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Revista de Educação PUC-Campinas

versión impresa ISSN 1519-3993versión On-line ISSN 2318-0870

Educ. Puc. vol.24 no.2 Campinas mayo/ago 2019  Epub 19-Jun-2019

https://doi.org/10.24220/2318-0870v24n2a4301 

Artigos

Currículo, Educação Física e multiculturalismo: análise de um currículo ribeirinho colonizado

Curriculum, Physical Education, and multiculturalism: An analysis of a colonized riverine curriculum

Marcio Antonio Raiol dos Santos1 
http://orcid.org/0000-0002-4723-1231

Lívia Maria Neves Bentes2 
http://orcid.org/0000-0001-8813-1301

Suellen Ferreira Barbosa3 
http://orcid.org/0000-0002-4056-8165

1Universidade Federal do Pará, Núcleo de Estudos Transdisciplinares em Educação Básica, Programa de Pós-Graduação em Currículo e Gestão da Escola Básica, Escola de Aplicação. Av. Perimetral, 1000, Terra Firme, 66095-780, Belém, PA, Brasil. Correspondência para/: M.A.R. SANTOS. : <marsraiol@gmail.com>.

2Universidade Federal do Pará, Escola de Aplicação, Coordenação do Ensino Fundamental I. Belém, PA, Brasil.

3Prefeitura Municipal de Cametá, Secretaria Municipal de Educação, Escola Municipal de Ensino Fundamental Magalhães Barata. Cametá, PA, Brasil.


Resumo

O contexto de uma sociedade multicultural faz com que a escola abrigue um intenso cruzamento de culturas. No entanto, historicamente, esse cruzamento tem acontecido dentro de relações assimétricas de poder, nas quais os conhecimentos das culturas dominantes tendem a prevalecer sobre os conhecimentos da cultura popular, aflorando a necessidade de questionamentos em torno deste cenário. Esta pesquisa tem por objetivo analisar a Matriz Curricular para o Ensino Fundamental – anos finais (6° ao 9° ano) do componente Educação Física, do município de Cametá (Pará), proposta em 2017, pela Secretaria Municipal de Educação. A partir da análise do documento se buscam elementos que o caracterizam como um currículo colonizado, trazendo para a discussão e reflexão os princípios norteadores de um currículo multicultural, que valorize o patrimônio cultural corporal ribeirinho. A pesquisa é do tipo documental e está ancorada em uma abordagem qualitativa. Os resultados apontam a necessidade de construção coletiva e conflituosa de um currículo ribeirinho, que considere os saberes de um povo que tem sua produção cultural tecida no convívio com os rios e a floresta.

Palavras-chave:  Cultura Ribeirinha; Currículo; Educação Física escolar; Multiculturalismo

Abstract

In multicultural societies, the school hosts a busy intersection of cultures. Historically, however, these crossings occurred within asymmetric relations of power, with dominant cultures’ knowledge usually prevailing over the knowledge of popular culture, stressing the need to question this scenario. This research analyzes the pysical education component of the Curricular Matrix for Elementary School - Final Years (6th to 9th year), from the city Cametá (Pará, Brazil) proposed in 2017 by the Municipal Education Secretariat. From the analysis of the document, we investigated elements that characterize it as a colonized curriculum, debating and reflecting on the guiding principles of a multicultural curriculum that values ​​the cultural-corporal heritage of the riverside. The results point to the need for a collectively constructed riverside curriculum that takes into consideration the knowledge of a people that has its cultural production woven with the conviviality with rivers and the forest.

Keywords:  Riverine Culture; Curriculum; Physical School education; Multiculturalism

Introdução

Esta pesquisa apresenta as inferências realizadas a partir da análise documental da Matriz Curricular Para o Ensino Fundamental – anos finais (6° ao 9° ano), proposta pela Secretaria Municipal de Educação (Semed) da cidade de Cametá, localizada no estado Pará, na região amazônica brasileira, para a Educação Física. Este estudo tem como objetivo problematizar os elementos que apontam para um currículo colonizado e traz uma reflexão sobre os princípios norteadores para uma educação e um currículo multicultural. Para isso, se desenvolve uma pesquisa documental, de caráter qualitativo, que, na visão de Rodrigues e França (2010), é um processo marcado pela reflexão da realidade permeada por métodos e técnicas específicas à intervenção no real que se deseja conhecer.

Esta pesquisa encontra legitimidade na medida em que os estudos curriculares se mostram como um campo fértil de investigações que vem, cada vez mais, incorporando as mudanças e (re)configurações ocorridas na sociedade. Concebido como um artefato sociocultural, imerso em relações de poder, envolvido por tensionamentos e negociações constantes dos sentidos e significados em torno dos projetos e processos educativos, o currículo constitui-se em um elemento fundamental para a construção de identidades culturais (Neira, 2008).

As identidades culturais abrigam marcadores de pertencimento a determinados grupos sociais que se desdobram meio a movimentos de exclusão-inclusão, de dominação-resistência que estão presentes dentro e fora da escola, estão no interior das esferas macro e microestruturantes do contexto político-pedagógico das instituições escolares. Por essa razão, advoga-se que a constituição de uma escola democrática passa pelo desenvolvimento de currículos (oficiais e praticados) que tragam a possibilidade de expansão de espaços e reverberação das vozes culturais historicamente silenciadas (Neira, 2008).

Os debates sobre o currículo também atingem a Educação Física Escolar, principalmente na relação entre o currículo e a construção das identidades. Desde a inserção dessa área do conhecimento como componente curricular obrigatório nas escolas brasileiras, as práticas corporais contempladas têm se apresentado como reforçadoras da cultura ocidental dominante, traduzindo-se em currículos eminentemente colonizados, construtores de identidades deslocadas no espaço-tempo em que se inserem (Neira; Nunes, 2009a).

Essa perspectiva aponta para a necessidade fulcral de reconhecer, em primeiro plano, que o conhecimento científico, universal, ainda que seja um patrimônio sociocultural, um direito a ser acessado por todos, não é o único tipo de conhecimento que circula no contexto dos processos educativos escolares.

Isso implica reconhecer, em segundo plano, que dentro de uma perspectiva democrática de escolarização, todos os sujeitos trazem consigo conhecimentos construídos no contato com seus grupos culturais, ou seja, saberes populares, que precisam ser legitimados e valorizados pela escola, entre os quais serão destacados aqui, os advindos da cultura ribeirinha, considerada uma representação peculiar da realidade insular da região amazônica.

Neste contexto, considera-se imprescindível que as vozes à beira do rio, conformadas por seus ritos e ritmos, muitas vezes silenciadas dentro dos projetos de escolarização que tendem a valorizar as culturais citadinas, sejam reverberadas a partir de experiências curriculares que respeitem a diversidade cultural que a escola ribeirinha abriga. Essa perspectiva, abre o caminho para que diferentes culturas negociem seus espaços e possibilita uma reorientação do currículo sob uma ótica multicultural.

Educação Multicultural

São muitas as trilhas teóricas que apontam meios para a edificação de uma escola verdadeiramente democrática. Entre diferentes linhas de pensamento e campos epistemológicos há uma luta discursiva que negocia sentidos e significados, legitimados ou contestados de acordo com a concepção de educação, de escola, de sujeito, de currículo, de ciência, de verdade, de mundo, que conduzem cada um dos grupos que se filiam a essas linhas e campos.

