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Revista de Educação PUC-Campinas

versão impressa ISSN 1519-3993versão On-line ISSN 2318-0870

Educ. Puc. vol.28  Campinas  2023  Epub 30-Mar-2023

https://doi.org/https://doi.org/10.24220/2318-0870v28e2023a7070 

Artigos

Práticas pedagógicas dos professores de Língua Inglesa e o desenvolvimento do seu letramento digital

English teachers’ pedagogical practices and their digital literacy development

1Universidade da Região de Joinville, Programa de Pós-Graduação em Educação. Joinville, SC, Brasil


Resumo

O presente artigo busca trazer informações sobre como o letramento digital dos professores de língua inglesa tem se desenvolvido por meio do que dizem de suas práticas em sala de aula. Os dados analisados aqui são um recorte de uma pesquisa de mestrado que procurou investigar o desenvolvimento do letramento digital desses professores, seus desafios e, superações e responsabilidade deles ao formar outros sujeitos letrados digitalmente. Para levantamento dos dados foram utilizados os instrumentos questionário e entrevista e as falas foram analisadas em seu conteúdo. Os resultados demonstraram que as práticas docentes que mais oportunizam o desenvolvimento do letramento digital dos professores referem-se ao planejamento e execução das aulas, principalmente por meio de atividades de pesquisa e apresentação de conteúdos, sejam por textos, imagens ou vídeos. Os recursos tecnológicos têm sido utilizados mais para apresentação/apreciação do que para a produção/criação de materiais digitais. Aponta-se a necessidade de formação sólida no tema letramento digital para um trabalho mais efetivo.

Palavras-chave: Atividades pedagógicas; Leitura e escrita na tela; Professores de língua inglesa

Abstract

This article provides information on how English teachers’ digital literacy has developed through what they say about their classroom practices. The data analyzed are an excerpt of a master’s research that sought to investigate the development of teachers’ digital literacy, their challenges, solutions, and their responsibility in forming other digitally literate subjects. Questionnaires and interviews were used for data collection and the speeches were subject to content analysis. The results showed that the teaching practices that most favor the development of such a literacy are the planning and execution of classes, mainly through research activities and content presentation, whether through texts, images, or videos. Technological resources have been used more for presentation/appreciation than for the production/creation of digital materials. Solid training in digital literacy is needed for a more effective work.

Keywords: Pedagogical activities; Reading and writing on the screen; English language teachers

Introdução

O último relatório do Programa Internacional de Avaliação de Alunos, de 2018, “Leitores do Século XXI – Desenvolvendo Habilidades de Alfabetização em um Mundo Digital”, indicou que 53,6% da população tem acesso à internet. Fazendo um recorte dos estudantes brasileiros na faixa dos 15 anos, constata-se que eles passam em média 36 horas por semana navegando na rede, das quais, em média, apenas 5 horas são na escola (Organisation for Economic Cooperation and Development, 2021).

O relatório também mostra que, apesar de tanta exposição ao mundo digital, isso não se reflete automaticamente na capacidade de usar de modo eficiente o conhecimento que está disponível na internet. Muitos estudantes não sabem distinguir um fato de uma opinião, por exemplo. Contudo, é importante destacar que os que se saíram bem nesse quesito reportaram que receberam instrução na escola sobre como descobrir se uma informação é falsa ou não; como decidir entre conteúdos relevantes para um trabalho escolar; quais as consequências das postagens na internet e como detectar spams ou phishing (Organisation for Economic Cooperation and Development 2021).

Verifica-se, então, a importante função que a escola desempenha na vida desses estudantes por meio de profissionais capacitados que os ajudem a navegar na internet de forma autônoma e responsável. Se a isso for somada a pandemia de coronavírus, em 2020 e 2021, que forçosamente migrou o ensino presencial para o remoto sem dar tempo para muitas escolas se prepararem, chegar-se-á à conclusão de que o tema letramento digital não é apenas importante, mas urgente.

Nesse sentido, o presente artigo, originado de uma pesquisa de mestrado entre professores de língua inglesa do Ensino Fundamental II da rede pública estadual de Jaraguá do Sul (SC), tem por objetivo compreender como as práticas pedagógicas desses professores podem contribuir para o desenvolvimento do seu letramento, o que pode, consequentemente, refletir na formação do letramento digital dos estudantes. Esta seção, além de justificar a importância do tema, também traz as contribuições dos autores Dudeney, Hockly e Pegrum (2016); Gilster (1997); Kleiman (2006a, 2006b, 2007), assim como, as orientações dos seguintes documentos oficiais: Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e o Currículo Base da Educação Infantil e Ensino Fundamental do Território Catarinense (CBEIEFTC), nos quais as práticas pedagógicas dos professores de língua inglesa da rede estadual devem estar fundamentadas. Após essa revisão de literatura, o artigo traz o percurso metodológico da pesquisa, a análise dos dados e as considerações finais.

Adentra-se a literatura iniciando pelo conceito de práticas pedagógicas tomado de Franco (2016, p. 5), que diz:

As práticas pedagógicas se organizam intencionalmente para atender a determinadas expectativas educacionais solicitadas/requeridas por uma dada comunidade social. Nesse sentido, elas enfrentam, em sua construção, um dilema essencial: sua representatividade e seu valor advêm de pactos sociais, de negociações e deliberações com um coletivo. Ou seja, as práticas pedagógicas se organizam e se desenvolvem por adesão, por negociação, ou, ainda, por imposição.

