1 INTRODUÇÃO

A discussão intersetorial envolvendo a promoção de saúde na e da escola e a formação continuada de professores é relativamente recente e ainda pouco difundida junto aos profissionais da educação. Investimento em pesquisas que possam gerar ideias para a solução de questões práticas do cotidiano dos professores têm sido um dos chamamentos da literatura recente sobre o assunto (^{NUNES, 2019}).

Investigar sobre escolas que promovem saúde é relevante nos tempos atuais. Levantamentos nacionais indicam um aumento considerável nos índices de sedentarismo e obesidade de jovens e adolescentes em idade escolar (^{BRASIL, 2017}). Estudos que investigaram o ensino de estilo de vida saudável pelos professores têm mostrado que estes possuem pouco conhecimento sobre o assunto, sobretudo quando não são professores ligados às áreas de saúde ou biológica, a saber, professores de educação física, de ciências ou biologia (^{IERVOLINO, 2000}). Pela falta de conhecimento, professores de outras áreas sentem-se inseguros e incapazes de ensinar considerando tal temática, apesar de a considerarem importante para o pleno desenvolvimento dos alunos e da promoção de um ambiente saudável na escola (^{SANTOS; BÓGUS, 2007}). Tanto o conhecimento como a convicção de que se consegue tratar de temas atuais na escola são elementos importantes para os professores lidarem com os desafios que se apresentam em sua realidade (^{PAJARES, 1992}). Conhecer sobre como alfabetizar alunos em prol da saúde pessoal e coletiva é também uma tarefa educativa interconectada com a saúde pública, haja vista, por exemplo, o desafio emergencial da pandemia causada pelo vírus Covid-19.

Ao se pensar em propostas pedagógicas que considerem o ensino de temas de saúde na escola, é preciso ter em conta o desenvolvimento profissional dos professores. É necessário ajudar os professores a se tornarem agentes transformadores, empoderados de conhecimento, habilidades e atitudes que amparem suas práticas pedagógicas para a promoção de uma escola saudável (^{MUKAMANA; JOHRI, 2016}; ^{SANTOS; BÓGUS, 2007}).

Cursos de formação continuada são estratégias efetivas para o desenvolvimento de conhecimentos relacionados à promoção da saúde, incluindo alimentação e hábitos que compõem um estilo de vida saudável. Como assinalaram ^{Davanço, Taddei e Gaglianone (2004)}, professores demonstraram melhor preparo conceitual acerca de conteúdos ligados à nutrição e o seu ensino na escola quando comparados a colegas que não participaram de nenhum tipo de formação continuada sobre o assunto. O conhecimento, como aponta ^{Pajares (1992)}, é um dos elementos necessários para a realização de práticas pedagógicas contextualizadas. Provavelmente, um professor não arriscará ensinar algo que não domina ou não acredita que pode ensinar de maneira adequada.

De maneira geral, as propostas de formação continuada de professores, no contexto brasileiro, concentram-se naquelas oferecidas para os professores do primeiro ciclo do Ensino Fundamental I, com ênfase nos conteúdos de português e matemática (^{DAVIS et al., 2011}). Oferecer propostas formativas que contribuam não só para esses conteúdos parece ser necessário para a melhoria do ensino de uma maneira geral. A formação para o desenvolvimento profissional dos professores é de suma importância para a melhora da qualidade do ensino, uma vez que “melhoras notáveis na educação quase nunca acontecem na ausência do desenvolvimento profissional [...] é um ingrediente absolutamente necessário em todos os esforços para melhorar a educação” (^{GUSKEY, 2000}, p. 4).

No que tange à escola promotora de saúde, pesquisas têm mostrado benefícios de oferecer formação, tanto para os professores como para os envolvidos no processo de ensino e aprendizagem (^{DETREGIACHI; BRAGA, 2011}; ^{JUZWIAK; BATISTA; CASTRO, 2013}; ^{SANTOS; BÓGUS, 2007}). Além das formações presenciais, há que se considerar também as ofertas de formação continuada que podem ocorrer a distância ou mediadas pelas tecnologias digitais de informação e comunicação (TDIC) (^{SANTOS, 2014}).

