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ETD Educação Temática Digital

versão On-line ISSN 1676-2592

ETD - Educ. Temat. Digit. vol.24 no.2 Campinas maio 2022

https://doi.org/10.20396/etd.v24i2.8660118 

Artigos

É PRECISO TOMAR AS COISAS COM FILOSOFIA: MICHEL FOUCAULT E O INFINITO DA TAREFA

ONE NEEDS TO TAKE THINGS WITH PHILOSOPHY: MICHEL FOUCAULT AND THE INFINITE OF THE TASK

ES NECESARIO TOMAR LAS COSAS CON FILOSOFÍA: MICHEL FOUCAULT Y EL INFINITO DE LA TAREA

Sandra Espinosa Almansa1 

1Doutora em Educação - Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Porto Alegre, RS - Brasil. Pesquisadora do Núcleo de Estudos em Mídia, Educação e Subjetividade (NEMES/UFRGS). Porto Alegre, RS - Brasil. E-mail: sandraealmansa@gmail.com


RESUMO

Este texto é elaborado a partir de uma pequena coleção de fragmentos da obra de Michel Foucault e de textos sobre sua pessoa e sobre seu pensamento. Em meio à tomada da palavra de Foucault, na voz de seus próprios livros, textos periféricos, cursos e entrevistas, e ante a imagem de Michel Foucault tal como o descrevem seus amigos e alguns daqueles que o conheceram e sobre ele escreveram, presta-se um elogio à filosofia como modo de vida, ou simplesmente como ponto de partida para outros modos mais éticos, mais livres, mais belos e mais verdadeiros de viver, de estar a sós com outro, de relacionar-se consigo mesmo e com o mundo. Com um olhar interessado sobre o percurso intelectual e a paisagem afetiva de Michel Foucault, presume-se a atividade filosófica, à luz de certa curvatura na noção de parrhesia, como linha de força e traço fundamental por meio do qual se deseja ensaiar uma escrita alicerçada na suspeita, decerto insolúvel, do caráter crucial entre palavra e ato, teoria e prática, verdade e vida.

PALAVRAS-CHAVE Michel Foucault; Filosofia; Ética; Linguagem; Parrhesia

ABSTRACT

This text is developed from a small collection of fragments of Michel Foucault’s work and texts about his person and his thought. Amid Foucault’s public speaking, in the voice of his own books, peripheral texts, courses and interviews, and before Michel’s Foucault image as described by his friends and some of those who knew him and wrote about him, we praise philosophy as a way of life, or simply as a starting point for other, more ethical, freer, more beautiful and truer ways of living, of being alone with another, of relating to oneself and to the world. With an interested look on Michel Foucault's intellectual path and affective landscape, the philosophical activity is presumed, in the light of a certain curvature in the notion of parrhesia, as a line of strength and as a fundamental trace through which one wishes to rehearse a writing based on suspicion, certainly insoluble, of the crucial character between word and act, theory and practice, truth and life.

KEYWORDS Michel Foucault; Philosophy; Ethics; Language; Parrhesia

RESUMEN

Este texto se elabora a partir de una pequeña colección de fragmentos de la obra de Michel Foucault y textos sobre su persona y pensamiento. En medio de la toma de la palabra de Foucault, en la voz de sus propios libros, textos periféricos, cursos y entrevistas, y ante la imagen de Michel Foucault tal como lo describen sus amigos y algunos de los que lo conocieron y sobre él escribieron, se presta una alabanza a la filosofía como modo de vida, o simplemente como punto de partida para otros modos más éticos, más libres, más bellos y más verdaderos de vivir, de estar a solas con otro, de relacionarse consigo mismo y con el mundo. Con una mirada interesada sobre el recorrido intelectual y el paisaje afectivo de Michel Foucault, se presume la actividad filosófica, a la luz de cierta curvatura en la noción de parrhesia, como línea de fuerza y rasgo fundamental por medio del cual se desea ensayar una escritura fundada en la sospecha, sin duda insoluble, del carácter crucial entre palabra y acto, teoría y práctica, verdad y vida.

PALAVRAS-CLAVE Michel Foucault; Filosofía; Ética; Lenguage; Parrhesia

1 UM TEXTO QUE DIZ SIM

Quando Didier Eribon se propôs a escrever uma biografia de Michel Foucault, logo de início esclareceu suas intenções. Do trabalho dedicado a Foucault, conta-nos que se inspirou unicamente na admiração pelo homem e pela obra, mas que seu livro se esforçou por ser, acima de tudo, uma história coletiva. Logo, o que lemos em Michel Foucault, 1926-1984 (ERIBON, 1990) é uma escrita tecida num jogo entre proximidades e distâncias, cuja polifonia narrativa se afirma como possibilidade de se acercar, profusamente, seja da obra, seja da pessoa complexa e múltipla de Michel Foucault. Ali, ao lado de textos e documentos, por entre diferentes memórias, trajetos e relatos que “situam” o filósofo no mundo intelectual e político de seu tempo, e realçam aspectos de sua obra, de sua vida e de sua morte, exibe-se algo do homem que foi Foucault, ao mesmo tempo que é apresentada sua filosofia em atividade.

Aqui, ainda que não tenhamos a intenção de construir um texto propriamente biográfico, a realização da escrita se inspira, em certo viés, no quadro metodológico evocado. Ou seja, reúne diversas vozes para falar a respeito de diferentes encontros com a presença de Michel Foucault no mundo e da singularidade de um homem e seu legado. Por meio de tópicos como a linguagem, a ética e o dizer verdadeiro, este texto rumina a maneira, quiçá, uma maneira pela qual Foucault vinculava seu pensamento filosófico às ciências, às artes e à política, sim, em diferentes momentos de sua trajetória e por meio de deslocamentos incessantes, mas, além disso, habitual e simplesmente, à prática da filosofia. A orientação deste artigo, ao lado e ao redor de Michel Foucault, constitui-se sobre linhas de força e traços fundamentais por meio dos quais se deseja ensaiar uma escrita alicerçada na suspeita, decerto insolúvel, do caráter crucial entre palavra e ato, teoria e prática, verdade e vida.

