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Revista de Educação PUC-Campinas

versão impressa ISSN 1519-3993versão On-line ISSN 2318-0870

Educ. Puc. vol.28  Campinas  2023

https://doi.org/10.24220/2318-0870v28e2023a8266 

Práticas Pedagógicas e Processos Educativos em Educação Estatística

Proposição para superação do ensino empírico do conceito estatístico de média no Ensino Superior

Proposition for overcoming the empirical teaching of the statistical concept of average in Higher Education

Danubia Sebastião, conceitualização, metodologia, investigação, análise, redação do texto1 
http://orcid.org/0000-0002-9887-1503

Graziela Fátima Giacomazzo, conceitualização, metodologia, investigação, análise, redação do texto2 
http://orcid.org/0000-0001-7232-8492

Lucas Sid Moneretto Burigo, conceitualização, análise, redação nas proposições de ensino2 
http://orcid.org/0009-0008-7743-2385

Daiane de Freitas, conceitualização, análise, redação nas proposições de ensino3 
http://orcid.org/0000-0002-9200-6033

1Escola de Ensino Fundamental Vincenzo De Villa. Urussanga, SC, Brasil.

2Universidade do Extremo Sul Catarinense, Programa de Pós-Graduação em Educação. Criciúma, SC, Brasil.

3Escola Municipal de Educação Básica Professora Maria de Lourdes Carneiro. Criciúma, SC, Brasil


Resumo

Este artigo apresenta um recorte de um estudo que visa o desenvolvimento de tarefas elaboradas com base no modo davydoviano de organização de ensino. Essas tarefas têm por objetivo promover a busca pela relação universal do conceito estatístico de média, divergindo dos métodos tradicionais encontrados nas literaturas. A delimitação ocorreu para duas tarefas particulares de um conjunto de tarefas desenvolvidas em uma pesquisa no âmbito de um programa de mestrado em Educação. Essas tarefas estão fundamentadas na Teoria da Atividade e nos estudos de Davýdov, organizadas para o ensino do conceito de média ao nível superior, com uso de lousa digital. A partir das análises realizadas, constata-se que o conceito de média se materializa a partir da determinação da igualdade entre grandezas, sendo essa a sua relação fundamental.

Palavras-chave Educação estatística; Lousa digital; Média aritmética; Modo davydoviano; Teoria da atividade

Abstract

This article presents an excerpt from a study aimed at developing tasks based on the Davydovian way of organizing teaching. Such tasks aim to promote the search for the universal relationship of the statistical concept of average, diverging from the traditional methods found in the literature. The delimitation occurred for two particular tasks from a set of tasks developed in research within the scope of a master’s in education program. These tasks are based on the Activity Theory and on Davýdov’s studies, organized for teaching the concept of average, at a higher level, using the Digital Blackboard. From the analyzes carried out, it appears that the concept of average materializes from the determination of equality between magnitudes, which is its fundamental relationship.

Keywords Statistical Education; Digital board; Arithmetic average; Davydovian mode; Activity theory

Introdução

As práticas pedagógicas e os processos educativos, no contexto da história da educação, apresentam-se como estratégias de avaliação e de investigação sobre o exercício docente, contribuindo com os estudos e as transformações nos processos de ensino e de aprendizagem.

Atualmente, tem-se a compreensão de educação como elemento de mediação da apropriação do conhecimento elaborado historicamente, com vistas à transformação da sociedade. Desse modo, se faz necessário pensar na organização do ensino que tem sido desenvolvido, sobretudo na finalidade que essa atividade desempenha.

Segundo Fiorentini (1995), a forma como o professor organiza o ensino depende dos seus pressupostos teóricos, mesmo sem que se tenha plena consciência deles. Ainda, a concepção de aprendizagem, de pesquisa e de finalidade do ensino de Matemática se incidem de formas diferentes a cada tendência adotada. Por exemplo, na tendência empírico-ativista entende-se que a base do desenvolvimento do conhecimento consiste na experimentação, captada pelos órgãos dos sentidos. Sendo assim, a apropriação do conhecimento consiste na internalização da manipulação de objetos ou de situações experimentais, que estão relacionadas às ideias preexistentes a respeito do material que se deseja conhecer. Tendências como essa, que apresenta uma base filosófica idealista, desconsideram o desenvolvimento histórico no processo de elaboração dos conceitos em situação de ensino e aprendizagem, os quais são apreendidos de modo fragmentado e isolado e sem que seja estabelecida uma relação com a realidade objetiva.

Entre as tendências em Educação Matemática, aquela que contrapõe essa forma de conceber o conhecimento como algo imutável e a-histórico a fim de superar o desenvolvimento do pensamento empírico é a Teoria Histórico-Cultural. Em oposição às teorias atuais, ela se preocupa não apenas com o ensino do conhecimento elaborado historicamente, mas com a formação humana e o desenvolvimento do pensamento. A todo momento “[...] o ensino escolarizado precisa ser organizado de modo que desenvolva o pensamento dos estudantes, sendo condizente com o que de mais atual a humanidade atingiu” (Damazio; Moura; Rosa, 2014, p. 3).

Contudo, não se pode perder de vista que o contexto educativo é complexo frente aos desafios da sociedade contemporânea. Entre eles, destaca-se a dinâmica das Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC) no âmbito da cultura digital. O contexto educacional ainda necessita incorporar e apropriar-se mais qualitativamente das potencialidades das TIC nos processos educativos. São muitas as tentativas de elucidar e significar o lugar das TIC no ensino.

