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INTRODUÇÃO
O turismo, atualmente, assume um papel relevante na economia em nível mundial, fortalecendo a competitividade dos destinos (ESTEVÃO; NUNES, 2015). Esta significativa representatividade da atividade turística justifica o investimento de recursos públicos na construção de infraestrutura adequada, que tem como objetivo atrair visitantes e tornar o destino mais competitivo (WEBSTER; IVANOV, 2014).
Para a Organização Mundial do Turismo ([OMT], 1994, p. 25), “o turismo compreende as atividades que realizam as pessoas durante suas viagens e estadas em lugares diferentes ao seu entorno habitual, por um período consecutivo inferior a um ano, com finalidade de lazer, negócio ou outras”.
Em diversos países, o turismo é considerado como determinante no processo de geração de empregos do setor de serviços, destacando-se as empresas ligadas aos meios de hospedagem, agências e operadores de viagens, alimentos, bebidas e transportes. A importância do turismo, enquanto atividade econômica, assim como o seu caráter multidimensional, tem recebido maior atenção por parte da academia e de instituições governamentais (ANDRIA; DI TOLLO; PESENTI, 2015). Nesse sentido, Olviedo-García (2016) explica que o turismo é por si uma área de pesquisa interdisciplinar no âmbito das ciências sociais aplicadas. Esta característica permite que o fenômeno adquira diferentes conceituações e metodologias de pesquisa, resultando em novos conhecimentos sobre a atividade.
Considerando que os destinos turísticos cada vez mais têm investido na oferta de serviços baseados em excelência, o gestor de turismo torna-se protagonista no processo de planejamento e execução de projetos que contribuam para o desenvolvimento de diversas localidades turísticas. Além disso, Silva, Holanda e Leal (2018) ressaltam o potencial da atividade turística para gerar empregos, bem como a necessidade de profissionais qualificados para atuarem no setor, levando diversas Instituições de Ensino Superior a investirem na criação de Cursos Superiores de Turismo (bacharelados e tecnólogos). Dentre essas instituições, destacam-se diversas universidades e institutos federais, fato observado em suas pesquisas que apontam para o iminente crescimento dos Cursos Superiores em Turismo no início deste século (SILVEIRA; MEDAGLIA; NAKATANI, 2020).
Com a expansão da Rede Federal de Ensino e a necessidade de se investir em cursos de formação de nível técnico e superior, o Instituto Federal Farroupilha, localizado no estado do Rio Grande do Sul, também investiu em cursos da área de Turismo, Hospitalidade e Lazer, apostando na verticalização do ensino oferecendo cursos técnicos integrados, subsequentes e tecnólogos nesta área de formação.
Dessa maneira, o Instituto Federal Farroupilha busca cumprir com um dos princípios para o qual foi criado, o de promover o desenvolvimento regional por meio da implantação de cursos com vistas às necessidades locais e regionais. Conforme esclarece Pacheco (2011, p. 23), os Institutos Federais devem “explorar as potencialidades de desenvolvimento, a vocação produtiva de seu lócus, a geração e transferência de tecnologias e conhecimentos e a inserção, nesse espaço da mão de obra qualificada”.
No âmbito do Curso Superior de Tecnologia em Gestão de Turismo, oferecido pelo Instituto Federal Farroupilha, as pesquisas de Lunardi et al. (2017) apontam que este se encontra adaptado às políticas nacionais de ensino técnico voltadas para o turismo, assim como para as exigências do mercado de trabalho, no momento em que absorve os egressos do curso.
Considerando a necessidade de avaliar e refletir sobre a estrutura organizativa, bem como as práticas pedagógicas desenvolvidas no Curso Superior de Tecnologia em Gestão de Turismo do Instituto Federal Farroupilha, com vistas à qualificação dos egressos, à sua inserção no mundo do trabalho e a adequação aos preceitos da Educação Profissional, os autores deste artigo, atuantes direta e indiretamente junto ao eixo de Turismo, Hospitalidade e Lazer, sentiram a necessidade de avaliar o Curso Superior de Tecnologia em Gestão de Turismo do IFFar, a partir dos resultados de uma pesquisa desenvolvida pelo Grupo de Pesquisa “Emancipação sem Fronteiras – formação inicial e continuada de professores”. Este grupo tem desenvolvido nos últimos anos pesquisas centradas na avaliação e na reflexão sobre as práticas de formação em cursos de ensino médio integrado, licenciaturas e tecnólogos no espaço dos Institutos Federais de Educação.
