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Revista de Educação PUC-Campinas

versión impresa ISSN 1519-3993versión On-line ISSN 2318-0870

Educ. Puc. vol.25  Campinas  2020  Epub 22-Oct-2020

https://doi.org/10.24220/2318-0870v25e2020a4572 

Artigos

Livro didático e as Tecnologias de Informação e Comunicação: perspectivas para a Educação Física escolar1

Textbooks and Information and Communication Technologies: Perspectives for Physical Education at Schools

Alison Nascimento Farias2 
http://orcid.org/0000-0002-2249-2371

Fernanda Moreto Impolcetto3 
http://orcid.org/0000-0003-0463-0125

2Universidade Estadual Paulista, Instituto de Biociências, Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Humano e Tecnologias. Rio Claro, SP, Brasil.

3Universidade Estadual Paulista, Instituto de Biociências, Departamento de Educação Física. Av. 24A, nº 1515, Jardim Bela Vista, 13506900, Rio Claro, SP, Brasil. Correspondência para/: F. M. IMPOLCETTO. : <fe_moreto@yahoo.com.br>.


Resumo

O objetivo deste estudo foi verificar as possibilidades que o livro didático de Educação Física apresenta para a inserção das Tecnologias de Informação e Comunicação no ensino dos conteúdos de Atletismo e Dança nas aulas de Educação Física escolar. Para tanto, foi realizada uma pesquisa qualitativa, com enfoque colaborativo, desenvolvida por meio de três etapas: (1) levantamento diagnóstico (observação das aulas de uma professora de Educação Física do 6º ano); (2) elaboração e implementação de duas unidades didáticas do livro de Educação Física; e (3) avaliação das unidades didáticas do livro didático de Educação Física. Participaram da pesquisa alunos de uma turma do 6º ano do Ensino Fundamental e uma professora da disciplina. Os dados coletados foram transcritos, revistos, organizados e classificados a partir da análise de categorias de codificação. Os resultados indicaram que o livro didático favoreceu a inclusão das tecnologias, colaborando com o ensino dos conteúdos propostos. Conclui-se que as Tecnologias de Informação e Comunicação podem ser ferramentas de apoio pedagógico para ensinar os conteúdos da Educação Física escolar, neste caso a partir de um livro didático, desde que ocorra uma mediação pedagógica por parte do professor.

Palavras-chave:  Educação Física Escolar; Livro didático; Tecnologias de Informação e Comunicação

Abstract

The objective of this study was to verify the possibilities offered by the textbook of Physical Education for the insertion of Information and Communication Technologies in teaching Athletics and Dance in Physical Education classes. For that purpose, we carried out a qualitative research with a collaborative approach, developed in three stages: (1) diagnostic assessment (observation of a 6th year Physical Education teacher’s classes); (2) design and implementation of two didactic units of the Physical Education book; and (3) evaluation of the textbook’s didactic units. Participants of the research were sixth-graders in elementary school and a teacher of the discipline. The collected data was transcribed, reviewed, organized, and classified from the analysis of coding categories. The results indicated that the textbook favored the inclusion of the technologies, collaborating with the teaching of the proposed contents. We conclude that Information and Communication Technologies might work as pedagogical support tools for the contents of Physical Education, in this case from a textbook, as long as there is pedagogical mediation by the teacher.

Keywords:  School Physical Education; Textbook; Information and Communication Technologies

Introdução

No campo da Educação, a investigação acerca do livro didático tem propiciado interesse dos estudiosos e pesquisadores; nas últimas décadas, houve crescimento das discussões a respeito desse assunto (Choppin, 2004; Bittencourt, 2010; Munakata, 2016). Esse tipo de material didático ainda é reconhecido como ferramenta fundamental no processo de escolarização, constituindo-se em uma das estratégias metodológicas mais utilizadas na sala de aula.

Na Educação Física Escolar (EFE), esse material didático tem evidenciado uma distância significativa da prática pedagógica, pois não é tradição da disciplina possuir livros didáticos, apesar de haver algumas iniciativas para sua elaboração, discussão e utilização. A ausência de pesquisas sobre o livro didático no componente curricular de EFE dificulta análises mais específicas quanto à repercussão dessa ferramenta nas aulas.

Em termos objetivos, historicamente a EFE tem sido representada por sua dimensão quase que exclusivamente procedimental. Isso a colocou, durante muitos anos, como área de menor impacto científico no âmbito escolar. Ela se restringia a exercícios repetitivos e as aulas eram descontextualizadas, sem haver uma reflexão sobre o “porquê” fazer. Essa disciplina, por muito tempo, caracterizou-se como atividade prática – concepção que possivelmente a tenha distanciado dos livros didáticos (Darido et al., 2010).

Considera-se que o livro didático é um instrumento que tem potencial de auxiliar na prática pedagógica do professor de EFE, desde que seja bem utilizado, como ferramenta de apoio no processo de ensino-aprendizagem, reconhecendo-se que outros materiais didáticos podem ser adotados para aprimorar as aulas e tornar a aprendizagem significativa. A finalidade do livro didático não deve ser causar dependência exclusiva do professor, mas servir como uma das várias ferramentas a serem empregadas em sua prática pedagógica (Barroso; Darido, 2017; Prado; Carneiro, 2017).