O presente estudo se trata de um recorte de uma pesquisa de mestrado em Educação na qual se investigou um modo de organização de ensino para o conceito de média aritmética, uma das Medidas de Tendência Central. Vale adiantar que, a média aritmética adotada nesse estudo envolve apenas a relação entre grandezas, em especial o volume. A elaboração desse estudo está constituída por um sistema de tarefas particulares em que a resolução de cada uma delas adota o uso da lousa digital como uma das operações. Para tanto, neste artigo os dados de análise são resultantes de duas das tarefas abordadas na pesquisa dissertativa. A fundamentação teórica adotada é a Teoria da Atividade. Tem-se a pressuposição de que a organização do ensino fundamentado na Teoria da Atividade propicia a aprendizagem de conceitos científicos e condições para o desenvolvimento do pensamento conceitual estatístico. O foco desta investigação é a busca por uma relação universal do conceito de média diferente do proposto pelas literaturas tradicionais, no contexto do Ensino Superior.

Após a introdução, apresenta-se o percurso teórico metodológico explicitando as ações empreendidas e que orientaram o estudo. Posteriormente, tem-se a análise das duas tarefas particulares referentes ao ensino do conceito estatístico de média no Ensino Superior. Ao final, são apresentadas as considerações finais seguidas das referências utilizadas no presente estudo.

Procedimentos Metodológicos

O presente estudo se caracteriza como uma pesquisa qualitativa do tipo propositiva, uma vez que propõe a elaboração de um conjunto de tarefas particulares guiado pelo pressuposto de que sua organização desenvolva o pensamento teórico dos estudantes. Na elaboração das tarefas, levou-se em consideração a necessidade de uma análise que explicite o modo geral; isto é, a tradução da relação essencial do conceito de média aritmética, vinculado à medição da grandeza volume.

A pesquisa, dado seu objeto, propôs algumas ações: 1) Buscar os fundamentos teóricos da perspectiva histórico-cultural, cuja matriz consiste no materialismo histórico dialético; 2) Organizar uma sequência de ensino que promova nos estudantes do Ensino Superior a apropriação do conceito de média com conteúdo teórico; 3) Desenvolver a análise das tarefas para identificação dos elementos que compõem a relação universal do conceito em correspondência com a primeira e a segunda ação de Davýdov estabelecidas para o estudo; 4) Verificar o papel e as inter-relações que se apresentam pela articulação da lousa digital com a organização de ensino proposta.

A intenção do estudo foi a não adoção dos procedimentos convencionais dos livros de Estatística que, geralmente, se baseiam em: (a) Definição de Medidas de Tendência Central (média, mediana e moda); (b) Exemplos, a partir de um conjunto de dados correspondentes a uma situação real ou imaginária; (c) Resolução de exercícios, que se poderia sintetizar por enunciados do tipo: “Calcule a média, mediana e moda de um determinado conjunto de dados”.

Por se tratar da proposição de uma organização de ensino, fez-se necessário o estudo da base teórica da Teoria da Atividade. Nesse sentido, destaca-se a estrutura da Teoria da Atividade e seus elementos de contribuição para o desenvolvimento da formação humana a partir dos pressupostos de Leontiev, Vigotsky e Davýdov. A compreensão de atividade dentro dessa perspectiva é imprescindível, uma vez que se visa a proposição de tarefas que, possivelmente, possibilitarão que aos estudantes de nível superior entrem em processo de apropriação do conceito matemático de média aritmética. Considera-se que o desenvolvimento das tarefas seja realizado a partir dos recursos da lousa digital, buscando articular as tecnologias mais atuais com a organização do ensino. Desse modo, para que a organização das tarefas ocorra a fim de colocar o estudante em processo de desenvolvimento teórico é necessário o entendimento, por parte do professor, da estrutura de sua atividade principal: ensinar. Nessa teoria, o ensino anseia pelo desenvolvimento do pensamento teórico.

A delimitação do conceito estatístico de média surgiu a partir das observações da pesquisadora sobre a abordagem do conceito feita pelos livros didáticos. Nas obras analisadas, apresenta-se a definição do conceito a partir da exposição das Medidas de Tendência Central mais comuns (média aritmética, mediana e moda), com elucidação de fórmulas matemáticas prontas que possibilitam encontrar o “centro dos valores” a serem analisados.

Segundo Cazorla (2003, p. 2) diversas pesquisas comprovam que, na maioria das vezes, os estudantes em diversos níveis de escolarização, conseguem compreender o procedimento de cálculo da média – “soma os valores e divide pelo número de dados envolvidos na soma” – porém, não compreendem conceitualmente o significado que ela representa. Dessa forma, dispersam a real compreensão do significado de medidas que tendem a um “centro de uma distribuição”. Ainda no contexto do ensino de Estatística, Batanero et al. (2013) destaca que apesar do estudo dos seus conceitos ocorrerem no contexto escolar, muitos estudantes finalizam esse estudo sem a sua compreensão.

No que se refere à elaboração da sequência didática sobre o conceito de média aritmética, numa perspectiva histórico-cultural, tomou-se como referência o modo de organização de ensino davydoviano. Para tanto, com base em Davídov4 (1988), estabeleceu-se a seguinte tarefa de estudo: formar nos estudantes de Ensino Superior uma concepção circunstanciada e válida de Medidas de Tendência Central no âmbito do número real; isto é, em nível teórico, com relações entre grandezas, em especial o volume, a partir do conceito de média. Vale enfatizar, que tal conceito será tratado em sua forma complexa estabelecendo não apenas sua relação matemática (soma e divisão em partes iguais), mas sua relação estatística “[...] como um valor equitativo proveniente da necessidade de uma distribuição uniforme” dos dados (Carvalho, 2011, p. 22).

Para essa tarefa foi adotada a primeira ação de estudo de Davýdov, que consiste em colocar o estudante em processo de análise para identificação da relação geral e essencial do conceito de média. Articuladamente com a primeira ação de Davýdov, foi proposta a modelação da relação identificada, que consiste na segunda ação de estudo.