Tem-se neste artigo, as reflexões desenvolvidas numa primeira etapa, que demarca a análise do Curso Superior de Tecnologia em Gestão de Turismo, onde foi verificado como o princípio da integração curricular se faz presente no Projeto Pedagógico do Curso (PPC) mencionado. Trata-se de uma pesquisa exploratória documental em que se procurou identificar e compreender quais as concepções de currículo integrado se fazem presentes na estrutura organizativa do PPC, considerando que esse é o documento base que norteia a organização e as práticas desenvolvidas dentro do curso supracitado.
Este artigo encontra-se dividido em cinco partes: a primeira, corresponde à introdução, contextualizando a temática da pesquisa e apresentando o objetivo geral do trabalho; a segunda, trata da fundamentação teórica, estruturada a partir dos constructos: Perfil do egresso do curso estudado; e Integração curricular; a terceira parte do trabalho, descreve a metodologia utilizada; na quarta parte, são apresentados os resultados e a discussão acerca das principais contribuições da pesquisa; e, finalmente, a última parte, onde são tecidas as considerações finais, limitações do trabalho e as sugestões de pesquisas futuras.
2 O PROFISSIONAL DE TURISMO E A PERSPECTIVA DA FORMAÇÃO HUMANA E INTEGRAL NO ESPAÇO DOS INSTITUTOS FEDERAIS DE EDUCAÇÃO
A partir das transformações mercadológicas identificadas nas décadas de 1960 e 1970, observou-se no Brasil um significativo crescimento das atividades atreladas ao turismo, trazendo discussões sobre o perfil dos profissionais deste setor para o centro dos diálogos (SILVA; MOTA, 2013). Pimentel e De Paula (2014) revelam que o iminente crescimento do setor também contribui para o incremento da procura pela formação específica em turismo, seja ela em nível técnico, tecnológico ou superior. Ou seja, o crescimento da atividade turística no Brasil impulsiona a necessidade de profissionais qualificados que possam atuar no segmento, oferecendo as habilidades e competências que o mercado exige (SILVA; MOTA, 2013). Para estas autoras, capacidade de adaptação, flexibilidade e dinamismo são características determinantes para os profissionais que desejam trabalhar no setor de turismo.
O segmento turístico oferece ao turismólogo um leque de opções para que ele se insira no mercado de trabalho. Este profissional adquire durante o seu processo de formação, competências para atuar em grandes áreas, tais como: planejamento, agenciamento, alimentos e bebidas, hotelaria, eventos, lazer e recreação, transportes, ecoturismo, docência entre outros. Esta possibilidade de inserção profissional em diversas áreas possui ligação direta com o que a literatura chama de multidisciplinaridade do turismo (SILVEIRA; MEDAGLIA; NAKATANI, 2020).
Marques, Darn e Imamura (2018) destacam que o profissional do turismo é um produto oriundo de um complexo contexto de mudanças tecnológicas e organizacionais. Afirmam que as características atuais dos profissionais pertencentes a este segmento, com que a profissão seja discutida com maior rigor científico, analisando o seu papel por meio das perspectivas sociais, culturais e mercadológicas.
Conforme exposto no Catálogo Nacional de Cursos Superiores de Tecnologia (BRASIL, 2010), a perspectiva de atuação do Tecnólogo em Gestão de Turismo se dá no planejamento e desenvolvimento da atividade turística nos segmentos público e privado. No desenvolvimento de ações no âmbito do planejamento turístico, agenciamento de viagens, transportadoras turísticas e consultorias voltadas para o gerenciamento das políticas públicas e para a comercialização e promoção dos serviços relativos à atividade. Esses profissionais, ainda podem atuar na identificação dos potenciais turísticos do receptivo, considerando a diversidade cultural e os aspectos socioambientais para o desenvolvimento local e regional. Assim, pode-se considerar que a formação esperada para estes profissionais tenha um caráter multidisciplinar e que o perfil previsto do Tecnólogo em Gestão de Turismo seja amplo visto o grande espectro de atuação. Por outro lado, a formação dos Tecnólogos em Gestão de Turismo dentro dos Institutos Federais de Educação denota a necessidade de identificação dos profissionais em formação com os princípios da Educação Profissional e Tecnológica, interferindo diretamente no perfil profissional do egresso.