A partir do advento das TDIC, observa-se um aumento na discussão sobre sua implementação ou não em processos de ensino e aprendizagem em diferentes níveis de ensino (^{GATTI et al., 2019}; ^{SOUZA; SOUZA, 2008}; ^{SOUZA et al., 2017}). O ambiente online, desde que apoiado em componentes pedagógicos, oferece uma nova possibilidade de oferta de estratégias e sistemas que podem colaborar com o desenvolvimento profissional dos professores (^{OLIVEIRA; BUENO, 2013}; ^{REALI; TANCREDI; MIZUKAMI, 2008}; ^{SOUZA; SCHNEIDER, 2016}). Dentre os benefícios da utilização de uma formação mediada pelas TDIC estão a capacidade de eliminar as limitações físicas, bem como a de proporcionar conexões entre profissionais que podem promover o desenvolvimento profissional (^{DROGUI, 2019}; ^{EDINGER, 2017}).

^{Reali, Tancredi e Mizukami (2008)}, identificaram que a formação online é uma alternativa tanto para professores iniciantes como experientes e que, quando se considera o contexto e as reivindicações dos professores, é possível a adaptação do processo formativo de modo que seu potencial seja ampliado. Dentre as alternativas estão o aprendizado do conhecimento do conteúdo e pedagógico do conteúdo, e o trabalho colaborativo entre participantes e tutores, que facilita o processo de transposição didática do que se aprende à realidade escolar dos participantes, que são elementos importantes para o desenvolvimento da prática pedagógica do professor.

Considerando os apontamentos de pesquisas e as indicações propostas nos documentos curriculares oficiais, entende-se necessário conhecer as contribuições da formação continuada de professores mediada pelas TDIC em temas ligados à promoção de saúde na escola. Entretanto, reconhecendo a existência de estudos já publicados sobre formação continuada de professores por intermédio ou com auxílio de TDIC e o tema saúde no contexto nacional, foram encontrados apenas estudos de revisão sobre a formação continuada para professores (^{DAVIS et al., 2011}). Dessa maneira, esta revisão teve por objetivo analisar criticamente os estudos levantados em relação aos resultados obtidos em cursos de formação continuada mediada por TDIC e fatores que se associaram à aprendizagem dos professores.

2 MÉTODO

Como método, a pesquisa realizada se caracteriza como estudo de revisão da literatura do tipo estado da arte (^{VOSGERAU; ROMANOWSKI, 2014}), com elementos de sistematização de busca de artigos sobre formação continuada de professores mediada por recursos de TDIC. A opção por essa estratégia analítica se deu por possibilitar a organização do conhecimento produzido de forma a apresentar um novo entendimento sobre o que já foi descoberto e as lacunas que precisam ser preenchidas (^{LÜDKE; ANDRÉ, 2013}; ^{PIMENTEL, 2001}).

Para se obter os documentos analisados foi realizado um processo sistematizado de busca e seleção de artigos. Esse procedimento advém das pesquisas de revisão sistemática, que têm seu emprego forte na área de saúde (^{MANCINI; SAMPAIO, 2006}) e orienta, guia e dá padronização e confiabilidade aos resultados de recuperação de material para o estudo de revisão. Para a realização desse passo da pesquisa, foi realizado um levantamento de artigos publicados na base de dados Scientific Eletronic Library Online (SciELO), que conta com mecanismo de busca em periódicos de diferentes áreas e que tem acesso aberto e gratuito aos artigos, sobre o tema de formação continuada de professores e saúde, mediados por TDIC, entre os anos de 2013 e 2019.

Para tanto, foram realizados dois procedimentos de buscas, um geral e outro mais específico. Para a busca geral, foram utilizados os termos: no título, “formação” e no resumo, os termos “continuada”, “permanente”, "em serviço", "em exercício" e “online”, “tecnologia”, "a distância", “EaD”, “TICS” ou “TDIC”. Nessa busca foram recuperados um total de 39 artigos. Aplicados os filtros de publicação entre os anos de 2013 e 2019 e duplicados, restaram 21 artigos. No procedimento de busca mais específico, foram utilizados os termos, todos devendo aparecer no resumo dos artigos: “formação”, “continuada”, “permanente”, "em serviço", "em exercício", e “saúde”, “saudável”, “alimentação”, "hábitos saudáveis", “hidratação” ou “higiene” e “online”, “tecnologia”, "a distância", “EaD”, “TICS” ou “TDIC”. Essa busca retornou 28 artigos. Aplicando os filtros de publicação entre 2013 e 2019 e resultados duplicados, foram recuperados 18 artigos. Assim, após a triagem por recorte temporal e duplicados, foram recuperados um total de 39 artigos publicados entre os anos 2013 e 2019 e que passariam pelo crivo dos critérios de inclusão e exclusão, como ilustra a Figura 1.

