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ETD Educação Temática Digital

versão On-line ISSN 1676-2592

ETD - Educ. Temat. Digit. vol.24 no.3 Campinas jul./set 2022

https://doi.org/10.20396/etd.v24i3.8666606 

ARTIGO

A DIDÁTICA EM UM NOVO TEMPO: A PANDEMIA E ESTRATÉGIAS DE ENSINO-APRENDIZAGEM NA EDUCAÇÃO SUPERIOR

DIDACTIC IN THE NEW TIME: THE PANDEMY AND TEACHING-LEARNING STRATEGIES IN HIGHER EDUCATION

DIDÁCTICA EM UM NUEVO TIEMPO: ESTRATEGIAS DE ENSEÑANZAAPRENDIZAJE EN LA EDUCACIÓN SUPERIOR

Alessandra Maieski1 

Ana Lara Casagrande2 

Katia Morosov Alonso3 

1Mestre em Educação - Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT). Cuiabá, MT - Brasil. Doutoranda em Educação no Programa de Pós-graduação em Educação - Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT). Cuiabá, MT - Brasil. E-mail: alemaieski86@gmail.com

2Doutora em Educação - Universidade Estadual Júlio de Mesquita Filho (UNESP). Rio Claro, SP - Brasil. Professor Adjunto II - Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT). Cuiabá, MT - Brasil. E-mail:analaracg@gmail.com

3Doutora em Educação - Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT). Cuiabá, MT - Brasil. Professora titular da Universidade Federal de Mato Grosso. Docente do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE). Líder do Laboratório de Estudos sobre as Tecnologias da Informação e Comunicação na Educação (LêTECE). E-mail: katia.ufmt@gmail.com


RESUMO

Neste texto, cujo objeto de investigação são as estratégias de ensino-aprendizagem envolvendo tecnologias digitais na Educação Superior, apresenta-se um estudo qualitativo por meio de uma pesquisa Survey, da qual participaram estudantes da disciplina Didática, desenvolvida no ano de 2020, primeiro semestre, no âmbito de uma universidade pública federal. Ao abordar tal objeto, as discussões envolvem a tessitura de análises sobre a cultura digital, hiperconectividade, sociedade da informação e constituída em rede. Problematiza-se o potencial das tecnologias digitais para a educação, mas também a necessidade de reconhecer seus limites, evidenciados numa sociedade desigual como a brasileira. Ademais, são apresentados os resultados obtidos junto ao referido questionário, o qual é entremeado pelas reflexões sobre o processo de ensino-aprendizagem, considerando as especificidades da suspensão das atividades presenciais. Os resultados indicam um retorno positivo sobre a disciplina ministrada por meio do Ambiente Virtual de Aprendizagem e sua contribuição para a formação dos estudantes como licenciandos. A proposta que se realiza é a de construção de um novo paradigma educacional, com base em Moreira e Schlemmer (2020), bastante apropriado no sentido de transcender a presencialidade e resgatar uma formação alinhada com o atual tempo histórico, cultural e social.

PALAVRAS-CHAVE Didática; Educação Superior; Tecnologias Digitais; Estratégias educacionais

ABSTRACT

In this text, in which the object of investigation are the teaching-learning strategies involving digital technologies in Higher Education, a qualitative study is presented through a survey survey, in which students of the Didactics discipline, developed in 2020, participated. first semester, at the federal public university. When approaching this object, the discussions involve analyzes about digital culture, hyperconnectivity, information society and constituted in a network. The potential of digital technologies for education is problematized, but also the need to recognize their limits, evidenced in an unequal society such as Brazil. Furthermore, the results of a questionnaire are presented, interspersed with reflections on the teaching-learning process, considering the specificities of suspension of face-to-face activities. The results indicate a positive return on the composition of the discipline through the Virtual Learning Environment and its contribution to the formation of students as undergraduates. The proposal that is carried out is the construction of a new educational paradigm, based on Moreira and Schlemmer (2020), very appropriate in the sense of transcending the presence and rescuing an education aligned with the current historical, cultural and social time.

KEYWORDS Didactics; College education; Digital Technologies; Educational strategies

RESUMEN

En este texto, cuyo objeto de investigación son las estrategias de enseñanza-aprendizaje que involucran tecnologías digitales en la Educación Superior, se presenta un estudio cualitativo a través de una encuesta encuesta, en la que participaron estudiantes de la disciplina Didáctica, desarrollada en 2020, primer semestre., En el universidad pública federal. Al abordar este objeto, las discusiones involucran análisis sobre cultura digital, hiperconectividad, sociedad de la información y constituida en red. Se problematiza el potencial de las tecnologías digitales para la educación, pero también la necesidad de reconocer sus límites, evidenciada en una sociedad desigual como Brasil. Además, se presentan los resultados de un cuestionario, intercalados con reflexiones sobre el proceso de enseñanza-aprendizaje, considerando las especificidades de la suspensión de las actividades presenciales. Los resultados indican un retorno positivo en la composición de la disciplina a través del Ambiente Virtual de Aprendizaje y su contribución a la formación de los estudiantes como estudiantes de pregrado. La propuesta que se lleva a cabo es la construcción de un nuevo paradigma educativo, basado en Moreira y Schlemmer (2020), muy apropiado en el sentido de trascender la presencia y rescatar una educación alineada con el momento histórico, cultural y social actual.

PALAVRAS-CLAVE Didáctica; Educación universitária; Tecnologías digitales; Estrategias educacionales

1 INTRODUÇÃO

A educação vive, neste momento de enfrentamento da Pandemia de Covid-19, uma flexibilização curricular imposta devido à obrigatoriedade do distanciamento social, em que as aulas presenciais estão acontecendo, nas instituições públicas e privadas, de forma remota, mediadas pelas tecnologias digitais. É visível em todo esse contexto educacional a dificuldade e os rearranjos necessários a serem mobilizados pelos sujeitos ligados à formação docente, no sentido de ministrarem aulas no formato remoto, incorporando na sua prática didático- pedagógica artefatos tecnológicos e diversificando as estratégias de ensino-aprendizagem para adequação ao momento presente. O Parecer n° 05 do Conselho Nacional de Educação (CNE), de 28 de abril de 2020 (reexaminado pelo Parecer CNE/CP nº 9/2020), autorizou a oferta de atividades não presenciais em todas as etapas de ensino, desde a Educação Infantil à Educação Superior (BRASIL, 2020). É fundamental reconhecer essa novidade como um efetivo desafio para docentes dos cursos presenciais das instituições de Educação Superior. Ainda que vivamos em meio à cultura digital, a ausência do contato físico para conter a disseminação do vírus SARS-CoV-2 redimensionou o modo de dar continuidade ao processo de ensino-aprendizagem, bem como aguçou o olhar sobre o potencial das Tecnologias Digitais (TD) para a educação e instigou o questionamento sobre os seus limites.

