e por aí vai”. Jéssica (EF) diz que realiza essa atividade três vezes por ano. E comenta: “ai gente, [isso] mata a gente, sabe!?”. Também para Renata (EI), o momento de maior sobrecarga é o final do semestre, por causa dos pareceres. Para não se sobrecarregar demais com essa atividade, Bruno (EI/EF-M) apoia-se nos conhecimentos acadêmicos, utilizando-os como justificativa para não seguir à risca a forma de elaborar os pareceres: “ah, que lindo e maravilhoso! Tem que botar detalhe por detalhe de cada criança. Daí eu disse: ‘não! Quando eu estudei não era bem assim. Não foi bem assim que foi nos passado’ ”.

No decorrer da jornada as professoras têm dificuldade de se desligarem do trabalho e realizarem as pausas de descanso a que têm direito. Na educação infantil, mesmo o intervalo de quinze minutos se torna difícil de ser feito: “eu não consigo sair da sala. A gente não sai da sala! Porque imagina: são 18 crianças. Trocar a fralda deles... Tem a questão da alimentação, que tem que... Não dá tempo, não tem nem como. Então eu saio acabada, desajuntada, podre, podre” (Lilian EI/EF).

Em síntese, as entrevistas revelam o grande número de tarefas que as professoras precisam dar conta em reduzido espaço de tempo, a ponto de ser impossível cumpri-las na jornada regular de trabalho, expressando, desse modo, o quão sobrecarregadas se sentem num trabalho por demais intensificado. A destacar também, que os dados mostram que a dedicação “de corpo e alma” (LIMA, 2010), característica dos trabalhos femininos ligados ao cuidado, leva a que as docentes precisem produzir ajustes nas esferas do trabalho docente e do trabalho doméstico (CAU-BAREILLE, 2014), intensificando ambos, na medida em que, realizando trabalho escolar no espaço da casa, compactam o tempo para usufruir do último, reduzindo as horas de lazer e de descanso, o que está em desacordo com um adequado dimensionamento do esforço que possibilite às docentes a recuperação de suas energias físicas e psíquicas (LIMA, 2010).

A compactação das tarefas faz com que as professoras tenham que realizar uma enorme quantidade de raciocínios e gestos num curto intervalo de tempo (BERNARDO, 1991), despendendo uma grande quantidade de energia física, cognitiva e emotiva (DAL ROSSO, 2006). Tudo se complica ainda mais devido aos limites imprecisos e variáveis do exercício da profissão (TARDIF; LESSARD, 2008), na medida em que sentem que sempre estão conectadas com o trabalho. Especialmente no caso das professoras contratadas, que, como disse Rosângela (EF), trabalham onde tem hora, o pouco controle que possuem sobre sua carga e local de trabalho é outro aspecto que resulta em intensificação (HARGREAVES, 1995). Como afirmam Garcia e Anadon (2009),

As estratégias de intensificação do trabalho docente em curso nas reformas da década de 1990 parecem, sim, incluir a ampliação das tarefas a serem desempenhadas pelas professoras no cotidiano das escolas, mas também a colonização ou o governo de seus sentimentos em relação ao seu trabalho e às suas carreiras, envolvendo os espaços privados e domésticos, seus tempos de descanso e suas energias. (GARCIA; ANADON, 2009, p. 82).

Trabalhando doentes

Os problemas de saúde destacados pelas professoras expressam a situação de sobrecarga e intensidade do trabalho revelados nas entrevistas e no grupo de discussão. Respondendo à frequência com que experimentam sintomas de problemas de saúde relacionados ao trabalho, numa escala de 0 (Nunca) a 6 (Sempre), 62,4% assinalaram entre 4 e 6 quanto à desgaste emocional, 62,9% quanto à esgotamento mental, 49,9% quanto à dores nas costas, 36,2% quanto à problemas na voz, 35,2% quanto à dores de cabeça e 31,3% quanto à insônia. Ainda, 42,4% das professoras afirmam estar tomando medicação para um ou mais desses sintomas, sempre considerando as que assinalaram de 4 a 6. Esses dados corroboram várias pesquisas que têm sido realizadas sobre os efeitos da sobrecarga e intensidade do trabalho na saúde docente (GUERREIRO et al., 2016; OLIVEIRA, D. et al., 2017; MARTINS et al., 2014).