Vale destacar que os estudos sobre os pressupostos teóricos e as discussões realizadas pelos integrantes do Grupo de Pesquisa de Educação Matemática: Uma Abordagem Histórico-Cultural contribuíram para o processo de elaboração das tarefas particulares com a hipótese de gerar, nos estudantes de nível superior, a necessidade do desenvolvimento da atividade de estudo a fim de promover a apropriação do conceito teórico de média aritmética. De acordo com Davídov (1988, p. 178), a necessidade da atividade de estudo instiga os estudantes à apropriação dos conhecimentos teóricos, assim como os motivos concretos da atividade levam-nos à apropriação dos “[...] procedimentos de reprodução dos conhecimentos por meio de ações de estudo, dirigidas a resolver as tarefas de estudo”.

A partir desse pressuposto, adota-se como uma operação básica na resolução das tarefas particulares o uso da lousa digital, aliada ao software ActivInspire. A escolha pela lousa digital deu-se por esse ser o recurso adquirido mais recentemente para uso em salas de aulas na universidade onde o estudo foi realizado. Outro motivo que contribuiu para a escolha foram os recursos que o software disponibiliza ao professor, principalmente o de propiciar a observação do procedimento na execução da tarefa, que pode ser coletiva e/ou individual.

A proposta foi organizada mediante exploração dos recursos da lousa digital, sendo selecionados aqueles que apresentaram as melhores condições de representar o movimento de pensamento.

A partir da elaboração da sequência de ensino, fez-se a análise das tarefas para identificar a consonância com os pressupostos da Teoria da Atividade e os elementos que compõem a relação universal do conceito a partir das ações estabelecidas para o estudo.

Para Davídov (1988, p. 125), é pelo desenvolvimento do pensamento teórico que os estudantes se desenvolvem:

O conteúdo do pensamento teórico é a existência mediatizada, refletida, essencial. O pensamento teórico é o processo de idealização de um dos aspectos da atividade objetivo-prática, a reprodução, nela, das formas universais das coisas. Tal reprodução tem lugar na atividade laboral das pessoas como peculiar experimento objetivo-sensorial.

Logo, este experimento adquire, cada vez mais, um caráter cognoscitivo, permitindo às pessoas passarem, com o tempo, a realizar os procedimentos mentalmente.

No desenvolvimento da proposição para o ensino de média, constatou-se que tanto o conceito de divisão quanto o de multiplicação são indispensáveis para a sua apropriação, isso porque ambos possibilitam expressar os resultados da comparação de várias medidas a fim de se estabelecer a relação de igualdade entre elas. Essa igualdade se apresenta como aspecto essencial para a introdução do sistema conceitual de Medida de Tendência Central (média aritmética e mediana), uma vez que, diante de uma variedade de dados (medidas), busca-se encontrar um valor que possa representar todos os demais. Vale ressaltar que, inicialmente, a relação entre todo e parte se dará através da escolha de uma variável quantitativa contínua (volume) que torna possível dividir o todo em partes iguais. No entanto, salienta-se a necessidade de outros estudos desenvolverem novas tarefas que deem conta de abordar aspectos particulares, como a mudança da natureza das variáveis que impedem o agrupamento e a divisão equitativa de dados devido à sua característica, como por exemplo, altura, idade ou a quantidade de equipamentos eletrônicos em um lugar.

As tarefas particulares abordadas tratam de introduzir o conceito de média, conforme os princípios da Teoria Histórico-Cultural. Elas, por sua vez, se diferenciam do ensino tradicional por não iniciarem o estudo desse conceito pelas definições, mas revelá-los durante o desenvolvimento das tarefas. Procura-se, portanto, superar o ensino que é oferecido tradicionalmente na sala de aula, baseado na apresentação de dados isolados e/ou no estabelecimento da média e da mediana deslocado de suas relações essenciais.

Fundamentalmente, o pressuposto é que a sequência de tarefas proporcione a apropriação do conceito teórico de média. Vale antecipar que elas estão organizadas de modo que possibilitem aos estudantes o entendimento de que a média é uma medida que expressa uma igualdade ou uma aproximação entre os dados. Propõe-se uma impossibilidade na resolução das tarefas para que elas não sejam resolvidas de forma imediata, com a possibilidade de colocar o estudante em ação investigativa.

Davídov (1988) estabelece que a tarefa de estudo para os primeiros anos escolares deve estar vinculada à finalidade de que os estudantes se apropriem do conceito de número como relação entre grandezas. Analogamente, as tarefas estabelecidas para o presente estudo trazem como finalidade a apropriação, por acadêmicos do curso superior, do conceito teórico de média como medida com tendência ao centro. Foi para cumprir com essa finalidade que as tarefas foram estabelecidas.

Proposições para o ensino do conceito estatístico de média no Ensino Superior

As tarefas propostas para o ensino de média foram elaboradas com a possibilidade de terem suas operações desenvolvidas com o uso da lousa digital na prática docente do Ensino Superior. Os recursos utilizados pelo equipamento são disponibilizados pelo software ActivInspire.

O primeiro recurso explorado foi a gravação de tela. A escolha por iniciar pela gravação de tela deu-se por essa ser considerada uma ferramenta importante para realizar o acompanhamento do desenvolvimento das tarefas. A “Gravação de Tela” captura todos os movimentos realizados, desde a escrita, a navegação por telas e o áudio. Esse recurso permite analisar, num momento posterior, os processos desenvolvidos para a resolução da tarefa proposta.

A primeira tarefa elaborada tem a pretensão de gerar a necessidade de os estudantes buscarem dados que os conduzirão à relação essencial do conceito de média. Em termos teóricos, traz a ideia de que os conceitos matemáticos têm como base essencial a relação entre grandezas (Davídov, 1988). A intenção é introduzir a necessidade de comparação entre as grandezas (no caso, volume) com o propósito de desenvolver a ideia de igualdade.

Para essa tarefa, dois recipientes com volumes diferentes (R1 e R2) são apresentados em cima de uma mesa. A sugestão é que o professor desenvolva um experimento com dois grupos de estudantes, sendo que os recipientes de ambos os grupos devem apresentar a mesma quantidade de água. Contudo, propositalmente, os volumes dispostos nos recipientes não devem corresponder ao estabelecido para que o processo de investigação tenha início.