Quando situadas dentro do campo de ensino da língua inglesa, os PCN orientam que a prática pedagógica considere dois importantes aspectos: o conhecimento que os alunos já têm sobre o idioma e a complexidade de se aprender uma língua estrangeira (Brasil, 1998). Posto o desafio, os professores deverão organizar suas práticas a partir dos interesses dos estudantes, abrangendo todos os níveis de conhecimento ao mesmo tempo em que possibilitam a ampliação desses. Sugere-se ainda o uso de materiais autênticos e contextualizados; trabalhos em grupo; o estímulo à autonomia e “[...] à capacidade de ouvir, discutir, falar, descrever, descobrir, interpretar situações, pensar de forma criativa, fazer suposições, inferências [...]” (Brasil, 1998, p. 55).

É necessário ainda destacar que a BNCC traz mudanças significativas no enfoque da língua em seu status, passando-a de língua estrangeira para língua franca – uma língua adotada internacionalmente para facilitar a comunicação entre os povos (Brasil, 2017). Como língua franca, o inglês não pertence apenas aos países que o têm por língua oficial, mas a todos os cidadãos que dele queiram fazer uso em qualquer parte do planeta (Brasil, 2017).

Se, enquanto língua hegemônica, o inglês já estava presente na maior parte das publicações das áreas de ciências, tecnologia, entretenimento e tantas outras, o que dizer agora como língua franca? Por experiência, sabe-se que muitos termos já consagrados no português estão em inglês e não vão ser “aportuguesados” (por exemplo: selfie, shopping center, delivery, diet, light, designer, insight...) sob pena de, como diz Bechara (2010, p. 1), “[...] segregar o idioma em face do internacional generalizado”.

Se for considerado o campo das tecnologias, ver-se-á que a lista é muito mais extensa, e, assim, adentrar-se-á numa segunda implicação orientadora da BNCC (Brasil, 2017) quanto ao ensino- aprendizagem da língua inglesa, que são os multiletramentos, entendidos como uma ampliação do termo letramento – pois agora esse se dá também no mundo digital –, envolvendo as

[...] práticas sociais do mundo digital – no qual saber a língua inglesa potencializa as possibilidades de participação e circulação – que aproximam e entrelaçam diferentes semioses e linguagens (verbal, visual, corporal, audiovisual), em um contínuo processo de significação contextualizado, dialógico e ideológico

(Brasil, 2017, p. 242).

Daí depreende-se que letramento digital e língua inglesa são como que intrínsecos, pois, para adentrar no espaço da escrita e da leitura nas telas, é necessário se apropriar da língua em um certo grau (ainda que mínimo), assim como o desenvolvimento do letramento digital permite avançar no conhecimento da língua. Em várias das competências específicas de língua inglesa a serem trabalhadas no Ensino Fundamental faz-se menção explícita quanto ao letramento digital, enquanto em outras pode-se supor que ele está implícito (se for entendida a possibilidade de mediação de alguma tecnologia para se alcançar essa competência).

Sendo a tecnologia digital, em especial a internet, um meio para desenvolver todas essas competências, o letramento digital passa transversalmente por todas elas. Através da navegação por páginas oficiais de outros países, por exemplo, é possível ter acesso à sua cultura, dados demográficos, história etc.; por meio de vídeos pode-se perceber os sotaques; através de ferramentas de videoconferência pode-se conversar com falantes do idioma; por e-mail, chats, fóruns, redes sociais, blogs etc., é possível ler e/ou deixar mensagens escritas; enfim, há uma infinidade de possibilidades e cada um desses espaços de leitura e escrita exige determinado conhecimento e habilidades desenvolvidos através do que se chama de letramento digital.

O CBEIEFTC compreende a língua como o instrumento através do qual os indivíduos adquirem conhecimento, se inserem em sociedade e exercem a sua cidadania (Santa Catarina, 2019). A apropriação da língua inglesa amplia esse conhecimento e essa participação na sociedade, uma vez que por meio da tecnologia/internet é possível se aproximar de outras culturas, parecendo um mundo sem fronteiras.

Na prática, o documento sugere que sejam trabalhados gêneros discursivos de materiais autênticos originais ou adaptados, criando situações de interação na e pela língua. Seguem exemplos:

[...] apresentação pessoal, crachá, recados, bilhetes, calendário, cartões comemorativos, dramatizações/esquetes, horário escolar, agenda, e-mail, pequenos textos e diálogos, trilhas sonoras, comic books/histórias em quadrinhos/tirinhas/charges, cartazes, foto legendas, legendas de filmes/seriados, entrevistas, pequenos documentários, biografias, timelines, blogspots, jogos digitais, mapas mentais e conceituais, notícias de jornais e revistas, resumos/tópicos de notícias de jornais e revistas, enciclopédias on-line, contos/ romances e poemas em versões originais ou simplificadas, artes plásticas/museus on-line, cadernos e livros on-line, aplicativos on-line, verbetes, comentários em fóruns e ambientes virtuais on-line, reportagens em suportes físicos ou on-line, carta/e-mail de solicitação ou reclamação, carta/e-mail de editorial de revista, crônica argumentativa, resenha crítica, publicidades/propagandas impressas e em suportes midiáticos, advice columns, videocasts e podcasts (Santa Catarina, 2019, p. 308, grifos do autor).