Nem uma biografia, portanto, nem um comentário, nem uma apropriação desinteressada de Foucault para fins de comunicação. Esta escrita quer ser, antes de tudo, um texto que diz sim. Sim, “é preciso tomar as coisas com filosofia” (LINDON, 2014, p. 183) ‒ como diria Michel Foucault recém-chegado da África, onde nadara ao lado de um crocodilo no rio Gâmbia, ao amigo que havia deixado morrer de sede sua estimada musácea. Diante do desastre, do remorso e do temor do jovem que, por descuido, esquecera-se de regar a árvore, a voz penetrante de Foucault apenas e com argúcia concluía que “a filosofia também é uma prática muito amigável” (LINDON, 2014, p. 183). Esse episódio, ao mesmo tempo prosaico e singelo, rememorado por Mathieu Lindon (2014), o aludido amigo de Foucault, guarda o vestígio de um gesto mínimo, e de certa disposição, a partir dos quais propomos desenvolver as questões deste texto.

A princípio, gostaríamos de tomar esse excerto do relato de Lindon em sua especificidade de acontecimento minúsculo, sem despojá-lo do acaso e do horizonte de liberdade aos quais ele indiretamente aponta; mas, sobretudo, sem perder de vista desde esse pequeno fato cotidiano o problema da relação entre as coisas no seio das quais nos situamos e os acontecimentos nos quais nos inscrevemos. Com isso, partimos de modo transversal em direção a uma suspeita, de inspiração vivamente nietzschiana, relativa à nossa própria habilidade, prática e teórica, de examinar e arrumar os acontecimentos da vida. Em outras palavras, pode-se dizer que recolhemos de uma breve cena afetiva, de uma experiência pessoal, matéria para explorar a potencialidade filosófica do gesto foucaultiano, a vertente da criação que dele dimana no tocante a possíveis modos de ocupar e transformar o presente, na heterogeneidade de nossas práticas imanentes e cotidianas. Propomos em alguma medida problematizar, sem dúvida, em caráter fragmentário, traços da estratégia da tomada da palavra em Foucault, relativamente a um modo possível do filosofar, e em direção à ordem das práticas que, sendo essencialmente linguagem, motivam-nos a pensar nossos modos de existência, justo a partir da atenção ao detalhe daquilo que nelas se faz e se diz.

Considerada a intenção de lançar um olhar que aponta para essa que é também (e sobretudo), como recorda Artières (2016, p. 15), uma permanente e exigente “busca ética da palavra”, sublinhamos não ser sem propósito que inauguramos essa discussão a partir de um evento cujo traço fundamental consiste menos em seu aspecto de acidente do que, decerto, numa possibilidade de passagem, de uma escala ínfima, a uma provocação exemplar, ali mesmo contida. O destaque dado inicialmente a um pequeno fato da vida cotidiana de Michel Foucault, longe de tomar irremediável distância do livresco e “abstrato” Foucault, tem algo genuíno a dizer a respeito de uma maneira concreta, filosófica e mesmo poética de viver, cuja singular expressão produz não apenas o homem, mas sua obra. O que queremos guardar, portanto, do minúsculo acontecimento que mencionamos, não é outra coisa senão a contraefetuação de Foucault e seu sentido ético, aquilo que daí diz respeito e nos remete à esfera do agir. Tudo se passa como se fosse preciso assumir, um tanto cinicamente, o perigo do anedótico: quem sabe a despretensiosa historieta foucaultiana narrada por Lindon nos inspire, como ponto de partida, a pensar, convidativa e filosoficamente, naquilo que, como sugere Deleuze (2011), nos faz sinal e nos espera — no que acontece. E por efeito, nos impulsione ao pensamento e às palavras de Foucault, de modo a com ele ver e compreender algo da ausência de separação que há entre nós mesmos e a experiência vivida, entre nós mesmos e a história, entre nós mesmos e a atualidade. E por fim, de sua peculiar lonjura, possa nos levar a reparar no que se passa conosco, a reparar nossa parte naquilo a que estamos intimamente ligados e que, justo por sua proximidade, escapa muitas vezes à nossa percepção.

2 DA ARTE DA ESCUTA À BUSCA ÉTICA DA PALAVRA

Foram muitos os gestos e os registros de linguagem mobilizados por Foucault. Filósofo, erudito, professor, pensador engajado, amigo franco, Michel Foucault, homem de mil máscaras, tomou a palavra de diferentes modos. Dos intermináveis alfarrábios de seus livros, escritos, em parte, na quietude do estúdio contíguo ao seu imenso apartamento na Rue de Vaugirard, em Paris, às altas, gestuais e meticulosas leituras públicas de suas pesquisas, nas aulas relativas aos cursos proferidos no Collège de France, de 1970 a 1984. Das inúmeras e variadas entrevistas que concedeu ao longo de seu percurso intelectual, cujos áudios depois transcritos, editados e traduzidos nos revelariam extensivamente sua fala a um sem número de textos curtos e artigos vigorosos sobre temas distintos, muitos deles frutos de conversações breves, “rastros de enunciados orais” recolhidos em colóquios, conferências e outras manifestações públicas (ARTIÈRES, 2016, p. 13). Da intimidade dos conselhos livres de obrigações que destinava a amigos — conselhos os quais não julgava necessariamente bons, mas capazes de liberar suas consciências da responsabilidade de agir de um ou de outro modo, às coletivas de imprensa, e ao rumor dos comícios e protestos políticos de resistência,2 com os quais passara a se envolver no início dos anos 1970.

Passados mais de 35 anos do prematuro desaparecimento de Michel Foucault em junho de 1984, seu espírito diagnosticador continua a viver. Sua apreciação do silêncio e a escuta atenta, o rumor de sua voz inconfundível, sua escrita cirúrgica, ora mais discursiva e teórica, ora mais livre e literária, sobrevivem. Sobrevivem e se desdobram: impressas em incontáveis folhas de papel, gravadas com imperfeições em fitas magnéticas, capturadas em movimento nas imagens de algumas películas, duráveis na lembrança sonora de sua risada e impetuosa gargalhada, para sempre inscritas na memória daqueles que foram próximos dele. Foucault, o homem, tornou-se palavra.

De fato, como observa Artières (2016), o corpus foucaultiano praticamente dobrou desde a morte do filósofo. Em 1995, a reunião e a publicação, na França, dos Ditos e Escritos revelaram ao mundo não apenas a fala de Foucault, mas a crítica permanente a que, por meio de diferentes gestos de linguagem, o filósofo submetia o próprio pensamento. A partir de 1997, iniciou-se a publicação dos cursos no Collège de France. Gilles Deleuze (2013), leitor de Foucault (pelo qual nutria grande admiração), recorda que, ao lado da paixão de Foucault pelo que escutava dizer e de sua paixão por ver, encontrava-se sua paixão por enunciar. Sem desconsiderar a distinção entre descrição e enunciado, Deleuze atribui a essa paixão, em toda a obra foucaultiana, a realização de grandes descrições. Descrições de quadros, sempre filosóficas (como a análise de Las Meninas, de Diego Velázquez, ou Isto não é um cachimbo, de René Magritte), mas também descrições das condições, do estatuto e da mutação de práticas discursivas e não discursivas em determinadas épocas. Descrever era, para Foucault, o modo de falar de uma visibilidade, ou seja, não propriamente de coisas ou objetos, mas de algo que cintila, brilha, resplandece no visível. Foucault, diz Deleuze (2013), caminha sobre dois pés dissimétricos, as descrições e os enunciados — estes últimos, em sua raridade, algo totalmente distinto de palavras e frases.