Neste estudo, portanto, compreende-se que a estruturação de uma escola democrática passa pela assunção de que se vive em uma sociedade multicultural. Ao se conceber a escola como um espaço constituinte da teia social, se admite que nela são agregados o contato e o conflito entre os diferentes, nela são manifestadas lutas sociais, nela são experimentados os movimentos de dominação e resistência, nela circula a problemática dos confrontos identitários, característicos de uma escola que também é multicultural.

Ao se deparar com a temática do multiculturalismo no âmbito da educação, é fundamental compreender, em primeira instância, a carga polissêmica e dinâmica que o termo apresenta, para que se possa imprimir uma tomada de posição em direção a uma educação multicultural coerente com a escola justa e democrática que é defendida aqui.

Tomando como base os escritos de Hall (2003) que apontam que o multiculturalismo é um termo valise que se expandiu no mundo de forma heterogênea e que denomina uma variedade de articulações, ideias e práticas sociais, que não corresponde a uma única doutrina, pois descreve uma série de processos e estratégias políticas distintas, consideradas sempre inacabadas.

McLaren (2000), ao buscar a transcodificação e o mapeamento das diferentes posições multiculturalistas, tomando cuidado para não se afastar da complexa amálgama que caracteriza o campo, apresenta quatro abordagens que nos ajudam a entender as diversas facetas que o multiculturalismo abriga, categorizando-as em: (1) conservador; (2) humanista liberal; (3) liberal de esquerda; e (4) crítico.

Fruto de uma ideologia imperial e colonialista, o multiculturalismo conservador ou empresarial tem nas teorias evolucionistas do século XIX o apogeu de suas ideias. Com base em determinismos biológicos e sociais, a vertente conservadora, conduzida pela elite branca (euro-norte-americana), justifica suas posições de dominação e poder a partir de uma perspectiva ambientalista, que aceita a inferioridade cognitiva negra em relação à branca. No escopo de seus ideais, figura a construção de uma cultura comum, que, na verdade, se traduz na universalização da cultura branca, vinculada a regimes dominantes dos discursos e das práticas sociais, inscritas em convicções racistas, classistas, sexistas e homofóbicas (McLaren, 2000).

Segundo McLaren (2000), o multiculturalismo conservador utiliza o termo “diversidade” como uma forma de encobrir a ideologia de assimilação que sustenta sua posição, localizada no interior de estruturas de poder totalizantes, no que tange ao conceito de igualdade. A esse respeito, Sousa Santos (2003) comenta que a política assimilacionista da vertente conservadora atribui a si mesma o direito e a imposição de sua universalidade, admitindo a existência de outras culturas apenas como inferiores.

Candau (2013), ao analisar o campo da educação a partir das abordagens multiculturais, endossa esse entendimento e esclarece que uma política assimilacionista favorece a integração de todos e de todas na sociedade, por meio da incorporação dos indivíduos à cultura hegemônica. Dessa forma, tende-se a promover uma política de universalização da escolarização, na qual todos e todas são convocados a participar do sistema escolar, mas sem questionar o caráter monocultural e homogeneizador presente na dinâmica desse sistema.

No que se refere ao multiculturalismo humanista liberal, a corrente argumenta em torno da noção de igualdade natural entre todas as populações raciais e grupos sociais e denuncia as condições desiguais promovidas pelo capitalismo, que fazem com que a competição social seja desfavorável para os grupos minoritários. Defende ainda, uma relação de tolerância e convívio harmonioso entre as diferentes culturas. No entanto, esta visão frequentemente resulta em um humanismo etnocêntrico e opressor, pois as normas sociais legitimadoras giram em torno de uma cidadania individual, universal, que são identificadas fortemente com a cultura dominante (McLaren, 2000; Lopes; Macedo, 2011; Silva, 2015).

No campo da educação, essa ideia se traduz no discurso afinado de que todos e todas têm o mesmo direito de acesso à escolarização. Porém, assim como na perspectiva conservadora, não se coloca em voga os elementos constituintes dessa escolarização, que, historicamente se construiu sobre a égide da cultura hegemônica. Além disso, as oportunidades igualitárias, sociais e educacionais, defendidas pelos liberais humanistas, vinculam-se fortemente à soberania da sociedade do capital, na qual a igualdade individual encontra-se intrínseca à livre circulação da economia de mercado.

Outro ponto a se destacar é que esta linha de pensamento, ao defender uma política de tolerância e coexistência pacífica entre culturas, não promove rupturas com uma postura universalista e reforça o obscurantismo em torno das relações de poder em que se inserem as práticas sociais e educativas, o que favorece a supremacia cultural dos grupos privilegiados.

Quanto ao multiculturalismo liberal de esquerda, McLaren (2000) aponta que, diferente do conservador e do liberal humanista, essa corrente traz à superfície o reconhecimento da diferença cultural e interpela a noção de igualdade como um elemento supressor de uma política de identidade. Essa linha advoga em torno da impossibilidade de existir uma convivência pacífica e harmoniosa entre diferentes grupos culturais e tem em vista a assimetria de forças estabelecida entre os grupos dominantes e os grupos considerados subalternizados. Por essa razão, seus defensores sugerem a criação de espaços específicos, onde os grupos socioculturais que tendem a ser marginalizados possam se expressar com liberdade e assegurar a manutenção e a valorização de suas matrizes culturais (Candau, 2013).

O reflexo dessa perspectiva para o campo da educação, segundo Lopes e Macedo (2011), pode ser percebido a partir dos movimentos reivindicatórios de grupos minoritários por escolas especializadas. No entanto, para McLaren (2000), essa postura abriga a tendência de essencializar as diferenças culturais, ignora o contexto histórico e cultural da diferença e, consequentemente, mantém a mesma lógica de um currículo escolar monocultural, que reforça a constituição de identidades estanques, além de abrir uma margem, ainda maior, para a formação de comunidades segregadas e para o surgimento de “nichos culturais”.

Em contraposição às ideias mitigadas e utópicas das abordagens conservadora e liberais, o multiculturalismo crítico ou de resistência inaugura uma agenda política de transformação social, ao adotar uma posição de denúncia das ações de poder e privilégios dos grupos dominantes, ao mesmo tempo em que argumenta em favor de uma diversidade afirmada dentro de uma política crítica da diferença, endossada pelo compromisso com a justiça social (McLaren, 2000).

Um dos pontos fulcrais da concepção multicultural crítica, elencados por McLaren (2000), está na recusa em compreender a cultura como um elemento não conflitivo, harmonioso e consensual. Ao apresentar sua clara filiação a essa corrente de pensamento, o autor, tomando por base os escritos de Chandra Mohanty, advoga que as diferenças culturais são forjadas em um território contestado, marcado por aspectos históricos, estratificados por relações de poder imensuráveis e assimétricas.

A partir de uma teorização pós-moderna e da ideia de uma cultura descentrada, McLaren enfatiza o papel da linguagem na construção de significados, compreende a cultura como um campo discursivo múltiplo e destaca a importância da escola e das reformas curriculares para o questionamento, enfrentamento e desconstrução dos pressupostos impostos pelos discursos hegemônicos universalistas e preconceituosos, o que garante a eclosão das vozes marginalizadas, oprimidas e sem poder (McLaren, 2000; Lopes; Macedo, 2011).