Apesar de o livro didático ser considerado uma ferramenta tecnológica, não pode ser classificado como nova tecnologia (Barroso, 2015), existindo, contudo, a possibilidade de integração entre o livro didático e as Tecnologias da Informação e Comunicação (TIC). As TIC também são conhecidas como Novas Tecnologias da Informação e Comunicação (NTIC), Tecnologias Digitais da Informação e Comunicação (TDIC) (Gemente, 2015), entre outros termos, todos se referindo às tecnologias da atualidade. Na presente pesquisa, optou-se pelo uso do termo TIC, o qual pode abranger algumas ferramentas tecnológicas mais utilizadas (entre elas videogames, redes sociais, pen drives, home pages, câmeras de vídeo, celulares, tablets, notebooks e computadores). Estas se inserem, conforme Belloni (2005), em três categorias: informática, telecomunicações e mídias eletrônicas.

As TIC são como um aglomerado de ferramentas tecnológicas presentes no cotidiano, fundamentais para um grande número de profissionais das mais variadas áreas de atuação na sociedade, e transformam os diversos segmentos sociais, econômicos e educativos (Bianchi; Hatje, 2007). Na área da Educação, muitos pesquisadores têm se debruçado sobre essa temática com o objetivo de compreender suas finalidades, possibilidades e seu potencial formativo no atual contexto educacional (Rosa; Cecílio, 2010). Estes afirmam que existem novos desafios para a intervenção dos professores, pois há uma necessidade de melhoria na qualidade da educação, de forma a estimular novos conhecimentos; sendo assim, a utilização das tecnologias é indispensável, tornando a sua implementação na educação algo relevante.

Considerando que a sociedade atual está inserida em um mundo tecnológico, que a EFE é uma disciplina obrigatória da educação básica e que a utilização tanto do livro didático quanto das TIC é algo novo para os professores dessa área, entende-se que é possível estabelecer estratégias de ensino que favoreçam uma interface entre o livro didático e as TIC nas aulas de EFE – temática na qual esta pesquisa se insere. No Estado do Ceará, o município de Caucaia foi um dos primeiros a utilizar o livro didático nessa disciplina, o que justifica a escolha desse cenário para a execução do presente estudo. Atualmente, o referido município abrange 200 escolas, com aproximadamente 50.000 alunos e 120 professores de EFE. Esse componente curricular está inserido do 1º ao 9º ano do Ensino Fundamental, cuja responsabilidade está a cargo da Secretaria Municipal de Educação (SME-Caucaia). O objetivo desta pesquisa foi verificar as possibilidades que o livro didático de Caucaia/CE apresenta para integrar as TIC no ensino dos conteúdos de Atletismo e Dança nas aulas de EFE.

Procedimentos Metodológicos

Para investigar as possibilidades de integração entre o livro didático e as TIC, realizou-se uma pesquisa qualitativa (Minayo, 2001) com enfoque colaborativo. A pesquisa colaborativa pode ser definida como um processo que envolve a contribuição dos professores no percurso da investigação científica, subsidiado por um ou mais pesquisadores (Desgagné, 2007). No caso deste estudo, uma professora colaboradora e o pesquisador elaboraram e implementaram duas unidades didáticas do livro de EFE (Atletismo e Dança) com o apoio das TIC para uma turma do 6º ano do Ensino Fundamental em uma escola municipal situada na cidade de Caucaia/CE. Como técnicas de coletas de dados, foram utilizadas observações, entrevistas, grupo focal e pesquisa documental.

Antes da elaboração das unidades didáticas a partir do livro de EFE, foram observadas oito aulas da professora com a turma do 6º ano, no período de um mês. Além disso, efetuou-se uma análise documental do material didático adotado no município. Após o período de observação das aulas, a docente da turma participou de uma entrevista semiestruturada (Ludke; André, 1994). A principal finalidade dessa primeira etapa foi verificar os métodos de ensino e se ela empregava alguma tecnologia para ensinar os conteúdos do livro didático.

As intervenções pedagógicas ocorreram durante três meses, com aulas duplas ou geminadas. Foram ministradas 12 aulas (6 de Atletismo e 6 de Dança), totalizando 24 horas/aula, as quais foram registradas em um diário de campo. Cabe mencionar que a escolha dos referidos conteúdos decorreu do planejamento anual da regente da turma. Com o objetivo de avaliar todo o processo das intervenções pedagógicas, ao final da implementação, a professora participou de outra entrevista semiestruturada.

Ainda, realizou-se uma sessão de grupo focal com 10 alunos que atendiam aos seguintes critérios: frequência em 80% das aulas, participação nas atividades de sala e extraclasse, gravação e edição de vídeo. Também foram escolhidos intencionalmente cinco meninas e cinco meninos. A sessão de grupo focal ocorreu na biblioteca da própria escola, sem a presença da professora. Foram utilizados dois gravadores ao mesmo tempo, e o encontro foi filmado. Um roteiro foi elaborado para contemplar duas condições indispensáveis: promover um debate motivado e participativo com o grupo e favorecer possibilidades de aprofundamento da temática estudada (Minayo, 2001).

Para a investigação dos dados, optou-se pelo método de Análise de Categorias de Codificação, fazendo uso do referencial de Bogdan e Biklen (1994) no que diz respeito a codificação e categorização. Como resultado, foram evidenciadas duas categorias, as quais conduziram à apresentação e à discussão dos resultados: o ensino dos conteúdos do livro didático de EFE e as possibilidades e limitações das TIC.

A fim de evitar possíveis constrangimentos aos colaboradores da pesquisa, os discentes receberam a seguinte nomenclatura: Aluno/nº (ex.: Aluno 1). Como somente uma docente participou do estudo, foi denominada “Professora”. Esta pesquisa foi submetida e aprovada pelo Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos com número do protocolo de aprovação 57737816.5.0000.5465.