Nessa perspectiva de intensas transformações e (re)adequações nos espaços educacionais, é mister promover discussões sobre esse cenário, com um olhar atento às práticas didático-pedagógicas voltadas para os processos de ensino-aprendizagem na Educação Superior, última etapa da educação escolar brasileira, segundo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (BRASIL, 1996, art. 21). É nesse esteio que este estudo segue, com o intuito de (re)pensar as estratégias de ensino-aprendizagem direcionadas à Educação Superior e que envolvem o acionamento intensificado das TD, não como meras ferramentas, mas como recursos/artefatos que contribuem para a construção do conhecimento de forma colaborativa entre os sujeitos partícipes da formação, que estão hiperconectados nas redes sociais e imersos na cultura digital. Para tanto, buscou-se respaldo em teóricos e pesquisadores que discutem essa temática, empregando como um dos métodos investigativos o levantamento bibliográfico, cuja vantagem reside em cobrir uma gama de fenômenos mais ampla (GIL, 2014). Compõe-se, então, um estudo qualitativo, uma pesquisa Survey, que busca refletir sobre o objeto de investigação, as estratégias de ensino-aprendizagem envolvendo TD na Educação Superior.

Este texto está organizado nesta introdução, seguido de seções que apresentam discussões voltadas para a questão do ensino-aprendizagem na etapa supracitada e que são complementares. A primeira seção apresenta entendimentos e reflexões sobre a cultura digital e a chamada educação em rede na sociedade da informação; na segunda seção, por meio de uma contextualização histórica, abordam-se compreensões sobre a Didática e o processo de ensino-aprendizagem; a terceira apresenta os procedimentos metodológicos da Pesquisa Survey realizada; e a quarta seção apresenta possibilidades de estratégias de ensino-aprendizagem no contexto educacional atual, nos quais as práticas didático-pedagógicas acontecem com mediação das TD, devido ao distanciamento social requerido. Por fim, nas considerações finais é apontada a urgência da ressignificação dessas práticas voltadas para processos de ensino-aprendizagem na Educação Superior.

2 DA CULTURA DIGITAL À EDUCAÇÃO EM REDE: ENTENDIMENTOS

As mudanças ocorridas nas últimas décadas na chamada sociedade da informação constituída em rede, cuja comunicação mediada por computadores gerou uma gama enorme de comunidades virtuais, como indicou Castells (2017), e, consequentemente, articulada com a emergência da Cultura Digital (GERE, 2008), acabam por trazer outras maneiras de constituição das relações sociais humanas, no âmbito cultural, histórico, político e econômico, cada vez mais mediadas pelas TD. Claro que a tecnologia por si só não é um indicativo que define essa cultura digital, mas é um dos elementos que contribuem para o seu desenvolvimento.

Por exemplo, Gere (2008) enxerga o desenvolvimento da Web 2.0 como “um espaço para colaboração e comunicação recíproca”, justificando essa afirmativa, pela velocidade com que as notícias se espalharam mundialmente, como a evidência de um mundo altamente interconectado pelas novas mídias e novas tecnologias, seja por meio de blogs, Wikis, podcasts, redes sociais, plataformas nas quais os usuários interagem em um espaço virtual tridimensional e compartilhado. Assim como aponta Sibília (2012, p. 101), ao abordar as relações conectadas: “a matéria-prima do discurso midiático é a informação e, a partir dela, a opinião”, de maneira que cada discurso é capaz de produzir e de se disseminar facilmente pelas redes.

No cenário dessa sociedade em rede, ao falar sobre o potencial da comunicação, Castells (2015) reflete sobre o surgimento de novos meios de comunicação, dentre ele as redes sociais, advertindo que a influência dessas plataformas extrapola as relações de amizade entre as pessoas; constituem-se também, por exemplo, como fonte de marketing, de e-commerce, de entretenimento, de educação e de organização de grupos de base política, já que as práticas sociais são fomentadas na virtualidade. Consequentemente, a internet ganhou o que o autor chama de poder da autocomunicação em massa, que resultou em um uso intenso e de grande influência dessas plataformas nos mais variados meios, cujos praticantes culturais incluem desde crianças até idosos, todos imersos nessa cultura digital.

Essas transformações acabam por influenciar o âmbito educacional, provocando o reconhecimento das potencialidades das tecnologias digitais no processo de ensino-aprendizagem. É possível tomar como exemplo estados que proibiam que estudantes fizessem uso do aparelho celular na escola, como o estado do Rio de Janeiro (por meio da Lei n°5.222, de 11 de abril de 20084 modificada e atualizada pela Lei n°5.453, de 26 de maio de 20095), que inicialmente vetou totalmente seu uso nas salas de aula das escolas públicas estaduais. No entanto, com a ampliação da discussão do potencial das TD para as aulas, tal decisão passou a não fazer sentido e foi incorporada a exceção para momentos em que houvesse finalidade pedagógica. Definitivamente, a educação foi confrontada a (re)pensar as relações pedagógicas estabelecidas na cultura digital dentro dos contextos escolares. Nesse sentido, Moran (2013, p.30) reconhece que “A chegada das tecnologias móveis à sala de aula traz tensões, novas possibilidades e grandes desafios”.