Ao lançar luz sobre a necessidade de uma educação multicultural crítica, McLaren reconhece a escola como um espaço fundamental de encorajamento dos estudantes para que possam realizar suas próprias leituras do conteúdo curricular e convoca os educadores críticos, considerados agentes revolucionários, a questionarem o seu fazer pedagógico e as estruturas escolares preestabelecidas, universalizadas e naturalizadas (McLaren, 2000).

Candau (2013), ao analisar os motes de uma educação multicultural, com base em uma perspectiva crítica intercultural, argumenta que a escola pode ser considerada um centro cultural, no qual diferentes linguagens e expressões culturais estão presentes e em permanente produção, sofrendo constantes mutações, por meio de cruzamentos e hibridismos. Para a autora, esse contexto chama os educadores e educadoras a interagirem com essas mutações, potencializa experiências e amplia o horizonte cultural dos alunos e alunas em diálogo com a comunidade escolar e a sociedade.

Dessa maneira, movimentar-se dentro de uma educação multicultural crítica sugere a assunção da existência de uma relação intrínseca entre a educação e as diversas culturas, por admitir que não há educação que esteja alheia aos processos culturais do contexto em que se situa, e também sugere a busca do rompimento com o viés padronizador, homogeneizador e monocultural de uma educação tradicional (Neira; Nunes, 2009b; Candau, 2013).

Assumir uma educação multicultural crítica sugere buscar o afastamento de noções hierarquizadas e assimétricas que orbitam as relações entre culturas no ambiente escolar. Alvitra colocar em destaque a “coexistência” dinâmica, complexa e conflituosa de culturas que são diferentes, porém não desiguais, o que significa compreender que os processos educativos estão situados no que Pérez Gómez (2001) denomina de “cruzamento de culturas”, que corresponde aos intercâmbios culturais manifestados no território da escola.

Na concepção de Pérez Gómez (2001), o fluido e complexo cruzamento de culturas produzido no interior dos espaços escolares pode ser considerado o responsável definitivo pela natureza, pelos sentidos e pela consistência do que os alunos e as alunas apreendem em seu processo de escolarização.

Esse cruzamento, segundo o autor, materializa-se nos influxos e (des)conexões estabelecidas entre a “cultura crítica”, alojada nas disciplinas científicas, artísticas e filosóficas; a “cultura acadêmica”, refletida nas linhas traçadas pelo currículo; a “cultura social”, manifestada pelos valores hegemônicos do cenário social; a “cultura institucional”, traduzida pelas normas, rotinas e ritos próprios da escola enquanto instituição; e a “cultura experiencial”, adquirida individualmente pelos estudantes, por meio de suas experiências espontâneas de intercâmbio com o meio em que cada um se insere (Pérez Gómez, 2001).

Diante dessa dinâmica, é necessário considerar que o cruzamento das diferentes culturas no ambiente escolar é produto e produtora de tensionamentos travados dentro do território contestado das práticas curriculares. Nessa perspectiva, o currículo assume uma importante posição dentro de uma educação multicultural, por ser concebido como o núcleo gerador de sentidos e significados dos processos educativos e, assim, espaço de lutas discursivas.

Sobre o Currículo Colonizado e o Currículo Colonizador

A relação entre povos dominantes e povos dominados, assim como entre culturas hegemônicas e culturas subjugadas, reflete no campo do currículo o fenômeno da colonização curricular. No escopo dos estudos desse fenômeno, se encontram as correntes de pensamento pós-colonialistas, que, incorporadas pela teorização pós-crítica, vêm imprimindo uma postura questionadora e contestatória no que tange às relações assimétricas de poder estabelecidas entre as diferentes culturas (Silva, 1995).

O processo de colonização curricular está associado à ideia de “colonialidade”, que se refere a um padrão de poder que emergiu como resultado do colonialismo moderno, mas, em vez de estar limitado a uma relação formal de poder entre dois povos ou nações, se relaciona à forma como o trabalho, o conhecimento, a autoridade e as relações intersubjetivas se articulam entre si (Torres, 2007; Oliveira; Candau, 2010).

Segundo Torres (2007), o colonialismo antecede a colonialidade, mas a colonialidade sobrevive mesmo com o fim do colonialismo, pois suas estruturas extravasam para o campo do ser e do saber. Ela mantém-se viva e atuante nos livros didáticos, nos critérios para um bom trabalho acadêmico, na cultura, no sentido comum, na autoimagem dos povos, nas aspirações dos sujeitos e em muitos outros aspectos de nossa experiência moderna. Por essa razão, se tem respirado a colonialidade moderna cotidianamente.

Para Sousa Santos (2003), o colonialismo segue presente na atualidade materializado nos cenários produzidos pela globalização contemporânea, por meio da qual as formas de dominação ganham novas configurações e justificativas. Para o autor, essa presentificação do passado tem consequências importantes e contundentes para o campo da educação, principalmente quando se destaca a maneira como as diversas áreas do conhecimento são apresentadas na escola.

Diante dessa conjuntura, ao buscar um olhar mais atento às trajetórias históricas dos conteúdos curriculares, os estudos pós-colonialistas, ainda que envoltos por diversas correntes, salvaguardando seus consensos e dissensos, têm proposto, de forma geral, não apenas imprimir denúncias sobre o processo de colonialidade moderna, promotor de hierarquias culturais e de saberes no espaço escolar, mas também, buscar a eclosão das narrativas de vozes historicamente marginalizadas.

Ao se inserir nesse movimento de denúncia e vocalização das narrativas subalternizadas, se busca compreender, a partir de uma breve e concisa incursão histórica, como posturas discriminatórias e supressoras se hegemonizaram nos currículos escolares brasileiros.

Colonização curricular no Brasil

O fenômeno de colonização curricular no Brasil tem suas raízes atreladas à relação entre dominante e dominado instituída a partir do período de invasão das terras brasileiras, iniciada no final do século XV, pelos colonizadores europeus. Até esse período, o cotidiano das comunidades indígenas brasileiras destinava-se à vida em comunidade, que não apresentava estruturação de classes sociais, o modo de produção era caracterizado pelo comunismo primitivo, os indivíduos eram livres e possuíam os mesmos direitos (Saviani, 2013).

De acordo com Saviani (2007), os homens produziam sua existência em comum e se educavam nesse próprio processo. A educação era essencialmente empírica e comunitária, os ensinamentos e as tradições eram transmitidos por meio das gerações. A escola era o próprio lar. No entanto, essa realidade foi modificada com a chegada dos portugueses e com a instituição do monopólio da educação jesuítica, que acabou por suprimir e sufocar a cultura dos povos nativos (Zotti, 2006).

Iniciou-se, nesse contexto, a imposição de valores e crenças europeias, por meio, principalmente, da catequese e da educação institucionalizada. Dessa forma, o processo de colonização mostrou-se como sinônimo de imposição da ideologia de um povo dominante sobre um povo dominado. Para colonizar a terra, era primordial colonizar as consciências e as formas de ser (Zotti, 2006).