Em contrapartida, nas “impressões” recentemente publicadas por Roberto Machado (2017), o “amigo brasileiro” de Foucault (além de agudo intérprete e importante veiculador do pensamento do francês no Brasil), a narrativa relata, com proximidade, a fina habilidade de Foucault — tão inscrita, é claro, em sua obra — de falar diferentemente do que já se sabe, de falar de diferentes modos até mesmo sobre os mesmos temas. Ousa dizer, além disso, que “Michel levava em consideração com quem estava falando para saber o que dizer” (MACHADO, 2017, p. 50), adaptando sua linguagem e comportamento ao interlocutor: fosse ele um professor universitário sul-americano, um jornalista de um jornal tunisiano, um crítico japonês de cinema, etc.

A marca do pensamento foucaultiano de que pensar é pensar diferentemente, a busca do novo, o desejo de não ficar repetindo o já sabido, sem querer a todo custo permanecer fiel ao já pensado, afirma-se até mesmo na diagonal dos deslocamentos de sua empreitada intelectual da arqueologia à genealogia, e destas à pragmática do sujeito. Justamente, na medida em que Foucault vislumbra, em alguma característica expressa pelo tema de análise de que se ocupara anteriormente, a necessidade de abordar novos objetos, aos quais só poderá interrogar e analisar por meio de um derramamento para outro plano, e mediante novos instrumentos de pesquisa. Para mais, o uso que Foucault fez das ideias como ferramentas provisórias, como instrumento parcial, aberto ao imprevisto e à experimentação, sujeito ao engano e ao recomeço, e não circunscrito à busca continuada e inflexível de fundamentação, deixa para nós o legado de uma “atitude metodológica” particular e, ao mesmo tempo, generosa, pois verdadeiramente favorece a apresentação de ideias distintas e a possibilidade, ao trabalho do pensamento, de traçar novos caminhos, de colocar novas perguntas.

De certa perspectiva, em que propomos focar aqui, o que se propaga da relação de Michel Foucault com a linguagem e o que podem nos ensinar suas diferentes experiências de linguagem, de modo mais amplo, é, dentre algo mais, uma atitude. A diferença inscrita em uma maneira de dizer, em um modo de olhar, em uma prática de tomar a palavra, e até mesmo a liberdade que o silêncio permite. Pensar diferentemente, nessa perspectiva, não diz respeito a uma interioridade pessoal — cujo exercício inato do pensamento se encontra fatalmente distante do ponto de vista foucaultiano de que pensar é, antes, um exercício que deve acontecer ao pensamento. Pensar diferentemente é um exercício que pressupõe afetar e ser afetado por forças do lado de fora do pensamento para poder pensar, de modo que o pensamento não pode prescindir desse domínio informe da pura exterioridade, para descobrir a sua própria potência.

Ao talento de Foucault para expressar de diferentes modos sua própria voz, aliavam-se uma escuta sagaz e a disposição fundamental de dar voz aos outros, de dar voz aos sem voz, de ajudar outras pessoas a prosseguirem suas lutas em campos específicos, de criar condições para que as pessoas falassem em seu próprio nome: não um nome próprio, mas em nome de potências impessoais, físicas e mentais a enfrentar e a combater, em nome das quais lutar. A manifesta relação, na atitude de Michel Foucault, entre experiência política e atividade intelectual jamais significou, no entanto, dizer aos outros, prescritivamente, o que fazer (FOUCAULT, 2017b). Não era esse, definitivamente, na visão do filósofo, o papel de um intelectual, tampouco dizer a muda verdade de todos e modelar a vontade política dos outros. Durante suas vindas ao Brasil no período da repressão, a exemplo de algo que nos diz diretamente respeito, por mais que o interpelassem, em nenhum momento teria usado suas análises, de acordo com Machado (2017), para dizer como nós, mulheres e homens desse tempo, deveríamos lutar contra a ditadura, mesmo sendo profundamente contra ela. Nesse aspecto, fazia viver nele próprio, pragmaticamente, a desobrigação intelectual de ter de desempenhar o papel daquele que dá conselhos, ou as respostas mais seguras.

No entender de Deleuze (FOUCAULT, 2012a, p. 72), Foucault foi o primeiro a nos ensinar, tanto em seus livros quanto no domínio da prática, a indignidade de falar pelos outros. Ao ter abertamente buscado dar a palavra para que outros descrevessem por si mesmos, em sua diferença, contextos específicos de opressão, e ter utilizado o próprio corpo na defesa dos direitos e para denunciar a violência e as injustiças dos poderes estabelecidos, “em lutas contra o racismo, contra a pena de morte, em favor dos imigrantes, dos prisioneiros, dos loucos, dos trabalhadores em greve, etc.” (MACHADO, 2017, p. 121), Foucault decerto nos ensina que falar é “se inscrever, ou não, numa ordem dos discursos, mas [...] também problematizar, no próprio gesto, essa prática”, é reinventar sem cessar um teatro profundamente político (ARTIÈRES, 2016, p. 16). Assim, na perspectiva foucaultiana, embora o intelectual possa fornecer os instrumentos de análise, cabe àqueles que se batem e debatem em lutas locais e específicas encontrar o projeto, as táticas, os alvos de que necessitam (FOUCAULT, 2012b, p. 151).

Quanto aos registros que abordam abertamente a relação (a ascese pessoal) de Foucault com a escrita e com os seus eventuais leitores, sabemos serem raros. A fala autobiográfica, fiada em meio ao “enunciado íntimo do autor sobre si mesmo” (ARTIÈRES, 2016, p. 25), essa fala, em sua resplandecência, é uma prática por um triz ausente ao longo do percurso intelectual de Foucault.3 Felizmente, quando se realiza, dela cintila qualquer coisa como um fulgor, a faúlha disfarçada de um secreto vagalume. Tudo se passa como se fosse preciso espreitar seus vestígios para então descobrir, num arvoredo estrangeiro, a condição do que lhe faz brilhar. Da face noturna do trabalho de Foucault, esfiapada não sem algum pavor, por ele próprio, à ocasião da conversa com Claude Bonnefoy em 1968, desponta o fluxo impalpável e estriado da escrita, em cuja história se desnudam impressões, lembranças e experiências profundamente subjetivas (FOUCAULT, 2016b).