Por se tratar de uma proposição para o Ensino Superior, pressupõe-se que não se faz necessária a presença física dos recipientes com água. Por isso recorre-se à lousa digital, por entender que as operações, em determinados momentos, se automatizam, concretizando-se, desde a mais simples até as mais elaboradas, em formas materiais como: instrumentos, calculadoras e computadores (Leontiev, 1978). No presente estudo, a linguagem digital tem a pretensão de expressar movimentos de pensamentos. Desse modo, tem-se o entendimento de que a lousa digital possibilita, de imediato, atender a um dos tipos de representação conceitual orientado por Davídov (1987), a objetal. Diante disso, o professor indica aos estudantes que não poderá iniciar o experimento, e questiona-os sobre o que está impedindo a realização.

Aqui, vale lembrar que, para o desenvolvimento dos experimentos, a condição necessária consiste na igualdade da quantidade de água nos recipientes utilizados. Espera-se que, na primeira análise realizada (de ordem sensorial), seja verificado que a quantidade de água do recipiente R1 é diferente da quantidade de água de R2. Se a lousa digital permite a primeira representação das grandezas, a objetal, também possibilita que os estudantes sejam orientados a respeito de outro tipo de representação, a gráfica (Figura 1 – item 1). Essa ocorre por segmentos de reta, que expressam as seguintes relações de medida: 1) Se as grandezas, no caso o volume, forem iguais, os dois segmentos representativos terão o mesmo comprimento; 2) Como os volumes são diferentes, suas representações se dão por segmentos de comprimentos desiguais.

Para essa representação, propõe-se que o professor indique que um estudante vá até a lousa digital e realize as representações dos segmentos. Enquanto o estudante está na lousa, os demais podem fazer o mesmo registro em seus cadernos – ou, ainda, em seus próprios computadores, pois há a possibilidade de instalação do software em suas máquinas. O estabelecimento da ida do estudante até a lousa é feito de forma intencional para que a interação entre eles ocorra com o intuito de que a tarefa seja resolvida em conjunto.

A análise permite que os estudantes verifiquem também que o volume do recipiente R1 é menor que o do recipiente R2, ou que o que o espaço ocupado no recipiente de R2 é maior que o de R1. Essa constatação é representada na reta numérica, novamente, por segmentos, e destacados por arcos em que a letra c representa a quantidade de volume do recipiente R1 e a letra d, a quantidade do recipiente R2 (Figura 1 – item 2).

De acordo com Madeira (2012), no modo davydoviano de organização do ensino de Matemática, essa representação indica que a reta se constitui como elemento mediador no processo de apropriação dos conceitos.

A partir dessa relação entre as duas quantidades de volume expressas nos segmentos de reta, constata-se que o volume c < d, ou d > c. Essas representações das grandezas por meio de letras “[...] permitem o estudo das propriedades entre relações de igualdade e desigualdade das grandezas” (Rosa, 2012, p. 128). Em outras palavras, derivam do estudo das relações de maior, menor, igual e diferente.

Diante da situação em análise, o professor lançará o questionamento: como proceder para iniciar o experimento? Considera-se, por exemplo, que cada grupo apresente uma solução diferente para a situação. Ambos os grupos devem expor suas soluções na lousa digital, que permite a gravação de todas as ações desenvolvidas no decorrer da aula e/ou das posteriores. Assim, quando necessário, será possível acessar o raciocínio desenvolvido.

Exemplo de resolução que o Grupo 1 poderia adotar: retirar do recipiente R2 um volume x que corresponda à diferença entre o volume d contido no recipiente R2 e volume c contido em R1.

Nesse momento, atribui-se ao professor o papel de discutir com os estudantes a representação, nos segmentos, dos movimentos de retirada de água do recipiente R2 para igualar ao volume de R1. Para tanto, se faz necessário que o segmento maior sofra a retirada de um pedaço para igualar-se ao segmento representativo do volume de R1 (Figura 1 – item 3).

A representação, conforme Rosa (2012), se constitui em uma ação essencial do processo de desenvolvimento do pensamento conceitual teórico. Trata-se de abstrações que desvinculam o pensamento de características externas do objeto; isto é, de dados empíricos que se apresentam de imediato aos órgãos dos sentidos.

A igualdade de volume pode ser expressa também na reta numérica. Ela possibilita o encaminhamento para uma nova representação, uma abstração – a literal – que, segundo Alves (2017), revela a relação essencial do conceito de adição e subtração, que é a relação todo – parte. Expressa-se o movimento do pensamento pela representação da igualdade por meio dos arcos e segmentos contidos na opção “formas” da lousa digital. Segundo Rosa (2012), os arcos serão subsídios para uma nova representação das relações entre grandezas, a representação literal, que proporciona a abstração dessas relações.

O procedimento consiste em retirar do segmento d a quantidade x expressa pelo arco, resultando em c (Figura 1 – item 4). O segmento c corresponde ao volume do primeiro recipiente; d representa a medida do volume do segundo recipiente e x, a quantidade de água a ser retirada para tornar o volume de R2 igual ao de R1. Genericamente, o referido procedimento é representado na forma literal por: d – x = c. Davýdov (1982) considera esse tipo de representação e suas interconexões a consolidação das propriedades fundamentais das grandezas.

Um procedimento oposto em relação ao anterior pode ser apresentado pelo segundo grupo: ao invés de retirar o líquido, acrescenta-se.

Exemplo de resolução que o Grupo 2 poderia apresentar: acrescentar ao recipiente R1 um volume x de água para igualar ao volume do recipiente de R2 (Figura 1 – item 5). A adoção de procedimento distinto do Grupo 1 não é um impeditivo para que sejam realizadas as mesmas representações objetais e por segmentos. No entanto, exige uma operação que requer o aumento dos segmentos.