Sob a égide da doutrina mercantilista, considerada a primeira fase do capitalismo, os colonizadores, com o objetivo de explorar a nova colônia, visando à obtenção máxima de lucros, promoveram um esquema de dependência que tinha na educação a ponte para a garantia de seus interesses econômicos. Desse modo, para assegurar a dependência econômica era fundamental a dependência política e, para garanti-la, por sua vez, era crucial a dependência cultural, e isso era feito por meio da instrução escolarizada, que teve como sustentáculo a atuação incisiva da igreja católica (Zotti, 2006).

Portanto, o primeiro modelo curricular proposto tinha como base o ensino da doutrina cristã, dos supostos “bons costumes” (eurocêntricos) e da língua portuguesa, com o objetivo de promover a aniquilação dos elementos indígenas para que a colonização acontecesse de maneira efetiva (Zotti, 2006). De acordo com Zotti, para atender, de forma mais contundente, às necessidades da sociedade dominante, os colégios jesuítas publicaram, em 1599, a “Ratio Studiorum”, um plano no qual tudo estava previsto, até mesmo a maneira de posicionar as mãos e levantar os olhos, ou seja, um currículo colonizador que ultrapassava os conteúdos escolares. Com finalidade humanista, o referido plano era adequado para a política colonial, pois havia uma supervalorização das atividades intelectuais, o que resultava em um preconceito contra as atividades braçais.

O destaque ao trabalho intelectual acabou por manter os alunos distantes dos problemas da realidade, culminou com a rejeição do real e levou a considerar civilizado apenas o seu mundo, que, de maneira ilusória, passou não apenas a propagar uma raça perfeita e pura, como também reforçou a dominação sobre a maioria que não tinha acesso ao mundo letrado, “portanto a educação pertencia a quem tinha o que fazer com ela” (Zotti, 2006, p.124).

À luz de Bhabha (2003), a fantasia colonial da origem pura cria estereótipos que exercem um papel crucial para a compreensão do “jogo ambivalente” que constitui a cultura colonial, de prazer/desprazer, de dominação/defesa, no qual o outro/diferente é colocado como expressão do mal, ao mesmo tempo em que é objeto de desejo, que suprirá o que falta.

Nessa perspectiva, é possível compreender a função reforçadora da educação no que tange à cultura do colonizador, uma função que se estabeleceu por meio da impressão de estereótipos. O currículo, por sua vez, viabilizou a sedimentação dos propósitos dos grupos dominantes, pois foi construído para perpetuar uma visão de homem, de mundo e de sociedade sob os moldes da cultura europeia, branca, masculina e cristã (Pereira, 2009).

Quando se analisa a conjuntura da institucionalização da educação brasileira, observa-se que o processo de colonização do currículo confunde-se com as investidas da colonização territorial, fruto da expansão europeia. Sendo assim, mesmo após o fim do período em que o Brasil esteve na condição de colônia, a colonização desses processos educativos seguiu transmutando seus formatos, razões e frentes de ação. Os processos de dominação e subjugação, não apenas de determinados grupos étnicos, mas também da cultura popular como um todo, continuam silenciando diferenças culturais, agora por meio do fenômeno da colonialidade, congênere da globalização contemporânea.

No entanto, o panorama dos estudos curriculares tem mostrado que, no cerne das propostas curriculares atuais, há uma preocupação, cada vez mais manifesta, de promover um processo de descolonização dos currículos, pois se reconhece o quão excludentes e discriminatórias têm sido as propostas curriculares ao longo do tempo. Neira (2008) destaca que a negação da diversidade cultural antes feita de maneira mais evidente, agora é discreta e arguciosa com a tentativa de camuflar a real intenção do currículo. Para Bhabha (2003), essas são formas limitadas de alteridade, pois as distinções racial, cultural e histórica são marginalizadas.

O que se observa hoje nas práticas curriculares colonizadas é que suas diretrizes se encontram distantes do cotidiano e do fortalecimento das identidades dos sujeitos, em que pese a restrição dos espaços para a voz da contextualização. O currículo tende a impor um padrão para os marcadores sociais de classe, gênero, locais de moradia e religião. Nessa lógica, a escola acaba por ratificar uma monocultura baseada em uma só forma de ser e estar no mundo: a branca, católica, eurocêntrica, machista, urbana e heterossexual (Louro, 2011).

Educação Física e a (des)colonização das práticas corporais

A Educação Física, enquanto disciplina/componente curricular da educação escolarizada, assim como diversas áreas do conhecimento, sofreu fortes influências do movimento de colonialidade, instaurado em contextos socioculturais e educativos. Por essa razão, a trajetória histórica da educação, em geral, e da Educação Física, em particular, traz à tona importantes elementos reforçadores da cultura ocidental dominante, que se manifestam em currículos eminentemente colonizados (Neira; Nunes, 2009a).

Na configuração de prática corporal institucionalizada, a Educação Física chega ao Brasil carregando fortes raízes europeias, tendo em vista que sua entrada nas escolas brasileiras se deu no formato dos métodos ginásticos europeus que perduraram nos currículos por um longo período, até assumir conformações outras que estiveram, em muitos momentos da história, alinhadas aos interesses de grupos sociais dominantes. Castellani Filho (2013) esclarece que, desde o período imperial, a Educação Física esteve a serviço da construção de estereótipos de comportamento, principalmente do masculino e do feminino, do modelamento dos corpos da elite mandatária e do trabalhador.

Dessa maneira, no que se refere às dimensões legais, em seu formato higienista, assumido ainda no período colonial, o currículo da Educação Física contribuiu com o movimento de assepsia social, encabeçado pelos médicos sanitaristas e gestores públicos da época. Vinculados aos ideais eugênicos de regeneração e embranquecimento da raça, os exercícios físicos apresentavam o poder capital de amenizar o grande estado de miséria social vivido pelo povo brasileiro, ao promoverem o desenvolvimento de corpos saudáveis, disciplinados e moralizados (Gordo; Santos; Moreira, 2014).

A Educação Física higienista seguiu soberana até meados do período republicano, no qual a formação de uma sociedade capitalista e industrial exigiu das práticas curriculares da Educação Física Escolar a assunção do papel de modeladora dos corpos da futura elite dirigente e dos futuros trabalhadores das fábricas (Soares, 2012).

Assim, de um lado, a Educação Física, voltada para os filhos das classes dominantes, forjava identidades empreendedoras, que, ao estilo europeu, deveriam apresentar corpos com ar de requinte, elegância e aspecto saudável. De outro, ajudava a moldar identidades subservientes, que deveriam apresentar força física suficiente para suportar horas extenuantes de trabalho fabril (Nunes; Rúbio, 2008; Neira; Nunes, 2009a; Soares, 2012).

Mais adiante na história, já em meados dos anos de 1930, período de instauração do Estado Novo, a Educação Física apreende uma conformação militarista, orientada para a formação de identidades nacionalistas, moldadas pelos discursos de uma educação moral e cívica. Nesse formato, os currículos oficiais estiveram atrelados a uma noção de adestramento físico. Com base em princípios de segurança nacional e eugenia da raça, a Educação Física deveria promover práticas pedagógicas suficientemente rígidas, que pudessem forjar uma juventude servidora e defensora da pátria, promotora da elevação da nação (Ghiraldelli Júnior, 1991).