Considerando-se que os Institutos Federais de Educação são estruturas de ensino que estão organizadas com base em alguns princípios, os quais orientam as práticas desenvolvidas no seu espaço de formação independente do nível ou modalidade de ensino, há que se considerar que o profissional formado nestas instituições de ensino tenha especificidades em sua formação que refletem a identidade destas instituições de ensino e a sua identificação com a Educação Profissional e Tecnológica. Em relação à formação de uma identidade própria o Plano de Desenvolvimento Institucional (PDI) do Instituto Federal Farroupilha sinaliza que a instituição está organizada na perspectiva de efetivar
[...] um espaço de construção do conhecimento, de socialização e de crescimento individual e coletivo, respeitando as diferenças, sem desconsiderar os conhecimentos, valores e cultura prévios dos atores desenvolvidos no processo educacional. Para tal, os cursos serão capazes de construir saberes, gerar resultados, tanto na educação básica integrada, como nos técnicos subsequentes, cursos superiores e de pós-graduação, tendo o empreendedorismo e a sustentabilidade como base para a atuação da instituição
A constituição da identidade no Instituto Federal Farroupilha perpassa pela “formação humana e integral, a partir de um currículo integrado que requer articular, dinamicamente, trabalho/ensino, prática/teoria, ensino/pesquisa, ensino/extensão e comunidade, fortalecendo as relações entre trabalho e ensino”, entre os problemas e suas hipóteses de solução e tendo como pano de fundo as características socioculturais do meio em que este processo se desenvolve (INSTITUTO FEDERAL FARROUPILHA, 2014, p. 51).
Sobre a concepção de formação humana e integral, o Documento Base da Educação Profissional Técnica de Nível Médio Integrada ao Ensino Médio (BRASIL, 2007, p. 41), sinaliza que “o que se quer com a concepção de educação integrada é que a educação geral se torne parte inseparável da educação profissional em todos os campos onde se dá a preparação para o trabalho”: seja nos processos produtivos ou educativos, como a formação inicial, o ensino técnico, tecnológico ou superior. Essa indissociabilidade entre a educação geral e a educação profissional perpassa pelo enfoque do trabalho como princípio educativo com a perspectiva de superação entre a dicotomia trabalho manual/trabalho intelectual, de incorporar a dimensão intelectual ao trabalho produtivo, de formar trabalhadores capazes de atuar como dirigentes e cidadãos (BRASIL, 2007, p. 41).
Nesse sentido, Ramos (2007) explica que a formação humana e integral pode ser expressa em um primeiro sentido (filosófico) com base na integração de todas as dimensões da vida no processo formativo. Segundo a autora, esse sentido pode orientar tanto a educação básica como a educação superior, possibilitando a formação omnilateral dos sujeitos, pois implica a integração das dimensões trabalho, ciência e cultura que estruturam a prática social.
Para a autora, o trabalho pode ser compreendido como: a realização humana inerente ao ser (sentido ontológico) e como a prática econômica (sentido histórico associado ao respectivo modo de produção); a ciência compreendida como os conhecimentos produzidos pela humanidade que possibilita o contraditório avanço produtivo; e a cultura, que corresponde aos valores éticos e estéticos que orientam as normas de conduta de uma sociedade
(RAMOS, 2007, p.3).
Considerando a perspectiva de Ramos (2007), de que a formação humana e integral deva orientar tanto a Educação Básica como o Ensino Superior e que os Institutos Federais de Educação se constituem em espaços próprios de formação integral, resta discutir e refletir sobre os processos e práticas pedagógicas desenvolvidos nesses espaços a partir da perspectiva de um ensino que também seja integrado.
Araújo e Frigotto (2015) ao discutirem sobre as práticas pedagógicas decorrentes do ensino integrado sinalizam que este deve ser visto como
[...] um projeto que traz um conteúdo político-pedagógico engajado, comprometido com o desenvolvimento de ações formativas integradoras (em oposição às práticas fragmentadoras do saber), capazes de promover a autonomia e ampliar os horizontes (a liberdade) dos sujeitos das práticas pedagógicas
(ARAUJO; FRIGOTTO, 2015, p. 63).
Entretanto, possivelmente que, do ponto de vista da organização das estruturas educativas e do desenvolvimento das práticas pedagógicas, a concepção de ensino
integrado seja vista tão somente a partir da perspectiva da organização das disciplinas e dos conteúdos escolares, e não, a partir de um sentido mais amplo com vistas a formação omnilateral dos sujeitos. Nesse contexto, como explicam Araújo e Frigotto (2015, p. 65) “em geral, o ensino integrado tem sido compreendido apenas como estratégia de organização dos conteúdos escolares, sem relevar ao conteúdo ético-político transformador da proposta ou da materialidade de sua operacionalização”.