Novamente, propõe-se que o movimento de pensamento para a representação da igualdade seja feito na lousa digital, expresso com o uso dos arcos e segmentos disponíveis na opção “formas”. O arco d indica o volume maior, o arco c representa o volume de R1 e o arco x, a quantidade de água a ser adicionada para a obtenção da igualdade entre os volumes dos dois recipientes (Figura 1 – item 6).

Esse procedimento realizado pelo Grupo 2 para igualar os volumes de R1 e R2 é representado genericamente na forma literal por: c + x = d. Trata-se, segundo Alves (2017), da relação aditiva, pois adiciona-se uma parte à outra para formar o todo.

Fonte: Elaborado pelos autores conforme Alves (2013) e Rosa (2012).

Figura 1 Representação dos processos realizados no software Activinspire da lousa digital na primeira tarefa. 

A finalidade do desenvolvimento dessa tarefa consiste em partir da desigualdade de volumes e alcançar a igualdade. Diante de duas possíveis formas de resolução da tarefa, pode-se verificar que tanto o acréscimo quanto a retirada de líquido ocasionam a alteração do volume contido inicialmente nos dois recipientes.

Essas duas possibilidades de resolução da tarefa trazem a ideia de procedimentos para que ocorra a “igualdade” entre a grandeza volume de dois recipientes – peculiaridade dos conceitos de adição e subtração (Alves, 2017). Mas por que uma tarefa com esse teor, de medidas de tendências centrais, deve ser desenvolvida com estudantes do Ensino Superior?

A explicação se pauta no modo como, provavelmente, o sistema conceitual adição/subtração foi apropriado pelos estudantes, não correspondendo ao que se propôs nas tarefas. Ou seja, diferem em sua essencialidade da relação todo/partes (Alves, 2017). O mesmo pode ser dito no que diz respeito ao sistema multiplicação/divisão. Em outras palavras, os dois sistemas conceituais – base para o conceito de média –, como apresentados anteriormente, trazem novas significações para os estudantes, mesmo em fase mais adiantada do sistema educacional brasileiro. A tarefa tinha por finalidade iniciar a busca por dados que conduzirão à revelação da relação essencial do conceito de média.

A segunda tarefa apresentada neste artigo trata-se de uma situação similar. Contudo, a necessidade de igualar a quantidade de volumes recebe o impedimento de alteração do volume inicial nos respectivos recipientes, o que entende-se ser um elemento pertinente de reflexão para colocar os alunos em ação investigativa.

Fonte: Elaborado pelos autores conforme Crestani (2016).

Figura 2 Representação dos processos realizados no software Activinspire para da lousa digital na segunda tarefa. 

Para a realização do próximo experimento, o professor simula que solicitou ao responsável do laboratório que colocasse uma certa quantidade de água em n recipientes, pois não sabia exatamente a quantidade de estudantes que viriam para fazer o experimento. Ele verifica que a quantidade de água em cada recipiente é diferente e distribuída propositalmente pelo professor aproveitando as funcionalidades que a lousa oferece.

A desigualdade apresentada pelos volumes nos recipientes (Figura 2 – item 1) gera um impasse na execução do experimento, uma vez que almeja-se que todos os estudantes cheguem a um mesmo resultado. Após enfatizar a desigualdade dos volumes, propõe-se que o professor levante o seguinte questionamento: diante desse impasse, como dar continuidade ao experimento?

Para que todos os estudantes possam chegar a um mesmo resultado, todos os recipientes deverão possuir a mesma quantidade de água. Sendo assim, para dar continuidade ao experimento, eles deverão adotar um procedimento que satisfaça esta condição: estabelecer a igualdade entre os volumes. Nesse momento, cabe ao professor orientá-los para que não seja alterado o total de líquido distribuído nos recipientes.

Pode ocorrer de os estudantes indicarem, para a resolução do impasse, a transferência de água de um recipiente para outro até que todos tenham a mesma quantidade. No entanto, o professor, por meio de discussões, deverá levantar a observação de que o procedimento se tornaria demorado devido à grande quantidade de recipientes utilizados. Além disso, durante a transferência de líquido, existe a possibilidade de ocorrer desperdício, o que implicaria na alteração do volume inicial de água. Vale lembrar que, conforme estabelecido pelo professor, o volume total não tolera modificações.

Outro aspecto a ser discutido é o modo de disposição dos recipientes. Diferentemente da escola tradicional, os objetos não estarão apresentados de forma direta; alguns recipientes foram suprimidos (Figura 2 – item 1). De acordo com Crestani (2016), essa condição leva à necessidade de reflexão sobre como atingir a representação total, colocando os estudantes em ação investigativa.

A ação de análise dos dados da tarefa que se estabelece inicialmente constitui-se como essencial para a identificação da relação universal do conceito. Para Davídov (1988), essa ação trata de uma transformação dos dados da tarefa orientada para atingir sua finalidade.

Com a intensão de agilizar o processo de deixar os recipientes com volumes iguais, o professor sugere transferir o líquido de todos os recipientes para um recipiente maior, representando o volume encontrado por meio de segmentos (Figura 2 – item 2). Nessa perspectiva, o professor apresenta a lousa digital como um instrumento substitutivo do experimento objetal propriamente dito, pois o nível escolar dos estudantes permite a execução de operações de reprodução do movimento do pensamento mais elaboradas.

Entende-se que um instrumento apresentado como meio operatório para atingir uma ação – nesse caso, de representação do pensamento – distancia-se de uma visão determinista, pois não prioriza o uso da tecnologia como fim, como centro do processo de aprendizagem. Segundo Peixoto e Carvalho (2011), a utilização de instrumentos tecnológicos por professores e estudantes deve acontecer com o intuito de favorecer a apropriação do conhecimento e desenvolvimento de suas funções mentais.