Impressiona o que dizem as docentes sobre a frequência com que trabalham estando doentes. Somando as que responderam que trabalham doentes muitas vezes, frequentemente e sempre, elas totalizam 55,8%. Um dado interessante é que, nesse grupo, 55,6% são as principais provedoras em suas famílias, percentual que é de 43,1% entre as que nunca ou raramente trabalham estando doentes, o que pode estar indicando mais um efeito da sobrecarga de trabalho. Além disso, verificamos que o percentual de mulheres que afirmam trabalhar muitas vezes, frequentemente ou sempre estando doentes (58,6%) é significativamente maior do que entre os homens (40,7%). Este resultado está em consonância com as conclusões de Araújo, Pinho e Masson (2019), que afirmam haver sólidas evidências de maior adoecimento originário do trabalho das mulheres do que do trabalho dos homens. Apenas 10,8% das docentes dizem que nunca trabalham estando doentes. A luta para não adoecer é expressa na fala de Tatiana: “eu tenho que achar aqui (no grupo de discussão), um meio, uma fórmula, de repente, pra tentar isso... pra eu não adoecer”.

O momento de realização da pesquisa coincidiu com o encaminhamento de uma orientação em nível estadual que penalizava com a demissão as professoras contratadas que estivessem com atestado médico superior a 15 dias (CPERS, 2019), o que foi bastante comentado pelas entrevistadas. Como se sabe, é crescente o número de docentes da educação básica no Brasil que possuem contratos temporários de trabalho (SEKI et al., 2017). Por sinal, apesar de avanços no início do século XXI, recuos significativos têm ocorrido no que respeita aos direitos das trabalhadoras docentes, expressos, por exemplo, nos fenômenos da meritocracia e do gerencialismo (IVO, HYPÓLITO, 2015), o que tem feito com que as professoras se sintam pressionadas a trabalhar mesmo não estando em boas condições de saúde. É o caso de Jéssica (EF), que, mesmo concursada, é penalizada conforme o número de faltas que tiver. No município em que trabalha, as professoras que possuem hora atividade acabam utilizando essas horas para cuidar de questões da saúde, inclusive sendo recomendadas pela supervisora para que assim façam: “é orientação da nossa supervisão, né!? ‘Vai no médico quando tu tá na tua janela’. Ficar doente quando na minha janela. É mais ou menos isso” (Jéssica EF).

Como afirmam Araújo, Pinho e Masson (2019), o fato das professoras estarem muito focadas no cuidado do outro também pode contribuir para explicar as dificuldades de olharem para si mesmas. Desse modo, ainda segundo as autoras, é comum os sintomas de adoecimento serem negados ou minimizados e “apenas quando um problema atinge patamar de severidade é que se atenta para a sua existência”. Para elas, a doença é “vivenciada como processo individual, uma inadequação ou dificuldade pessoal” (ARAÚJO; PINHO; MASSON, 2019, p. 6). São muitas as razões para agirem dessa maneira. Em sua pesquisa, por exemplo, Ferreira (2019, p. 5) constatou que “muitos professores confessaram que iam trabalhar doentes por não terem tempo de ir ao médico, por não poderem faltar ao trabalho devido ao compromisso com os alunos ou ao medo de ficarem mal vistos nas escolas, onde a assiduidade era um critério de desempenho”. Tais atitudes podem estar relacionadas com as características históricas de feminização do trabalho docente, que, desde sua origem, carrega a “dupla marca do modelo religioso e da metáfora materna: dedicação-disponibilidade, humildade-submissão, abnegação-sacrifício” (LOURO, 1997), produzidas para explorar o trabalho das mulheres.

Nesse sentido, Garcia e Anadon (2009, p. 69) afirmam que a intensificação do trabalho docente tem se refletido especialmente na ampliação das demandas e no que tem sido chamado de autointensificação, definida pelas autoras como a “exploração do sentimento de profissionalismo das professoras e de suas autoimagens calcadas no cuidado e no zelo que caracterizam historicamente a educação da infância”.