A descoberta do prazer da escrita, conta-nos Foucault (2016b, p. 38), e a afirmação de sua necessidade só foram possíveis para ele no momento mesmo em que se vira como que impossibilitado de falar, “de dizer realmente o que queria dizer”. Cingido na exterioridade de uma língua estrangeira, por ocasião de sua estada na Suécia, viu se simplificarem diante dele as palavras que queria dizer, palavras tornadas “como que marionetes irrisórias” (FOUCAULT, 2016b, p. 38) à sua frente no momento em que as pronunciava. Foi preciso padecer a impotência, encontrar-se a certa distância de sua própria língua para que pudesse então perceber, sob a presença de um sensível paradoxo, que ali onde não é mais possível falar avista-se, justo na distância, a tarefa fascinante e perigosa da escrita (FOUCAULT, 2016b).

A existência da escrita, das falas e do discurso numa cultura e numa sociedade como a ocidental sempre se constituiu para Michel Foucault como um problema e uma preocupação. A despeito da frase que ele tanto repetira, qual seja, que “escrevia para não ter mais rosto”, e de sua insurgência contra o recobrimento do pensamento pelo nome do autor (ARTIÈRES, 2016, p. 28), a figura de Foucault, um tanto quanto legatária da figura de Sócrates, tornava-o, já no final dos anos 1970, tanto em seus cursos no Collège de France quanto em suas intervenções, um “mestre do pensamento” — muito embora ele próprio não se comportasse, absolutamente, desse modo. Assim que, para fazer justiça ao pensamento de Michel Foucault e ao seu posicionamento combativo a qualquer espécie de vedetização, talvez fosse acertado menos repeti-lo do que ousar o oposto, vergando dele para si a força de uma máscara qualquer que lhe incendiasse fatalmente o rosto. Não seria lógico, ao passo que de Foucault nos tornamos herdeiros, absorver ao máximo seu rosto, considerar seu desaparecimento sem com isso eliminar sua presença, na esteira do que ele próprio fizera com os autores dos quais falava?

Foucault percorria com sua escrita, como um ser subterrâneo a trabalhar, “o corpo dos outros”: fazia incisões, levantava os tegumentos e as peles, escavava, tentava avistar os órgãos, trazer à luz as feridas, os venenos do coração (FOUCAULT, 2016b, p. 45). Era esse “foco de lesão”, dizia, ao qual fazia aparecer com um olhar clínico e com um talho meticuloso, capaz de tornar visível algo característico de uma vida e de um pensamento (FOUCAULT, 2016b). Para o “escrevente” Foucault,4 “no fundo, o lugar de possibilidade da escrita é esse ponto onde a vida dos outros descambou para morte” (FOUCAULT, 2016b, p. 47). Por isso, falar do presente e das coisas que estão próximas sempre exigiu, para ele, a condição de que houvesse, entre essa proximidade e o momento da escrita, um mínimo descompasso, alguma distância na qual se situar e a transpor, uma fina película através da qual a morte se instala.

Como se a palavra só pudesse começar após a morte, após uma espécie de desaparecimento, apenas uma vez estabelecida essa ruptura — uma abertura que não funda diante daquele que escreve, contudo, um espaço soberano e livre.

Por certo, os caminhos pelos quais se atribui à atividade de escrever a qualidade de um modo de existência podem ser muitos e diversos. O que parece essencial é a atenção de perceber, no nível surdo das impressões, no limite da impotência do pensamento, na nervura do impossível das palavras, como uma fenda capital, a abertura abarcadora da linguagem. Em vez de lançar mão de uma atividade de linguagem cujo impulso seria somente demonstrar alguma coisa que já estivesse interiormente atestada, da deriva do pós-morte, que caracteriza para Foucault a escrita, desdobra-se intensamente a possibilidade de arriscar um trabalho no qual, ao final, possa-se encontrar alguma coisa nova, uma partícula de diferença, algo que inicialmente não se havia visto e só se encontra no movimento mesmo, numa espécie de salto ao desconhecido, na aventura indefinida e arriscada de uma arte. Nisso consiste, fundamentalmente, a tarefa do diagnosticador.

A escrita como instrumento de diagnóstico, herança que Michel Foucault atribui em grande parte a Nietzsche, e a relação entre escrita e vida, a qual se vê insinuar clandestina por entre as considerações do francês a propósito das maneiras como se anuncia, a seu ver, a “obrigação de escrever”, parece, entre algo mais, roçar a pele do desequilíbrio existente entre o discurso e a língua (FOUCAULT, 2016b). Se, por um lado, infinita e inesgotável, a língua mantém o discurso sempre em suspenso, hesitante, num porvir sem cessar incompleto — o que o torna todo o tempo limitado e finito —, por outro lado, a vida nunca se fixa na medida da escrita, a vida sempre prossegue, excede, prolifera-se — arremessa-se do quinhão imensurável das frases. Ao mesmo tempo que deseja não ser mais, em matéria de vida, do que uma garatuja morta e tagarela, e o situa justo na distância entre o discurso dos outros e o seu, o papel da escrita diagnóstica de Foucault (2016b, p. 72, grifo nosso) consiste em “medir a diferença com aquilo que não somos”.

Designar, mostrar forças não visíveis, manifestar fora da própria escrita “alguma coisa que, sem ela, teria permanecido se não oculta, ao menos invisível” (FOUCAULT, 2016b, p. 69), tudo isso consiste em pensar diferentemente. Em contrapartida, um sentido possivelmente prático se revela quando, ao forçar a diferença (e à diferença) a partir dela própria, chega-se ao ponto em que a diferença é inelutavelmente incorporada, em que ela se inscreve no pensamento e na vida, em que “uma diferença percebida, descrita, visível é também uma diferença a ser vivida” (ROCHA, 2014, p. 13). Nisso consiste seu traço prático ou ético: pensar diferentemente é estender vivamente a diferença, estendê-la indefinidamente, como, aliás, ao pensamento e à vida, na direção de novas formas e possibilidades de pensamento e de vida (ROCHA, 2014).