Resultados e Discussão

O ensino dos conteúdos do livro didático

Foram observadas as aulas da professora durante um mês antes da elaboração das unidades didáticas. Nesse processo, verificou-se que ela utilizou o livro didático de EFE como apoio pedagógico nas aulas. A professora mencionou na entrevista, após as observações, que esse material didático apresenta poucos indicativos para o uso das tecnologias e que os conteúdos não são aprofundados. Isso foi constatado na análise do livro do professor e do aluno antes das observações e também na entrevista com a docente antes da implementação, conforme se observa neste trecho:

[...] o livro é um pouco resumido, ele deixa no final de alguns conteúdos um link, ou então deixa a indicação de um filme relacionado com o conteúdo que a gente está vendo. Eu acho que o livro não tem tanta indicação para o uso da tecnologia, assim eu sei que tem alguns indicativos para alguns conteúdos, mas não são para todos os conteúdos (Professora).

Sobre os limites do livro didático quanto à sua estrutura, Carmo (1999) destaca que, quando apresentam capítulos densos ou muito resumidos, são classificados como de baixo valor editorial. Assim, é importante que demonstrem arcabouço adequado e que indiquem conteúdos com informações atualizadas e significativas para favorecer o trabalho do docente e contribuir com o processo de aprendizagem dos discentes.

Do ponto de vista de elementos avaliativos apontados por Carmo (1999), como qualidade das imagens, tamanho das letras e atratividade, observa-se a presença desses requisitos no livro didático do município, pois ele contém diversas imagens ilustrativas que enriquecem a sua estrutura. Na capa, por exemplo, exibe as praias e pontos turísticos da região; os conteúdos propostos incluem também imagens diversificadas, favorecendo, desse modo, sua atratividade; as letras têm tamanho adequado e uma linguagem clara, contribuindo para a leitura fluente tanto dos professores quanto dos alunos.

Apesar de algumas limitações no trato com as TIC, nota-se que o material didático do município propõe aproximações com as tecnologias, mesmo que de uma forma ainda restrita. Percebe-se que os livros atuais são totalmente diferentes quando comparados com os materiais didáticos utilizados em outras décadas. Com o advento das tecnologias, os livros didáticos trazem indicações para o uso de vídeos, sites, filmes, entre outros. Considera-se importante que o livro didático e as TIC se aproximem na sociedade contemporânea, marcada pela evolução tecnológica.

A docente mencionou na entrevista que utilizou um filme indicado pelo livro para ensinar o conteúdo de rugby. Ela destacou que o filme auxiliou na compreensão da prática corporal, visto que a escola não possui condições favoráveis para o ensino desse esporte. A professora também relatou na entrevista que, apesar de o livro didático do município ter limitações no que tange ao aprofundamento dos conteúdos e de sugestões para o uso das TIC, ela considera o material didático como uma ferramenta que auxilia na sua prática pedagógica. Nesse aspecto, em um estudo realizado por Rodrigues e Darido (2011) sobre o ensino da modalidade basquetebol, os professores participantes ressaltaram algumas vantagens referentes à utilização do livro didático, como atualizar os docentes, contribuir na condução das aulas e servir como um instrumento para colaborar nas reflexões acerca das ações do professor no seu cotidiano.

Durante a entrevista, a professora expôs que geralmente não se restringe ao material didático do município devido a algumas limitações relativas aos conteúdos – fato constatado durante as observações das aulas, nas quais ela utilizou outros livros como suporte didático. Essa concepção é sustentada por Zabala (1998) quando aponta a relevância de os docentes se servirem de mais de uma fonte de consulta e a possibilidade de elaborarem o seu próprio material. A postura autônoma demonstrada pela professora ao selecionar e empregar outros materiais didáticos e fazer adaptações quanto ao uso coaduna com os resultados dos estudos de Barroso e Darido (2017), nos quais os docentes se mostraram favoráveis à utilização do livro didático, desde que tenham liberdade para realizar alterações no material.

A partir do relato da professora sobre as limitações de conteúdo, foram realizadas adaptações no material didático adotado nesta pesquisa quanto ao seu aprofundamento à implementação das TIC para os temas de Atletismo e Dança. Especialmente neste último, resumia-se a duas páginas, mencionando apenas que o docente deveria tratar de aspectos relacionados à definição da dança e à mobilização inicial por meio de movimentos livres e criativos. Já para o Atletismo, sugeria que o professor trabalhasse com as características e regras básicas das provas de campo e pista. Apontava também como tarefa um mural com provas de campo e pista que deveria ser construído pelos discentes. Além disso, apresentava sugestões de vivências para as provas; estas foram ampliadas e adaptadas.

Quanto ao uso das TIC, o material não continha qualquer indicação para os conteúdos de Dança. Para Atletismo, o livro indicava um site da Confederação Brasileira de Atletismo (CBAT), no qual seriam encontradas informações sobre regras, provas, recordes, dentre outros, que poderiam ser trabalhadas com os alunos em sala de aula. Verificou-se que, embora o livro didático de EFE apresentasse limitações quanto aos conteúdos e inserção das TIC, favoreceu o planejamento das unidades didáticas. Igualmente, o conteúdo de Dança abordado pelo livro, em relação ao Atletismo, era mais limitado.

Dessa forma, os conteúdos foram aprofundados, e as tecnologias que poderiam servir de apoio para melhor ensinar esses conteúdos foram escolhidas. Optou-se por alguns tipos de TIC, entre eles o Xbox 360, com os jogos Kinect Sports (Atletismo) e Just Dance (Dança), para trabalhar os conteúdos com os alunos, por serem dispositivos de seu interesse. O mesmo ocorreu no estudo de Ferreira (2014) e Salgado (2016), os quais verificaram ser o videogame uma excelente ferramenta para o ensino dos conteúdos da EFE.