Fonte: os autores.

Figura 1 Fluxograma do processo de recuperação e seleção dos artigos revisados. 

Como critérios de inclusão, além do recorte temporal, os artigos deveriam versar sobre a temática da formação continuada de professores sobre o tema de saúde, usar recursos das diferentes tecnologias digitais de informação e comunicação e ter sido realizado no contexto brasileiro (11 excluídos). Apesar do filtro regional e dos artigos recuperados, apenas um estudo foi realizado na Colômbia e outro na região Pan-Americana, sendo que ambos não se referiam a profissionais da saúde, não contemplando, assim, o contexto deste estudo. Como critério de exclusão, foram considerados fora do escopo da pesquisa artigos duplicados nas buscas, que fossem somente de revisão, que a formação ocorresse sem o uso de TDIC, que não oferecessem um curso de formação, que não fossem voltados a profissionais ligados à Educação Básica, que usassem a tecnologia como forma de gerir a escola ou gerir a própria saúde, ou então que não apresentassem relação com o tema investigado (17 excluídos). Após a aplicação desses critérios, foram incluídos na amostra dos estudos revisados 11 artigos publicados entre 2013 e 2019 que se relacionam com o objetivo da pesquisa e podem ser observados no Quadro 1.

Como processo de análise desses artigos, foram utilizados elementos da análise qualitativa e codificação de dados (^{MILES; HUBERMAN; SALDAÑA, 2014}; ^{SALDAÑA, 2016}). O emprego dessa metodologia respeitou os procedimentos de pré-análise, condensação do material e o tratamento, inferência e interpretação dos dados. A pré-análise foi composta por elementos como a leitura superficial, escolha dos documentos, elaboração de indicadores e preparação do material (processo de busca e seleção, aplicação dos critérios de inclusão e exclusão). A fase de condensação dos dados consistiu em leituras mais profundas e extensivas do material e culminou na identificação das unidades de registro e contexto (códigos) que geram as primeiras compreensões sobre o tema estudado. O tratamento dos dados compreendeu a organização das informações em categorias ou temas para explorações e inferências do investigador e representou o terceiro passo da análise.

Devido à demanda desse tipo de processo analítico, nesta pesquisa, como ferramenta de suporte, foi utilizado o software de análise qualitativa Nvivo em sua versão 11. A escolha por essa ferramenta se deu devido às funcionalidades do software, que permite o manuseio de diferentes tipos de fontes de informação (word, excel, PDF, vídeos, áudios, entre outros), pesquisas de palavras e grupos de palavras, contextos, entre outros, como forma de organizar e sistematizar o processo de análise.

3 RESULTADOS

Como resultado, foram encontrados 11 artigos publicados entre 2013 e 2019 que respeitaram os critérios de seleção, inclusão e exclusão. Como pode ser observado no Quadro 1, em termos descritivos, verificou-se que a maioria foi publicada entre 2013 e 2014 (quatro em cada) e realizada na região sudeste, seguida por sul e centro-oeste, e norte e nordeste. A maioria dos estudos foi de natureza qualitativa (9), um de natureza mista e outro de revisão, e não foi encontrado nenhum estudo de natureza puramente quantitativa.

Os resultados encontrados nos estudos que tiveram como objetivo analisar o processo formativo em cursos de formação continuada mediados pelas TDIC apresentam, de maneira geral, variáveis diversificadas. A partir da organização dos resultados e por meio do procedimento de codificação realizado com auxílio do software Nvivo 11, foi possível organizar os resultados dos estudos em três categorias: pessoal, comportamento e ambiente, como mostra a Figura 2.

Fonte: os autores.

Figura 2 Resultados de aprendizagem na formação continuada em serviço com intermédio das TDIC. 