Sibília (2012) alerta, há certo tempo, que a sociedade da informação é hiperconectada por redes interativas e está cada vez mais presente no contexto educacional, transformando as relações sociais nos espaços e tempos virtuais, ultrapassando, assim, os muros da escola e aí estabelecendo-se, de maneira a contribuir para a construção de pontes entre docentes, estudantes e famílias. Vivencia-se essa realidade hoje nos espaços escolares no período pandêmico pelo qual o Brasil ainda passa, embora haja percalços a serem reconhecidos, quais sejam: conectividade suficiente para suportar a realização de atividades síncronas ou acessar arquivos mais robustos; falta de equipamentos (muitas vezes compartilhados entre pessoas de uma família), entre outros.

Na verdade, é importante destacar que esses empecilhos refletem a desigualdade social própria do país. Logo, o debate das TD nas escolas não deve desprezar a questão socioeconômica. Na Educação Superior, o que se viu foram os órgãos responsáveis pela formulação, implementação, gestão e acompanhamento de políticas institucionais no âmbito da assistência estudantil e de ações afirmativas lançarem editais para buscar minimizar tal problema. Não se aterá, pelos limites do texto, às considerações nesse sentido, o que não significa que sejam desconsideradas. O imprescindível neste momento é reconhecer que as TD promovem “[...] uma ruptura na ideia de tempo e espaço, assim como nas noções de ensino e de aprendizagem, que não podem se revelar mais apenas por meio de um texto escrito e sequencial” (COSTA, et al., 2021, p. 221).

Não são recentes as pesquisas acerca do uso das TD nos contextos educacionais, pelo contrário, há tempos, pesquisadores e teóricos chamam a atenção para a importância desses artefatos nas práticas didático-pedagógicas. É o caso de Moran (2013), que alertou para o fato de a transmissão de conteúdos depender cada vez menos dos docentes, devido ao vasto arsenal disponível de materiais digitais sobre qualquer assunto, no entanto, há um importante papel docente na definição de quais, quando e em que espaços esses conteúdos serão disponibilizados, bem como o delineamento dos objetivos e metodologias empreendidos relacionados a tais conteúdos.

A presença das TD se impôs e ganhou notoriedade no ano de 2020 (ano em que a Organização Mundial da Saúde declarou emergência em Saúde Pública de Importância Internacional) na educação, devido ao distanciamento social obrigatório imposto – entre outras medidas não farmacológicas, como lavagem das mãos, uso de máscaras faciais e limpeza de objetos e superfícies com álcool – devido ao surgimento da pandemia mundial Covid-19 (identificada pela primeira vez em Wuhan, na China, em 2019)6.

Como efeito desse distanciamento em âmbito educacional, as instituições escolares de modo geral, amparadas legalmente por portarias e resoluções, tiveram que reajustar seu modus operandi para que as atividades pedagógicas tivessem continuidade por meio do ensino remoto, isto é, para que não se estagnasse o processo de ensino-aprendizagem. O ensino remoto, também chamado de ensino remoto emergencial e flexibilização de componentes curriculares em caráter excepcional e temporário, obrigou os docentes a emergirem repentinamente em diferentes plataformas, exercendo papéis adicionais àqueles assumidos no ambiente de ensino-aprendizagem presencial, com o qual a maioria estava acostumada, face a face. Mesmo docentes que também já atuavam na modalidade Educação a Distância (EaD) precisaram rever seus métodos de ensino no que tange ao ensino presencial. Tal mudança envolveu a atuação desses profissionais como youtubers e editores, gravando videoaulas, assim como aprendendo a “utilizar sistemas de videoconferência, como o Skype, o Google Hangout ou o Zoom e plataformas de aprendizagem, como o Moodle, o Microsoft Teams ou o Google Classroom” (MOREIRA, et al., 2020, p. 352).

A adaptação metodológica em meio ao ensino remoto (emergencialmente estabelecido) adotado nos cursos presenciais foi permeada pelo equívoco de que se trataria de um sinônimo da EaD, o que não procede. Ainda que na EaD haja uso das TD, suas características fazem com que a modalidade guarde especificidades, por exemplo, na EaD, parte das atividades são realizadas não presencialmente, na plataforma Moodle predominantemente, mas há polos de apoio para o desenvolvimento de atividades pedagógicas presenciais e para que estudantes acessem biblioteca e laboratórios, há também a figura dos tutores e um programa específico de financiamento, no escopo da Universidade Aberta do Brasil (UAB), cujos pagamentos de bolsas, realizados por meio de editais, são gerenciados pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes).

No ensino remoto, por seu turno, há a possibilidade de uso de plataformas abertas e aplicativos, sendo que os recursos, as estratégias e as práticas são definidos a partir da familiaridade do docente com o ambiente (GARCIA et al., 2020; MOREIRA et al., 2020). Não se notou, assim, um padrão, mas uma adaptação das instituições de Educação Superior em consonância com as suas possibilidades e opção dos docentes. Algumas delas indicaram como requisito que apenas houvesse a comprovação das atividades desenvolvidas, o que favoreceu o uso de plataformas com recurso de gravação disponíveis.

Carece enfatizar que não se defende a aplicabilidade instrumental das TD, isto é, a concepção de educação e a visão do profissional sobre o processo de ensino-aprendizagem continuam tão imprescindíveis quanto sempre foram. As TD ultrapassam a perspectiva de transmissão de conteúdo. Nesse esteio, cumpre sair da fase de ensino remoto de emergência, de maneira que “urge agora criar modelos de aprendizagem virtuais que incorporem processos de desconstrução e que promovam ambientes de aprendizagem colaborativos e construtivistas nas plataformas escolhidas (MOREIRA et al., 2020, p. 352).

Para além do uso dos artefatos tecnológicos, nesse período pandêmico, intensificam-se outros processos baseados nas relações, interações, colaborações e compartilhamentos em rede, denominados de Educação Digital em Rede (MOREIRA, et al., 2021; COSTA, et al., 2021), que são fundamentais nesse período de distanciamento social, justamente pela característica de manutenção das relações por meio da conectividade. A compreensão da educação em rede requer o envolvimento profundo dos partícipes na definição dos objetivos e percursos de aprendizagem da comunidade e “nas relações de proximidade construídas nas colaborações entre pares que sustentam os processos de inovação e criação do novo conhecimento” (MOREIRA, et al., 2021, p. 355).