Procurou-se inserir diversas tecnologias (Xbox 360, celular, redes sociais, Kahoot4) que favorecessem a aprendizagem dos alunos. Os nativos digitais têm contato desde cedo com essas tecnologias e por isso estão mais sensivelmente envolvidos com o saber digital (Coelho; Costa; Neto, 2018).

Em relação às aulas de Atletismo, os alunos relacionavam as provas do Xbox 360 com as regras e características básicas das provas oficiais. No início da primeira aula, eles assistiram a alguns vídeos das provas; em seguida, vivenciaram as provas no console; e, por fim, realizaram um quiz online com perguntas acerca dos conteúdos vistos em sala, além de tarefas extraclasse.

Verificou-se nos depoimentos do grupo focal que os educandos conseguiram lembrar grande parte do conteúdo de Atletismo que foi abordado nas seis aulas, especialmente quanto ao tamanho da pista, número de raias, obrigatoriedade do bloco de partida nas provas de velocidade, dentre outros. O Aluno 3 ressaltou a regra de não poder sair da raia na prova dos 100 metros e também comentou que no jogo Kinect Sports aparecia o bloco de partida, mas, apesar disso, o jogador realizava a saída alta. Outras falas relevantes foram dos Alunos 3 e 4, que fizeram uma pequena síntese das provas de 100 metros, abordando que elas ocorrem em pistas ovais. O Aluno 5 apontou a diferença do jogo virtual para a vida real. Esse relato está relacionado ao fato de os discentes terem vivenciado essas provas no festival de miniatletismo que ocorreu na última aula em um campinho da escola (pequeno espaço com areia).

Nessa mesma aula, os alunos praticaram algumas provas de campo e pista e as relacionaram com os vídeos e as provas do Xbox 360 vistas em sala. No jogo, como foi mencionado, não existe a saída baixa com o bloco de partida. Além disso, o comando da largada, “às suas marcas”, é feito em inglês; porém, de acordo com a Confederação Brasileira de Atletismo (2014, p.58), os comandos de largada são “às suas marcas e prontos”. No festival de miniatletismo, os alunos realizavam a saída baixa imaginando um bloco de partida e largavam conforme os comandos da prova oficial.

Nas corridas com barreiras e nas provas de campo, os Alunos 1, 2, 3 e 4 ressaltaram que o jogo Kinect Sports ajudou na realização da prova no festival de miniatletismo. Também citaram que a visualização e a vivência no videogame facilitaram a realização das provas no festival de miniatletismo. O Aluno 2 destacou a dificuldade para transpor as barreiras, pois o jogo apresentava um sinal verde no chão indicando que o jogador deveria saltar. A transposição da barreira no jogo é feita com técnica oficial, em que uma perna é estendida e a outra flexionada; no entanto, o jogador poderia saltar de qualquer maneira. O importante era realizar o salto quando o sinal ficasse verde; caso contrário, as barreiras eram derrubadas.

Nas provas de lançamento do dardo e de salto em distância, o console também indicava o momento para lançar o implemento ou realizar o salto; caso o jogador não realizasse o salto no período indicado, o personagem passava pela tábua de impulsão e ocorria a falha na tentativa. Apesar dessas dificuldades, os alunos as encararam como desafio para conseguir realizar a prova e aprenderam como ocorria a falha de uma tentativa nas provas.

No festival de miniatletismo, foram utilizados vários elásticos para substituir as barreiras. No primeiro momento, os educandos poderiam saltar de qualquer modo; no segundo, tentariam realizar a passada correta. Nos depoimentos do grupo focal, notou-se que os discentes se lembravam das provas que foram trabalhadas em sala e no festival de miniatletismo; eles ressaltaram algumas de suas particularidades.

Um fator importante para a compreensão dessas provas foi a elaboração do mural sugerido pelo livro didático. A tarefa do livro didático indicava que os alunos, individualmente, deveriam pesquisar e depois escrever em um quadro (no livro do aluno) as provas de campo e pista do Atletismo. O diferencial dessa atividade era que, em vez de apenas escreverem, foi sugerido que eles pesquisassem imagens na Internet e as agrupassem em cada prova. Além disso, o trabalho seria realizado em equipes de cinco e seis alunos e socializado com os demais em forma de um pequeno seminário. Todos desenvolveram a atividade solicitada, demonstrando interesse em sua execução.

Barroso e Darido (2017) constataram em sua pesquisa que os alunos se mostraram mais favoráveis a fazer tarefas do livro didático que fossem rápidas e curtas, como sínteses de vivências, registros sintéticos, preenchimento de quadros e que tivessem ligação com conceitos. Isso indica que a forma como o docente utiliza o livro didático é um fator que repercute em sua participação e interesse nas situações de aprendizagens.

Na unidade didática de Dança, os alunos também tiveram um total de seis aulas. Como já relatado, o livro didático do município apresentava apenas duas páginas sobre o conteúdo, recomendando que o professor abordasse o conceito de dança e a relação de ritmo e expressividade. Ainda, foram tratadas a classificação da dança e, na última aula, uma dança popular, o maculelê. Em relação às TIC, como não havia nenhuma sugestão quanto ao emprego, decidiu-se utilizar o celular, vídeos, redes sociais e o Xbox 360 (Just Dance).

Dos 35 estudantes, apenas uma aluna tinha tido aulas de dança. É importante ressaltar que tanto o pesquisador quanto a professora tinham pouca experiência nessa temática. O conteúdo da dança dificilmente é abordado nas aulas de EFE, sendo que os principais motivos, segundo Diniz (2014), são déficit na formação docente e insegurança no trato dessa manifestação corporal. Desse modo, a implementação contribuiu para a formação de ambos.