A estratégia da tomada da palavra em Foucault traz consigo, tanto no impacto de seus escritos quanto na força de seu investimento na expressão oral, uma incessante busca ética da palavra, sempre excedente ao domínio da teoria. E “o mais belo testemunho dessa atitude é decerto [Foucault] tê-la transformado, no final de seu ensino, numa questão filosófica, a do dizer verdadeiro” (ARTIÈRES, 2016, p. 15, grifo nosso). É aí que Frédéric Gros (2004, p. 12) encontrará a “grade de leitura” da indissociabilidade entre a obra e a vida de Michel Foucault, como aquilo que simultaneamente fundamenta a escrita de livros e a ação política, sem definitivamente dissociar discurso verdadeiro, neutro e pálido de um lado “e, do outro, uma coragem em busca de causas a defender”.

3 VERDADE E VIDA FILOSÓFICA

Michel Foucault sempre se esforçou para entender como a verdade atinge as coisas e os modos pelos quais diferentes domínios se integraram, pouco a pouco, com a problemática e com a pesquisa da verdade (FOUCAULT, 2014). Em que pesem os diferentes modos pelos quais a problematizou em momentos específicos, a questão filosófica das relações entre sujeito e verdade consistiu sempre numa espécie de força motriz no desenvolvimento da obra do filósofo, como ele próprio menciona nas diversas situações em que comenta os seus trabalhos. Foi a partir dessa questão, em relação ao estudo das práticas de si históricas, que Foucault por fim chegou ao tema da parrhesia, a “liberdade da linguagem”, a atitude do “franco falar”, o “dizer verdadeiro”, ao modo da “coragem da verdade”, cuja análise realizou mediante o estudo de textos da chamada “cultura de si” da Antiguidade greco-romana.

Apesar de já ter sido mencionada no curso A hermenêutica do sujeito (1981-1982), é nos dois últimos anos de curso no Collège de France (1982-1984), publicados no Brasil sob os títulos O governo de si e dos outros e A coragem da verdade, que a parrhesia constitui o objeto privilegiado de estudo de Foucault. Nesses cursos, em que observamos o desenrolar do exame da prática parrhesiástica histórica, articula-se finalmente o campo problemático daquilo que, no fundo, Foucault sempre procurou fazer: a análise das relações entre os modos de dizer verdadeiro (saberes), as técnicas de governo (poderes) e as práticas de si (constituição do sujeito) (FOUCAULT, 2011). A problematização do discurso e da atitude parrhesiásticas em filosofia como sendo o discurso ao mesmo tempo da irredutibilidade da verdade, do poder e do êthos, e de sua necessária e mesmo essencial relação, inscreve-se no derradeiro estudo de Foucault ao modo de uma atualização, desde sua fundação socrático-platônica, do problema do dizer filosófico e, mais do que isso, do tema da vida filosófica. É neste marco que, nas palavras de Walter Kohan (2012, p. 159), “Foucault coloca o problema específico que lhe é crucial nos últimos anos: a verdade da própria vida, o sentido de uma vida filosófica e como a sua vida pode relacionar-se com certas maneiras de viver a filosofia”.

Do exercício das análises tardias de Foucault apreende-se o conjunto dos fundamentos e inflexões da parrhesia ao longo de sua história, identificam-se seus deslocamentos, assimilam-se seus elementos constitutivos, compreendem-se os caminhos bifurcados que ela toma, a crise democrática por que passa. Vê-se, sobretudo, a estreita articulação entre a parrhesia filosófica e o cuidado de si. Dessa história, em que a parrhesia sofre transformações significativas, vê-se destacar especialmente o papel, genealogicamente político e extensivamente ético, do discurso parrhesiástico relativamente às práticas de governo de si mesmo e dos outros (FOUCAULT, 2011). Assim, para além de uma parrhesia essencialmente política estudada em 1983, as aulas de 1984 prolongarão a problematização de uma parrhesia propriamente ética, filosófica, fundada no jogo das relações individuais, praticada como cuidado de si e voltada para o êthos do indivíduo e sua constituição como sujeito moral.

A diferença ética construída por Foucault relativamente à dimensão política da noção de parrhesia intervém como a inscrição de um princípio no interior do problema do governo dos homens, na maneira como são governados. Ela (a diferença ética), que “supõe intervir na construção da relação consigo a diferença da verdade”, ou antes, “a verdade como diferença”, consiste no “efeito, num sujeito, da diferença da própria verdade” (GROS, 2011, p. 305). De acordo com a analítica foucaultiana, é Sócrates quem instaura — e cuja morte funda, como acontecimento exemplar na realidade do pensamento grego e, logo, no coração da racionalidade ocidental — uma nova forma de parrhesia, particularmente distinta das outras modalidades de veridicção tradicionais e da parrhesia política. Oposta por sua forma, princípios, procedimentos e objetivos, aos outros modos de dizer verdadeiro, a parrhesia socrática se afirma como a franqueza corajosa do dizer a verdade, como coragem da verdade que deve ser exercida até a morte, ao modo de uma prova de alma “que não pode ter seu lugar na tribuna política” (FOUCAULT, 2011, p. 99).

Ao longo das aulas de 1984, Foucault orienta a análise da parrhesia socrática por meio dos diálogos platônicos que constituem a trilogia em torno da morte de Sócrates — Apologia de Sócrates, Críton e Fédon — e procede a uma retomada do diálogo platônico Alcibíades (o qual já havia analisado em A hermenêutica do sujeito) ao lado do exame do Laques (no qual o tema da verdade se entrelaça ao da coragem e a vida surge como objeto do cuidado). Assim, ao mesmo tempo que tenta mostrar Sócrates como aquele que articula, na história da filosofia, a exigência da parrhesia com os temas do cuidado de si e da técnica da existência (GROS, 2004), Foucault faz ver os traços cruciais daquelas as quais compreenderá como as duas linhas de evolução da reflexão e da prática filosófica ocidental: a filosofia como conhecimento da alma e como prova de vida.

Diferentemente do que se encontra no Alcibíades, em que o cuidado de si (objetivo final e preocupação constante da parrhesia socrática) é orientado para a alma do indivíduo, no Laques, o vínculo entre parrhesia e cuidado de si instaura uma relação em que o modo de vida, a forma que se dá a vida (e não mais a alma, como realidade ontológica distinta do corpo) aparece como correlativo essencial da prática do dizer a verdade. Tem-se, portanto: a coragem do dizer a verdade, no Alcibíades, quando se trata de descobrir e elaborar a alma; a coragem da verdade, no Laques, quando se trata de dar à vida forma e estilo (FOUCAULT, 2011). De um lado, conforma-se uma ontologia de si, metafísica, em que a forma do cuidado torna-se a forma do conhecimento e contemplação da alma; de outro, uma estilística da existência em que o objeto do cuidado passa a ser a vida (o bios), sua forma imanente. Essa seria a bifurcação fundamental descrita por Foucault ao examinar as diretrizes da parrhesia filosófica socrática. É nela que, em que pesem as diferenças de um caminho e outro, Foucault (2011, p. 141) diz encontrar lugar uma forma de filosofia em que a prática da verdade é ao mesmo tempo prática de si. Pela emergência e pela fundação da parrhesia socrática, a existência foi constituída no pensamento grego como “objeto de elaboração e de percepção estética” eticamente justificável.