Percebe-se uma grande quantidade de gêneros que só pode ser trabalhada on-line (com auxílio de computador e internet, por exemplo) e outros tantos que podem ser trabalhados através de programas e aplicativos não necessariamente on-line, como: editores de textos de imagens, de planilhas e de criação de pôsteres, todos exigindo certo conhecimento e habilidades específicos, demandando letramento digital.

O termo letramento digital foi cunhado em 1997 por Paul Gilster como sendo “[...] a habilidade de entender e usar a informação em múltiplos formatos a partir de uma ampla variedade de fontes apresentadas via computador” (Gilster, 1997, p. 1, tradução nossa)1. O autor argumenta que esse conceito quer dizer mais do que apenas ser capaz de ler no computador; significa ler com significado e entendimento, ser capaz de encontrar e filtrar a informação on-line, de usá-la em sua vida e de pensar criticamente. Sendo a internet o meio que se desenvolve mais rapidamente na história, em sua opinião, ser letrado digitalmente é essencial.

Quando Gilster (1997) escreveu sua definição para letramento digital, a internet já passava por mudanças. Essas alterações foram tão significativas no sentido de como seus usuários passaram a se comportar no mundo on-line, organizando e contribuindo com conteúdo, que Tim O’Reilly em 2005, a batizou de Web 2.0. Nessa fase da web, a inteligência coletiva é o ponto principal. Usuários de todo o mundo podem contribuir sobre os mais diversos assuntos (O’Reilly, 2005). Essas interações permitem aos desenvolvedores de softwares tornar seus aplicativos cada vez mais acessíveis/inteligentes, o que, por sua vez, possibilita aos usuários fazerem novas contribuições, e assim o ciclo vai se retroalimentando.

Em 2016, Dudeney, Hockly e Pegrum, professores e pesquisadores das áreas de tecnologias e línguas, trouxeram um conceito para letramento digital que se acredita estar mais em consonância com as características da Web 2.0. Em suas palavras: “[...] letramentos digitais: [são] habilidades individuais e sociais necessárias para interpretar, administrar, compartilhar e criar sentido eficazmente no âmbito crescente dos canais de comunicação digital” (Dudeney; Hockly; Pegrum, 2016, p. 17).

Percebe-se que leitura e escrita são a base e permeiam todas as habilidades mencionadas no conceito acima; no entanto, dois outros pontos chamam a atenção nesse conceito: o uso das expressões habilidades sociais e letramentos digitais, agora escrito no plural.

Sendo a internet um mundo sem fronteiras onde todos os que navegam por ela estão mais ou menos expostos, o que é lido e principalmente o que é escrito não afeta somente quem o faz, mas a todos. Logo, que atitudes os usuários precisam desenvolver para estabelecer uma comunicação clara, efetiva e evitar a construção de barreiras? Sendo ainda um espaço onde confluem textos escritos, imagens estáticas ou móveis com ou sem sons, que habilidades ou conhecimentos são necessários para que os usuários construam significados a partir daquilo que veem e sobre o que escrevem? Acredita-se que isso explique o porquê de o termo agora estar no plural: letramentos digitais abarcam outros letramentos – mas que outros letramentos seriam esses?

Dudeney, Hockly e Pegrum (2016) elencam uma série de conhecimentos e habilidades que consideram ser de suma importância para os professores, e estudantes, nos dias atuais, no que tange aos usos sociais da leitura e escrita por meio do computador. Um resumo desses letramentos pode ser visualizado no Quadro 1. Os letramentos estão agrupados em quatro áreas distintas e seguem uma ordem crescente de complexidade.

Quadro 1 – Quadro dos Letramentos Digitais. 

Complexidade crescente Primeiro foco: Linguagem Segundo foco: Informação Terceiro foco: Conexões Quarto foco: (Re)desenho
*

Letramento impresso

Letramento em SMS

** Letramento em hipertexto Letramento classificatório
*** Letramento em multimídia

Letramento em pesquisa

Letramento em informação

Letramento em filtragem

Letramento pessoal

Letramento em rede

Letramento participativo

****

Letramento em jogos

Letramento móvel

Letramento intercultural
***** Letramento em codificação Letramento remix

Ainda que não se adentre em detalhes sobre os conceitos desses letramentos, pode-se perceber que são muitas as habilidades e os conhecimentos envolvidos em cada um deles, e, para além das dificuldades quanto ao acesso à tecnologia e à formação dos profissionais, o letrar-se digitalmente é uma necessidade indiscutível para toda a sociedade, e quanto mais cedo a escola puder ofertar essa possibilidade, melhor para todos.