As mulheres, como dissemos, são educadas desde cedo para se dedicarem às tarefas domésticas. Um trabalho que exige muitos anos de dedicação para que seja aprendido e realizado de forma eficiente e que traz realização pessoal. Como afirma Marcondes (2013), “a existência social feminina realiza-se na medida em que elas cuidam” (MARCONDES, 2013, p. 252). Logo, há uma pressão das próprias professoras para que não faltem ao trabalho, mesmo estando doentes. Viviane (EI/EF) diz que cansou “de ir pra escola com a garganta ‘desse tamanho... ãhm’, inflamada, porque eu não me permito tirar atestado. Tem gente que tira tão fácil. Eu não consigo”. Acrescenta que para ela é uma “tortura” pegar atestado.

Porém, nas entrevistas, o motivo mais destacado para ir trabalhar estando doente foi mesmo o fato de boa parte das professoras terem vínculo precário de trabalho11 ou, mesmo sendo concursadas, perderem alguns direitos. Segundo Cléber (EM), atualmente são muito poucas as docentes do município em que trabalha que são concursadas. Rosângela, que é professora estadual, diz que “com certeza, mais de 15 dias de atestado é rua mesmo”, referindo-se à orientação da Secretaria de Educação do estado (CPERS, 2019). Cléber (EM) acredita que, como consequência dessa orientação, a tendência é que aumente o número e a frequência com que as professoras vão trabalhar estando doentes. Lilian (EI/EF) diz que recentemente teve que ir trabalhar com conjuntivite: “não botei atestado. Fui trabalhar com o olho daquele jeito. Por que? Acima de três faltas, eu não me lembro se é 3 ou 4 ou... mesmo justificadas com atestado, tu perde o teu vale, aquele do bônus. Eles querem que a gente trabalhe doente, né!?”12. Entretanto, algumas professoras manifestaram não ter vontade de ir trabalhar quando se sentem muito cansadas e com problemas físicos: “dá vontade de ligar e dizer que não dá pra ir”.

Considerações finais

Os resultados do estudo não deixam dúvida sobre o fato de que o trabalho docente das professoras da região de abrangência da pesquisa se dá sob condições de intensificação e de sobrecarga. As causas desses fenômenos são as exigências originárias da quantidade de trabalho referente à preparação de aulas e de materiais pedagógicos, a forma de organização e de divisão do trabalho, as avaliações dos alunos e a pressão para trabalharem doentes, questões que, em seu conjunto, levam as professoras a um envolvimento constante com o trabalho, fazendo com que a jornada se estenda ao espaço privado, pressionando o trabalho doméstico e fazendo com que este também se torne intensificado.

O adoecimento é uma das consequências da sobrecarga e intensificação, levando as trabalhadoras a apresentarem diversos problemas de saúde que elas associam ao trabalho. Aspectos como o risco de perda de bonificações, descontos nos salários e mesmo ameaças de perda de emprego, além do compromisso profissional e com as colegas de trabalho, fazem com que as professoras não tenham tempo de recuperar adequadamente sua força de trabalho e assim laborem frequentemente estando doentes, o que resulta no agravo dos problemas de saúde.

Alguns temas não abordados aqui, ou abordados rapidamente, merecem maior atenção e discussão. Um desses temas é a relação entre trabalho docente e gênero e, relacionado a isso, as relações entre trabalho na escola e trabalho doméstico, temáticas que contribuem sobremaneira para compreender os processos de intensificação e sobrecarga no trabalho docente. Com efeito, uma de nossas conclusões, como apontamos no início do texto, é que a jornada de trabalho da professora precisa ser entendida globalmente, compreendendo o espaço da escola em suas relações com a divisão sexual do trabalho, gênero, trabalho doméstico e cuidado.