Nesse sentido, explorar as possibilidades e potencialidades do uso das TD na educação, nos processos de ensino-aprendizagem, é indispensável não apenas no período da pandemia, mas carece que seja dada sequência ao debate de sua prestabilidade para o desenvolvimento de competências sociais, culturais, intelectuais e tecnológicas na sociedade da informação, em rede, de modo a promover a formação humana de estudantes e docentes conectados, produtores dos saberes distribuídos em rede (COSTA et al., 2021; LOIO et al., 2020). Olhando especificamente para o momento da pandemia Covid-19, Moreira et al. (2021) afirmam que ela trouxe a necessidade de se problematizar a contemporaneidade frente às TD e às possibilidades do ensino-aprendizagem para além dos muros acadêmicos. Para Costa et al. (2021, p.223), as dúvidas de como isso deve ser feito precisam ser observadas a partir das modificações causadas pela cultura digital. Isso não será feito repentinamente.

A referência que se pode fazer, diante da abrupta adoção do ensino remoto, para a continuidade das atividades educacionais por meio das TD, é ao lançamento do Plano de Metas do Governo de Juscelino Kubitschek (1955-1960), com o projeto de desenvolvimento do país de cinquenta anos efetivados em cinco (CARVALHO, 2021). Comparando esse discurso para o progresso condensado do país à época desse governo com o uso das TD na educação, vemos que se avançou bastante em termos de estratégias de ensino-aprendizagem no período da pandemia, mas a falta de debate anterior, de lidar com essas questões na formação docente fez com que o processo fosse mais penoso do que, por ventura, poderia ter sido; considerando o que Moran (2013, p.31) anunciava sobre a escola e que estendemos às instituição da Educação Superior, de poder “transformar-se em um conjunto de espaços ricos de aprendizagens significativas, presenciais e digitais, que motivem os alunos a aprender ativamente, a pesquisar o tempo todo, a serem proativos, a saber tomar iniciativa e interagir”.

Uma coisa é certa, com a onipresença das tecnologias no dia a dia como artefato cultural e os sujeitos como praticantes culturais, imersos na cultura digital, os estudantes estão cada vez mais conectados, estabelecendo redes; portanto, ressignificar os processos educativos nas universidades se torna premente, por óbvio, sem deixar de lado a concepção de educação assumida e as demandas formativas a ela relacionadas (aqui se preconiza aquela que contribua para os processos emancipatórios da população), a autonomia universitária e a liberdade acadêmica (COSTA et al., 2021).

Numa conjuntura em que os estudantes são compreendidos enquanto praticantes culturais das TD, imersos na cultura digital de uma sociedade em rede, faz-se necessário pensar a Didática na Educação Superior com uma nova representação dos sujeitos sociais atuantes dentro e fora da sala de aula (COSTA et al., 2021). Nesse sentido, cumpre refletir sobre as possibilidades das TD para a prática pedagógica docente, o que perpassa as estratégias de ensino-aprendizagem, como notar-se-á.

3 DIDÁTICA E O PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM NO TEMPO PRESENTE

A Didática pode ser entendida de modo ampliado, dado que se ocupa do fenômeno educativo. Segundo Libâneo (2013), ela se incumbe da investigação dos fundamentos, condições e modos de realização da instrução e do ensino. Assim, o autor afirma, à Didática “cabe converter os objetivos sociopolíticos e pedagógicos em objetivos de ensino, selecionar conteúdos e métodos em função desses objetivos, estabelecer os vínculos entre ensino e aprendizagem, tendo em vista o desenvolvimento das capacidades mentais dos alunos” (LIBÂNEO, 2013, p.25). Atentando para as discussões empreendidas sobre a cultura digital e considerando a necessidade de “refletir, constantemente, acerca da relação entre as tecnologias digitais e os processos educativos” (COSTA, SANTOS e MENDONÇA, 2021, p.220), buscaremos pensar o processo de ensino-aprendizagem, intencionando resgatar as bases para o trabalho em rede, didaticamente falando, para, na sequência, pensarmos os desafios suscitados pela pandemia em relação às estratégias de ensino-aprendizagem, logo, ao trabalho docente.

Saviani (2012) lembra que existem inúmeros fatores que compõem a estrutura social e qualquer pedagogia que se julgue capaz de mudar a sociedade sozinha é ingênua, na medida em que desconsidera os demais aparatos que tornam o processo de ensino-aprendizagem complexo. O autor elabora três teses com a finalidade de desconstruir a imagem que a concepção corrente fez acerca do reformismo e do tradicionalismo. Desde já, indicamos a convicção de que a educação é um direito de todos, de que a escola é um espaço plural e de que sofre efeitos do contexto econômico e político mais amplo, mas, contraditoriamente, é a única instituição pela qual passarão as mudanças sociais vislumbradas, são premissas deste estudo.

Segundo Saviani (2012), ao reformismo (Pedagogia Nova) foram atribuídas todas as virtudes e ao tradicionalismo (Pedagogia Tradicional) todos os vícios. Resgatando a história da educação, ampliamos o olhar para entender que os desafios encontrados hoje são, também, uma construção histórica. A primeira grande ruptura foi travada com a chegada dos portugueses ao território do novo mundo. Não se pode deixar de reconhecer que os portugueses trouxeram um padrão de educação próprio da Europa, o que não quer dizer que as populações que por aqui viviam já não dispunham de características próprias de se fazer educação. Convém ressaltar que a educação que se praticava entre as populações indígenas não tinha as marcas repressivas do modelo educacional europeu (SAVIANI, 1983).

Desde a colônia, a preocupação no Brasil não foi alfabetizar o povo, a educação esteve quase sempre vinculada à elite dominante. Isso porque quase sempre se defendeu a igualdade essencial entre os homens, quando entendemos a importância de uma igualdade real, que não é interessante para essa elite. Atualmente, nota-se que essa distribuição desigual se intensificou com o advento da pandemia da Covid-19, pois apesar de chegarem estudantes cada vez mais conectados às escolas de Educação Básica e instituições de Educação Superior, o ensino remoto expôs as agruras da grande desigualdade socioeconômica brasileira.