Um outro aspecto importante a se considerar é a abordagem que o professor terá frente ao letramento digital. Segundo Kleiman (2006a), o papel do professor no contexto do letramento é entendido como de um agente, alguém que mobiliza os recursos necessários para, em conjunto com seus estudantes, criar produções escritas para fins sociais. Essa concepção diferencia-se da de mediador (entendida como uma posição neutra, que faz uma ponte entre o conhecimento e o estudante), para um trabalho de coautoria (entre professor e estudantes), promovendo ações através da escrita. Como bem salienta Kleiman (2006b, p. 422):

Ao mobilizar os recursos do grupo e ao promover estrategicamente a participação de todos, segundo as suas capacidades, em prol dos objetivos coletivos, o agente de letramento ajuda, como ator social que é, a criar contextos para que outros atores que se engajarão em atividades relevantes para o grupo venham a se constituir. Um processo de profissionalização acadêmica no qual o aluno é sempre posicionado subalternamente pelos seus professores, pela mídia, pelo empregador não contribui para a formação de sujeitos autônomos, capazes de decidir qual a melhor ação para uma determinada situação, em vez de aplicar uma receita ou modelo aprendido a qualquer situação.

Nesse contexto, é importante valorizar as práticas de leitura/escrita extraescolares como forma de aproximar a escola da realidade de seus estudantes e, juntamente com eles, construir (novas) práticas de leitura/escrita que venham ao encontro de suas necessidades. Como exemplos dessa perspectiva de agência, podem ser citadas a escrita coletiva de um e-mail para solicitação de uma demanda específica da turma/escola para algum órgão ou empresa e a criação de campanhas escolares em que são elaboradas fanpages, com textos multimidiáticos, permitindo a participação/colaboração de toda a comunidade escolar por meio da escrita.

Kleiman (2007, p. 1) ressalta que, além dos conhecimentos que o professor precisa constantemente adquirir, o mais importante é a atitude política, pois, “[...] é essencial querer fazer, acreditar que é possível inserir todos os grupos sociais nas práticas de prestígio de uso da escrita, para que se tornem usuários e críticos dessas práticas”. Essa agência de letramento, que procura articular vários recursos em prol de um determinado objetivo coletivo, exige um repensar constante da prática pedagógica do professor, para alinhar os interesses da escola com os de fora dela.

Em suma, trabalhar o letramento sob a perspectiva de agência significa, para o professor, adotar práticas pedagógicas de leitura/escrita que tenham uma função real na vida dos estudantes; trabalhar com gêneros textuais que estejam ligados às suas práticas sociais para que a aprendizagem seja mais significativa; e, como a tecnologia ocupa um tempo e espaço importantes na vida extraescolar dos alunos, os professores precisam inseri-la nessas práticas. Para os estudantes, ler e escrever tornam-se atividades para se alcançar algum propósito, não apenas para que o professor corrija; o objetivo é apropriar-se do gênero para que ele lhe sirva em outras situações futuras, com bem ressalta Bazerman (2021, p. 25): “[...] quanto mais ferramentas flexíveis de escrita [gêneros textuais] e mais reflexão compreensiva temos, de maiores possibilidades e recursos para agência dispomos”.

Após os procedimentos metodológicos da pesquisa, o artigo abordará como as práticas pedagógicas dos professores de língua inglesa do Ensino Fundamental II da rede pública estadual de Jaraguá do Sul têm contribuído para o desenvolvimento do seu próprio letramento digital.

Procedimentos Metodológicos

Esta seção traz parte dos dados levantados por uma pesquisa realizada com os professores de língua inglesa do Ensino Fundamental II da rede estadual de Jaraguá do Sul sobre o tema letramento digital. Para a coleta de dados foi utilizado primeiramente um questionário, que foi encaminhado às escolas para serem repassados aos professores após o projeto ter sido aprovado pelo Comitê de Ética (CAAE: 49986121.0.0000.5366, parecer nº 4.948.708). De um total de 12 escolas que ainda oferecem o Ensino Fundamental, foram obtidos 12 questionários respondidos, vindos de 8 diferentes unidades. Desses 12 respondentes, 5 professores também concederam entrevistas (semiestruturadas) como forma de aprofundar o tema, sendo essas transcritas e analisadas em seu conteúdo conforme proposta de análise de Bardin (1977).

A coleta dos dados aconteceu entre setembro de 2021 e agosto de 2022 e, tendo-se o cuidado de manter o distanciamento por conta da pandemia de coronavírus, deu-se prioridade ao contato telefônico, questionário on-line e à entrevista por videoconferência. Os dados discutidos neste artigo referem-se a perguntas diretamente associadas às práticas pedagógicas desenvolvidas por professores de língua inglesa, por meio da tecnologia, cujo objetivo é levar à compreensão de como se dá o desenvolvimento do letramento digital dos participantes da pesquisa.

Resultados e Discussão

Nesta seção serão apresentadas parte dos dados obtidos durante a pesquisa e as análises a respeito do desenvolvimento do letramento digital dos professores de língua inglesa do Ensino Fundamental II da rede pública estadual de Jaraguá do Sul, segundo suas falas.

Dos questionários aplicados e conversas tidas durante a realização da pesquisa foi possível compreender que o desenvolvimento do letramento digital dos professores acontece, pelo menos, de quatro formas distintas: através de cursos ou treinamentos, sejam eles em serviço ou não; da troca de experiências com os colegas de profissão; da troca com os próprios estudantes; e das atividades pedagógicas que preparam e realizam com seus estudantes. Para fins de elaboração deste artigo, as autoras se limitaram a trazer as análises das práticas que envolvem o fazer pedagógico para a sala de aula; ou seja, desde o planejamento da aula até sua execução propriamente dita.