Quanto às pesquisas que os alunos precisaram fazer nas redes sociais a respeito do conteúdo de dança, eles as mencionaram de forma positiva no grupo focal:

Foi interessante porque eu não sabia que poderia pesquisar coisas no Instagram, Facebook, só sabia em Youtube, não pesquisava no Instagram (Aluno 5).

A gente usou essas redes sociais, eu achava que elas só serviam pra encontrar amigos, pessoas diferentes, mas agora eu vou começar a utilizar elas de um modo diferente, vou pesquisar coisas, algum trabalho, por exemplo, vou pesquisar e eu não acho alguma coisa, aí eu vou nessas redes sociais e procuro e talvez eu ache até mais coisas (Aluno 2).

Os depoimentos indicam os recursos adotados pelos alunos para realizar as pesquisas na Internet, e as duas declarações evidenciam que eles desconheciam que as redes sociais poderiam ser utilizadas como ferramentas de pesquisa e estudo. Verificou-se também que os discentes mudaram de percepção em relação às redes sociais e relataram que pretendem mudar a forma de empregá-las.

Das três aulas de dança, a que os alunos mais mencionaram quanto ao conteúdo foi a que abordou a sua classificação. Os Alunos 1, 3, 4, 5, 6, 9 e 10 exemplificaram uma dança para a sua respectiva categoria de classificação, p. ex., a quadrilha e o maculelê, pertencentes às danças populares; o tango, relacionado à dança de salão; e o hip hop, à dança de rua, dentre outras. É importante mencionar que, no diagnóstico dessa aula, havia sido identificado que os alunos tinham dificuldades no tocante à classificação das danças. No entanto, observou-se que, após as intervenções pedagógicas, eles conseguiram classificá-las.

Os resultados da pesquisa evidenciaram que as TIC auxiliaram no ensino dos conteúdos do livro didático de EFE, o que foi ratificado na entrevista com a professora após as intervenções das aulas. Ela ressaltou a possibilidade de utilizá-las em outros conteúdos. Todavia, as TIC por si só não mudam a prática pedagógica; é necessário que o professor tenha clareza do que vai ensinar. Além disso, deve-se refletir sobre “como” e “em qual momento” utilizá-las.

Quando questionada sobre quais dimensões dos conteúdos foram contempladas nas intervenções, a professora informou que foram abordadas as dimensões conceitual, procedimental e atitudinal. Na primeira dimensão, foram apresentados aos alunos diversos conceitos, como histórico, regras e características das provas de atletismo (tamanho da pista, número de raias, equipamentos), conceito e classificação da dança, histórico e características do maculelê. Na segunda, os discentes vivenciaram as provas de atletismo (100 metros, corrida com barreiras, salto em distância, salto triplo, salto em altura, arremesso de peso) e elaboraram coreografias de dança. Entretanto, a terceira dimensão foi explorada de forma pontual nas aulas e nos momentos em que os alunos tinham que realizar tarefas em equipe. Verificou-se que as dimensões conceitual e procedimental foram mais favorecidas pelo uso das TIC no ensino dos conteúdos do livro didático e que este, apesar de suas limitações, especialmente relacionadas ao aprofundamento dos conteúdos, contribuiu para o planejamento das unidades didáticas.

Os resultados apontaram que as TIC tiveram um papel positivo como estratégia de ensino dos conteúdos de Atletismo e Dança e que as diferentes tecnologias utilizadas favoreceram a compreensão de determinados conceitos. Observa-se que o livro didático e as TIC podem ser aliados, pois ambos promoveram possibilidades educacionais no ensino das práticas corporais, que devem estar sob a autonomia do professor. Assim, para que o docente possa potencializar o ensino dos conteúdos por meio das TIC, são necessárias diversas mudanças, sobretudo em metodologias de ensino que coloquem o aluno no centro do processo educativo e o professor como facilitador.

Possibilidades das Tecnologias de Informação e Comunicação

Os estudos de Barral (2012) e Ferreira (2012) constataram um aumento considerável do uso das tecnologias móveis por jovens, mostrando que estes realizam grande parte das suas atividades cotidianas com o uso desses equipamentos, principalmente o celular, o que propicia a geração da mobilidade. Por meio da presente pesquisa, percebeu-se que os alunos apresentaram discernimento e concentração nas atividades com a utilização do celular quando comparados, por exemplo, aos discentes do estudo de Germano (2015), o qual verificou nos resultados pouca maturidade por parte dos alunos no uso do celular, apesar de frequentarem o 9º ano do Ensino Fundamental, com idade entre 14 e 15 anos. Vale ressaltar que os alunos da presente pesquisa tinham entre 10 e 11 anos de idade.

Ficou evidente também que esses dispositivos móveis podem ser uma boa alternativa para minimizar os problemas concernentes à falta de infraestrutura nos estabelecimentos de ensino. Essa possibilidade distinguiu-se quando a professora relatou, na entrevista, que a maioria dos alunos de 8º e 9º anos possui celular, e aproximadamente a metade dos discentes tem um pacote de Internet; além disso, levam o smartphone para a escola.

Em relação aos benefícios do uso do celular na escola, Ferreira (2012, p.16) afirma que “a adesão da escola a esse universo comunicacional, aproveitando o repertório juvenil que já está sendo construído nesses usos, poderá potencializar as ações da escola e revitalizar suas práticas”. Assim, é essencial que se discuta a inserção pedagógica dessa ferramenta nos espaços educacionais e, sobretudo, nas aulas de EFE.