A leitura foucaultiana de Sócrates, e aqui seguimos o pressuposto de Kohan (2012, p. 161), “tem um tom fortemente laudatório”. Sócrates, “irmão um instante sonhado, duplo sorridente” (GROS, 2010, p. 155), marca com seu estilo de vida e sua morte “o início de uma trajetória das vidas filosóficas na qual Foucault [parece querer] ver também a si mesmo” (KOHAN, 2012, p. 161). Nessa ótica, Frédéric Gros (2004, p. 155) sugere que o tema da parrhesia em Foucault é algo mais que uma nova invenção conceitual, que sucederia as da governamentalidade e da subjetivação, justamente por “retomar um ponto de articulação entre a teoria e a prática, entre o discurso e as ações, entre os saberes e as resistências”. Inscrevendo-se no interior de uma herança filosófica crítica, na qual pretende reconhecer sua própria atitude de “provocar o presente a partir do diagnóstico do que somos” (GROS, 2010, p. 345), com esse tema, Foucault, no entender de Gros (2004, p. 155), “chega o mais próximo possível de si mesmo”: como se anunciasse que, mediante os estudos sobre a parrhesia, ele problematizava o estatuto da sua própria palavra, a definição de seu papel de intelectual público, os desafios de sua função e, no limite, sua própria vida filosófica.

No quadro geral do interesse que o tema da parrhesia suscitou em Foucault, a filosofia cínica ganha notabilidade na medida em que nela o dizer verdadeiro e o modo de vida se articulam de modo radical, na forma mesma de existência como “escândalo vivo da verdade” (FOUCAULT, 2011, p. 158). Com os cínicos já não se trata simplesmente de viver uma vida em que palavras e atos se harmonizem, de viver uma vida conforme apenas aos princípios enunciados no discurso. Antes disso, é a própria forma de vida cínica, com suas regras, condições e características precisas, que serve de marco e justificação para a parrhesia. O modo de vida cínico desempenha, por ele mesmo, o papel de condição de possibilidade para o exercício do dizer a verdade.

Embora marcada por uma diversidade de esquemas de atitude, a filosofia cínica comporta intrinsecamente certo uso da fala (uma franqueza sóbria, eficaz, sem ornamentos, provocadora) e um modo de vida caracterizado pelo despojamento, pela errância, pela pobreza, imundície, mendicidade. Sua função — instrumental, de redução e de prova — consiste (respectivamente) em que: para assumir o risco do dizer verdadeiro, é preciso ser livre de qualquer vínculo, não se prender a nada e a ninguém; impõe-se reduzir da existência todas as obrigações inúteis e opiniões supérfluas, fundadas em convenções e em crenças (e não em natureza ou em razão); a vida torna visível a verdade no próprio gesto da vida cínica, em sua nudez elementar e liberdade fundamental (FOUCAULT, 2011, p. 149 et. seq.). A prática filosófica cínica não tinha como objetivo essencial transmitir conhecimentos, conjuntos de ideias e doutrinas. Seu objetivo consistia em “armar para a vida”, de modo que se pudessem enfrentar os acontecimentos, por meio de um tipo de aprendizado, de resistência e de combate, que passa antes pelos exercícios cotidianos do que pelo discurso.

Desde a perspectiva de Foucault, o cinismo, a prática cínica, dá uma nova forma ao “grande e velho problema”, ao mesmo tempo político e filosófico, da coragem da verdade. A coragem da verdade cínica consiste em conseguir fazer condenar, rejeitar, desprezar pelas pessoas, na própria vida, o que elas admitem ao nível dos princípios (FOUCAULT, 2011, p. 204). É o escândalo cínico, portanto, que Foucault tomará como ponto de aplicação para evocar, finalmente, o tema da verdadeira vida (alethès bíos). Reconhecida desde Platão como a vida não dissimulada, a vida sem mistura, reta e incorruptível, vida de soberania, garantidora de liberdade e felicidade, a verdadeira vida terá seu rosto tradicional careteado pelos cínicos, que a empurram até o extremo da tradição e do que esta reconhece. À semelhança de Sócrates, Diógenes, o Cínico, teria recebido do oráculo de Delfos um conselho, o qual consistia em “mudar, alterar o valor da moeda” (parakharáttein tò nómisma) (FOUCAULT, 2011, p. 199) e se tornaria o preceito fundamental da verdadeira vida cínica. Nesse princípio Foucault identifica, por meio da aproximação etimológica entre as palavras nomisma (moeda) e nómos (lei, norma), uma tarefa de contestação da convenção, da ordem, da regra, para transformá-las. O cinismo, como careta da verdadeira vida (FOUCAULT, 2011, p. 200), extrapola e reverte o tema da verdadeira vida numa figura ao mesmo tempo conforme ao modelo e careteira como a verdadeira vida.

A atitude cínica, que modula a vida fazendo do filósofo ele próprio (em sua vida, em seu corpo, em seus gestos) a testemunha viva da verdade, constitui, para Foucault (2011), uma categoria trans-histórica que perpassa, através de diferentes perfis e com objetivos variados, a longa história do cinismo no Ocidente. Se não como doutrina, ao menos como maneira de ser o cinismo pode ser reconhecido, variante em outros lugares e em outras formas, em práticas tão diversas na cultura europeia quanto o ascetismo cristão, em alguns movimentos revolucionários do século XIX, na arte moderna, nas práticas carnavalescas, enfim, em movimentos e práticas cuja forma do dizer a verdade estabelece com o real uma relação que não é da ordem da ornamentação e da imitação, mas sim “da ordem do desnudamento, do desmascaramento, da decapagem, da escavação, da redução violenta ao elementar da existência” (FOUCAULT, 2011, p. 164). O interesse de Foucault pelo cinismo, como figura particular da filosofia antiga e também como fenômeno recorrente através da história, modela-se desde o ponto de vista de uma atualização possível da estilística da existência. Para Foucault, o que o problema da vida cínica coloca à filosofia é a própria questão da vida filosófica (bíos philosophikos).