Para compreensão do envolvimento dos professores com a tecnologia, os entrevistados foram questionados sobre quanto tempo eles leem nas telas diariamente. Das respostas obtidas, acredita-se que algumas tenham sido dadas considerando o tempo de leitura/escrita apenas para fins pessoais, e outras, considerando o trabalho na frente do computador durante um dia inteiro, conforme se pode ler nas falas dos entrevistados:

Eu acredito que em torno de umas duas horas, é certo. Porque no trabalho eu também uso esses recursos, então, leio textos, vou mostrando, apresentando pros alunos um vídeo e para preparar as aulas também eu uso bastante (Professor 1).

Eu passo quase 24h por dia no computador, porque de manhã cedo, já inicio às 7h30, sempre através do computador; é chamada... são as minhas aulas... planejamento... é tudo através do computador [...]. Às vezes preciso entrar em contato, a gente teve feira de ciências e mostra de trabalhos ontem, então tinha que tirar dúvida com aluno, ver se o aluno ensaiou, então era tudo através de chat, [...], então é praticamente 24h por dia (Professor 2).

[...] Creio que uma hora, duas horas mais ou menos. No computador a maior parte do tempo são planos de aula e pesquisando [...]. Mas têm mais coisas que eu faço usando a internet além desses dois, eu gravo vídeos, eu edito os vídeos pra usar na aula; pra jogar; em projetos que eu também faço. Estou sempre utilizando a internet. É algo que tem que estar toda hora comigo, senão, não vou pra frente (Professor 3).

Acredito que em média, talvez, entre 1 e 2 horas [...] eu uso bastante a internet, pra tudo de pesquisa que vem na minha cabeça eu já to pesquisando. Gosto de redes sociais. Acho que profissionalmente eu uso muito também, porque eu tenho que fazer muitas pesquisas para preparar minhas aulas. Eu pego uns sites assim que eu gosto muito de procurar, principalmente exercícios de gramática, ou vídeos, algumas coisas para ter ideias diferentes do que fazer na sala de aula com eles. Eu faço algumas atividades mais lúdicas, então eu pesquiso bastante, eu uso muito [...] (Professor 4).

Se o tempo de trabalho for considerado, acredita-se que todos passem mais tempo do que imaginam em frente às telas. Da leitura desses dados, entendeu-se que esses profissionais fazem uso da tecnologia diariamente, tanto por razões pessoais, mas mais ainda por razões de trabalho, ou motivados pelo trabalho – como é o caso das pesquisas para preparo de aulas. Ao acessarem blogs, notícias e outros sites, eles estão em contato direto com textos multimodais, hyperlinks e com a língua inglesa, o que também contribui para o próprio desenvolvimento do letramento digital.

A fim de compreender de forma mais específica quais práticas pedagógicas que envolvem o uso da tecnologia fazem parte da rotina dos professores e lhes permitem desenvolver seu letramento digital, foram feitas as seguintes perguntas: (a) com que frequência você utiliza os recursos digitais (computador/tablet/celular) na sua prática em sala de aula? e (b) quando os utiliza, de que forma o faz?

Os dados demonstraram que a utilização dos recursos tecnológicos é frequente; a maioria os utiliza sempre ou quase sempre e ninguém respondeu que raramente ou nunca usa. Os recursos mais mencionados durante as entrevistas foram: computador com projeção através de projetor, celular e lousa digital. Esses recursos, segundo as respostas dadas nos questionários, são utilizados durante as atividades de pesquisa e planejamento das aulas; realização da chamada; apresentação de conteúdos através de slides e vídeos e utilização de aplicativos dos mais diversos: música, jogos, tradução, entre outros. Como é possível perceber, algumas atividades são exclusivas do ofício do professor, mas outras são executadas tanto por professores quanto por estudantes, como, por exemplo: a pesquisa e a apresentação de slides. A partir das entrevistas foi possível constatar que a pesquisa e o planejamento das aulas, assim como a chamada, estão sempre apoiados na tecnologia, e a plataforma utilizada para a entrega dos conteúdos aos estudantes é o Google Classroom. Essa plataforma educacional permite aos professores não apenas depositar o conteúdo como também criá-lo através de editores de texto, planilha e formulário, entre outros, e o mais interessante é que essas criações podem não apenas ser facilmente compartilhadas, como também feitas em colaboração com outros sujeitos. A seguir são trazidos alguns recortes das entrevistas dos professores nesse sentido:

[...] geralmente eu planejo antes, gosto de deixar tudo pronto (Professor 1)

[...] eu coloco todos os meus slides no Classroom, então eu tenho usado bastante essas ferramentas. [...] é chamada, são as minhas aulas, planejamento, é tudo através do computador (Professor 2).

No computador a maior parte do tempo são planos de aula e pesquisando, mas tem mais coisas que eu faço usando a internet [...] se eu não uso o projetor, a tecnologia, eu vou estar usando a internet para pesquisa (Professor 3).

[...] pesquisas, pra planejar as aulas, eu uso direto (Professor 4).