O professor tem a opção de dirigir-se até a lousa digital ou, preferencialmente, solicitar a um estudante que o faça, para, assim, realizar a operação de representação da transferência de líquido para um recipiente maior. Essa operação pode ser concretizada, novamente, através das “formas” disponíveis no software, ou, ainda, desenhada manualmente selecionando a opção “caneta” na barra de ferramentas.

A transferência dos líquidos para o recipiente B possibilita a identificação do total de líquido (m) a ser utilizado no experimento. Sugere-se ao estudante que estiver na lousa que represente a referida transferência de líquidos na reta numérica (Figura 2 – item 3). A sugestão é proposital e objetiva que os demais estudantes o auxiliem nessa síntese.

O total de volume é representado por m; cada arco menor hi indica o volume de cada recipiente e n, a quantidade de recipientes. A letra i, presente em hi, é utilizada para indicar quais volumes serão adicionados.

Considerando que o total de volume (m) consiste na soma dos volumes dos recipientes, esse total pode ser representado por Σ hi. A letra grega maiúscula sigma significa “somatório”, e hi representa os volumes a serem somados. Em Matemática, somatório consiste em somar as partes – em outras palavras, indica a totalidade (Houaiss, 2001). O somatório proposto é representado por Σ hi = h1 + h2 + h3 + ... + hN-2 + hN-1 + hN.

Após a identificação do volume total, o professor questiona os estudantes sobre o volume a ser colocado em cada recipiente para que seja possível iniciar o experimento.

Esse questionamento direciona os alunos para um componente conceitual essencial: que os recipientes apresentem a mesma quantidade de líquido. Há, pois, uma relação de igualdade a ser estabelecida por meio da distribuição do total de volume (m) em partes iguais nos n recipientes. Diante da necessidade de transferir todo o líquido de B para os n recipientes, o professor introduz um novo recipiente, que será a base material que trará o conceito de medida intermediária no âmbito do conceito de média (Figura 2 – item 4).

A partir da introdução do recipiente A é estabelecida a relação entre ele e o volume total em B. O recipiente A é tomado como uma unidade de medida, o que permite determinar quantas vezes cabe na grandeza – em outras palavras, indica que em B a unidade A cabe m vezes (Figura 2 – item 5). De acordo com Davídov (1988), a introdução de uma unidade de medida é necessária para que sejam estabelecidas relações entre as grandezas em cumprimento à primeira ação de estudo: transformação dos dados da tarefa.

Contudo, surge outra necessidade conceitual: saber o quanto de líquido será colocado em A para esvaziar B de modo a garantir que cada um dos n recipientes a ser usado pelos estudantes tenha a mesma quantidade de líquido.

Sabendo que cada um dos n recipientes terá a mesma quantidade de líquido, o professor faz a representação, na reta numérica, do total de volume de água (Σ hi), da quantidade n de recipientes e de que cada um dos n recipiente terá a mesma quantidade de líquido. Essa representação auxilia os estudantes na identificação do conceito, que se constituirá quando a quantidade de líquido a ser colocada em A para esvaziar B for revelada (Figura 2 – item 6).

Para que os arcos fiquem todos iguais, desenha-se apenas um arco a partir da opção “formas”, seleciona-se o objeto e duplica-se n vezes a partir do “menu de edição de objetos”. Esse movimento pode ser reproduzido em outros instrumentos não abordados nesta pesquisa. No entanto, essa representação realizada na lousa se apresenta de caráter imediato por reunir as funcionalidades de outros recursos tecnológicos num único espaço.

O conceito a ser usado remete ao de divisão, pois tem-se a representação do total de líquido, a quantidade de agrupamentos (n recipientes) e falta identificar o tamanho de cada agrupamento (quantidade de líquido a ser colocado em cada recipiente).

Sendo assim, realiza-se a divisão do total de volume de água (Σ hi), pela quantidade n de recipientes, que resulta no volume de água que será colocado no recipiente A (unidade básica), representando por a, para depois transferir essa quantidade de volume para cada um dos recipientes a serem usados pelos estudantes. Novamente, o professor retoma a representação na reta numérica para indicar o resultado da divisão realizada (Figura 3 – item 7).

Fonte: Elaborado pelos autores conforme Crestani (2016)

Figura 3 Modelação da relação universal do conceito de média. 

Para Davídov e Slobódchikov (1991), a tarefa precisa manifestar uma necessidade nos estudantes para que os mova a entrar em atividade de estudo. Nesse sentido, na transferência do líquido de B a cada um dos n recipientes com o recipiente A, cabe ao professor discutir com os estudantes o quão lento pode ser o processo, pois o recipiente A é pequeno. Para agilizar o processo de transferência, o professor introduz o recipiente C, que é maior que A (Figura 3 – item 8).

Como os estudantes sabem que em cada um dos n recipientes será colocado a vezes o recipiente A cheio de líquido, eles colocam as a vezes em C e realizam uma marca para identificar o quanto de líquido será colocado em cada um dos n recipientes. Essa marca é representada na seguinte anotação feita na lousa (Figura 3 – item 9). Cabe dizer que em C o líquido será colocado n vezes até atingir a marca para esvaziar completamente o recipiente B (Figura 3 – item 10).

Pelo recipiente C ser o intermédio durante o processo de transferência de líquido do recipiente B para os n recipientes, isso permite afirmar que C foi a unidade intermediária. Propõe-se, para este momento, uma síntese que indique a revelação dos dados pertinentes à primeira ação de estudo de Davídov. Tem-se: a unidade de medida básica (volume menor); mudança da unidade de medida para uma intermediária; total de medidas (volume maior) e a quantidade de vezes que uma cabe na outra. Esses dados se apresentam diante da necessidade de transferência de líquido em partes iguais. Conforme Crestani (2016), nessa ação, a relação objetal constituída entre as unidades de medida possibilita que a tarefa seja resolvida no plano teórico.

