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Revista e-Curriculum

versión On-line ISSN 1809-3876

e-Curriculum vol.17 no.2 São Paulo abr./jun 2019  Epub 08-Ago-2019

https://doi.org/10.23925/1809-3876.2019v17i2p592-615 

Artigos

CULTURAS COTIDIANAS NA INTER-RELAÇÃO DA CIDADE COM A UNIVERSIDADE DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO - UERJ À LUZ DO DOCUMENTÁRIO LIXO EXTRAORDINÁRIO

EVERYDAY CULTURES IN THE INTERRELATIONSHIP OF THE CITY WITH THE UNIVERSITY OF THE STATE OF RIO DE JANEIRO - UERJ, IN THE LIGHT OF THE EXTRAORDINARY GARBAGE DOCUMENTARY

CULTURAS DIARIAS EN LA INTERRELACIÓN DE LA CIUDAD CON LA UNIVERSIDAD DEL ESTADO DE RIO DE JANEIRO - UERJ, A LA LUZ DEL EXTRAORDINARIO DOCUMENTAL DE BASURA

Mirian Maia do AMARAL1 

Rosemary SANTOS2 

Edméa SANTOS3 

1 Professora do Programa MBA da Fundação Getulio Vargas (FGV-RJ). Pesquisadora do Grupo de Pesquisa Docência e Cibercultura (GPDOC/UERJ). Pós-doutorado em Educação pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro - UERJ. Rio de Janeiro, RJ, Brasil. E-mail: amaral3378@gmail.com

2 Professora da Faculdade de Educação da Baixada Fluminense - FEBF/UERJ. Coordenadora-adjunta e Pesquisadora do Grupo de Pesquisa Docência e Cibercultura (GPDOC/UERJ). Doutora em Educação pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro - UERJ. Rio de Janeiro, RJ, Brasil. E-mail: brisaerc@hotmail.com

3 Professora do Programa de Pós-graduação em Educação da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ); Pós-doutora pela UAB-PT, professora convidada no Mestrado em Pedagogia do e-Learning UAB-PT. Líder do Grupo de Pesquisa Docência e Cibercultura (GPDOC). Rio de Janeiro, RJ, Brasil. E-mail: edmeabaiana@gmail.com


RESUMO

Neste artigo, as autoras discutem as culturas cotidianas, na inter-relação da cidade com a Universidade do Estado do Rio de Janeiro - UERJ, em tempos de cibercultura e mobilidade ubíqua, percorrendo e cartografando saberes, fazeres e poderes, tecidos e compartilhados pelos praticantes culturais, nas redes educativas. Mediante a apresentação de atos de currículo, deixam em evidência o movimento #UerjResiste, de onde emergem formas narrativas em diferentes materialidades discursivas sobre a crise por que passa a Universidade. Esses discursos constituem o eco linguístico entre o poder e o saber, enquanto a fala, com seu caráter subjetivo, encarna e propaga uma prática de resistência à objetivação discursiva. Nesse contexto, procuram compreender as principais características dessas redes ao serem tecidas com outros tantos cotidianos em que vivem esses sujeitos, estabelecendo o diálogo com o filme “Lixo Extraordinário”, indicado ao Oscar como o melhor documentário brasileiro, que mostra o trabalho do artista plástico Vik Muniz, junto a catadores de materiais recicláveis, no lixão de Jardim Gramacho, no Rio de Janeiro.

PALAVRAS-CHAVE: Cidade e cotidianos escolares; Atos de currículo; Multirreferencialidade; Políticas de resistência; #UerjResiste

ABSTRACT

In this article, the authors discuss everyday cultures, in the interrelationship of the city with the University, of the State of Rio de Janeiro - UERJ, in times of cyberculture and ubiquitous mobility, traversing and mapping knowledge, actions and powers, tissues and shared by cultural practitioners, in educational networks. Through the presentation of curriculum acts, they highlight the movement #UerjResiste, from which emerge narrative forms in different discursive materialities about the crisis that the university is going through. These discourses constitute the linguistic echo between power and knowledge, while speech, with its subjective character, embodies and propagates a practice of resistance to discursive objectification. In this context, they try to understand the main characteristics of these networks when they are woven with other everyday lives in which these subjects live, establishing the dialogue with the film Waste Land, nominated for the Oscars as the best Brazilian documentary, showing the work of the plastic artist Vik Muniz, along with collectors of recyclable materials, in the Jardim Gramacho garbage dump in Rio de Janeiro.