Por meio do tema da vida filosófica, ou simplesmente da “coragem em experimentar uma nova vida”, Foucault parece apontar, no fim da vida, para uma certa “reconciliação” de si mesmo com a própria filosofia (ROCHA, 2014, p. 14), cuja definição agora consiste, justamente, em “um ensaio de transformação de si mesmo” (FREITAS, 2013, p. 331, grifos do autor). De fato, parece haver uma dobra do jogo parrhesiástico a que torna então problema, sobre o filósofo ele mesmo, relativa à sua própria ligação enunciativa com a verdade, com a coragem e o risco de dizê-la. Ao dizer que Michel Foucault transforma, “na vertical de si mesmo”, em pesquisa e ensino a atitude de permanente busca ética da palavra, a coragem da verdade que fundamenta, ao mesmo tempo, a escrita de seus livros e suas intervenções políticas, Gros (2004) observa existir, na origem desse movimento, uma relação singular do filósofo consigo mesmo, a caracterizar seu próprio gesto e discurso filosófico. Nela, o enlaçamento de coragem e verdade se constitui como um complexo fundamental, e não apenas em tese. Nessa relação, na qual a coragem da verdade assume radicalidade prática, combinam-se uma maneira de ver o presente e a tarefa de diagnosticador, a implicar a mobilização da presença e do trabalho do próprio corpo de Foucault nos livros que ele assinou, na obra que ele empreendeu, na vida que viveu (ARTIÈRES, 2004).

Ao passar primeiramente por uma relação física com a atualidade e com o espaço que a constitui, o corpo de Foucault — posicionado, deslocado, em exercício, em movimento — torna-se um instrumento de luta e de pensamento no trabalho de diagnóstico do presente por ele empreendido (ARTIÈRES, 2004). Apesar disso, o filósofo não apenas resiste à valorização do estatuto de autor como em alguns momentos propõe, ao contrário, estilhaçar sua identidade, fazer desaparecer seu rosto, sobrepondo ao lugar de fala a qualidade do olhar, esta última na qual repousa, na visão de Foucault, o valor do diagnóstico. É desse modo que, desfazendo-se da figura de intelectual universal, cujo modelo consiste em ser ele o portador da verdade e a consciência crítica de toda sociedade, Foucault desempenhou um papel e ação de intelectual (filósofo) defendendo a função política do intelectual, a qual, noutra perspectiva, deve ser operada a partir da atividade específica de cada um.

Desde a ótica foucaultiana e sua referência nietzschiana na consideração da verdade como resultado de um jogo de forças, a função política do intelectual está profundamente ligada ao problema da produção da verdade e seus diferentes regimes — político, econômico, institucional; além de abranger a implicação direta dos indivíduos nos problemas que julgam e nas questões que formulam. Em outras palavras, a função política do intelectual está estreitamente ligada ao problema da produção da verdade quando, de certo modo, a verdade toma corpo no próprio corpo e na própria vida. A relação estabelecida entre o trabalho teórico e a prática de vida, no entanto, não anula a ligação existente entre particular e geral, ou seja, é justamente por colocar problemas e formular juízos a partir de seus questionamentos individuais que o intelectual pode mobilizar, com questões técnicas e locais, interrogações históricas e teorizações de caráter geral.

Ao deslocar a questão crítica do que nos é dado como universal e submetê-la ao que é contingente, ao recuperar o valor crítico do pensamento e da filosofia e questionar a verdade pelo próprio corpo, Foucault faz da crítica intelectual uma prática ética. As causas com as quais se ocupou em diferentes domínios, as lutas políticas nas quais se engajou de maneira descontínua e sobre pontos específicos são, segundo ele, “fragmentos autobiográficos” (FOUCAULT, 2014, p. 250) que não tiveram o esforço de desenvolver qualquer coerência, senão aquela de seu pensamento (como risco de si), ou mesmo aquela de sua própria vida, na qual cada um de seus livros reflete uma parte da sua história (FOUCAULT, 2017c). Sua coerência, segundo suas próprias palavras, é antes de natureza estratégica, pois sua luta por um ou outro fim se faz, de fato, por ser ela importante para ele mesmo, em sua subjetividade (FOUCAULT, 2014, p. 250). É justamente aí que, Foucault acreditava, pode-se buscar a chave da atitude política pessoal de um filósofo: “não em suas ideias, como se pudesse ser delas deduzida, mas sim em sua filosofia como vida, em sua vida filosófica, em seu êthos” (FOUCAULT, 2017b, p. 213). O que se põe em jogo na atitude política pessoal de Foucault, cujas verdades, Veyne diria (2011, p. 240), “não eram negociáveis”, é nada menos que o vínculo ético, forte e constituinte entre o dizer e o fazer — vínculo continuamente problematizado, e a cada passo confrontado com a própria posição de Foucault, por ele mesmo.

A interação entre teoria e prática e a associação entre o pensamento e a ação, ligadas de maneira ética na trajetória de Michel Foucault, não deixam de constituir, por certo, um gesto político. Muito embora não tenha se colocado, nas diferentes lutas em que se engajou, como “combatente universal” contra os sofrimentos gerais da humanidade (FOUCAULT, 2014, p. 250), o fundamento de verdade da atitude crítica de Foucault abriu possibilidades, na realidade e na história, de constituição e fomento de subjetividades da diferença e de mudanças sociais e políticas no exterior dos esquemas de poder. Assim que se vê marcar, na trajetória do filósofo, uma clara articulação entre duas práticas, das quais se poderia dizer incomensuráveis: a análise científica ou filosófica capaz de motivar intervenções políticas (VEYNE, 2011).

O retorno de Foucault aos gregos, e especialmente o que ele vai buscar nos cínicos, seu traço fundamental, faz perfurar o domínio meramente especulativo e doutrinal da filosofia. À vista do caráter combativo, militante e revolucionário dos modos de vida cínicos, ele reabilita o sentido originariamente prático da filosofia — que, mediante a prática da parrhesia, consiste na invenção e no sustento de modos de operar sobre si mesmo, de exercer um trabalho sobre si mesmo para uma transformação possível, para dar forma a uma maneira de fazer, a um modo de se conduzir, a um modo de existir — “pela força que eles [os cínicos] têm para se inscrever crítica e devastadoramente na tradição de como deve ser vivida uma vida filosófica” (KOHAN, 2012, p. 168).