A partir da revelação dos dados da tarefa, encaminha-se para a segunda ação de estudo, que consiste na modelação da relação universal do conceito de média. Isso se deve pelas abstrações realizadas por meio da reta numérica, do esquema de setas e letras. De acordo com Davídov (1988, p. 182), o modelo constitui “[...] uma ligação interna imprescindível no processo de assimilação dos conhecimentos teóricos e dos procedimentos gerais de ação”.

Os dados apresentados na tarefa – unidade básica, intermediária e total de unidades – compõem a relação universal do conceito de divisão (Crestani, 2016). Esse, por sua vez, mostra-se essencial para o conceito de média, pois a partir dele se obtém a igualdade. Diante disso, é proposto valer-se do mesmo esquema e das representações na reta para que se estabeleça a relação universal de média. Assim, o professor encaminha os estudantes para que representem todo o processo no esquema e no modelo literal (Figura 3 – item 11). Por meio dessa divisão, tem-se o valor do agrupamento (a), que resulta em recipientes com o mesmo volume (Figura 3 – item 12).

Na operação de divisão, ao dividir o total de água pelo número de agrupamentos formados (n) obtém-se o valor a, que corresponde ao valor da unidade intermediária. Em estatística, ao realizar a divisão do total de volume (soma dos líquidos) pelo número de agrupamentos, que resulta em a, tem-se o conceito de média. O pensamento desenvolvido a partir desse movimento – representação objetal, gráfica e literal – é entendido por Davýdov (1982) como pensamento teórico.

No entanto, as literaturas que tratam sobre o tema abordam o conceito de média por meio da divisão da soma dos valores dos elementos pelo número de elementos encontrados. Segundo Tiboni (2010, p. 129), a média (x) é uma medida de posição central que corresponde a uma posição de equilíbrio entre os dados coletados, e seu cálculo é feito “por meio da divisão entre a soma dos valores da série pelo número total de valores”.

χ¯=χ1+χ2+χ3++χnn=Σi=1nχinχ¯=Σi=1nχin Figura 4 – Representação de média. Fonte: Elaborado pelos autores e adaptado de Tiboni (2010)

Na representação feita por Tiboni (2010, p. 129), x corresponde ao valor da média e os termos x1, x2, x3, ..., xn correspondem aos dados que foram coletados. O ? xi indica que foram somados os dados coletados até a ordem n, de modo que n corresponde à quantidade de dados coletados.

Diferentemente das literaturas tradicionais, a apropriação do conceito de média derivaria da relação entre grandezas quando os dados coletados fossem somados e divididos pelo número de agrupamentos, resultando no valor da unidade intermediária. Essa é a relação universal do conceito de média. Essa conjuntura de investigação do princípio interno do objeto, refletindo a essência do conceito, é o que possibilita aos estudantes desenvolverem o tipo de pensamento teórico (Libâneo, 2004), que é entendido por Leontiev (1978) como propulsor do desenvolvimento humano.

Essa tarefa proporcionou a revelação do conceito de média num processo em que a partir de valores diferentes (desiguais) foi obtido um valor que representa uma igualdade. Sobre essa igualdade, vale destacar que ela corresponde ao que Tiboni (2010) entende por média; isto é, uma posição de equilíbrio entre os dados coletados. Novamente, se faz necessário destacar que a grandeza utilizada modifica o modo de agregar os dados coletados; contudo, mantém-se a relação estabelecida: de igualdade. Para Marnichi (2008) apudCarvalho (2011, p. 33) o conceito de média é definido mediante a duas ideias que são essenciais para articular os domínios matemáticos e estatísticos. Uma delas consiste na divisão equitativa, entendida como um modelo que “[...] é caracterizado por um objeto ou uma coleção de objetos que são divididos e distribuídos em partes iguais, ou em número igual de subcoleções”. A outra é entendida como centro de equilíbrio e “[...] pode ser utilizado como modelo que melhor representa distribuição do conjunto de dados”.

Sendo assim, como já explicitamos nessa investigação, se faz necessário destacar que a grandeza utilizada modifica o modo de agregar os dados coletados, contudo, mantém-se a relação estabelecida, a relação de igualdade. Ao buscar a igualdade de volumes que não toleram alteração, a quantidade utilizada como referência será um valor que está localizado exatamente entre os valores coletados ou um valor que se localize próximo do meio. Vale retomar que a média corresponde a uma posição de equilíbrio entre os dados coletados, sendo uma Medida de Tendência Central que não necessariamente se encontra no centro de uma distribuição (Tiboni, 2010). Isso se caracteriza pela média ser o resultado de uma relação estabelecida entre todos os dados do conjunto. Assim, quanto mais discrepâncias houver entre os dados, mais distantes do centro do conjunto estará localizada a média.

Resultados e Discussão

A partir da relação entre os volumes, por meio dos elementos revelados na primeira ação, propôs-se a modelação da relação essencial dos conceitos nas formas objetal, gráfica e literal, pertinentes à segunda ação de estudo. A revelação da relação essencial do conceito de média foi possível pela vinculação à medição de grandezas.

Ao analisar as tarefas, constata-se que o conceito de média apresenta como finalidade a busca por um valor que tende ao centro de um conjunto de dados por meio da determinação da igualdade, levando em consideração todos os dados do conjunto.

A lousa digital se apresenta, durante o desenvolvimento de operações para resolução das tarefas, com a finalidade de colocar os estudantes diante das possibilidades de representação e interação de uma recente elaboração humana para o campo educacional.

Essa tecnologia apresentou a possibilidade de representar os dados objetais e gráficos de forma mais elaborada quando comparada com a lousa tradicional. As opções disponíveis no software permitem a execução das operações de representação do pensamento desenvolvido de forma diferente da tradicional: há formas geométricas para ilustrar as representações objetais, gráficas e até mesmo as literais. Esse feito permite buscar formas alternativas de representação do movimento de pensamento, como: duplicar um objeto anteriormente elaborado e alterar as representações ou reposicionar objetos sem descartar o que já foi produzido. Contudo, vale destacar que, por vezes, a impossibilidade de movimentação torna-se essencial para que a tarefa se constitua. Assim, cabe ao professor, na organização do ensino, verificar a viabilidade do uso desse movimento ou, em outras palavras, analisar se o movimento do objeto irá contribuir para o desenvolvimento do pensamento teórico ou não.