No que se refere à utilidade dos conteúdos escolares e a relação esperada com vistas a uma efetiva integração, ainda no mesmo artigo, os autores mencionam que
[...] a utilidade dos conteúdos passa a ser concebida não na perspectiva imediata do mercado, mas tendo como referência a utilidade social, ou seja, os conteúdos são selecionados e organizados na medida de sua possibilidade de promover comportamentos que promovam o ser humano e instrumentalizem o reconhecimento da essência da sociedade e a sua transformação. Procura-se, com isto, formar o indivíduo em suas múltiplas capacidades: de trabalhar, de viver coletivamente e agir autonomamente sobre a realidade, contribuindo para a construção de uma sociabilidade de fraternidade e de justiça social
(ARAUJO; FIGOTTO, 2015, p. 68).
Freire (1987) estabelece uma relação entre a educação formal e os conteúdos escolares com vistas a sua problematização para a formação de uma consciência crítica.
A educação que se impõe aos que verdadeiramente se comprometem com a libertação não pode fundar-se numa compreensão dos homens como seres “vazios” a quem o mundo encha de “conteúdos”; não pode basear-se numa consciência especializada, mecanicamente compartimentada, mas nos homens como “corpos conscientes” e na consciência como consciência intencionada ao mundo. Não pode ser a do depósito de conteúdos, mas a da problematização dos homens e suas relações com o mundo
(FREIRE, 1987, p. 37).
Ademais, Araújo e Frigotto (2015) ensinam que a organização de um currículo integrado requer alguns princípios orientadores, quais sejam, a contextualização, a interdisciplinaridade e a transformação social que se encontram em consonância com a perspectiva da utilidade dos conteúdos escolares. Assim:
A contextualização trata da articulação dos conteúdos formativos com a realidade social e com os projetos políticos dos trabalhadores e de suas organizações sociais.
A interdisciplinaridade pode ser compreendida como a exploração das potencialidades de cada ciência, da compreensão dos seus limites, como o princípio da diversidade e da criatividade.
O compromisso com a transformação social revela a teleologia do projeto de ensino integrado, ou seja, é esse o princípio que distingue a práxis marxista da filosofia pragmática que busca vincular os processos formativos com demandas imediatas e pontuais (ARAÚJO; FRIGOTTO, 2015).
Tendo como referência as ideias de contextualização, interdisciplinaridade e teleologia, se pode, então, propor estratégias de organização dos conteúdos na perspectiva do ensino integrado, conforme preconizam Araújo e Frigotto (2015).
Finalmente, considerando ainda a organização do trabalho pedagógico frente ao ensino integrado, cabe refletir sobre a postura e o papel do professor neste contexto. Carvalho (2020) sinaliza para a possibilidade e o exercício da docência compartilhada como prática pedagógica no sentido de compor o ensino integrado. Desta forma, defende que
[...] práticas pedagógicas que priorizem o trabalho coletivo, ao invés do trabalho individual devem, portanto, ser valorizadas, sem que isso signifique o abandono de estratégias de ensino e de aprendizagem individualizadas. Neste caso, entretanto, estas devem ser compreendidas como momentos intermediários para o trabalho coletivo de ensinar e de aprender
(CARVALHO, 2015, p. 75).
Considerando a natureza e o objetivo deste estudo, assume-se, assim como Pacheco (2011), a postura de que o trabalho dos Institutos Federais de Educação não se resume à pluralidade de cursos e de currículos e, sim, a distinção pela proposição de um projeto pedagógico que contemple, além dos diferentes cursos e níveis de formações, também os nexos possíveis entre diferentes campos do saber. A esse processo, deve estar integrada a “inovação na abordagem das metodologias e práticas pedagógicas, com o objetivo de contribuir para a superação da cisão entre ciência-tecnologia-cultura-trabalho e teoria- prática ou, mesmo, o tratamento fragmentado do conhecimento” (PACHECO, 2011, p. 66).
3 CAMINHOS METODOLÓGICOS
Este estudo tem por caráter o de ser uma pesquisa exploratória e documental. O documento analisado do Projeto Pedagógico do Curso Tecnólogo em Gestão de Turismo do Instituto Federal Farroupilha, localizado no Campus de São Borja e que se encontra disponível no site da instituição.
Os dados coletados no Projeto Pedagógico do Curso estão relacionados com os aspectos em que se compreendeu ou se esperava encontrar elementos ou traços que tenham relação com o currículo integrado, quais sejam:
Objetivos e Perfil Profissional do Egresso.
Metodologia de trabalho.
Organização curricular.
Prática Profissional Integrada (PPI).
Políticas de ensino, pesquisa e extensão.
As informações coletadas por intermédio do Projeto Pedagógico foram analisadas à luz do referencial teórico adotado, em que se procurou evidenciar os aspectos e as concepções relacionadas ao currículo integrado presentes no itinerário formativo dos egressos dos cursos analisados.
A seguir serão descritos os principais resultados evidenciados com esta pesquisa.