Durante a implementação, aspectos que ficaram visíveis foram o interesse e o domínio dos discentes ao utilizarem as TIC. Eles se mostraram empenhados em experimentar as diferentes tecnologias e revelaram facilidade em manuseá-las. Isso foi perceptível na frequência dos alunos às aulas e nos depoimentos do grupo focal, conforme relatos a seguir:

O que eu mais gostei foi do Xbox na aula de Dança porque eu não sei dançar (risos). Eu aprendi muito também, foi legal (Aluno 5).

Ajudou pra gente evoluir, como exercícios que a gente faz com esses esportes e as pessoas se estimulam mais agora a vir pra escola com tudo isso (Aluno 6).

De acordo com as declarações dos alunos, percebeu-se que o Xbox 360 foi uma das TIC que eles mais gostaram. Durante a implementação, principalmente na vivência do jogo, todos queriam participar ao mesmo tempo. Conforme Sancho (2006), crianças e jovens têm contato muito cedo com ambientes imersos pela tecnologia, especialmente o digital e o audiovisual. O processo de socialização da juventude contemporânea diverge totalmente dos vividos pelos pais e docentes. O cinema, o computador e os videogames atraem de modo especial a atenção deles, assimilando rapidamente a mensagem.

Uma possibilidade favorecida pelo Xbox 360 (Kinect Sports) foi a visualização das provas, da pista de atletismo e da sensação de estar no próprio evento. Jogar videogame proporciona o desenvolvimento das habilidades do jogador em vivências de acompanhamento concomitante de diversos locais. Os participantes do jogo ganham rapidez de resposta tanto em relação aos estímulos esperados quanto aos inesperados (Prensky, 2012).

As vivências com o uso do Xbox 360 foram significativas para a turma, que se mostrou entusiasmada com a comparação entre seus próprios resultados nas diferentes provas. O Aluno 6 relatou que o console contribuiu para a evolução das manifestações corporais que foram vistas em aula, e, segundo ele, os alunos se sentiam mais motivados a vir para a aula, o que se constatou pelo controle de frequência. Pode-se inferir, com isso, que o uso desse equipamento contribuiu como inovação nas aulas, despertando o interesse dos alunos. Nos estudos de Ferreira (2014) e Salgado (2016), ambos também utilizaram o Xbox 360 como ferramenta pedagógica nas aulas de Educação Física e verificaram igualmente que os discentes se sentiram mais motivados em participar das intervenções pedagógicas.

Os estudantes tiveram domínio das diversas tecnologias empregadas. Isso se evidenciou na observação de várias atividades realizadas, como pesquisar imagens na Internet, editar vídeos, buscar vídeos nas redes sociais e vivenciar os jogos do Xbox 360. Observou-se que, mesmo em atividades que eles nunca tinham feito, como editar vídeos e jogar no console, a facilidade em manuseá-los foi adquirida rapidamente.

De acordo com Prensky (2012), a assimilação rápida da linguagem é consequência de a geração das crianças e jovens da contemporaneidade ser considerada “nativa digital”, isto é, já nasceu imersa na cultura digital. Por outro lado, existem os pais, professores e adultos que são considerados “imigrantes digitais”, tendo mais dificuldade em assimilar essa nova linguagem virtual na sociedade digitalizada.

O presente estudo apontou, portanto, diversas possibilidades quanto ao uso das TIC nas aulas de EFE. Em síntese, os discentes tiveram facilidade quanto à sua utilização e exploraram várias tecnologias a que antes não tinham acesso. A motivação deles também foi demonstrada nas intervenções pedagógicas, principalmente quando comparadas com as aulas antes da implementação das unidades didáticas.

Uma das razões que favoreceu a exploração das TIC na escola foi o acolhimento dos gestores e docentes, assim como a disposição para auxiliar no andamento da pesquisa. A gestão da escola se mostrou igualmente interessada no uso do site Kahoot, solicitando informações sobre cadastro e uso para apresentar aos professores, visando a uma possível implementação nas aulas. Além disso, acordou-se uma formação com os docentes, ao término da pesquisa, sobre uso das TIC no contexto escolar.

Inserir as TIC no contexto escolar não é uma tarefa exclusiva do professor. É necessário que todos os atores educacionais estejam alinhados com esse propósito. A gestão escolar exerce também um papel muito importante, pois decisões referentes à liberação de equipamentos eletrônicos, alunos, compras de materiais, autorização para se utilizar espaços fora da escola, dentre outros, passam pelo seu crivo. Mudanças significativas na educação dependem de diretores e coordenadores flexíveis que estejam envolvidos no processo pedagógico e, principalmente, que apoiem os docentes, contribuindo para um ambiente de comunicação e inovação (Moran, 2014).

Essa interlocução foi imprescindível para o bom andamento deste estudo, uma vez que, além da comunicação com a gestão escolar e com a professora da turma, se obteve contato com a maioria dos pais. Em uma reunião que ocorreu na escola, foi explicado, em termos gerais, o propósito da pesquisa e solicitou-se colaboração no estudo, no sentido de saberem que os alunos estavam utilizando diversas ferramentas tecnológicas, não como passatempo, mas como instrumento para potencializar a aprendizagem.

O apoio dos pais foi importante, visto que a maioria autorizou os filhos a levar o celular para a escola. Ainda que nem todos o tenham autorizado, a liberação dos dispositivos móveis de alguns discentes foi fundamental para as atividades das aulas.

As TIC estão inseridas no cotidiano, estão imersas no mundo; por esse motivo, deve-se considerar sua inclusão no contexto da educação (Sancho, 2006). Entretanto, constatou-se que os discentes só haviam tido contato com vídeos e imagens nas aulas anteriores de EFE, e, dos 10 alunos que participaram do grupo focal, apenas um aluno se recordou dos vídeos.