Outro formato curricular emblemático do importante papel direcionado à Educação Física, no que tange à propagação de discursos dominantes, configura-se por meio do fenômeno da esportivização, vivido no Brasil de maneira mais contundente a partir da instauração do Estado ditatorial, no qual o esporte passou a representar a falaciosa coesão patriótica almejada pelo governo militar. Sob forte influência da cultura norte-americana, o esporte ganhou no espaço social brasileiro traços de espetacularização midiática, enquanto no campo educacional tornou-se conteúdo hegemônico nas aulas de Educação Física, assumindo a missão de forjar identidades lutadores e vencedoras (Nunes; Rúbio, 2008).

A força do movimento de colonialidade no currículo da Educação Física promoveu durante muito tempo no interior das escolas um abismo cultural, que, de um lado, segregou diferenças e, de outro, universalizou um único sentido de cultura. De acordo com Neira e Nunes (2009b), ao analisar rapidamente as propostas curriculares da Educação Física atualmente em vigor nas escolas brasileiras, não é difícil de encontrar o predomínio de práticas corporais europeias e estadunidenses. Em contrapartida, a mesma análise permite constatar que as diversas manifestações da cultura corporal popular têm sido pouco prestigiadas.

Como exemplo, os autores citam o ensino esportivo, que tende a valorizar sobremaneira modalidades como o vôlei, o futebol, o basquete e o handebol, que contemplam a cultura branca, do hemisfério norte, de fortes raízes cristãs e masculinas, em detrimento de outras práticas mais próximas dos referenciais culturais dos povos brasileiros. Esse movimento acaba por contribuir fortemente para o processo de colonização do patrimônio cultural das práticas corporais dos povos locais (Neira; Nunes, 2009b).

No entanto, é fundamental destacar que todas essas conformações e discursos curriculares hegemônicos não caminharam pela história sem passar por conflitos e pelo questionamento e ressignificação de movimentos contestatórios contra-hegemônicos, de resistência. Ainda que se manifestem de maneira paulatina, os processos de descolonização vêm mostrando novas possibilidades curriculares e desbravando caminhos que abrem clareiras para uma política da diferença que valorize o diálogo multicultural.

A descolonização curricular sugere, assim, a valorização da heterogeneidade identitária, manifestada na pluralidade de pertencimentos que definem modos de ser e de pensar. Um possível caminho para que esta valorização possa emergir e se materializar no contexto escolar está na projeção de práticas educativas alternativas, que sejam capazes de pensar do lugar das ruínas, das margens, de falar por meio das vozes e das subjetividades subalternizadas (Sousa Santos, 2003; Bonow; Mascarenhas, 2012)

Para tanto, no campo da Educação Física, Neira e Nunes (2009a) defendem que se os princípios da descolonização e da justiça curricular forem articulados dentro de uma perspectiva multicultural crítica, as atividades de ensino do componente abordarão com idêntica dignidade, tanto as experiências relacionadas às práticas corporais euroamericanas, quanto as práticas provenientes de outros povos e segmentos socioculturais, como os indígenas, os negros e os caboclos.

Outro ponto fundamental levantado pelos autores, no que tange ao processo de descolonização curricular, refere-se à necessidade de tratar a ação educativa com o cuidado suficiente para não incorrer no que Stoer e Cortesão (1999) denominam de daltonismo cultural, que consiste na incapacidade perceptiva que o professor manifesta ao não se mostrar sensível ao arco-íris de culturas presente na realidade dos alunos e das alunas (Neira; Nunes, 2009a).

Neira e Nunes (2009a) advertem que uma intervenção pedagógica daltônica pode amparar uma visão distorcida de igualdade que tende a promover a homogeneização ou a universalização da diversidade cultural, o que frequentemente acontece no campo da Educação Física, por meio da legitimação apenas de práticas corporais oriundas da cultura dominante. Outro reflexo de uma postura daltônica pode ser identificado quando os professores projetam desempenhos semelhantes por parte da coletividade discente.

Portanto, pensar um currículo descolonizado para a Educação Física requer a impressão de um olhar inquieto e desnaturalizado para as nuanças multiculturais expressas no ambiente escolar, nos territórios locais que circundam a escola, na subjetividade corporal de cada sujeito que compõe a comunidade escolar, nas matrizes locais e globais que influenciam o patrimônio da cultura corporal dos povos. Requer também uma negociação conflituosa e constante dentro do universo das práticas corporais que contemplam as mais diversas e diferentes culturas.

Procedimentos Metodológicos

Esta investigação constitui-se em uma pesquisa documental, desenvolvida sob os princípios da abordagem qualitativa, que, para Minayo (2002), responde questões muito particulares, trabalhadas a partir da busca por significados, motivos e aspirações, no interior de processos marcados pela reflexão da realidade, que não podem ser quantificados.

Recorrendo à análise documental, que, segundo Lüdke e André (2017, p.45), consiste em uma técnica exploratória que “busca identificar informações factuais nos documentos a partir de questões ou hipóteses de interesse”, se direciona o olhar investigativo para a “Matriz Curricular Para o Ensino Fundamental – anos finais (6° ao 9° ano)”, lançada em 2017 pela Secretaria Municipal de Educação (Semed) da cidade de Cametá para a disciplina/componente curricular Educação Física.

No presente movimento de análise, seguem-se os procedimentos metodológicos sugeridos por Lüdke e André (2017), que sugerem o encaminhamento de dois passos fundamentais. O primeiro consiste na seleção e na caracterização do documento selecionado, que devem estar balizadas por critérios de escolha não aleatórios. O segundo, por sua vez, se efetua a partir da análise propriamente dita dos dados.

Dessa forma, o documento selecionado para a realização desta pesquisa é caracterizado como um documento oficial, elaborado por um órgão público municipal do estado do Pará. O critério para a sua seleção girou em torno da clara assimetria existente entre o currículo oficial, direcionado às escolas do município de Cametá e a realidade local da região amazônica brasileira.

A centralidade da educação do município em uma pedagogia tradicional, alicerçada em um currículo oficial prescritivo e monocultural, porém inserida dentro de um cenário múltiplo e ao mesmo tempo peculiar, em que se insere a cultura corporal ribeirinha, leva a interrogar o currículo oficial de Cametá para a Educação Física e a trazer à tona seus traços de colonialidade.

O acesso à fonte se deu via solicitação do documento junto ao diretor de uma das escolas da rede pública municipal de Cametá, que por sua vez entrou em contato com a Secretaria Municipal de Educação. O documento foi entregue ao diretor que repassou o arquivo digitalizado.

No que se refere à análise propriamente dita do documento, se aplicam algumas técnicas da análise de conteúdo desenvolvida por Franco (2012). Sendo assim, se realiza uma “pré-análise” do material, que consiste no conjunto de buscas iniciais, nos primeiros contatos com os arquivos selecionados. Nesta fase, imprime-se a atividade denominada “leitura flutuante” sobre o texto, deixando-o “invadir” a quem o lê, conforme sugere a autora por impressões e representações preliminares.

Em seguida, se passa ao processo de categorização, definido como “uma operação de classificação de elementos constitutivos de um conjunto, por diferenciação seguida de um reagrupamento baseado em analogias, a partir de critérios definidos” (Franco, 2012, p.63). Isso implica extrair do texto analisado elementos centrais que serão colocados em questionamento e confrontação com a literatura especializada da área para posteriores inferências.