4 CONCEPÇÕES DE CURRÍCULO INTEGRADO PRESENTES NO PROJETO PEDAGÓGICO DO CURSO SUPERIOR EM TECNOLOGIA DE GESTÃO DE TURISMO
Os quadros de 1 a 5 apresentam os excertos extraídos do Projeto Pedagógico do Curso Superior de Tecnologia em Gestão de Turismo que foram organizados de forma sintética, com a finalidade de facilitar a observação e a identificação dos elementos relativos ao ensino integrado presentes no documento analisado.
Quadro 1 Objetivos e perfil profissional do egresso
| Aspectos observado | Excerto do texto (Fonte PPC em Gestão de Turismo) |
Observação |
|---|---|---|
| Objetivos geral e específicos | [...] à preservação do meio ambiente e do patrimônio cultural, divulgando e valorizando a cultura e os costumes da região, de modo a estimular o desenvolvimento local e regional (p.10). | De maneira geral, os objetivos estão focados no desenvolvimento da atividade fim/específica relacionada com a área de formação. Não foram evidenciados excertos específicos relacionados a integração curricular. Porém no objetivo geral e em alguns objetivos específicos percebem-se traços relacionados à imersão dos sujeitos na realidade regional promovendo possíveis transformações sociais. Essas transformações sociais ocorrem na medida em que os egressos devam ser capazes de estimular o desenvolvimento local e regional preservando o meio ambiente e o patrimônio cultural, divulgando e valorizando a cultura. Neste sentido, a cultura foi colocada com um vetor responsável pela promoção da transformação social por meio das ações dos egressos do curso. |
| Perfil profissional | • Atuar no planejamento e gestão do turismo nos segmentos público e privado,promovendo a articulação entre os diferentes agentes locais, regionais e internacionais da área; • Operacionalizar o processo de produçãodos serviços de agenciamento de viagens, receptivo, emissivo e operadores de turismo, desenvolvendo ações interligadascom os transportes turísticos e a produção de roteiros turísticos, sempre pautando pelo desenvolvimento sustentável da atividade; • Promover a integralização do conhecimento fomentando o desenvolvimento de ações inovadoras na área do turismo, incentivando o espírito empreendedo repromovendo a comercialização e promoção dos serviços turísticos. |
Dos seis aspectos mencionados na composição do perfil proposto para o profissional Gestor de Turismo formado no IFFar, observou-se que três apresentam elementos relacionados a integração curricular. Nestes casos, identificou-se que o foco da integração está voltado para: a articulação entre os agentes/sujeitos da área; a promoção de ações interligadas no espaço de atuação e, finalmente, a integração do conhecimento. |
Fonte: Dados da pesquisa
Quadro 2 Objetivos e perfil profissional do egresso
| Excerto do texto (Fonte PPC em Gestão de Turismo) |
Observação |
|---|---|
| [..] buscar-se-á assegurar os princípios curriculares da flexibilidade, contextualização, interdisciplinaridade e que contemple fundamentos científicos, tecnológicos e a prática profissional, desenvolvendo no profissional a capacidade de engajar-se em equipes interdisciplinares para construção e produção de conhecimentos articulados às realidades sociais (p. 23). [...] considera de extrema importância a integração das áreas de ensino, pesquisa e extensão juntamente com os componentes curriculares propostos na matriz. Os componentes curriculares serão implementados tendo como concepção metodológica o alinhamento da teoria com a prática (p.24). [...] projetos de pesquisas tendo como objeto de estudo a atividade turística serão desenvolvidos juntamente pelos docentes do curso (p. 24). [...] as Práticas Profissionais Integradas serão realizadas semestralmente envolvendo os componentes curriculares específicos (p. 24). |
No primeiro excerto, evidenciam-se princípios pedagógicos relacionados à organização do currículo integrado, tais como a flexibilidade, a contextualização e a interdisciplinaridade. Também se evidencia a presença do trabalho em equipe numa perspectiva interdisciplinar. No segundo excerto, evidencia-se a intensão em promover a integração curricular por meio da articulação entre o ensino, a pesquisa e a extensão. Também é mencionada a integração teoria e prática. No terceiro excerto, evidencia-se a concepção de docência compartilhada ou trabalho coletivo com foco em projetos de pesquisa e não propriamente no espaço do ensino, tendo a pesquisa como princípio pedagógico, por exemplo. No quarto excerto, evidencia-se que as práticas profissionais se dão pela aproximação/envolvimento ou sobreposição de componentes curriculares. |
Fonte: Dados da pesquisa
Quadro 3 Organização curricular
| Excerto do texto (Fonte PPC em Gestão de Turismo) |
Observação |
|---|---|
| A concepção do currículo do curso tem como premissa a articulação entre a formação acadêmica e o mundo do trabalho, possibilitando a articulação entre os conhecimentos construídos nas diferentes disciplinas do curso com a prática real de trabalho, propiciando a flexibilização curricular e a ampliação do diálogo entre as diferentes áreas de formação (p. 24). O currículo [...] está organizando a partir de 04 (quatro) núcleos de formação, a saber: Núcleo Comum, Núcleo Articulador, Núcleo Específico e Núcleo Complementar, os quais são perpassados pela Prática Profissional (p. 25). |