KEYWORDS: City and everyday school; Curriculum Acts; Multireferentiality; Resistance policies; #UerjResiste

RESUMEN

En este artículo, las autoras discuten las culturas cotidianas, en la interrelación de la ciudad con la Universidad, del Estado de Río de Janeiro - UERJ, en tiempos de cibercultura y movilidad ubicua, recorriendo y cartografiando saberes, hacer y poderes, tejidos y compartidos por los mismos practicantes culturales, en las redes educativas. A través de la presentación de actos de currículo, dejan en evidencia el movimiento de UerjResiste, de donde emergen formas narrativas en diferentes materialidades discursivas sobre la crisis por la que pasa la Universidad. Estos discursos constituyen el eco lingüístico entre el poder y el saber, mientras que el habla, con su carácter subjetivo, encarna y propaga una práctica de resistencia a la objetivación discursiva. En ese contexto, buscan comprender las principales características de esas redes al ser tejidas con otros tantos cotidianos en que viven esos sujetos, estableciendo el diálogo con la película Basura Extraordinaria nominada al Oscar como el mejor documental brasileño, que muestra el trabajo del artista plástico Vik Muniz, junto a recolectores de materiales reciclables, en el basurero de Jardim Gramacho, en Río de Janeiro.

PALABRAS CLAVE: Ciudad y cotidianos escolares; Actos de currículo; Multirreferencialidad; Políticas de resistência; #UerjResiste

1 INTRODUÇÃO

O crescimento da economia global e o surgimento contínuo de tecnologias digitais impactam, sobejamente, as relações sociais, ensejando novas atividades, comportamentos e valores. A partir da instauração de uma cotidianidade específica, essas relações se realizam, cada vez mais, fora das instituições, sendo transferidas para a cidade, lugar no qual emergem os movimentos reivindicatórios e, portanto, lugar das contradições, dos conflitos e das lutas de classe. Nesse contexto, em que a normatização ocorre de forma difusa, por meio da ideologia do consumo, modos de ser, fazer e viver também se impõem, celeremente.

A expansão dos negócios, em escala mundial, e a imensa quantidade de produtos transportados diariamente, aumentam a quantidade de lixo gerado, impulsionado, em parte, pelo mais poderoso dos fatores: o demográfico. E, se a economia vai bem, maior o consumo. Os resíduos sólidos, principalmente nas cidades, dispostos de forma inadequada, causam emissão de gases que destroem a camada de ozônio, poluindo a água e o solo. Os impactos dessas ações são os deslizamentos e as inundações que, não raramente, provocam tragédias e potencializam doenças em áreas carentes de atenção do poder público.

Nessa perspectiva, em 23 de dezembro de 2010, o Decreto nº 7404 da Presidência da República regulamentou a Lei no 12.305, de 2 de agosto de 2010 (que instituiu a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) e criou o Comitê Interministerial da Política Nacional de Resíduos Sólidos e o Comitê Orientador para a Implantação dos Sistemas de Logística Reversa), definindo, em seu Artigo nº 54, o fechamento de todos os lixões a céu aberto, presentes em quase todos os municípios brasileiros. Também proibiu a inserção de qualquer tipo de resíduo passivo de reciclagem, ou reutilização, em aterros sanitários (BRASIL, 2010).

O cenário delineado, objeto de preocupação de governos, empresas e sociedade, exige ampla discussão dessas questões nas diferentes redes educativas; o que demanda abordagens curriculares que extrapolem modelos hegemônicos de investigação e análise, herdados da ciência moderna, e contemplem a diversidade, o diferente e o heterogêneo, na tessitura do conhecimento.