Desta forma, se focaliza o documento a partir de dois eixos previamente estabelecidos: (1) os aspectos gerais do documento e (2) a disciplina/componente curricular Educação Física na Matriz Curricular da Semed/Cametá. Dentro desses eixos, se mobiliza as inferências em torno das categorias: competência; unidades temáticas e habilidades, que foram categorizadas a priori. Ou seja, tanto as categorias, quanto seus respectivos indicadores foram predeterminados em função da busca por uma resposta específica. No caso deste estudo, a questão norteadora e mobilizadora foi: quais os elementos que indicam traços de colonialidade na matriz curricular do município de Cametá para a disciplina/componente Educação Física?

Locus da pesquisa: o município de Cametá

O cenário no qual se lança o olhar investigativo se insere na realidade educacional do município de Cametá, cidade paraense pertencente à região amazônica brasileira, inundada pelas águas dos rios da região do Baixo Tocantins, que aproxima e distancia, alimenta e é espaço de lazer, contemplação e poética, é quintal de lendas e reduto de uma cultura ribeirinha ímpar (Almeida, 2010).

Também conhecido como “Pérola do Tocantins”, Cametá é o terceiro município mais antigo do estado do Pará e está dividido em duas porções de terra: a região das ilhas e a região de terra firme. A cidade apresenta uma população formada por 110.323 habitantes, de modo que 47.984 estão localizados na área urbana e 62.339 na área do campo, o que configura 43% da população urbana e 56% da população do campo (Sousa, 2002).

A área ribeirinha ou das ilhas, como comumente é chamada, concentra muitas espécies de vegetação de valor econômico, como o açaizeiro, o buritizeiro e a andirobeira, assim como uma diversidade de espécies de animais terrestres e aquáticos. As ilhas abastecem a cidade com pescado, carne suína e objetos artesanais feitos de vegetais como paneiros, peneiras, bolsas e outros produtos utilizados como instrumento de trabalho no campo ou na cidade (Pinheiro, 2009).

Os transportes fluviais de pequeno, médio e grande porte são responsáveis pela locomoção da população das ilhas, bem como têm servido para transportar passageiros da cidade e de outras localidades do município para a capital do estado ou para outras cidades da região Norte, ligadas a Cametá por meio do Rio Tocantins (Pinheiro, 2009).

Ao longo de sua constituição histórica, a cidade esteve marcada pela formação de populações do campo (quilombolas, agricultores e ribeirinhos), que estão inseridas no contexto das belezas naturais com uma rica flora e fauna, que revelam uma forte e íntima relação com a natureza que transcende as questões de sobrevivência e que proporcionam a construção de inúmeros saberes populares, peculiares dessa região (Pinheiro, 2009).

Oliveira (2008) explica que os saberes populares são frutos de experiências de vida (trabalho, vivência afetiva, religiosidade etc.). São saberes experienciais adquiridos no fazer cotidiano, oriundos da relação dialética com o mundo, e também auxiliam no processo de construção de identidades.

Na lógica social dos caboclos-ribeirinhos, construída a partir da inter-relação homem-natureza, os saberes populares constituem a dimensão cognitiva da cultura, que se traduzem em pelo menos três tipos de saberes: os saberes da terra; os saberes da mata e os saberes das águas, que são repassados de geração em geração a partir da oralidade, que apresenta-se como a forma típica das populações rurais-ribeirinhas de expressarem suas vivências, transmitirem seus saberes, valores e hábitos (Oliveira, 2008).

Diante do exposto, percebe-se que a realidade insular do município denota um arcabouço cultural que necessita ser valorizado pelo processo de escolarização. Convergindo com Neira (2008) e Oliveira (2008), acredita-se que a educação não pode ser construída desvinculada da cultura, uma vez que educação e cultura se retroalimentam constantemente. Concorda-se com as palavras de Forquin (1993, p.14) que alerta para que a “educação não é nada fora da cultura e sem ela”.

Análise do Currículo da Educação Física da Semed/Cametá: as marcas de um currículo colonizado

A partir dessa incursão analítica sobre o documento, organiza-se a apresentação dos dados e das análises em torno de dois eixos: (1) Aspectos gerais do documento e (2) A disciplina/componente curricular Educação Física na Matriz Curricular da Semed/Cametá. Essa conformação permitiu obter, tanto uma visão panorâmica do documento, quanto uma percepção específica dos elementos que caracterizam a proposta curricular da Semed para as escolas do município de Cametá.

Aspectos gerais do documento

No que concerne à estrutura, o documento intitulado “Matriz Curricular para o Ensino Fundamental II” é composto de 230 páginas e está dirigido aos anos finais do Ensino Fundamental, contemplando do 6º ao 9º ano. A proposta curricular foi divulgada em 2017 e traz a estruturação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) como referência para indicar a organização do currículo em “Áreas do conhecimento”.

Dessa forma, a Matriz Curricular para a Educação Básica do município de Cametá está configurado em: (1) Área de Linguagens, que contempla os conhecimentos de Língua Portuguesa, Arte, Educação Física e Língua Inglesa; (2) Matemática; (3) Ciências da Natureza, que corresponde à disciplina de Ciências; (4) Ciências Humanas, que se refere aos conhecimentos de Geografia e História; e (5) Ensino Religioso.

As Áreas do conhecimento apresentam quatro campos direcionados para cada ano da etapa de ensino: (1) Competências Específicas, que refletem os objetivos gerais de aprendizagem de cada área; (2) Unidades Temáticas, que compreendem os assuntos a serem abordados; (3) Habilidades, que se traduzem em objetivos específicos de aprendizagem para cada ano; (4) Objetos do Conhecimento ou Conteúdo de Ensino, que se referem aos conceitos, processos e práticas a serem desenvolvidas em cada unidade temática.

De maneira geral, o documento não anuncia o referencial teórico que sustenta suas escolhas estruturais, não apresenta a concepção de educação que orienta a proposta curricular, nem os princípios pedagógicos da concepção de cada área do conhecimento.

Uma outra ausência percebida nessas análises é a não exposição do contexto de elaboração da proposta. No documento, não há nenhuma descrição de informações que permita compreender se a proposta em vigor se estabeleceu como fruto de um trabalho coletivo ou não. Não permite também identificar quais agentes participaram do processo de construção da proposta, ou seja, se o desenvolvimento do documento contou com a participação de professores, de consultores especialistas e de outros sujeitos da comunidade escolar.

A disciplina/componente curricular Educação Física na Matriz Curricular da Semed/Cametá

Como a maioria das áreas do conhecimento dispostas na matriz curricular da rede pública de Cametá, a disciplina/componente curricular Educação Física está dividida em quatro campos distribuídos por ano, conforme se detalhou no tópico “Aspectos gerais do documento”.

Sendo assim, no que tange ao campo das “Competências específicas da Educação Física para o Ensino Fundamental”, o documento da Semed de Cametá realiza uma clara transposição das competências elencadas no documento da BNCC e acrescenta ao conjunto de dez competências da Base apenas mais uma, que traz o seguinte texto: “Considerar as práticas corporais como fonte de legitimação de acordos e condutas sociais, e sua representação simbólica como forma de expressão dos sentidos, das emoções e das experiências do ser humano na vida social” (Cametá, 2017, p.102).