Considerações Finais

Este artigo apresentou um recorte de um conjunto de tarefas elaboradas a partir dos pressupostos da Teoria da Atividade como uma possibilidade para a organização do ensino do conceito de média aritmética para o Ensino Superior, tendo como operação o uso da lousa digital. As tarefas tinham ênfase na análise indicadora da relação essencial do conceito de média e sua modelação.

O ensino organizado na perspectiva da Teoria da Atividade pressupõe que o ambiente acadêmico tem a função de criar condições para que a aprendizagem de conceitos científicos aconteça. A partir dessa concepção, o professor tem como objetivo organizar o ensino de modo a proporcionar o alcance desse desenvolvimento, da apropriação conceitos teóricos e da cultura produzida historicamente.

Na perspectiva dessa teoria, a apropriação dos conceitos teóricos é feita por meio de símbolos culturais e científicos que promovem relação entre sujeito e objeto. Essa configuração implica numa organização de ensino por meio de tarefas que o professor propõe aos estudantes, caracterizadas por problemas significativos, de modo que surgem de uma necessidade do sujeito. Para a resolução do problema torna-se necessário buscar ações e operações que o levem a determinado fim. No desencadear das tarefas, o professor proporá situações cuja resolução não seja possível por procedimentos que deem conta de alcançar a sua finalidade. Desse modo, emergirá a necessidade de buscar um conhecimento novo e possível para solucionar o problema. É durante esse processo que o sujeito se desenvolve e se constitui ser humano.

Nesse âmbito teórico é que foi proposta uma organização de ensino para o estudo do conceito matemático de média. Para tanto, sugerem-se tarefas caracterizadas por situações que envolvam as grandezas (discretas e contínuas) entendidas como relação essencial da Matemática no sistema davydoviano. Decorrente dessa concepção, o intuito foi identificar a relação essencial, bem como a modelação da média.

Esse conceito revelou, durante o estudo, que tem por essência a igualdade entre grandezas. Para tanto, as tarefas têm início com situações que envolvem desigualdade, mas que propõem a igualdade como solução para o problema. A revelação da igualdade possibilita identificar a localização do padrão ou da normalidade, que é essencial para o entendimento do que seria uma medida que tende a situar-se em um centro, pois o valor encontrado propende a estar posicionado no meio do conjunto de dados se esse possuir uma certa homogeneidade.

No processo de análise verificou-se que grande parte dos registros realizados a partir da lousa digital suscitaram o uso da opção “formas”, que permite o desenho de linhas, setas, quadrados e outras formas geométricas, tornando-os precisos e claros. Além disso, o instrumento admite, se necessário, que as representações realizadas sejam modificadas, editadas ou movimentadas, o que diferencia a lousa digital do quadro estático.

Além disso, constatou-se que as resoluções das tarefas que forem realizadas e salvas na lousa poderão ser confrontadas, a qualquer momento, com as dos demais estudantes, visto que há a possibilidade de voltar as telas e rever as representações anteriores. Entende-se que isso pode colaborar no desenvolvimento das tarefas porque o foco estará na resolução delas ao invés de na necessidade de copiar os registros, já que esses podem ser disponibilizados em outro momento.

No entanto, as operações para registrar o movimento de pensamento poderiam ter acontecido como no quadro tradicional, com a utilização da opção “caneta”. Essa retomaria as mesmas funções da escrita com giz ou o pincel para quadro branco. Outras operações poderiam, ainda, ser facilmente realizadas com outros instrumentos que não foram tratados no estudo. Contudo, observou-se que na lousa digital as representações ocorrem de forma imediata, pois equipamento engloba a funcionalidade de diversos recursos, propiciando ao estudante o uso de um produto atual elaborado pelo homem para o ambiente educacional.

A relação entre a lousa digital e a finalidade do conjunto de tarefas proposto – apropriação do conceito de média – não se apresentou de forma essencial/indispensável. Contudo, revelou-se como uma operação de contribuição no desenvolvimento das tarefas com o intuito de identificar a relação essencial e a modelação do conceito. Além disso, expôs também, ainda que não de forma comprovada, indícios de contribuição para o processo avaliativo, tanto de aprendizagem quanto metodológico, pela possibilidade de retornar ao desenvolvimento das tarefas e rever possíveis falhas ou novas configurações.

4A forma usual neste trabalho será Davýdov, exceto as citações x referências, as quais serão escritas conforme a grafia do texto original.

Como citar este artículo/How to cite this article

Sebastião, D. et al. Proposição para superação do ensino empírico do conceito estatístico de média no Ensino Superior. Revista de Educação PUC-Campinas, v. 28, e238266, 2023. https://doi.org/10.24220/2318-0870v28e2023a8266

Apoio/Support: Programa de Bolsas Universitárias de Santa Catarina e Fundo de Apoio à Manutenção e ao Desenvolvimento da Educação Superior (Processo nº 019/SED/2015).

Artigo elaborado a partir da dissertação de D. SEBASTIÃO, intitulada “Teoria da Atividade e lousa digital no ensino superior: perspectivas para aprendizagem dos conceitos matemáticos”. Universidade do Extremo Sul Catarinense, 2017.

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Recebido: 05 de Abril de 2023; Revisado: 24 de Junho de 2023; Aceito: 06 de Julho de 2023

Editora responsável: Celi Espasandin Lopes.

Conflitos de interesse: não há.

Correspodência para/Correspondence to: G. F. GIACOMAZZO. E-mail: gfg@unesc.net.

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