O trabalho com os aplicativos ou softwares utilizados para elaboração de apresentações permite que seus usuários (professores e estudantes) desenvolvam muitas habilidades e conhecimentos relacionados ao letramento digital. Atualmente esses programas já vêm com diversas sugestões de gêneros textuais para apresentação; é possível, por exemplo, escolher entre cartazes, relatórios, infográficos, banners e até mesmo uma videoaula, em que se pode filmar a apresentação do texto, acrescida de imagens, vídeos, sons e hyperlinks. Enfim, através de uma aparentemente simples apresentação de conteúdo, primeiramente o autor prepara-se para escrever através da pesquisa (letramento em pesquisa, informação e filtragem), então, escreve dentro de um determinado gênero textual (letramento impresso on-line), lê/interpreta imagens, vídeos e áudios (letramento multimídia e em hipertexto) e se posiciona dentro do conteúdo apresentado (letramento pessoal e intercultural) – só para citar alguns exemplos. Esses programas são bastante utilizados, pelo que foi possível constatar:

Geralmente eu utilizo pra começar um assunto, e às vezes conforme o andamento deles eu faço uma avaliação ou um trabalho de apresentação pra finalizar aquele assunto [referindo-se ao uso de slides]. Eu trago vídeo, podcast, eles conseguem visualizar, ouvir [...] (Professor 1).

As minhas aulas são todas baseadas em slides [...] Às vezes preciso entrar em contato [...] então era tudo através de chat [...] Compreensão de texto é tudo no Classroom [...] às vezes prova [...] às vezes eu trago vídeos do Youtube, até como forma de revisão do conteúdo [...] sites da BBC também procuro utilizar [...] tem o Ingú, tem o English Levels também, que são três níveis de textos pra trabalhar um pouquinho essa leitura com eles, porque eles não têm muito acesso à leitura em língua inglesa [...] a gente usa bastante o Canva, pra fazer pôster ou outros gêneros textuais (Professor 2).

[...] eu gravo vídeos, eu edito os vídeos, pra usar na aula, pra jogar, em projetos que eu também faço, estou sempre utilizando a internet [...] geralmente eu peço um assunto e divido em três partes, sendo primeiro uma apresentação de slides, ou uso a lousa digital ou o projetor; após isso temos uma produção sobre o assunto, a gente para um tempo pra fazer um feedback e em terceiro nós fazemos uma prática, prática oral, escrita ou listening, uma dessas três sempre vai estar inclusa nesses três momentos de aula (Professor 3).

A gente consegue trazer algumas atividades diferentes, eu tento levar bastante atividades com áudio, passar pelo próprio notebook algumas atividades com áudio, vídeos ou filmes, séries não tanto, algumas coisas assim mais visuais pra eles também [...] (Professor 4).

Percebe-se que os slides são um dos recursos mais utilizados pelos professores, empregados sempre na apresentação ou finalização do conteúdo ministrado, por exemplo: “Geralmente utilizo para apresentar um assunto [...] pra finalizar aquele assunto” (Professor 1); “As minhas aulas são todas baseadas em slides” (Professor 2); “[...] primeiro uma apresentação de slides [...]” (Professor 3). Seria esse recurso o mais recorrente por ser mais parecido com outros anteriormente utilizados pelos professores, como a projeção de lâminas através do retroprojetor ou de cartazes? Afinal de contas, a criação de seus próprios vídeos exige habilidades diferentes, e é pouco provável que qualquer professor tenha tido acesso a essa habilidade antes da era dos computadores portáteis – o que, possivelmente, torna esse recurso mais raramente utilizado.

Nos exemplos acima, a tecnologia é destacada como meio para o desenvolvimento das habilidades de leitura, escrita e compreensão auditiva em língua inglesa, conforme os excertos:“Eu trago vídeo, podcast, eles conseguem visualizar, ouvir”(Professor 1);“Compreensão de texto é tudo no Classroom [...] às vezes eu trago vídeos do Youtube [...] sites da BBC [...] tem o Ingú, tem o English Levels [...] pra trabalhar um pouquinho essa leitura com eles” (Professor 2); “eu gravo vídeos, eu edito os vídeos” (Professor 3); “[...] eu tento levar bastante atividades com áudio, vídeos ou filmes [...]” (Professor 4). Como se pode verificar, na internet é possível encontrar uma grande variedade de gêneros textuais (muitos já existentes no gênero impresso; outros novos, digitais), o que permite o aperfeiçoamento de habilidades com a leitura e a escrita enquanto o letramento digital é desenvolvido. Além do mais, trabalhar com materiais autênticos e atuais, conforme os exemplos acima, torna a experiência com a língua mais motivadora e real, e a escola pode estreitar seus laços com os estudantes conciliando os conteúdos com assuntos do interesse deles (Holden; Nobre, 2018).

Outro letramento que se pode depreender da entrevista é em jogos, na verdade, trata-se de um macroletramento, pois, abarca vários outros, e que envolvem“[...] habilidades linguísticas, multimidiáticas, espaciais, cinestésicas e outras” (Dudeney; Hockly; Pegrum, 2016, p. 30). Pelo que foi possível constatar, os estudantes desenvolvem melhor esse letramento do que os professores, pois, segundo as entrevistas, na maioria das vezes, parte dos estudantes a proposta para se usar o jogo em sala de aula, conforme esta fala de um dos professores: “[...] eles já sabem trabalhar alguns programinhas de games, você lança um assunto... ‘ah, posso criar um jogo com isso?’, é bem interessante!” (Professor 1).