Ao fazer uma análise da pandemia sob o viés da desigualdade, Felippe (2020) afirma que o vírus atingiu o planeta de modo geral, no entanto, nele:

[...] vive o 1% das pessoas que detém renda maior que os restantes 99% da população mundial. Vivem 42 pessoas cuja riqueza é igual à de 3,7 bilhões dos mais pobres que lutam para sobreviver, para suprir as necessidades básicas. Vivem os que têm renda para ficar em casa e fazer suas compras de alimentos pela internet, os que não vão comer hoje por conta da pandemia e os que já não comiam antes da pandemia

(FELIPPE, 2020, p.58).

Logo, precisa-se considerar que ter aparelho celular, por exemplo, não significa: ter condições de transcender os aplicativos de comunicação instantânea ou conexão capaz de dar conta além da interação nas principais redes sociais, bem como que cada estudante, em um ano atípico, tenha o seu próprio equipamento tecnológico, espaço de estudo, entre outros fatores que distanciaram os estudantes pobres (pessoas que vivem com renda domiciliar per capita mensal inferior ou igual a meio-salário mínimo) ou extremamente pobres (a pobreza extrema atualmente está fixada em menos de US$ 1,25 por dia, isto é, atinge pessoas que vivem com renda domiciliar per capita mensal inferior ou igual a um quarto de salário- mínimo).

Com a Constituição de 1891, a educação continuou refletindo o ideal de formação da elite, política dominante da monarquia e das oligarquias que lideraram a política do país até 1930, quando há o marco da abertura educacional no país. A promulgação da primeira LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação) do Brasil, formulada dentro dos dispositivos legais da Constituição Federal de 1946, efetivou um grande processo de descentralização na educação, delegando a sua organização aos estados da Federação. Em relação à descentralização, tem sido uma questão interessante de ser pensada no período pelo qual estamos passando, pois essa característica foi imprescindível para manejar as ações necessárias diante da realidade diversa do Brasil. Nesse sentido, os estados e municípios precisaram assumir um protagonismo, ao olhar para a realidade de contaminação e mortes do seu contexto e determinar as ações a serem adotadas, embora tenha havido discordância do governo federal sobre as medidas adotadas por alguns dos estados e municípios. Em alguns casos, a judicialização foi o caminho encontrado para lidar com a questão, com tribunais de justiça suspendendo as atividades presenciais de Educação enquanto o estado estivesse em bandeira preta, como ocorreu no Rio Grande do Sul, em oposição ao Decreto Estadual n° 5.579/2021.

O contexto político e econômico do Brasil no século XX trouxe reformas educacionais que partiam do pressuposto de uma crise do Estado, considerando que as políticas neoliberais eram o caminho (PERONI, 2003). O século XXI revela uma continuidade dessas políticas e a incorporação do debate sobre as TDIC na educação. Loio et al. (2020) problematizam as tecnologias pensadas fora do ambiente escolar, chegando como pacotes prontos e formatados, numa concepção exógena, que nem sempre respondem aos anseios e necessidades pedagógicas da comunidade; assim, lembram que: “É no chão da escola que essas expectativas e as próprias TDIC são reconfiguradas e recontextualizadas para uma apropriação baseada nas necessidades e possibilidades dos seus coletivos” (LOIO et al., 2020, p.638).

No chão da escola é que se materializa a formação, que se operacionalizam as tendências pedagógicas, identificadas por Libâneo (2013), em relação aos condicionantes sociopolíticos.

É sabido que questões contraditórias e impasses ideológicos estão nas políticas educacionais brasileiras e pedagogias ligadas à educação desde os primórdios, mesmo porque as tendências pedagógicas, como afirma Libâneo (2013), não aparecem em sua forma pura, nem sempre são mutuamente exclusivas ou conseguem captar toda a riqueza da prática concreta. Levemos em consideração, portanto, que pensar a educação no tempo presente envolve muitos fatores. Não se pode simplificar o debate. Como afirma Libâneo (2013), a prática escolar tem atrás de si condicionantes sociopolíticos que configuram diferentes concepções de homem e de sociedade e, consequentemente, diferentes pressupostos sobre o papel da escola e função social da educação, por exemplo.

Se considerarmos que o processo de democratização da sociedade brasileira se consolida, também, nas práticas pedagógicas empreendidas nas salas de aula da Educação Superior, tratemos, logo, de pensar a educação articulada a um projeto de sociedade. Se a concepção supõe não apenas uma reprodução do saber e da cultura, mas também a produção de novos saberes e de novas expressões culturais em meio à sociedade em rede, é preciso refletir sobre em que tendência pedagógica a prática se sustenta.

À vista disso, é apropriada a proposta de Moreira e Schlemmer (2020) de aproximação de uma Educação OnLIFE, uma educação para a vida, que não separa as modalidades educacionais em presencial e online, mas se assenta em diferentes desenhos multidimensionais, construídos a partir da análise do sujeito aprendente e do modo como ele aprende, seu contexto sociocultural, que considere as especificidades das áreas do conhecimento, as potencialidades e limites das diferentes tecnologias, com suporte dos “estudos das neurociências, da cognição e teorias de aprendizagem contemporâneas, a partir de uma epistemologia reticular, conectiva e atópica” (MOREIRA; SCHLEMMER, 2020, p.119).

Essa educação OnLIFE “desligada da visão binária e dualista, do Online e do Offline, do analógico e do digital, do pré-digital e do digital”, como propõem Moreira e Schlemmer (2020), é um interessante ponto de partida para pensar de modo peculiar a ação pedagógica docente em meio à cultura digital, à Web 2.0 (referência à segunda geração de comunidades e serviços oferecidos na internet), à hiperconectividade e ao distanciamento social, que fez urgir o ensino remoto.

4 ENCAMINHAMENTOS METODOLÓGICOS

Para investigar a efetividade das estratégias de ensino-aprendizagem envolvendo as TD na Educação Superior, buscou-se, por meio de pesquisa qualitativa com Survey, tecer reflexões acerca dos dados levantados junto à disciplina Didática, no âmbito da universidade federal pública, com base na aplicação online do instrumento questionário (com questões objetivas e discursivas), dos quais são trazidos os resultados. Ele foi aplicado aos alunos regularmente matriculados nessa disciplina na ocasião do seu encerramento, especificamente nos cursos de Ciências Sociais (total de oito estudantes) e Letras (total de quatro estudantes)7. O objetivo central foi o de captar a impressão discente sobre as estratégias desenvolvidas na referida disciplina em meio à Declaração de Emergência em Saúde Pública de Importância Internacional pela Organização Mundial de Saúde, bem como o estabelecimento da Resolução8 que regulamentou a flexibilização de componentes curriculares em caráter excepcional e temporário, e o desenvolvimento de estratégias de ensino-aprendizagem por meio de Tecnologias da Informação e Comunicação e outros instrumentos em substituição e/ou complementação às estratégias presenciais, para o ensino de graduação no período de suspensão das atividades presenciais.