No primeiro excerto, evidencia-se a Integração de conhecimentos gerais e específicos com vistas a totalidade. Ou seja, conforme Ramos (2007) nenhum conhecimento específico é definido como tal se não consideradas as finalidades e o contexto produtivo em que se aplicam (p. 13). No segundo excerto, evidencia-se que as práticas profissionais se dão pela aproximação/envolvimento ou sobreposição de componentes curriculares. |
Fonte: Dados da pesquisa
Quadro 4 Prática Profissional Integrada
| Excerto do texto (Fonte PPC em Gestão de Turismo) |
Observação |
|---|---|
| A prática profissional permeia todo o currículo do curso, desenvolvendo-se através da Prática Profissional Integrada e do estágio curricular supervisionado. Essa estratégia permite a constante integração teórica e prática e a interdisciplinaridade, assegurando a sólida formação dos estudantes (p.25). A Prática Profissional Integrada consiste em uma metodologia de ensino que visa assegurar um espaço/tempo no currículo que possibilite a articulação entre os conhecimentos construídos nas diferentes disciplinas do curso com a prática real de trabalho, propiciando a interdisciplinaridade e flexibilização curricular e a ampliação do diálogo entre as diferentes áreas de formação (p.30). A Prática Profissional Integrada desenvolve-se com vistas a atingir o perfil profissional do egresso, tendo como propósito integrar os componentes curriculares formativos, ultrapassando a visão curricular como conjuntos isolados de conhecimentos e práticas desarticuladas e favorecer a integração entre teoria e prática, trabalho manual e intelectual, formação específica e formação básica ao longo do processo formativo (p. 30). São objetivos específicos das Práticas Profissionais Integradas: II - Aproximar a formação dos estudantes com o mundo de trabalho; III - articular horizontalmente o conhecimento dos componentes curriculares envolvidos, oportunizando o espaçode discussão e espaço aberto para entre laçamento com outras disciplinas, de maneira que as demais disciplinas do curso também participem desse processo; V - Integrar verticalmente o currículo, proporcionando uma unidade em todo o curso, compreendendo uma sequência lógica e crescente complexidade de conhecimentos teóricos epráticos,emcontatocomaprática realdetrabalho;- Incentivar a produção e a inovação científico-tecnológica, esuas respectivas aplicações no mundo do trabalho, de acordocom as peculiaridades territoriais, econômicas e sociais em queocurso está inserido; VII - incentivar a pesquisa como princípio educativo; VIII - promover a interdisciplinaridade; IX - Promover a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão (p. 30). A PPI deve ser realizada por meio de estratégias de ensino que contextualizem a aplicabilidade dos conhecimentos construídos no decorrer do processo formativo (p. 30). |
De maneira geral, neste item se evidencia que tanto a PPI quanto o Estágio Curricular são espaços característicos e/ou naturais para a integração curricular por meio da prática profissional. Em relação a PPI, são mencionados aspectos como a relação teoria-prática, a interdisciplinaridade, a contextualização, a articulação entre conhecimentos das diferentes disciplinas, o trabalho como princípio educativo e a pesquisa como princípio pedagógico, também a verticalização dos conhecimentos o que sinaliza para aspectos relacionados a integração curricular presentes na Educação Profissional e Tecnológica. |
Fonte: Dados da pesquisa
Quadro 5 Políticas de ensino, pesquisa e extensão
| Excertos do texto (Fonte PPC em Gestão de Turismo) |
Observação |
|---|---|
| O ensino proporcionado pelo IF Farroupilha é oferecido por cursos e programas de formação inicial e continuada, de educação profissional técnica de nível médio e de educação superior de graduação e de pós-graduação, desenvolvidos articuladamente à pesquisa e à extensão, sendo o currículo fundamentado em bases filosóficas, epistemológicas, metodológicas, socioculturais e legais, expressas no seu projeto Político Pedagógico Institucional e norteadas pelos princípios da estética, da sensibilidade, da política, da igualdade, da ética, da identidade, da interdisciplinaridade, da contextualização, da flexibilidade e da educação como processo de formação na vida e para a vida, a partir de uma concepção de sociedade, trabalho, cultura, ciência, tecnologia e ser humano (p. 14). | Dentre os princípios propostos para as políticas de ensino, pesquisa e extensão, em relação a integração, evidenciam-se a interdisciplinaridade e a contextualização. |
Fonte: Dados da pesquisa
Considerando a sistematização dos aspectos analisados e dispostos em síntese nos quadros 1 a 5, foi possível pontuar dois elementos relativos à concepção de ensino integrado presente no PPC.