Os depoimentos mostraram que os discentes se lembravam de quase todas as tecnologias e da aula específica em que cada uma foi utilizada. Por exemplo, sobre a primeira aula de Atletismo (características e regras básicas das provas de pista), eles apontaram os vídeos, o Xbox 360 (Kinect Sports) e o Kahoot. Sobre a última aula de Dança (maculelê), destacaram os vídeos e as redes sociais (Facebook, Instagram).

O celular foi uma ferramenta que se configurou como promissora nas aulas em virtude das suas diversas funções. Ele foi empregado como meio de pesquisa pelos alunos nas aulas de Atletismo e Dança e como cronômetro no festival de atletismo. Ele também foi usado para o Kahoot nas aulas. Além disso, os alunos recorreram a ele para tirar fotos, filmar as provas de atletismo nas vivências e para gravar um vídeo em equipe relatando o que aprenderam em todas as aulas. Percebe-se que o celular desempenhou múltiplas funções que são atribuídas aos computadores, câmeras digitais e cronômetros.

Germano (2015), ao pesquisar o uso desse dispositivo móvel, identificou ainda outras atribuições: a exploração como fonte de pesquisa imediata, registro de imagens e situações pedagógicas, bem como interatividade, a partir de um grupo virtual. O celular tornou-se menor, todavia mais eficaz, permitindo o acesso à Internet, a incorporação aos aplicativos e às redes sociais, contribuindo para elaborar, receber e enviar mensagens e imagens, ouvir música, jogar, além de outras funcionalidades (Ferreira, 2012).

Em resumo, o apoio dos gestores e dos pais foi importante para a efetivação das TIC na escola. Em termos de aprendizagem, as TIC auxiliaram no ensino dos conteúdos de Atletismo e Dança. Alguns conceitos ficariam mais difíceis de serem ensinados caso não houvesse o apoio das TIC, e.g., as provas de pista e campo no Atletismo. O fato de os alunos visualizarem as dimensões da pista, executarem o próprio movimento no videogame e o compararem com as provas oficiais ajudou na compreensão das regras básicas e das características das provas e na dimensão procedimental.

Apresenta-se, a seguir, as dificuldades que surgiram antes e durante a implementação nas aulas de EFE, assim como as estratégias utilizadas para minimizar essas limitações nas intervenções pedagógicas.

Limitações das Tecnologias de Informação e Comunicação

Um dos obstáculos encontrados na pesquisa foi a estrutura física do estabelecimento de ensino, que possuía uma quadra, mas com problemas na sua estrutura; além disso, não era coberta, o que inviabilizou sua utilização nos dias chuvosos. Ela também necessitava de reforma no piso e nas paredes em sua volta, pois comprometia a segurança dos alunos.

A escola contava com poucos materiais para a disciplina de EFE, como bolas, cones, arcos etc. De forma geral, a EFE ainda enfrenta diversos problemas relacionados à falta de espaço físico adequado e à escassez de materiais. Essa conjuntura dificulta o trabalho docente no ensino das práticas corporais.

Em se tratando de infraestrutura para adoção das TIC, a escola tinha um pequeno laboratório de informática; contudo, além de haver poucos computadores, a maioria não funcionava. O laboratório contava com duas TVs LED 40” e um projetor. Para utilizar esses equipamentos, era necessário fazer um agendamento com um professor responsável. A escola possuía Internet, mas a conexão era pouco eficiente.

Dificuldades em relação à aquisição de materiais igualmente foram registradas na pesquisa de Ferreira (2014), como falta de estrutura física adequada, falta de manutenção da sala de informática, entre outras. É fato que ainda existem muitas barreiras no que se refere à inserção das tecnologias em ambientes educacionais públicos (Mendes, 2008; Oliveira, 2012), por a escola não estar preparada em termos estruturais, uma vez que os recursos disponíveis não funcionam de forma regular e os docentes se sentem inseguros (Kenski, 2003; Miranda, 2007).

Os estabelecimentos de ensino, juntamente com os órgãos municipais, necessitam estruturar minimamente a escola para que os docentes possam ter condições favoráveis para efetivamente inserir as tecnologias. Isso pode ser corroborado na fala da professora quando foi questionada acerca dos principais desafios para implementar as TIC nas aulas de EFE:

[...] A escola não tem material necessário, eu tenho que levar notebook, tenho que arranjar, sair de uma escola para outra, uma escola não tem e na outra já tem dois ou três, assim até hoje o principal empecilho foi a falta de material. A Internet também dificilmente pega (Professora).

Durante as aulas de Atletismo, houve atividades para as quais era necessário um número mínimo de celulares para a realização das tarefas (p. ex., o Kahoot). Além disso, o uso desse dispositivo móvel servia para outras atividades que ocorreram ao longo das intervenções pedagógicas. Entretanto, alguns alunos não trouxeram seus celulares, devido à não autorização dos pais; outros, que o trouxeram, não tinham acesso à Internet. A saída para lidar com essa questão foi a realização das atividades em grupos.

Os problemas de acesso à Internet e o controle dos pais foram considerados fatores limitantes na implementação das unidades didáticas. Este último se deveu possivelmente pelo desconhecimento de que os aparelhos possam ser utilizados como veículos que auxiliam no ensino.

Apenas uma parte dos discentes que levou os dispositivos móveis para a escola possuía um pacote de Internet, sendo uma das razões o custo financeiro. Apesar disso, devido à democratização às tecnologias, predições para os próximos anos apontam que o acesso à Internet será realizado de forma abundante por celulares e tablets (Kenski, 2013). Essa constatação demonstra que a escola, enquanto instituição social, precisa se aproximar dessa nova sociedade digitalizada.