A categoria pessoal diz respeito ao que foi aprendido no curso de formação continuada e se relaciona aos conhecimentos do conteúdo e das ferramentas das TDIC. Já a categoria comportamento diz respeito aos modos de se envolver no curso e que influenciaram o processo de ensino e aprendizagem na formação continuada. Esses comportamentos tiveram relação principalmente com o engajamento e interação entre participantes e entre tutores. Por fim, a categoria ambiente se relaciona com a estrutura dos cursos propostos e envolvem as variáveis que constituíam o ambiente da formação continuada e seus elementos, como a existência do tutor, da mediação das TDIC, da relação do curso com a prática e dos processos avaliativos.

4 DISCUSSÃO

Quando se considera a função dos cursos de formação continuada, é possível afirmar que, de maneira geral, os que foram apresentados pelos estudos aqui analisados conseguiram atingir o objetivo principal, que era desenvolver conhecimentos (ligados aos fatores pessoais) sobre questões relacionadas às temáticas tratadas nos cursos de formação continuada em serviço (^{DROGUI, 2019}; ^{JUZWIAK; BATISTA; CASTRO, 2013}; ^{OLIVEIRA et al., 2013}).

No que tange ao conteúdo específico dos cursos, foram observados resultados positivos em relação à aprendizagem. Os professores participantes puderam assimilar os conhecimentos e conteúdos propostos nos cursos (^{DROGUI, 2019}), a saber, conhecimentos sobre o funcionamento da alimentação escolar e estratégias para elaborar propostas alimentares (^{JUZWIAK; BATISTA; CASTRO, 2013}), passaram a refletir sobre as próprias práticas pedagógicas e teorias que as fundamentam (^{ALMEIDA; SILVA, 2014}), bem como entenderam seu papel no processo de aprendizagem continuada, sendo que precisam aprender para ensinar (^{MIRANDA, 2014}).

No entanto, há ainda alguns aspectos que merecem maior atenção, como idade, experiência e nível de formação docente, que podem ser obstáculos na eficácia da aprendizagem nesses cursos. Professores jovens ou com pouca experiência, ou mesmo aqueles que possuem pouca experiência com EaD podem aproveitar menos os conteúdos do curso em relação à prática pedagógica (^{GARCIA; BIZZO, 2013}).

Apesar de ter ocorrido o desenvolvimento de capacidades dos participantes para agirem dentro do ambiente virtual de aprendizagem (AVA) (^{DROGUI, 2019}), a fluência digital continua sendo um pré-requisito para cursos de formação continuada mediados pelas TDIC (^{SANTOS, 2014}). A falta dessa fluência dificulta a inclusão dos professores em serviço nos processos formativos. Foi constatado que “esta nova modalidade de educação a distância, por ser estruturalmente alicerçada em novas tecnologias, demanda habilidades e competências diferenciadas de seus usuários” (^{SANTOS, 2014}, p. 278). Ou seja, de certo modo, para que cursos de formação continuada mediados pelas TDIC tenham sua eficácia favorecida, é necessário que os participantes desses cursos dominem minimamente essas tecnologias, ou se sintam suficientemente confiantes de que de conseguem realizar as atividades formativas, mesmo com o desafio do manuseio e interação dos diferentes recursos tecnológicos que venham a ser utilizados. Essas informações precisam estar sempre em mente na proposição de cursos e seleção de quais ferramentas tecnológicas podem ser mais apropriadas para o público-alvo (^{EDINGER, 2017}; ^{REALI; TANCREDI; MIZUKAMI, 2008}; ^{SOUZA; SCHNEIDER, 2016}).

A análise dos estudos revistados também evidenciou que a participação contribuiu para que os professores se tornassem mais reflexivos acerca do uso das TDIC, bem como sobre a razão de escolher um determinado recurso tecnológico e seu vínculo com o conteúdo a ser ensinado (^{ALMEIDA; SILVA, 2014}).

Assim, mesmo com as diferentes críticas e dificuldades aferidas aos processos formativos mediados pelas TDIC, observa-se que é possível alcançar resultados de aprendizagem junto aos seus participantes. Claro, isso se deve a um conjunto de fatores que, quando engendrados de maneira a propor uma formação continuada de qualidade, podem favorecer a eficácia desses cursos e mesmo superar dificuldades que porventura se apresentem.