A pesquisa Survey pode ser definida como uma forma de buscar dados e informação a partir de características e opiniões diretamente relacionadas a um determinado grupo de interesse, de modo que os participantes não sejam identificáveis, garantindo o sigilo sobre suas respostas (BARBIE, 1999).

Como as disciplinas estão ocorrendo de forma online, o acompanhamento didático- pedagógico acontece no Ambiente Virtual de Aprendizagem (AVA), espaço de formação e de novas apropriações das práticas didático-pedagógicas. Como este texto trata de um questionário respondido pelos estudantes que cursaram a disciplina nesse ambiente, esclarecemos que o AVA utilizado corresponde ao Moodle versão 3.1, e a sua popularização se justifica por ele se caracterizar como um sistema de código aberto, passível de ser customizado pelas instituições e que está continuamente sendo revisado e aprimorado para atender às necessidades dos usuários. É uma plataforma de aprendizado projetada para fornecer aos educadores, administradores e alunos um sistema robusto, seguro e integrado para criar ambientes de aprendizado personalizados (RAMOS, 2010).

Em razão de esse ambiente ser baseado na perspectiva da Web 2.0, ele permite trabalhos que se caracterizam ou se vinculam à lógica do trabalho colaborativo, cooperativo, da horizontalização e da construção coletiva (CARVALHO, 2008). Isso posto, o AVA da disciplina Didática esteve organizado em seções, das quais: uma dedicada ao vídeo de abertura (gravado pela docente, transferido como não listado no Youtube e disponibilizado no ambiente), no qual se abordava o objetivo da disciplina, a metodologia e sua estruturação; uma composta pela Introdução, com um texto de boas-vindas direcionado aos estudantes e o Guia de Estudo; e as direcionadas às Unidades I, II, III e IV, que continham os textos estabelecidos como leitura obrigatória, os textos complementares indicados (Saiba Mais), os links para os encontros síncronos e as atividades assíncronas (questões de múltipla escolha, questões dissertativas, fóruns e game Kahoot9). Na sequência, serão discutidas, conceitualmente, as estratégias de ensino-aprendizagem na Educação Superior, ao mesmo tempo em que será apresentada a ótica dos estudantes que participaram da pesquisa sobre o que foi aplicado em Didática no período de flexibilização para a oferta de componentes curriculares obrigatórios ou optativos.

5 ESTRATÉGIAS DE ENSINO-APRENDIZAGEM, CULTURA DIGITAL E DISTANCIAMENTO SOCIAL: A PRÁTICA DA DISCIPLINA DIDÁTICA

É imprescindível considerarmos, na prática didático-pedagógica docente, as especificidades do momento em que se vive. Segundo um dos relatórios do Comitê de Prevenção, instituído por Portaria para adoção de medidas de proteção e controle da propagação do vírus, no âmbito da Universidade Federal e da comunidade em que se insere, a média diária chegou a mais de 2.350 óbitos no país. Isso evidenciava a necessidade do distanciamento social, bem como de se ressignificarem os tempos e espaços de ensino-aprendizagem. Adiciona-se ao cenário, ainda, a cultura digital própria do tempo presente. Santaella (2008) afirmará que cada período da história é marcado por meios de produção de linguagem que lhe são próprios. Logo, pensamos que adequar as estratégias de ensino diante da pandemia, por exemplo, seja o modo de explorarmos novos territórios de produção da linguagem educacional.

Com a finalidade de evitar que seja feito um uso instrumental das TD, considerando que elas não são neutras e exercem efeitos sobre o meio social no qual foram desenvolvidas, evitemos a “utopia de um mundo futuro, no qual os avanços tecnológicos garantirão justiça e democracia, desconsiderando, assim, as condições materiais e objetivas do modelo econômico vigente” (PEIXOTO, 2015, p.322). Para uma adequada organização do trabalho pedagógico neste período pandêmico, apresentam-se alguns elementos que auxiliam a ressignificar as estratégias de ensino-aprendizagem em meio à instituição do ensino remoto e em uma perspectiva de incorporação das TD, articuladas ao potencial que assumem no processo educativo na Educação Superior. Esse potencial é confirmado pela unanimidade afirmativa (100%) da resposta à pergunta direcionada aos estudantes da disciplina Didática: Acredita que a disciplina tenha contribuído para sua formação acadêmica? O fato de terem considerado que sim, a disciplina contribuiu para sua formação acadêmica do modo como foi dada, evidencia a latência das TD para a formação.

Inicialmente, parece fundamental que sejam observados princípios básicos para o design de um ambiente de ensino-aprendizagem online. Não nos referimos ao belo kantiano, em sua “Crítica do julgamento estético” (KANT, 2008), uma estética filosófica: que captura os sentidos em razão de ser o que é em si mesmo, mas dizemos respeito à composição de um AVA bem organizado, no qual haja um guia de estudo claro. Moreira, Henriques e Barros (2020) chamarão a atenção sobre tal aspecto. Com o nome de Guia Pedagógico Semanal, formaria a sigla GPS, o que é muito interessante, porque podemos associá-lo ao planejador de rotas (quando usamos o GPS, temos clareza do mapa até determinado destino), os autores afirmarão que a esse guia compete informar aos estudantes sobre os conteúdos (o que se vai aprender), de que forma será conduzido o processo de ensino-aprendizagem (métodos), quais serão as estratégias e atividades a serem desenvolvidas e a avaliação concreta dessas atividades.

Quando perguntados se tiveram a sensação de que a disciplina Didática foi organizada/planejada e se o AVA estava organizado e apropriado para o estudo, os oito estudantes que responderam ao questionário enviado eletronicamente, novamente em caráter unânime (100%), responderam que sim às duas questões. Como houve uma preocupação em elaborar um Guia de Estudo que fosse efetivamente um GPS, analisamos que tenha sido um fator primordial para a obtenção de tal resultado.