As considerações, aqui expostas, apontam para o grande paradoxo em que a vida social se conforma no cotidiano das cidades, na medida em que nelas estão presentes, concomitantemente, sementes da prosperidade e da destruição. Calvino (2002) revela-nos que as cidades, assim como os sonhos, são construídas por desejos e medos, ainda que o fio condutor de seu discurso seja secreto, suas regras absurdas, suas perspectivas enganosas, e que todas essas coisas escondam umas às outras, como uma nebulosa. Constituídas de diferentes sons, odores, gostos e olhares que captam o fluir e a essência das coisas, entendê-las, assevera o autor, requer que se dê especial atenção aos seus ínfimos detalhes, as suas filigranas. Isso se justifica pelo fato de o urbano englobar, a um só tempo, o modo de vida e a reflexão sobre a vida, tendo como pilares nossas individualidades, personalidades, dilemas, conflitos, crenças e valores, nos quais se entrecruzam, dialeticamente, situações rotineiras e acontecimentos singulares, que nos trans (formam), dando sentido a nós próprios e ao mundo em que vivemos.

Camargo e Mariguela (2007) afirmam que, em espacostempos i diversos, saberes, sujeitos, corpos, identidades, diferenças e hierarquias são construídos, no entrelace do cotidiano escolar com o currículo oficial. Santos E. (2014), por sua vez, propõe que, na pesquisa com os cotidianos sejam utilizadas práticas que ensejem o diálogo permanente entre diferentes saberes; o que exige adotar uma abordagem multirreferencial, um olhar plural, que rompa a hierarquia entre conhecimento científico e saberes comuns, possibilitando a interação entre certezas e incertezas, com vistas ao enfrentamento dessas últimas.

A partir dessa ótica, a Secretaria da Educação do Estado de São Paulo, como parte do Programa Cultura é Currículoii, que integra um conjunto de ações por ela definido para concretização da sua política educacional, selecionou o documentário Lixo Extraordinário, para exibição nas escolas paulistas, com vistas ao aprimoramento do ensino oferecido nessa rede pública estadual, com três objetivos específicos: (a) democratizar o acesso de professores e alunos da rede a equipamentos, bens e produções que constituem patrimônio cultural da sociedade, tendo em vista uma formação plural e a inserção social; (b) fortalecer o ensino por meio de novas formas e possibilidades de desenvolvimento dos conteúdos curriculares em articulação com produções socioculturais e fenômenos naturais, diversificando-se as situações de aprendizagem; e (c) desenvolver a aprendizagem por meio de interações significativas do aluno com o objeto de estudo/conhecimento de disciplinas, reforçando-se o caráter investigativo da experiência curricular.

Não há uma teoria universalmente aceita sobre cinema. O que existe é uma diversidade de teorias fundamentadas que nos permitem analisá-lo, sob diferentes matizes. Diante de projeções cinematográficas, formas articuladas de pensar causam-nos euforia, espanto e surpresa, mexem com nossos brios, queimam nossas faces, chocam-nos, muitas vezes, colocando em xeque conceitos, preconceitos, culturas, atitudes e valores. Além de registrar fatos, percepções e reflexões, o cinema constrói e “reapresenta seus quadros da realidade por meio dos códigos, convenções, mitos e ideologias da cultura, e mediante práticas significadoras específicas desse meio de comunicação” (Turner, 1997 apudFRESQUET, 2007, p. 1). Mais do que apresentar respostas, a arte cinematográfica nos leva a perguntar; foge da racionalidade ilusória do mundo, inventa novos estados e pontos de vista, questiona, rompe paradigmas e nos agracia com a ambiguidade, em lugar de convicções. Diante dela, vivenciamos as experiências propostas pelos artistas que nos colocam em contato com a sua criação, e estabelecemos elos e compartilhamentos com outros sujeitos, nas diferentes redes que habitamos.

Com esse olhar, as autoras dialogam com o documentário Lixo Extraordinário, originalmente intitulado Waste Land, produzido em 2010, sob a direção de João Jardim, Karen Harley e Lucy Walker, para melhor compreender de que forma o cinema, com sua linguagem imagética, pode ser utilizado para potencializar currículos multirreferenciais, nos diferentes espaçostempos , de aprendizagem. Nesse processo, estabelecem a inter-relação entre a Universidade do Estado do Rio de Janeiro - UERJ e a cidade, a partir do movimento de resistência #UerjResiste.