Em primeiro lugar, a partir da sistematização realizada no quadros 1, percebe-se, inicialmente, que o perfil profissional do egresso está orientado pela Resolução CNE/CES nº 013/2006 que institui as Diretrizes Curriculares Nacionais dos Cursos de Graduação na área de Turismo (BRASIL, 2006). Quanto aos objetivos do curso, estes estão organizados conforme as orientações do Catálogo Nacional de Cursos Superiores de Tecnologia (BRASIL, 2010).
Por outro lado, de maneira geral, ao observar os quadros 2, 3, 4 e 5, evidencia-se a presença de alguns princípios que se relacionam com à organização do currículo integrado, quais sejam: interdisciplinaridade e contextualização. Também, o trabalho como princípio educativo, a pesquisa como princípio pedagógico e, finalmente, a relação teoria/prática e parte/totalidade.
Apesar de mencionar os princípios no decorrer do PPC, em diferentes aspectos, estes refletem pouco no perfil do egresso e nos objetivos do curso. Isto é, se percebem poucas aproximações entre o que está posto no PPC em termos de perfil e de objetivos e os preceitos que orientam a integração curricular na Educação Profissional e Tecnológica (EPT) relacionados com a formação humana e integral.
Dos seis elementos que compõem o perfil profissional do egresso, apenas três deles mencionaram aspectos tais como: a articulação entre os agentes/sujeitos da área; a promoção de ações interligadas no espaço de atuação; e a integração do conhecimento. Dessa forma, compreende-se que o sentido da integração está posto a partir da aproximação entre os conhecimentos gerais e a área profissional (integração do conhecimento) e, também, a partir das estratégias de trabalho e atuação junto aos pares.
Em segundo lugar, observa-se que a Prática Profissional Integrada é o espaço próprio e especifico onde deve acontecer a integração. A PPI é entendida como uma estratégia ou metodologia de ensino e, nesse sentido, é ela que articula as disciplinas do currículo e, portanto, que proporciona a interdisciplinaridade. Ela proporciona o diálogo entre a teoria e prática nos diversos espaços de formação, incluindo o ensino, a pesquisa e a extensão.
Como se pode perceber, a Prática Profissional Integrada é a responsável por articular diversos elementos dentro do PPC e, como consequência desta articulação, tem-se o reflexo na construção do perfil do egresso, conforme mencionado no próprio documento.
Entretanto, a relação entre objetivos e perfil do egresso com princípios da EPT, praticamente, inexistem.
Em outro estudo, Tasca (2020, p. 94), ao realizar a análise de Projetos Pedagógicos de Cursos Técnicos Integrados do Instituto Federal Farroupilha, em relação à concepção de currículo integrado, sinalizou que a “Prática Profissional Integrada vem se tornando um lugar vazio no trabalho dos profissionais de educação e que essa lacuna se origina na compreensão precária do conceito de ensino integrado”.
Com base neste estudo e, nas observações advindas da análise do PPC Superior de Tecnologia em Gestão de Turismo, percebe-se que o entendimento de currículo integrado, ao que tudo indica, se aproxima da sobreposição/aproximação/articulação de disciplinas e conteúdos de formação geral e de formação específica, bem como a organização de estratégias e metodologias de ensino como a Prática Profissional Integrada.
Ao se resgatar o estudo de Carvalho (2020), que trata sobre as concepções de currículo integrado de professores de um Instituto Federal de Educação brasileiro, observa-se que as concepções de currículo integrado que foram identificadas na pesquisa referem-se a
[...] relacionar os componentes do curso (34,8%); integrar os conteúdos da formação geral com aplicabilidade na formação técnica (26%); articular as múltiplas áreas para que possam desenvolver habilidades técnicas e ser um humano crítico (17,4%); ter conteúdos que objetivam uma formação integral do sujeito (8,7%); e ainda a indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão (4,3%), dentre outros
(CARVALHO, 2020, p. 174).