Todavia, ser letrado em jogo não significa apenas saber jogar, mas, para além da habilidade de jogá-los, é ter a capacidade de entender seus significados no contexto da cultura humana, de outros gêneros de jogos e da plataforma tecnológica em que são executados, e conhecer seus componentes e ter a capacidade de criá-los (Zagal, 2009). Portanto, para desenvolver esse letramento efetivamente, seria necessário que o próprio professor criasse seus jogos – e que ele permitisse aos estudantes criarem. Dois professores manifestaram utilizar-se da gamificação, criando seus próprios jogos. Pode-se inferir que eles estejam, de certa forma, desenvolvendo seu letramento em jogos, pois para gamificar é necessário conhecer os pormenores dos jogos:

Eu fiz um curso de gamificação on-line há duas semanas atrás, gratuito, através do Youtube, foi bem bacana, ele passou pra nós e-books com exemplos de atividades, algumas eu apliquei em sala de aula como meio de recuperação [...] então eu usei um pouquinho desse curso de gamificação que eu fiz on-line para recuperação, e deu certo [...] (Professor 2).

Eu faço vários joguinhos, Stop, às vezes eu faço em cartas, com os verbos, as frases, e também umas ferramentas que a gente faz na internet. Tem umas criações de jogos que dá pra fazer pra eles acessarem no celular e da pra gente colocar no projetor, então às vezes a criação de algum game, algum jogo eu acho que dá certo, tento, se conseguir fazer de forma tecnológica fica bem legal, mas se for de forma mais simples também dá certo (Professor 4).

Um ponto a favor da utilização da tecnologia (computador/internet) é a oportunidade de contato com falantes nativos do idioma para trabalho com o listening e a pronúncia, conforme relatam os professores:

[...] essa questão ajuda muito comparado há 20 anos atrás quando eu comecei, a facilidade agora é muito maior [...] eles conseguem ouvir, daí eles se concentram bastante nisso e eles gostam porque a maioria deles tem facilidade pra pegar a pronúncia melhor do que a escrita [...] o que eu acho muito bom são os diálogos, tem alguns sites que têm vários textos falados que você escuta os personagens, então, uma hora do inglês britânico, outra hora do inglês americano, então isso eu gosto bastante, eu acho que isso pra eles é muito bom, porque eles não escutam só a gente pronunciando em sala (Professor 1).

[...] posso passar um videozinho sobre como pronunciar as palavras com th, porque eles têm muita dificuldade, o thank you, think, though... então, isso auxilia muito ali dentro da sala de aula, essa facilidade, eu acho muito prático (Professor 2).

[...] as práticas de listening e speaking, eu preciso da internet porque não dá pra fazer um listening/speaking com a minha voz, então se não tiver esse recurso à mão, vai ficar muito difícil de tornar a aula mais dinâmica e interativa [...] (Professor 3).

Como é possível observar, frases do tipo: “a facilidade agora é muito maior” (Professor 1); “isso auxilia muito ali dentro da sala de aula, essa facilidade, eu acho muito prático” (Professor 2); “eu preciso da internet porque não dá pra fazer um listening/speaking com a minha voz” (Professor 3) são exemplos de como a tecnologia tem sido um grande auxílio – em especial para os professores de língua inglesa, que na prática dependem de materiais produzidos na língua de forma escrita e falada, e o ambiente virtual tem sido o maior depositório de conteúdos nesse sentido. Ainda que muitos desses conteúdos não tenham sido criados especificamente para a sala de aula, podem ser aproveitados para essa finalidade.

A pronúncia trabalhada através de vídeos enriquece muito a experiência e o êxito da atividade (sendo o vídeo de boa qualidade de som e imagem, obviamente); e, sem dúvida alguma, o computador/ internet tem sido um grande aliado. A variedade de sotaques é riquíssima e muito mais acessível do que por qualquer outro dispositivo, permitindo que professores e estudantes tenham contato com muitas culturas diferentes, não apenas com as culturas inglesa/americana. Nesse sentido, Dudeney, Hockley e Pegrum (2016, p. 53) chamam a atenção para o letramento intercultural e o cuidado que os professores devem ter ao propor atividades transculturais, pois “[...] a menos que sejam muito bem- preparadas, bem estruturadas e bem apoiadas pelos professores, as interações transculturais podem levar a confusões, desentendimentos e, pior ainda, ao reforço de estereótipos e preconceitos”. Essa é uma boa oportunidade para se trabalhar o respeito às diferenças, temas transversais e o inglês como língua franca, citando apenas alguns exemplos.

No Quadro 2 são apresentadas as práticas pedagógicas (que envolvem a tecnologia – computador/ celular/internet) mais mencionadas pelos professores durante as entrevistas, elencando os letramentos digitais que mais oportunizam desenvolver.

Quadro 2 – Práticas pedagógicas e letramentos digitais. 