O Guia de Estudo é, em suma, uma complementação do Plano de Ensino, comumente elaborado por docentes há tempos, algo que traz ainda maior clareza do trajeto a ser percorrido, sustentado em uma ressignificação do ambiente educacional institucionalizado. Moreira, Henriques e Barros (2020) recomendam que os professores busquem desenvolver nos estudantes o hábito da leitura atenta do Guia na sua totalidade, para que eles tenham uma visão global do planejamento traçado e possam programar o seu percurso de estudo no decorrer da disciplina: “É muito importante que o professor habitue os estudantes, antes de começarem qualquer tipo de atividade, seja individual ou em grupo, a lerem o GPS na sua totalidade, para que tenham uma visão global de tudo o que há a fazer e possam, a partir daí, programar as atividades” (MOREIRA, et al., 2020, p.353).

Dando sequência ao que pode ser feito em termos de estratégias de ensino-aprendizagem, considera-se importante que sejam selecionados recursos de comunicação diversificados a partir do que o AVA possibilita, tais como questionários, fórum de discussão, atividades dissertativas, possibilidade de trabalho em grupo (dada a solidão a que estamos submetidos, parece uma estratégia interessante), sugestão de filmes e séries ligadas à temática trabalhada, gravação de podcasts, vídeos, entre outros. Dado que foi buscada essa diversificação na disciplina Didática, foi perguntado aos estudantes sobre a estratégia que consideraram mais interessante, dentre as seguintes: game; fórum; questões de múltipla escolha; documentário; dinâmica no chat da aula síncrona; mapa conceitual; outra.

Verificamos que a maior parte gostou da dinâmica empreendida no chat da aula síncrona (quatro estudantes), que consistiu na divisão da sala em grupos, cada um desafiava os outros a comentarem sobre as temáticas abordadas, o que, efetivamente, conferiu um envolvimento grande por parte da turma como um todo. Na sequência, aparecem os fóruns, opção selecionada por dois participantes. Um estudante (1) indicou as questões de múltipla escolha e tivemos um (1) participante que assinalou outro, salientando o desejo de selecionar várias alternativas (transcrição do comentário: “Tá dando para selecionar só um, mas gostei do game, do fórum e das dinâmicas das aulas síncronas”). De forma discursiva, os estudantes responderam sobre qual leitura obrigatória julgaram mais interessante, bem como foram questionados se tinham conseguido efetuar a leitura dos textos do Saiba Mais (textos de leitura complementar), sendo o resultado: seis indicaram sim e dois responderam negativamente à questão.

Notamos que a maior parte dos estudantes conseguiu realizar as leituras complementares indicadas, o que denota uma adequação no planejamento realizado, para que efetivamente as leituras não obrigatórias subsidiassem a compreensão das unidades pensadas no escopo da disciplina em questão.

Explorar as TD em sua totalidade, que não são mais o futuro, são o presente, a hiperconectividade é um fato. Esse processo de incorporação à educação deixará marcas. Mas convidamos a pensarmos que é a nossa realidade hoje. Não algo abstrato do futuro, de uma presença no devir. Ganha concretude com a pandemia. Castells (2017) considerará que, a partir do final do século XX, estamos vivendo a transformação de nossa cultura material por um novo paradigma tecnológico, que se organiza em torno da tecnologia da informação, um evento histórico que, para o autor, é de igual importância em relação à revolução industrial.

É preciso, ainda, que haja um acompanhamento contínuo dos estudantes. Entender a educação como “um sistema aberto, não linear e não hierarquizado, por meio do qual as pessoas aprendem em diferentes contextos e espaços, em processos conectivos de interação em rede” (MOREIRA; SCHLEMMER, 2020, p.119) não significa que o docente não tenha um papel de extrema importância. Claro que isso era importante antes do período pandêmico, no entanto, agora parece determinante a produção da docência e do processo de ensino- aprendizagem sob um novo paradigma, o que envolve pensar a formação docente como um projeto que envolve a formação inicial e contínua, em um duplo processo, de “autoformação, a partir da reelaboração constante dos saberes que realizam em sua prática, confrontando suas experiências nos contextos escolares; e o da formação nas instituições escolares em que atuam” (AZZI, 2012, p.33).

É interessante ainda: que sejam estabelecidas atividades síncronas (aquelas realizadas ao vivo, ao mesmo tempo) e assíncronas; que o tempo das atividades síncronas não seja excessivo, pois a ausência de contato físico no mesmo espaço parece exigir mais atenção, portanto, um esforço que gera maior desgaste. À exceção, claro, de ficar encerrado em casa e sujeito a tantas mortes e adoecimento, o que, naturalmente, gera um stress (termo tomado da física, que designa a tensão e o desgaste a que estão expostos os materiais).

Em relação às atividades síncronas, foi perguntado aos estudantes da turma de Didática em análise se acreditavam que o tempo das aulas síncronas tinha sido suficiente e solicitava-se que justificassem brevemente, as respostas obtidas são aqui transcritas: Estudante 1 “Sim, aliado com o plano de ensino conseguimos ter um bom aproveitamento no tempo”; Estudante 2 “Sim. Acredito que a duração das aulas foi de bom tamanho, acredito que nessa modalidade (ensino remoto) é recomendável que as aulas sejam mais diretas”; Estudante 3 “Sim. As aulas síncronas no geral não ficaram cansativas e pra mim foi a frequência mais adequada de aulas”; Estudante 4 “Acredito que sim, pois não ficou apertado e nem atrapalhou outra matéria”; Estudante 5 “Sim, foi tranquilo”; Estudante 6 “Sim! Acredito que ao passar de duas horas de duração, não há mais o aproveitamento efetivo por parte dos alunos”; Estudante 7 “Não só foram suficientes, como foram na medida certa. Não foram longas demais e, pelo contrário, era a melhor aula da semana”; Estudante 8 “Sim, a professora buscou não tornar algo exaustivo para os alunos e todas as discussões foram muito bem planejadas de forma que pudéssemos participar e não apenas ouvir”.