Outro aspecto que merece maior atenção é o do envelhecimento, tema que reúne poucos estudos na literatura acadêmica que aborda o trabalho das professoras. A força de trabalho docente possui um número significativo de professoras com mais de 40 ou 50 anos, o que verificamos também em nosso estudo. Há também indicativos de um envelhecimento precoce resultado de anos de trabalho intensificado, assim como de iniciativas das professoras para atenuar os esforços e preservar sua saúde para enfrentar os problemas do envelhecimento.

Diante desses achados, percebemos que há muito por fazer para que o trabalho docente se constitua como uma atividade profissional onde as trabalhadoras possam cuidar melhor de si, de seu corpo e de sua saúde, dispondo de tempo mais adequado para poder se dedicar às coisas da casa, da família e dos filhos.

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2- Embora os docentes que fizeram parte da pesquisa sejam dos gêneros masculino e feminino, optamos pelo uso, na escrita, apenas do gênero feminino, dado que a grande maioria dos professores da educação básica é do gênero feminino. Achamos importante marcar essa identidade na linguagem utilizada, não apenas em função do aspecto quantitativo, mas principalmente pelas qualidades que fazem da profissão docente um trabalho com características femininas, cuja histórica invisibilização impede que se conheçam aspectos fundamentais do trabalho do magistério.

3- Para a elaboração das questões desse eixo buscamos apoio no QPW-5, instrumento básico de coleta de informações do projeto WONPUM (Working under the New Public Management), desenvolvido em países da Europa, América Latina e Central, especialmente em instituições hospitalares e de ensino. O estudo foi coordenado pelo pesquisador Josep M. Blanch, da Universidade Autônoma de Barcelona.

4- Três professoras foram entrevistadas duas vezes.

5- Os sujeitos são identificados no artigo por nome fictício seguido da sigla correspondente ao nível de ensino em que trabalham. Desse modo, EI é educação infantil, ef é ensino fundamental e em é ensino médio. Os que atuam em turmas multisseriadas receberam a sigla EF-M. Nos casos em que atuam em mais de um nível de ensino, foram indicadas as siglas de todos os níveis em que trabalham.

6- Para Hargreaves (2005), o conceito de intensificação tem origem nas teorias gerais sobre o processo de trabalho, especialmente na forma elas como são apresentadas por Larson no artigo “Proletarianisation and educated labour”. Theory and Society, n. 9, p. 131-175, 1980.

7- Outros resultados quantitativos da pesquisa foram abordados no texto “Condições de trabalho e saúde dos trabalhadores docentes das escolas públicas do Vale do Rio Pardo, RS”, publicado no livro Estudos e reflexões sobre educação, trabalho e saúde, organizado por este autor e por Suzane Beatriz Frantz Krug e Laísa Xavier Schuh. Disponível em: https://editora.pucrs.br/download/livros/1377.pdf

8- Também chamadas de monitoras ou, ainda, auxiliares, dependendo do município ou estado.

9- No momento da pesquisa Vera tinha jornada de 20 horas semanais, mas já na semana seguinte iria assumir novamente 40h.

10- A entrevista com Maria foi realizada num estabelecimento comercial, onde, no turno da manhã, ela ajuda no trabalho realizado pelo marido.

11- Embora a maior parte das professoras entrevistadas fosse concursada, muitos comentários a respeito dessa questão referem-se aos professores em geral.

12- Em meados de 2018, a Câmara de Vereadores de Santa Cruz do Sul, maior município entre aqueles onde a pesquisa foi realizada e, portanto, o que contou com o maior número de participantes, aprovou o projeto de lei de nº 18/E/2018, que excluía o pagamento de vale-alimentação dos funcionários que tivessem faltas, mesmo que estas fossem justificadas e que ocorresse em apenas em um turno de trabalho. Servidores que estavam em gozo de licença, auxílio-doença e doença na família também passaram a não ter direito ao Vale-Alimentação. Parte do projeto foi revogado posteriormente, no ano 2021.

Recebido: 02 de Outubro de 2020; Revisado: 23 de Novembro de 2021; Aceito: 07 de Fevereiro de 2022

Moacir Fernando Viegas é professor do Departamento de Ciências, Humanidades e Educação e do Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade de Santa Cruz do Sul e coordenador do grupo de pesquisa Trabalho Docente, Cuidado e Classe Social.

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