Práticas pedagógicas que envolvem a tecnologia mais utilizadas pelos professores de língua inglesa do Ensino Fundamental II Letramentos digitais que podem ser desenvolvidos através dessas práticas
Planejamento de aulas em editores de texto Letramento impresso on-line; hipertexto; pesquisa; informação; filtragem
Apresentação de slides Letramento em multimídia; hipertexto
Vídeos Letramento em multimídia
Pesquisa em sites Letramento em pesquisa; informação; filtragem; hipertexto; multimídia
Aplicativo de jogos/gamificação Letramento em jogos; pessoal; codificação
Blogs Letramento impresso on-line; hipertexto; multimídia
Redes sociais Letramento em Multimídia; pessoal; SMS
Chat Letramento em SMS
E-mail Letramento impresso on-line; SMS; hipertexto
Aplicativos para aprender inglês Letramento impresso on-line; em jogos; multimídia
Músicas Letramento impresso on-line; intercultural; multimídia

Como foi possível ver, há uma grande possibilidade de exercitar diversos letramentos digitais por meio das práticas pedagógicas em sala de aula; no entanto, faz-se necessário lembrar que, para o desenvolvimento desses letramentos de forma efetiva, não basta conhecer a interface dos aplicativos/ programas; é indispensável apreender as especificidades dos gêneros textuais que ali circulam, como entender/produzir sentidos por meio deles, entre tantas outras habilidades. Então questiona-se: será que os professores estão realmente cientes disso tudo?

Outra situação que o quadro reflete é que parece que se faz mais do mesmo; ou seja, o computador tem sido usado como substituto da televisão/DVD, para a apresentação de vídeos, filmes, clipes e séries; do rádio para reprodução de músicas e podcasts; dos cartazes e flip charts para apresentar slides (mais elaborados, certamente), entre outros. Aqui vale lembrar as palavras de Papert (1990, online, tradução nossa, grifo do autor)2 ao se referir à introdução dos computadores na educação “[...] não deveríamos pensar na máquina como tendo um efeito. Deveríamos falar sobre a oportunidade que nos é oferecida, pela presença do computador, para repensar sobre o que se trata o aprendizado, para repensar a educação”. A intenção deste artigo não é diminuir a tecnologia, nem a desvalorizar; todas as ações explicitadas acima são legítimas. Acredita-se apenas que é necessário pensar em como é possível aproveitar essa ferramenta, que tem um potencial riquíssimo para produção de conteúdo, disseminação de boas ideias e, principalmente, de criação, da melhor forma possível para que não se incorra no erro de usar novas tecnologias, mas manter os velhos hábitos de sempre.

Considerações Finais

O presente artigo, elaborado a partir de uma dissertação de mestrado, teve por objetivo compreender como o letramento digital dos professores de língua inglesa do Ensino Fundamental II da rede púbica estadual de Jaraguá do Sul tem se desenvolvido por meio do que dizem de suas práticas pedagógicas. Entre as tantas atribuições que os professores têm, são suas práticas pedagógicas cotidianas, que se referem à pesquisa, ao planejamento e à realização das aulas, que mais influenciam em suas experiências com o letramento digital.

Percebeu-se a utilização da tecnologia como uma aliada da prática pedagógica dos professores de língua inglesa, que a tem aproveitado como fonte de material autêntico para as aulas, especialmente para as atividades de listening e reading .

Como a coleta de dados se deu em dois momentos diferentes, as entrevistas de 2021, realizadas durante as aulas remotas, enfatizaram muito a falta de formação para se trabalhar por meio da tecnologia. Após o retorno às aulas presenciais, a ênfase foi maior na falta de equipamentos. Independentemente do formato, remoto ou presencial, acredita-se que a tecnologia em sala de aula ainda é subutilizada quando é empregada somente como um recurso moderno que substitui outros equipamentos tecnológicos, conforme mencionado anteriormente. Faz-se necessário pensar o uso dessa ferramenta a fim de aproveitá-la para melhorar a prática docente e a aprendizagem dos estudantes ainda mais.

Acredita-se que os dados aqui apresentados contribuem para a reflexão quanto às práticas pedagógicas e a educação, de um modo geral, quando demonstram tanto o quanto já se caminhou em relação à inserção da tecnologia e seu uso nas salas de aula, quanto os obstáculos que ainda precisam ser superados. Entre aqueles que se referem à prática pedagógica dos professores de língua inglesa, destaca-se a necessidade de uma formação sólida no tema do letramento digital, pois, mais importante do que saber como a máquina ou seus programas funcionam, é saber o que é possível fazer com/por meio dela, e, nesse sentido, o produto do trabalho do professor por meio da tecnologia precisa ser ético e responsável – temas que o letramento digital contempla muito bem.

Referências

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1No original: “The ability to understand and use information in multiple formats from a wide range of sources when it is presented via computers” (Gilster, 1997, p. 1).

2“[…] we should not think about a machine having an effect. We should be talking about the opportunity offered us, by this computer presence, to rethink what learning is all about, to rethink education” (Papert, 1990, online, grifo do autor).

Recebido: 15 de Novembro de 2022; Aceito: 24 de Janeiro de 2023

E-mail:<rosanamarakoerner@gmail.com>.

Correspondência para/Correspondence to:

R.M. KOERNER

Editor responsável:

Samuel Mendonça.

Conflito de interesse:

não há.

Artigo elaborado a partir da dissertação de C. PEDRI, intitulada “O Letramento Digital nas práticas pedagógicas dos professores de Língua Inglesa do ensino fundamental II da rede estadual de Jaraguá do Sul”. Universidade da Região de Joinville, 2022.

Como citar este artigo/How to cite this article

Pedri, C.; Koerner, R. M. Práticas pedagógicas dos professores de Língua Inglesa e o desenvolvimento do seu letramento digital. Revista de Educação PUC-Campinas, v. 28, e237070, 2023. http://doi.org/10.24220/2318-0870v28e2023a7070

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