Os comentários dos estudantes indicam a importância de flexibilização também dos tempos das atividades síncronas, isto é, um atendimento à especificidade da disruptura do compartilhamento do mesmo espaço, evitando uma transposição didática, que ignora as especificidades das TD e busca copiar o que era feito na ocasião do ensino estabelecido na lógica da presencialidade.

Parece imperioso, na mesma linha de raciocínio, que a avaliação da aprendizagem seja perpassada pela lógica do processo, considere a função social da educação, e não se dê na ótica da regulação (como se preconizou no interior das políticas neoliberais), apenas ao final, o que revela uma visão linear do processo de ensino-aprendizagem. Nesse sentido, em acordo com Pimenta (2012, p.24), entende-se que “a educação é um processo de humanização; que ocorre na sociedade humana com a finalidade explícita de tornar os indivíduos participantes do processo civilizatório e por levá-lo adiante”. No questionário aplicado, os estudantes foram convidados a tecerem impressões finais, que servissem de ajustes a serem empreendidos em outras turmas, elas foram manifestações elogiosas, que mostraram que as estratégias foram adequadas para o momento de caráter excepcional e temporário, a exemplo do que se apresenta: Estudante 7 “Essa matéria foi certamente a melhor do semestre, além de ter sido a melhor durante todo o período de aulas online. Do meu ponto de vista, não haveria necessidade de modificar nada”.

É importante que enfatizemos que não há uma técnica universal ou técnicas infalíveis, uma receita que possa ser passada, por exemplo: utilize a estratégia da gamificação e sua aula será um sucesso, felizmente isso não é possível; felizmente, pois a Didática, enquanto campo de estudo, prevê que as estratégias sejam ampliadas pela natureza experiencial da docência, visto que cada turma tem as suas especificidades, a serem consideradas no planejamento docente. Lembrando que diversificar estratégias não significa que o lúdico tome espaço do rigor pedagógico e que as TD valham por si.

Cumpre destacar que, para caminhar no sentido de estruturação de uma educação OnLIFE, como indicado por Moreira e Schlemmer (2020), que permita mobilidade, seja pervasiva, ubíqua e imersiva, requer-se, também, uma nova forma de pensar e estruturar a formação docente, por isso a importância do debate em relação à Educação Superior. Urge que essa formação seja, como se entende neste estudo, nas palavras dos autores: “mais coerente com este tempo histórico e social que considere as especificidades e potencialidades das tecnologias digitais conectivas” (MOREIRA; SCHLEMMER, 2020, p.119).

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Espera-se que as trevas experimentadas com os adoecimentos e mortes no período da pandemia sejam dissipadas e que a educação conte com docentes munidos de mais estratégias de ensino-aprendizagem, força e táticas de ação, que conduzam às mudanças pretendidas para a educação emancipatória. Mais do que uma dualidade entre online e offline, é imperioso refundar a lógica da produção de informação/saberes na cultura digital: buscar, relacionar, criar, compartilhar... o que se contrapõe à lógica da escola comeniana, da centralidade na figura docente. Ao trazer a perspectiva de constituição de uma educação OnLIFE, defende-se o foco nos sentidos da colaboração e cooperação nos fazeres/saberes da Didática.

Embora não seja objeto do presente estudo, é importante destacar que, com o uso intenso das TD, outras perspectivas sobre o ensinar e aprender ensejam análises e reflexões indicativas de ecologias/ecossistemas de aprendizagem (BARRON, 2006) que se configuram nesse contexto. Zaduski (2020) define esse novo cenário como um conjunto de contextos encontrados tanto em espaços físicos quanto virtuais que proporcionam oportunidades para a aprendizagem. Trabalhar, portanto, sobre tais entendimentos, é essencial não só no repensar os processos educativos, mas sobretudo nas outras oportunidades do aprender com os artefatos tecnológicos na cultura digital. Mais um desafio para nós educadores/as.

De toda maneira, nada como vivenciar a catástrofe, experimentar a água do fundo do poço, para entender que é preciso que o rumo seja diferente: caminhar para frente com base nos aportes culturais do hoje. Acredita-se que, com o auxílio de uma priorização efetiva na educação, de um olhar atento para a atividade docente, uma prática pedagógica comprometida com a cultura do tempo presente e com uma análise do processo de ensino- aprendizagem nas dimensões epistemológica, praxiológica e axiológica, será possível.

4Proíbe-se o uso do telefone celular nas salas de aula das escolas públicas estaduais.

5Amplia-se a proibição a walkmans, diskmans, Ipods, MP3, MP4, fones de ouvido e/ou bluetooth, game boy, agendas eletrônicas e máquinas fotográficas, especificam-se os espaços da escola: nas salas de aulas, salas de bibliotecas e outros espaços de estudos. Mas adiciona-se que a exceção fica por conta da autorização do estabelecimento de ensino, para fins pedagógicos.

6A Covid-19 é uma infecção respiratória aguda causada pelo coronavírus SARS-CoV-2, potencialmente grave, de elevada transmissibilidade e de distribuição global, em que a maioria das infecções se espalha por contato próximo (menos de 1 metro), principalmente por meio de gotículas respiratórias. Disponível em: https://coronavirus.saude.gov.br/. Acesso em: 06 mai. 2021.

7Cabe esclarecer que a disciplina ocorreu no momento em que foram suspensas as atividades presenciais, mas não era obrigatório cursá-la de modo flexibilizado (bloco 1), denominação adotada em Resolução para a mediação via Tecnologias da Informação e Comunicação. Desse modo, 2020/1 ficou dividido em: bloco 1 (não-obrigatório), iniciado em maio de 2020 – Calendário Suplementar; bloco 2 (obrigatório), iniciado em fevereiro de 2021.

8Resolução CONSEPE nº 32, de 08 de julho de 2020.

9Ferramenta de aprendizado baseada em jogos e testes de múltipla escolha, acessada gratuitamente pelo aplicativo mobile, compatível com IOS e Android ou navegador.

Revisão gramatical realizada por: Marta Maria Covezzi.

E-mail:martacovezzi@hotmail.com

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Recebido: 06 de Agosto de 2021; Aceito: 27 de Julho de 2022

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