Parece ser evidente que a aprendizagem em cursos de formação continuada, sejam presenciais ou a distância, depende também da participação e envolvimento dos professores nas atividades propostas. Para que a aprendizagem ocorra, é necessário que haja engajamento, motivação e participação ativa nos processos de ensino e aprendizagem (^{REALI; TANCREDI; MIZUKAMI, 2008}; ^{SOUZA; SOUZA, 2008}). De maneira geral, os cursos que apresentaram resultados positivos também puderam acompanhar um engajamento dos seus participantes, destacando-se tanto a participação no curso como a interação entre participantes (professores-tutores-participantes).

Do ponto de vista da participação, talvez surja a maior preocupação. Como apontaram ^{Oliveira et al. (2013)}, a participação nesses cursos é fundamental para os profissionais que estão afastados dos grandes centros. Tal afirmativa corrobora a potencialidade da democratização ao acesso e à aprendizagem via cursos a distância mediados pelas TDIC. Por outro lado, há dois aspectos que requerem maior atenção dos proponentes dos cursos: a sobrecarga ao trabalho devido a necessidade de formação em momentos fora do horário de trabalho e as estratégias de estudo empregadas pelos participantes.

Identificou-se que um dos fatores que dificultou a participação efetiva nos cursos foi o tempo. Como estratégias de estudos utilizadas para superar essa dificuldade, os participantes mencionaram que estudavam durante a noite ou aos finais de semana, em momentos que deveriam ser destinados ao descanso e lazer (^{SANTOS, 2014}), ou dedicavam de duas a três horas semanais de estudo para o curso (^{GARCIA; BIZZO, 2013}).

Outro desafio encontrado está relacionado à motivação e engajamento dos participantes. É particularmente difícil para tutores e professores, nos ambientes virtuais, promoverem a participação ativa e engajamento dos participantes do curso, sobretudo quando há um número elevado de participantes e poucos professores e tutores. Nessas situações, ocorreram participações protocolares, em que a frequência de postagens nos fóruns e atividades compartilhadas aumentou conforme se aproximava o final do curso (^{SANTOS, 2014}). Videoconferências longas também se mostraram desfavoráveis à motivação e engajamento dos participantes, uma vez que desencadearam comportamentos dispersivos durante as sessões (^{OLIVEIRA; BUENO, 2013}).

Apesar das dificuldades encontraras em relação ao tempo e às estratégias de estudo, a interação entre participantes e entre participantes e tutores/professores foi elogiada em outros estudos, sendo considerada vital para o aprendizado e desenvolvimento profissional nos cursos frequentados (^{DROGUI, 2019}; ^{SOUZA et al., 2017}), propiciando a construção coletiva de conhecimento (^{MASSI; GIORDAN, 2014}). Entre as aprendizagens oportunizadas pelas interações, foram mencionadas a possibilidade de se conhecer e compreender o papel dos diferentes integrantes da escola em um trabalho integrado: “nutricionistas tornam-se mediadores junto à comunidade escolar; gestores constituem facilitadores das ações e professores exercem papel de modelo aos estudantes, assumindo a alimentação saudável na perspectiva transversal” (^{JUZWIAK; BATISTA; CASTRO, 2013}, p. 1016).

Assim, compreende-se que a interação promovida entre participantes e entre participantes e tutores/professores mediada pelos recursos das TDIC podem ser um elemento crucial no processo de formação continuada em serviço, considerando, inclusive, a realidade que cada um ocupa, podendo ser transformadora de práticas pedagógicas nas escolas (^{DAVIS et al., 2011}; ^{GATTI et al., 2019}; ^{REALI; TANCREDI; MIZUKAMI, 2008}).

Enfim, apreende-se que algumas condições ambientais foram importantes para o desenvolvimento efetivo das práticas formativas e do conhecimento produzido ao longo da participação nos estudos revisados. As TDIC foram consideradas importantes ferramentas para mediação do desenvolvimento dos conhecimentos (^{DROGUI, 2019}) e discussão entre os participantes (^{SOUZA et al., 2017}) que, muitas vezes, estavam geograficamente distantes entre si. Nessa realidade, o processo de tutoria foi muito importante. Como descreveu ^{Miranda (2014)}, a tutora presencial foi responsável pela adaptação das atividades ao contexto dos participantes e, em suas atribuições, procurou empoderá-los no que tange à utilização dos recursos tecnológicos, promovendo inclusive o aprendizado das tecnologias. Com a mesma importância, só que às avessas, os professores dos cursos foram contramodelos, de forma não intencional, sobre como as práticas educativas necessitavam ser repensadas (^{OLIVEIRA; BUENO, 2013}).