Outra dificuldade encontrada na pesquisa foi em relação ao tempo das aulas nas intervenções. A vivência com o Xbox 360 demorou a ser concluída em virtude do número de alunos em sala de aula. Por conta do tempo de espera para vivenciar as atividades do Kinect Sports nas aulas de Atletismo, os alunos ficaram bem agitados, pois todos queriam participar ao mesmo tempo. Para lidar com essa situação, adotou-se a seguinte estratégia: os alunos deveriam seguir um roteiro de observação enquanto aguardavam sua vez de participar. Na primeira aula de Dança com o Just Dance, utilizou-se outra estratégia: todos deveriam acompanhar uma dupla que estava dançando. Esse procedimento foi eficaz, e todos os alunos se envolveram.

A pesquisa confirmou que alguns desses limites se constituem como a realidade de grande parte das escolas públicas brasileiras. Os maiores, como já relatado, foram em relação à aquisição de materiais, infraestrutura da escola e número excessivo de alunos por sala. Contudo, foram adotadas estratégias para reduzi-las, tornando possível realizar as implementações com todas as tecnologias que haviam sido planejadas.

Considerações Finais

O livro didático do município de Caucaia/CE serviu de base para investigar as possibilidades de inserção das TIC no ensino dos conteúdos de Atletismo e Dança nas aulas de EFE. Constatou-se que as dimensões conceitual e procedimental foram favorecidas pelo uso das TIC no ensino dos conteúdos do livro didático, o qual, por sua vez (apesar das limitações relativas aos conteúdos e inserção das TIC), contribuiu para o planejamento das unidades didáticas, para a restruturação e o aprofundamento dos conteúdos. Ou seja, o material didático cumpre seu papel de suporte pedagógico quando o professor tem liberdade para fazer as adaptações quanto ao seu uso.

O celular, o Xbox 360 e os vídeos foram fundamentais para auxiliar no ensino dos conteúdos do livro didático de EFE. O primeiro, especificamente, foi considerado um instrumento versátil que facilitou o desenvolvimento e execução das atividades durante as intervenções pedagógicas. Esse dispositivo móvel foi utilizado para registrar imagens, pesquisar (Youtube, Facebook, Instagram, Google), filmar, editar vídeos, cronometrar o tempo no festival de miniatletismo e utilizar o Kahoot.

O Xbox 360 foi uma das tecnologias que os discentes mais gostaram e possibilitou entender determinadas regras e execução das provas de pista e campo do atletismo. Sem esse console, a compreensão dos alunos certamente seria prejudicada. O videogame foi muito importante para as vivências de dança, auxiliou o pesquisador e a professora, pois ambos tinham pouca experiência no trato dessa manifestação corporal, sobretudo na dimensão procedimental.

A utilização do vídeo também foi essencial para que os discentes pudessem fazer uma comparação com a atividade do Xbox 360 (Kinect Sports) do festival de miniatletismo. Cabe ressaltar que o grupo focal só ocorreu um mês após a unidade didática de Atletismo e, mesmo decorrido esse tempo, os alunos ainda se lembravam do conteúdo.

Em relação às principais dificuldades encontradas na pesquisa para inserção das TIC, destacam-se: falta de estrutura física, escassez de equipamentos eletrônicos e insuficiência de Internet na escola. Apesar disso, foi possível implementar as duas unidades didáticas e superar essas dificuldades com o apoio da gestão da escola e dos pais dos alunos, que ofereceram o suporte necessário. A primeira foi responsável por autorizar o uso do celular, tendo em vista o objetivo educativo. Os pais autorizaram o uso do aparelho pelos discentes no estabelecimento de ensino.

Considera-se fundamental, portanto, que os órgãos públicos invistam em infraestrutura adequada e promovam formação de qualidade aos docentes para o tratamento das TIC no contexto escolar. São primordiais, ainda, mais pesquisas sobre a relação das TIC com o livro didático na EFE, pois esse assunto é recente e existem poucos estudos na área. Investigações sobre essa temática podem auxiliar os docentes na prática pedagógica, contribuindo para a reflexão sobre novas metodologias de ensino por meio das quais os alunos possam aprender de uma forma mais criativa, autônoma e sejam os autores do processo de ensino-aprendizagem.

Espera-se que o estudo contribua para o aprimoramento do livro didático de EFE adotado pelo município de Caucaia e que venha a subsidiar outros materiais didáticos da área no que se refere a práticas inovadoras com o uso das TIC. Conclui-se que as TIC podem ser ferramentas de apoio pedagógico para ensinar os conteúdos da EFE (neste caso, a partir de um livro didático), desde que ocorra uma mediação pedagógica por parte do professor.

1Artigo elaborado a partir da dissertação de A. N. FARIAS, intitulada “Livro didático e as TIC: limites e possibilidades para as aulas de Educação Física do município de Caucaia/CE”. Universidade Estadual Paulista, 2018.

4 O site, aplicativo ou plataforma eletrônica pode ser acessado para produção de quiz online, permitindo a inclusão de vídeos e imagens.

Como citar este artigo/How to cite this articleFarias, A.N.; Impolcetto, F.M. Livro didático e as Tecnologias de Informação e Comunicação: perspectivas para a Educação Física Escolar. Revista de Educação PUC-Campinas, v. 25, e204572, 2020. https://doi.org/10.24220/2318-0870v25e2020a4572 Resumo

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Recebido: 26 de Abril de 2019; Aceito: 17 de Fevereiro de 2020

A. N. FARIAS foi responsável pela concepção do projeto, coletas de dados, interpretação, análise dos dados e redação final. F. M. IMPOLCETTO foi responsável pela concepção do projeto, interpretação, análise dos dados e redação final.

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