4. À GUISA DE CONCLUSÃO

Diferentemente de uma abordagem que privilegiasse estritamente o comentário ou a análise interna da obra foucaultiana, o que mobilizou a presença de Michel Foucault nesse texto foi o desejo de explorar, filosoficamente, algo da complexidade pulsante entre sua pessoa e seu pensamento, a partir da reunião de rastros de sua palavra, de diferentes vozes a seu respeito, de sua filosofia em atividade. Os movimentos aqui arriscados dispõem algo dos fios por meio dos quais se relacionam e se acenam acontecimentos de linguagem, a trajetória de uma vida e sua inscrição histórica, a invenção de uma vida filosófica. Nesse sentido, o que aqui esteve em jogo foi certamente menos um estudo “filológico” do que uma aproximação não “desencarnada” da filosofia de Foucault.

Por um momento, hesitamos em fazer isso um tanto à revelia das claras investidas do filósofo contra a noção de autor e de sua franca recusa a levar em conta, ele próprio, aspectos biográficos, e mesmo o contexto social e cultural hodiernos aos autores dos quais falava. Logo em seguida, no entanto, essa que estivemos a imaginar como uma espécie de infidelidade à própria tentativa de abstração de Foucault (e ao seu intento de fazer falar os autores como puros sujeitos falantes) de certo modo se apequenou diante do legado de seus últimos cursos, cujo ensino restitui, como problema e promessa, a força das formas, dos modos e dos estilos de vida na tessitura mesma da filosofia e sua história, a questão complicada e instigante da vida filosófica, no cerne da própria vida da filosofia, das filosofias.

Eis que esta escrita despontou e conclui-se como uma forma de elogio ao “estilo Foucault” e aos efeitos da prática de estudar Foucault, e das possibilidades que com ele se abrem para o campo educacional, para o pensamento e a prática filosófica que o contempla, germina, confronta (problematiza). Desde o legado de seus últimos cursos, são instigantes as possibilidades de reflexão que se abrem “a respeito dos métodos, dos conhecimentos e dos exercícios necessários para impulsionar uma dinâmica formativa direcionada ao dizer-fazer ético” (FREITAS, 2013, p. 332). Trata-se, por fim, de convidar o pensamento a acolher as pistas e a dispor das ferramentas (filosóficas, pedagógicas, metodológicas) deixadas por Michel Foucault em torno das temáticas da parrhesia e do cuidado, não de modo isolado em sua obra, mas, sobretudo, por meio dos vestígios da irrupção e atitude de um corpo: esse lugar no mundo através do qual todos e cada um de nós falamos, atuamos, somos videntes e visíveis, lutamos.

Além de parecer incorporar, em suas análises, modos antigos de praticar a experiência da filosofia (FREITAS, 2013), Foucault, parece, moveu-se pela vida manifestando algo da qualidade de uma presença que há muito tempo precedera-o. Algo ao modo do “outro” que ele finalmente verá se delinear na vida filosófica dos antigos: o outro que escuta, que incentiva a falar, e que fala, ele próprio, sem se furtar e arriscadamente. E que, igualmente, interroga, interpela, descreve e desvela o que a desatenção dos homens não pode perceber, na singularidade das situações, das conjunturas e dos indivíduos. Outro que sacode, agita, incita a uma experiência outra do pensamento e da palavra, a um exercício de vida. Que risco supõe sonhá-lo entre nós, e à linha feiticeira por via da qual costura a si mesmo e sua prática filosófica, na trilha aberta por vidas filosóficas como as de Sócrates, dos cínicos, dos heróis filosóficos de tempos idos e quaisquer, cujo estilo da existência Foucault traceja, atesta, enuncia?

Seja como for, resta a urgência (e a exigência) de enfrentar que os caminhos que assumimos, as vidas que vivemos e as lutas que afrontamos têm sempre a ver com a linguagem, com a complexidade da relação entre palavras e coisas, não são alheios aos discursos, às práticas discursivas ou não, sempre associadas a relações de poder e a modos de constituição de sujeitos individuais e sociais (FISCHER, 2012). Quer se trate de interrogar relações de poder, de identificar as forças que atravessam nosso presente ou de fitar uns aos outros sem temer encarar um só tremor da alteridade, nossa existência e realidade, em todo caso plural e imprecisa, obriga a filosofia ao infinito da tarefa, num processo movido pela busca da diferença, seja para nós mesmos, seja para o que existe fora de nós. A tarefa do dizer verdadeiro na forma da parrhesia filosófica aprendemos com Foucault, com as vidas filosóficas que ele atualiza e a “filosofia feita vida” (KOHAN, 2012, p. 168) que o precede e anima; “é um trabalho interminável” que se deve respeitar e perseguir em sua complexidade, e sempre.

2Por meio do GIP, por exemplo, o Groupe d’information sur les prisons, criado no início de 1971, em Paris, após a dissolução da Gauche Prolétarienne, em maio de 1970, pelo ministro do interior Raymond Marcellin. Ao lado de Jean-Marie Domenach e Pierre Vidal-Naquet, Michel Foucault anuncia a criação do GIP em uma coletiva de imprensa em fevereiro de 1971. Ao longo de sua atividade (o GIP decide por sua dissolução em dezembro de 1972), aderem ao movimento nomes como Gilles Deleuze, Daniel Defert, Jean-Pierre Faye, Jacques Donzelot, entre outros. Além das ações voltadas às prisões, o grupo se mobilizou também em torno de casos de repressão e racismo.

3De acordo com Philippe Artières na introdução de Le beau danger, transcrição referente à conversa no outono de 1968 entre Michel Foucault e o então crítico literário da revista Arts, Claude Bonnefoy, é justamente nesse momento (nessa conversa) que Foucault teria praticado uma fala autobiográfica, até então inédita. Ao final dessa experiência, Foucault se diz “transformado e feliz por ter conseguido inventar um novo tipo de discurso: nem uma mera conversa, nem uma ‘espécie de monólogo lírico’” (ARTIÈRES, 2016, p. 25).

4 Foucault (2016, p. 68) declara situar-se ao lado dos escreventes, daqueles cuja escrita se destina a “manifestar fora dela própria alguma coisa que, sem ela, teria permanecido se não oculta, ao menos invisível”. Ele se diz escrevente, em vez de escritor, utilizando a distinção feita por Roland Barthes no ensaio Écrivains et Écrivants, publicado originalmente na revista Arguments, em 1960.

Revisão gramatical realizada por: Ana Maria Marson

E-mail: ana_marson@yahoo.com.br

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Recebido: 19 de Junho de 2020; Aceito: 20 de Janeiro de 2021

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