O documentário - uma síntese

Lixo Extraordinário, documentário que concorreu ao Oscar, em 2011, retrata o projeto do artista plástico, Vik Muniz, no maior aterro sanitário do mundo - Gramacho, no Rio de Janeiro. Brasileiro, reconhecido mundialmente por incorporar objetos do cotidiano em seu processo fotográfico, criando imagens ousadas e, geralmente, enganosas. Desse modo, Vik se propõe a fazer arte com lixo, mediante colagem e montagem de materiais diversos, para formar retratos, como a tela ‘Retratos do Lixo’, com o firme propósito de transformar a vida de um grupo de catadores.

Fonte: helenfarias.blogspot.com

Imagem 1 Foto da tela Retratos do Lixo 

Além da criatividade e beleza das obras produzidas, o filme mostra a realidade de pessoas que vivem literalmente no lixo, em condições críticas de pobreza e saneamento, dele dependendo para sobreviver, e alerta para o problema ambiental da disposição de resíduos sólidos, como sintetiza o texto da Imagem 1.

A primeira reação de Vik ao assistir o vídeo produzido por seu amigo, sobre o referido lixão, é carregada de preconceitos: “As pessoas devem ser mais rudes do que possamos imaginar. São viciados... É o fim da linha. Dê uma olhada na geografia da área (...). É pra onde vai tudo que não é bom. Incluindo as pessoas”. No entanto, à medida que se envolve com os catadores e suas histórias de vida, o artista vai modificando suas concepções iniciais, desvelando o que há de humano naquela realidade, representado pelo bom humor, o gosto pela leitura, a capacidade de liderança, superação e resistência, além da preocupação com o meio ambiente, que caracterizam alguns daqueles indivíduos.

Mediante leitura estético-visual dos elementos que compõem os clichês do lixo, e, a partir de imagens capturadas por meio de sua câmera fotográfica, Vik escolhe as pessoas que vão trabalhar em suas obras, esclarecendo-lhes seu objetivo: transformar aquelas fotos em imagens criativas, constituídas tão somente por resíduos selecionados no local, e proporcionar, a cada um, condições de modificar suas vidas. Com efeito, a partir do envolvimento com esse tipo de trabalho - transformação do lixo em arte -, cresce a autoestima daqueles ex-catadores.

O reconhecimento profissional de Vik lhe rende um convite para participar de um leilão numa galeria de Londres, o que aumenta as expectativas quanto a um bom retorno financeiro e social. Entre as obras produzidas, Retratos do Lixo foi a escolhida para integrar a exposição. Trata-se de uma reprodução da pintura em óleo sobre tela, de Jacques-Louis David, retratando Jean-Paul Marat, revolucionário francês assassinado, em casa, por Charlotte Corday.

Tião (Presidente da Associação dos Catadores do Jardim Gramacho), que serviu de modelo para a produção do quadro, feito com materiais recicláveis, é convidado a viajar com Vik. No entanto, a decisão de levar uma pessoa simples e humilde para aquela cidade traz algumas preocupações ao artista (logo afastadas), pelo receio de lhe causar algum tipo de constrangimento. Presente ao evento, Tião tem contato com obras de grandes pintores; o que lhe possibilita adquirir novos conhecimentos sobre arte.

Ao final do documentário, Vik visita seus colaboradores, presenteando-os com cópias de seus quadros. Com o retorno obtido com as reproduções do quadro leiloado - mais de 250 mil dólares, a Associação comprou um caminhão e inaugurou um centro de ensino e uma biblioteca comunitária, com 15 computadores. De uma forma geral, os catadores envolvidos na exposição mudaram suas vidas: alguns melhoraram suas condições, outros apenas abandonaram o lixão. No entanto, todos - artista e personagens -, foram tocados, de uma forma ou de outra, por uma experiência única.

Nessa perspectiva, o documentário ultrapassa a questão referente à coleta seletiva e à educação ambiental: aponta para a falta de responsabilidade social do governo e a necessidade de um planejamento efetivo de saneamento básico, especialmente em áreas urbanas, que possibilite a melhoria da qualidade de vida da população.

2 CULTURAS COTIDIANAS NAS CIDADES E NAS REDES EDUCATIVAS

Aumenta, de forma significativa, a consciência de que o conjunto de teorias, noções e categorias advindo dos conhecimentos científicos, criados e desenvolvidos na modernidade - ainda indispensáveis ao desenvolvimento das ciências -, são cada vez mais limites para compreendermos as lógicas de tessitura dos conhecimentos, na atualidade; o que requer, na ótica de Alves (2018) “ir além do já sabido”.