Há uma linha tênue na relação entre o que se ensina nesses cursos e a realidade prática dos professores que participam de formações continuadas em serviço. O que deveria ser o elemento precípuo nessas formações, às vezes acaba se perdendo na urgência da organização, generalização e oferta dos cursos para grupos cada vez mais volumosos e heterogêneos, tanto em termos de conhecimento, como em infraestrutura.

A relação dos conteúdos com a prática dos professores foi imprescindível para a percepção de sucesso na formação. Os cursos que conseguiram engendrar esses elementos ofereceram movimentos de pensar a própria prática, geraram novas ideias para intervenção, de conhecimento e conteúdo, para serem desenvolvidos pelos seus participantes (^{ALMEIDA; SILVA, 2014}; ^{OLIVEIRA et al., 2013}; ^{SOUZA et al., 2017}). Contudo, há que se atentar à elaboração do material utilizado, uma vez que materiais de apoio e referência são importantes instrumentos para estudo, atualização e desenvolvimento de conhecimentos. Além disso, devido à possibilidade de levar o curso para diferentes regiões do Brasil, esses materiais podem não refletir a realidade encontrada pelos participantes (^{MIRANDA, 2014}). Assim, em última instância, pesam sobre o trabalho dos tutores e professores que precisam procurar diferentes maneiras de atrelar os conhecimentos advindos dos materiais e das videoaulas às realidades individuais locais dos participantes.

Em suma, pode-se dizer, a partir da revisão dos estudos, que os cursos oferecidos com recursos ou por intermédio das TDIC conseguiram entregar o resultado a que se propuseram: democratizar o acesso ao conhecimento, fomentar a formação e atualização profissional, integrar diferentes profissionais envolvidos na escola e promover o desenvolvimento de novos conhecimentos relacionados aos conteúdos trabalhados. Dessa maneira, é possível compreender que as ferramentas oferecidas pelas TDIC podem ser um elemento importante para a melhora da formação dos professores, dos processos formativos e da qualidade de ensino na Educação Básica (^{GATTI et al., 2019}; ^{SOUZA; SOUZA, 2008}), principalmente no que tange à promoção de saúde na e para a escola (^{DETREGIACHI; BRAGA, 2011}; ^{IERVOLINO, 2000}). Contudo, é necessário dispender maior atenção para a forma como ocorrem esses processos. Ao se propor formações dessa natureza, sugere-se que atenção seja destinada aos fatores que podem se constituir em barreiras para a participação efetiva nos cursos e, do mesmo modo, que atenção seja destinada para se entregar atividades que procurem fomentar a interação dos participantes, que existam momentos destinados à aprendizagem das ferramentas tecnológicas e preparação dos tutores para intervir nos diferentes aspectos dos cursos.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

No contexto educacional, mais especificamente na formação profissional de professores ao longo da vida, há um número elevado de debates e discussões sobre o que e como aprender e ensinar. De fato, num país continental como o Brasil, era de se esperar que debates acalorados permeassem a profissão. São muitos contextos, desafios e possibilidades a se considerar.

Esta pesquisa teve como objetivo analisar criticamente os estudos levantados em relação aos resultados obtidos em cursos de formação continuada mediados por TDIC e fatores que se associaram à aprendizagem dos professores. A revisão dos estudos permitiu identificar resultados de aprendizagem em três âmbitos diferentes, mas que interagem no processo de aprendizagem: o pessoal, referente às aprendizagens sobre conceitos de saúde, bem como sobre o manuseio da tecnologia; o comportamental que se relacionou à interação, engajamento e estratégias de aprendizagem empregados pelos participantes; e o ambiental, ligado à organização e alinhamento da proposta formativa e do papel do tutor enquanto responsável tanto pela facilitação do desenvolvimento do conteúdo, como para solução de problemas técnicos, e os processos de acompanhamento. É possível aferir que, quando esses resultados são atendidos, cursos de formação de professores mediados pelas TDIC podem potencializar a formação em serviço, por meio da ativação de processos reflexivos e aproximação entre os diferentes contextos de formação e de trabalho pedagógico.