Estes dados mostram uma aproximação com os sentidos e a compreensão presentes no PPC Superior de Tecnologia em Gestão de Turismo, mostrando que, ao que tudo indica, ser uma compreensão que extrapola os diferentes locais e níveis de formação dentro dos Institutos Federais de Educação. Percebe-se, ainda, no documento, a constante presença das palavras interdisciplinaridade e contextualização. Estas foram mencionadas dentro dos seguintes aspectos analisados e que compõe o PPC: metodologia do trabalho, PPI e nas políticas de ensino, pesquisa e extensão.
Entretanto, considerando a tríade contextualização-interdisciplinaridade- compromisso, com a transformação social proposta por Araújo e Frigotto (2015) como princípios de integração do currículo, percebe-se que a transformação social não é mencionada. Conforme os autores, a transformação social é proposta na perspectiva marxista e, nesse sentido, “a ação pedagógica é tomada como ação material, que subordina os conteúdos formativos aos objetivos de transformação social, visando à produção, portanto, da emancipação” (ARAUJO; FRIGOTO, 2015, p. 69).
O discurso exposto no PPC Superior de Tecnologia em Gestão de Turismo sinaliza quanto às formas de organização e a metodologia de trabalho como currículo, mas não direciona para a transformação social que promove a emancipação dos sujeitos, para a formação crítica e a inserção consciente no mundo do trabalho.
Carvalho (2020, p. 175) corrobora com este estudo ao questionar os professores que atuam na EPT sobre as estratégias utilizadas para promover a integração curricular. Isso, evidenciou: “aulas e atividades conjuntas para promoção da interdisciplinaridade (30,4%); visitas técnicas (13%); leituras específicas do curso técnico (13%); articulação de conteúdos da formação geral com técnica (13%); dentre outros”.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Considerando a necessidade de problematizar, discutir e compreender a concepção de educação integral e de ensino integrado que perpassa as estruturas dos cursos e as práticas pedagógicas no espaço dos Institutos Federais de Educação compreende-se como fundamental desenvolver trabalhos de pesquisa e análise voltados para o interior destas instituições de ensino com base nestas temáticas.
Os Institutos Federais de Educação são instituições relativamente novas no cenário educacional brasileiro, sua estrutura compreende diferentes níveis de ensino e atuação. Muito embora, as estruturas organizativas destas instituições, seus projetos pedagógicos, resoluções e documentos normatizadores estejam “até certo ponto” comprometidos com os preceitos e as concepções que norteiam a EPT, as práticas educativas estão em processo de construção e as reflexões sobre as mesmas são incipientes. Por isso, refletir sobre os princípios de organização e funcionamento, com vistas à compreensão do proposito e da função social dos Institutos Federais com vistas a consolidação das práticas e a criação de uma identidade própria é fundamental para a rede e, em especial ao curso tecnólogo aqui analisado.
No caso do Curso Superior de Tecnologia em Gestão de Turismo, evidenciou-se a perspectiva da verticalização do ensino e a presença das bases conceituais da EPT, entretanto, o estudo documental demonstra que a concepção de currículo integrado é pensada a partir de um espaço denominado de Prática Profissional Integrada que se constitui como uma metodologia responsável por articular os diferentes componentes curriculares, os conteúdos gerais e os profissionais, a teoria e a prática, o ensino, a pesquisa e a extensão.
Neste sentido, a análise documental sinaliza que a integração curricular não acontece de forma orgânica e natural, ou seja, embora anunciada em alguns excertos do projeto pedagógico, na organização curricular e até mesmo no perfil do egresso, a necessidade de criação de um espaço próprio e anunciado (Prática Profissional Integrada) para a efetivação da prática acaba sugerindo aos componentes curriculares envolvidos a responsabilização pelo processo e pelo desenvolvimento da integração curricular.
Ademais, a ideia de integração curricular associada a “metodologia de ensino que visa assegurar um espaço/tempo no currículo” sinaliza maior preocupação com as questões relacionadas com a organização e com a proposição de metodologias e estratégias visando o desenvolvimento da integração curricular do que propriamente com a reflexão sobre o que é a integração. Isto corrobora com o estudo de Carvalho (2020, p. 180), segundo o qual ainda há “a dificuldade de superar a dualidade entre a educação para o ‘fazer’ versus educação para o ‘pensar’”, mesmo que os estudos realizados enfocassem diferentes fontes de pesquisa e diferentes níveis de ensino.
Considera-se, então, que no espaço dos Institutos Federais há que se investir na cada vez mais na promoção de discussões que permitam reflexões e contribuam para a formação de uma identidade educacional própria que privilegie os princípios da EPT e que possibilitem a formação de profissionais mais qualificados para a atuação profissional.