Essa competência acrescida, ainda que traga a importante compreensão das práticas corporais como fruto de uma construção social, direciona a construção para um lugar de “acordos” e “representações simbólicas”, que, inevitavelmente, partem da legitimação das culturas hegemônicas, em detrimento das culturas populares, locais ou regionais.

Isso ocorre porque, à luz de uma concepção multicultural crítica de educação, que não acredita em um cruzamento cultural harmonioso e não conflitivo, além das assimetrias de poder, historicamente estabelecidas entre as diferentes culturas, a ideia de representações, acordos ou consensos caminha dentro de um viés conservador e liberal, que tende a homogeneizar as manifestações culturais tomando como mote a reprodução da cultura dominante.

A esse respeito, Neira (2008) comenta, com base em uma visão multicultural crítica, que os indivíduos produzem, renovam e reproduzem os significados sociais em um contexto constantemente configurado e reconfigurado pelo poder. É por meio das variadas e assimétricas conformações das estruturas de poder que os processos de reprodução ajudam a construir a experiência coletiva, cuja tendência é atuar em favor de uma cultura comum que, na verdade, é o reflexo da supremacia branca, do patriarcado, do elitismo de classe e de outras formas dominantes de cultura.

Partindo dessa perspectiva, Neira e Nunes (2009a) destacam que as diversas práticas corporais são um artefato construído na cultura e, portanto, não abrigam um sentido fechado em si mesmo, pois sua existência é fruto de um longo processo de significações. Assim, uma dança, uma luta ou um esporte, qualquer manifestação da cultura corporal, carrega os significados próprios para o grupo que a formulou e neles se expressam intenções, histórias, relações e sentidos múltiplos e, ao mesmo tempo, singulares, que não podem estar fechados dentro de acordos comuns ou de representações únicas.

Ao se analisar as demais competências de maneira isolada, se destacou que dois saltos positivos são realizados em torno dos objetivos gerais de aprendizagem. O primeiro deles relaciona-se ao claro esforço em realizar um desatrelamento da concepção de Educação Física a ideais de desempenho e aptidão física, que, por um longo período da história, sustentaram a construção dos currículos escolares do componente neste país. Esse fato se constata quando no texto das competências são anunciadas a busca pela ampliação do acervo cultural dos estudantes; a necessidade de identificar e analisar criticamente padrões de desempenho, saúde e beleza; e a abordagem da saúde enquanto um direito de todo o cidadão.

O segundo salto se configura, tanto na ênfase do desenvolvimento das práticas corporais a partir da compreensão dos efeitos e do combate a posicionamentos discriminatórios e preconceituosos, quanto na emersão que o texto das competências faz à necessidade do reconhecimento das práticas corporais como elementos constitutivos da identidade cultural dos diferentes povos e grupos, com base na análise dos marcadores sociais de gênero, geração, padrões corporais, etnia e religião.

No entanto, quando se confrontou esses saltos em relação aos demais campos em que se desdobram as competências, bem como, quando observou-se o diálogo (ou a falta dele) desses campos entre si, notou-se arranjos contraditórios, limitadores do desenvolvimento e sustentação de práticas pedagógicas e curriculares que transcendam uma concepção de Educação Física compensatória, predominantemente voltada para a promoção da saúde, do bem-estar físico e da socialização.

Em outras palavras, ao trazer, de um lado, uma estruturação das competências com alguns saltos e potenciais para o trabalho em uma perspectiva multicultural, e de outro, uma inclinação às experiências explicitamente voltadas para a promoção da saúde e apreensão de técnicas corporais, a proposta acaba enfraquecendo a possibilidade de fomento à ampliação de uma leitura dos diversos e diferentes contextos socioculturais em que as práticas corporais se manifestam, o que leva a constatar o silenciamento da cultura corporal popular que a região em torno de Cametá abriga.

Nesse sentido, quando nessas análises se estabelece uma justaposição entre as “Unidades Temáticas” e os “Conteúdos de Ensino”, observou-se que a matriz curricular da Semed de Cametá para a disciplina/componente Educação Física sugere o desenvolvimento de práticas corporais ligadas, predominantemente, a uma cultura comum citadina que em nada dialoga com os saberes da terra, da mata e das águas, típicos dos modos de ser e viver das populações ribeirinhas, citadas por Oliveira (2008). Essa perspectiva reforça os traços de um currículo colonizado de nuanças monoculturais.

O documento, portanto, apresenta oito “Unidades Temáticas”: (1) Atividade física e saúde; (2) Jogos e brincadeiras; (3) Esporte; (4) Ginástica; (5) Danças; (6) Lutas, (7) Atividades de aventura urbanas; e (8) Atividades de aventura na natureza. Dessas oito unidades cinco estão relacionadas à “Conteúdos de Ensino”, que valorizam a cultura corporal hegemônica euroamericana e urbana e expressam visões naturalizadas da disciplina/componente curricular Educação Física.

No que tange à unidade Atividade Física e Saúde, notou-se que as sugestões dos conteúdos de ensino para essa unidade denotam uma relação latente que apregoa a história, os benefícios e a importância da Educação Física a uma visão naturalizada da área do conhecimento, que a relaciona instantaneamente ao campo da saúde.

Nas unidades de Esporte e Ginástica, a predominância de conteúdos de ensino voltados para modalidades como basquetebol, handebol, voleibol, futsal, futebol e atletismo no esporte e para modalidades olímpicas e paraolímpicas na ginástica, além de reforçar a perspectiva de Neira e Nunes (2009a), que denunciam a hegemonia de práticas corporais estadunidenses e europeias, também abre margem para a transposição do esporte profissional e performático para dentro do ambiente da escola, uma vez que, no campo das “Habilidades”, que tratam dos objetivos de aprendizagem específicos de cada unidade temática, não se prevê a reflexão crítica desses conteúdos, contradizendo o que sugerem as competências do documento para a Educação Física.

Os contextos dos conteúdos de ensino que abordam as atividades de aventura urbanas e de aventura na natureza também são reforçadores de um profundo desligamento das práticas corporais sugeridas no currículo da Semed com o universo dos saberes e da cultura corporal ribeirinha da região do município de Cametá. Isto ocorre porque, de um lado, a predominância e a valorização de atividades urbanas dentro de um ambiente rural e insular já se configuram como um fator que desconsidera a especificidade local e impõe práticas pedagógicas e curriculares totalmente alheias ao cenário real. De outro, as atividades de aventura na natureza, ao sugerirem modalidades como rapel, mergulho e rali, por exemplo, perdem a oportunidade de buscar um diálogo profundo com a identidade cultural da região, que tem na relação com a natureza o elemento fundante de sua constituição, tanto em relação ao universo da coletividade, quanto das subjetividades dos sujeitos que nela se inserem.

Todas essas nuanças analisadas no currículo da Semed de Cametá para a disciplina/componente Educação Física ganham um traço de colonialidade mais evidente quando colocou-se em questão os possíveis desdobramentos provocados pela escolha dos verbos que são elencados no campo das “Habilidades”, que, como já se referiu aqui, diz respeito aos objetivos de aprendizagem específicos para cada uma das unidades temáticas em relação aos conteúdos de ensino.