A partir desta revisão, também foi possível destacar que esse é um campo em desenvolvimento e que pesquisas nessa área podem ajudar a avançar na compreensão dos processos formativos mediados pelas TDIC no campo da promoção de saúde na e da escola. A realização deste estudo foi um recorte de um tema bastante abrangente e pertinente nas questões educacionais atuais. Assim, entende-se que há, neste processo de pesquisa, aspectos que podem ser melhorados e explorados futuramente. Como limitações, se reconhece os critérios de seleção e inclusão. A título de exemplo, os termos pesquisados recuperaram um estudo que contou com participantes do Brasil e Argentina, um estudo realizado na Colômbia, na área de enfermagem, e um estudo Pan-Americano sobre gestão de recursos humanos em saúde que, por não integrarem o escopo selecionado para esta investigação, foram excluídos quando aplicados os critérios de inclusão e exclusão. Uma revisão mais abrangente da literatura, considerando descritores mais amplos ligados, por exemplo, à formação inicial, ou estudos de intervenção na educação básica podem contribuir para a identificação de um panorama dos resultados e aprendizagens promovidos com intermédio das ferramentas das TDIC. Quanto à abrangência, a seleção de outras bases de dados ou a pesquisa em outras áreas do conhecimento podem retornar estudos e pesquisas que tragam novas visões e perspectivas formativas, conforme o caso de áreas da saúde como enfermagem e medicina, que têm avançado em soluções para a atualização de profissionais da área. Quanto ao procedimento de análise, estudos futuros podem encontrar novas iluminações ao lançarem mão de outros referenciais e estratégias de análise de dados, como estudos de meta-análise.

De modo positivo, as evidências aqui apontadas podem também servir de subsídio para elaboração de práticas pedagógicas em contextos formativos em serviço. Além disso, a revisão de cursos ofertados a distância ou em formatos híbridos em outros temas que não o da saúde, também pode apontar indicativos de como melhorar o processo de elaboração e implementação de formação continuada em serviço mediada pelas TDIC. No entanto, em todas elas, é necessário que se tenha sempre o professor no centro do processo de aprendizagem, para desenvolver novos conhecimentos e competências que permitam a ele se tornar reflexivo sobre o próprio trabalho pedagógico.

Por fim, em uma época em que se tem discutido estratégias educacionais, como sala de aula invertida, educação a distância e metodologias ativas, por exemplo, é relevante conhecer fatores que favorecem e dificultam o processo de participação e aprendizagem em cursos que lançam mão dessas ferramentas metodológicas. Sabemos que ter fluência digital é condição facilitadora para que o professor faça uso e produza material de forma crítica, reflexiva e criativa, de maneira a potencializar os processos educativos (^{MODELSKI, GIRAFFA, CASARTELLI, 2019}).

Sendo assim, desenvolver essa competência possibilita que os docentes se sintam mais seguros para, ao reformular seus conhecimentos, ensinar de forma criativa, envolvendo os estudantes para novas formas de aprender. Isso implica que a formação inicial poderia, ao invés de tratar o ensino das TDIC como um acessório, promover o desenvolvimento dessa competência por meio de oportunidades de reflexão acerca do papel das TDIC no contexto educativo, bem como de aquisição das habilidades necessárias para seu uso no ensino. Neste estudo investigou-se resultados de pesquisas ligadas à formação continuada mediada por TDIC. Mas esse é apenas um recorte, e outros recursos e metodologias de ensino, como sala de aula invertida, gamificação (^{MARTINS; GIRAFFA, 2018}) e ‘design thinking’ também podem ter um papel importante no processo de ensino e aprendizagem.

À guisa de conclusão deste estudo, foi possível compreender que o uso de TDIC possibilitou a formação profissional em serviço em temas ligados à promoção de saúde na e da escola. Além de conceitos sobre o tema, a aprendizagem no manuseio de tecnologias pode colaborar com a prática profissional, uma vez que é uma ferramenta efetiva para comunicação e disseminação de informação. As TDIC podem e devem ser vistas como uma das possibilidades de enfrentamento em tempos de desafios e emergências ligadas à intersetorialidade, como, por exemplo, entre educação e saúde. Em tempo, iniciativas de formação continuada em serviço mediadas por TDIC requerem adaptação estrutural e de práticas educativas, assumindo modelos de formação pautados em metodologias centradas na aprendizagem e ativação de processos reflexivos de todos os envolvidos.