Desse modo, é importante ressaltar que a escolha dos verbos (que são a voz da ação) dentro de uma proposta curricular são fundamentais para o direcionamento das práticas pedagógicas, pois eles abrigam as intencionalidades que conduzirão os processos educativos. No caso do currículo analisado, a predominância dos verbos “conhecer”, “reconhecer”, “identificar”, “experimentar”, “praticar”, “planejar” e “construir”, em relação aos verbos “problematizar”, “compreender” e “analisar”, denuncia dois movimentos que merecem reflexão.

O primeiro deles é a ênfase em verbos que engessam a disciplina/componente curricular Educação Física em uma noção pragmática e procedimental, que fomenta muito mais o “saber fazer”, em detrimento de uma postura questionadora, que também estimule o estudante a “pensar” e a “interrogar” esse fazer. O segundo movimento se dá a partir da pouca ênfase em verbos que desenvolvam processos importantes de problematização, o que esvazia as possibilidades de um aprofundamento crítico em torno de temas como, por exemplo, as diferenças culturais.

Esses dois movimentos também tendem a repercutir no enfraquecimento de saltos aparentemente positivos dentro do currículo da Semed de Cametá. Quando foram focalizadas as unidades temáticas Jogos e Brincadeiras, Danças e Lutas, se observou a sugestão de conteúdos de ensino que trazem à tona elementos da cultura popular, como os jogos tradicionais, as danças indígenas e as lutas de matrizes indígenas, caboclas e africanas.

No entanto, a presença desses elementos no currículo, sem uma atmosfera problematizadora, desemboca no que Neira e Nunes (2009a) apontam como abordagens superficiais, que terminam por transmitir a impressão de que essas culturas são mera perfumaria ou algo exótico e curioso. Os autores defendem que o simples fato de serem anunciados ou abordados no texto da proposta curricular elementos da cultura popular de forma pontual e esporádica, longe de uma contextualização que articule manifestações e processos sociopolíticos de luta e resistência, pouco ou nada favorece a construção de subjetividades abertas à diferença e à diversidade.

A incursão analítica realizada sobre a matriz curricular do município de Cametá colocou esta análise diante de um currículo com traços marcantes do fenômeno de colonialidade, presente na conjuntura contemporânea das experiências cotidianas dos autores deste artigo. Esses traços acabam por materializar um desenho curricular, no qual as marcas da realidade e do cotidiano da cultura insular ribeirinha, tão forte na região da Amazônia paraense, acabam tendo seus tons e suas formas desbotadas.

Nesse sentido, a defesa aqui pretendida é pela elaboração coletiva e conflituosa de um currículo ribeirinho que negocie, dentro do território contestado da escola, a abertura de espaço-tempos que problematizem e valorizem as diferentes culturas e conectem o global e o local na perspectiva não apenas de ampliar o acervo cultural dos estudantes, mas também de fomentar uma postura crítica em relação às leituras que são feitas do mundo e das conjunturas sociais imersas em estruturas de poder, que reverberam e influenciam as formas de ser e de viver, seja no plano da subjetividade, seja no da coletividade.

Considerações Finais

Chega-se às considerações finais deste estudo compreendendo que toda a investigação científica se encontra em um lugar transitório, refutável, aberto e inacabado. Portanto, segue-se consciente de que o olhar que se imprime sobre o presente objeto de pesquisa carrega o peso de dessas subjetividades e alinhamentos teóricos que estão sempre passíveis de contestação ou ampliação.

Desta forma, orientados por uma perspectiva multicultural crítica busca-se analisar a “Matriz Curricular para o Ensino Fundamental - anos finais (6° ao 9° ano)”, do município de Cametá-Pará, para o componente Educação Física, lançada em 2017, pela Secretaria Municipal de Educação. Os resultados do esforço investigativo revelaram que a proposta curricular analisada abriga traços de colonialidade em seus elementos estruturantes, categorizados e denominados aqui de “campos”.

Estes campos, distribuídos em competências específicas; unidades temáticas; habilidades e objetos do conhecimento ou conteúdo de ensino, abrigam contradições e dissensos nos seus conteúdos em si e na relação uns com os outros. A proposta não apresenta uma coerência entre as intenções de aprendizagem apresentadas no campo competências e as intenções pedagógicas elaboradas nos demais campos. As intencionalidades descritas no campo das competências que trazem traços potenciais para o desenvolvimento de uma perspectiva multicultural de educação, acabam se desbotando diante do tom prescritivo e do alinhamento da Educação Física com um lugar compensatório.

Outros traços de colonialidade também são percebidos através do afastamento explícito, não apenas dos conteúdos projetados, mas principalmente da abordagem sugerida para cada conteúdo, demonstrando uma perspectiva limitante para o trato com as práticas corporais orientadas por dimensões socioculturais, que ao serem negociadas entre o local e o global e abordadas por um viés problematizador abrem possibilidades de diálogos e cruzamentos culturais.

As desconexões entre o texto do currículo oficial analisado e a cultura ribeirinha do locus em que se insere, traduzida no predomínio da cultura urbana na organização dos saberes curriculares das criança e jovens que habitam a beira dos rios amazônicos, apontam para a necessidade de se refletir sobre os movimentos de silenciamento e negligência que tem marcado a construção dessas políticas e práticas curriculares.

O cenário insular da região amazônica apresenta uma densa teia de singularidades e sujeitos, entre os quais estão os ribeirinhos, que, por sua vez, possuem um alicerce cultural de variados saberes e práticas que não podem estar desatrelados do processo de escolarização.

Por esta razão, reconhecer que se vive em uma sociedade multicultural impõe desafios para a educação e seus agentes, para a construção e vivência dos currículos, enquanto produções culturais discursivas, que precisam estar atentas às particularidades dos sujeitos e seus grupos identitários, conectando-se às demandas políticas e sociais que a diversidade cultural reivindica.

Acredita-se que as discussões aqui levantadas não darão conta de abarcar ou esgotar todo o universo de possibilidades e olhares a serem lançados sobre a proposta analisada, nem tampouco sobre a temática que se coloca em evidência e os desdobramentos que nela incidem, principalmente se se leva em consideração a necessidade de um debruçar aprofundado no cotidiano dinâmico e incerto em que esta proposta se insere. Porém, admitindo algumas fragilidades investigativas, espera-se que estas linhas sejam contributivas e, em certa medida, inspiradoras também.

Como citar este artigo/How to cite this articleSantos, M.A.R.; Bentes, L.M.N.; Barbosa, S.F. Currículo, Educação Física e multiculturalismo: análise de um currículo ribeirinho colonizado. Revista de Educação PUC-Campinas, v.24, n.2, p.300-317, 2019. http://dx.doi.org/10.24220/2318-0870v24n2a4301

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Recebido: 18 de Junho de 2018; Revisado: 18 de Novembro de 2018; Aceito: 28 de Novembro de 2018

Colaboradores M.A.R. SANTOS colaborou com a concepção e o delineamento teórico metodológico, orientação e a supervisão em todas as etapas da execução, correção e aprovação da versão final. S.F. BARBOSA e L.M.N. BENTES colaboraram na coleta documental, análise e interpretação dos dados e redação do manuscrito.

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