A partir desse entendimento, os cotidianos não podem mais ser dissociados dos espaços de produção do conhecimento, nem percebidos como espaçostempos de repetição e simples expressão do senso comum. Ao contrário, assumem uma importante dimensão de lócus de efetivação de todos esses entrecruzamentos, como afirma Morin (2003), no qual se insere toda produção de conhecimento e práticas científicas, sociais, individuais e grupais, e a vida social segue em fluxo. Daí a extrema importância de aprofundarmos seu estudo para melhor compreensão de sua complexidade intrínseca, tendo em vista pensarmos a realidade social, em geral, ou em particular. Desse modo, estimuladas pela releitura do referido documentário, dirigimos nosso olhar para nossas práticas, na aproximação cidade e cotidiano escolar, aqui representado pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro - UERJ.

Certeau (2013) afirma que os passos tecem lugares, modelam espaços, delineiam discursos sobre a cidade. Por sua vez, o caminhar consiste numa enunciação, pois, assim como a língua se apropria do som, o pedestre faz do lugar (sistema topográfico) um espaço, e se relaciona com a cidade por meio de seus movimentos, da mesma forma como nos relacionamos com o outro, por meio da linguagem. Para o autor, a arte de moldar percursos implica tanto o estilo - o quê de cada sujeito, sua singularidade -, como os usos que dela fazemos.

Dado que os processos de transformação por que passam as cidades, a partir de uma racionalidade técnica sob a perspectiva econômica, não levam em conta valores e significados a elas atribuídos por seus usuários, vemos emergir, a cada instante, a dimensão do seu cotidiano como lugar do exercício da vida política, no qual a negociação (e não o consenso) se faz necessária, e as resistências ao ‘produto’ tomam vulto. Santos, M. (2006, p. 306) afirma que:

Certos espaços da produção, da circulação e do consumo são a área de exercício dos atores ‘racionais’, enquanto os demais atores se contentam com as frações urbanas menos equipadas [...] o imperativo da competitividade leva à aceleração da modernização de certas partes da cidade em detrimento do resto.

Para o autor, a ampliação de áreas/setores não beneficiados pelos investimentos públicos e pela lógica racional dominante dificulta aos habitantes desses territórios urbanos o acesso à modernidade material. Desse modo, instalam-se, nessas ‘zonas opacas’, racionalidades outras, a partir de táticas de sobrevivência, deflagradas da partilha do território e da experiência da escassez, evidenciadas nas práticas sociais. Sem dúvida, esse raciocínio pode ser estendido, em sua totalidade, ao momento histórico vivenciado pela UERJ que, sem as condições mínimas necessárias para desenvolver suas atividades, foi obrigada a suspender, por tempo indeterminado, o ano letivo de 2017.

Assim sendo, a análise desses cotidianos pressupõe focar na relação dialética entre ordem global e local na materialização do espaço urbano, lócus da existência individual, subjetiva e política da vida que o percorre, posicionando essa existência como parte ativa do processo macropolítico-econômico contemporâneo, que reconfigura as grandes cidades, por todo o planeta. Ao serem esfaceladas, as cidades têm sua dimensão humana amputada, e as ações e acontecimentos cotidianos contribuem para a fragmentação das relações sociais, resultando na apropriação de espaços diferenciados e fechados por seus próprios habitantes. Desse modo, a compreensão das atividades presentes nos cotidianos, em geral, e nos cotidianos escolares, em particular, exige a predisposição para ver além do já aprendido e sabido, como enfatiza Alves (2008): mergulhar inteiramente em uma determinada realidade, atentos a todos os eventos e a tudo que nela acontece.

Com efeito, na medida em que os sujeitos produzem e transformam o mundo e a si próprios, dentrofora da escola, na imbricação cidade e ciberespaço, currículos tecidos em redes operadas por pessoas comuns no seu dia a dia ganham sentido, e as formas como nos relacionamos com nossos iguais e com os Outros nessas redes assumem um caráter político, que possibilita articular valores, éticas e estéticas diversificadas, funcionando como campo de lutas políticas; uma estratégia para fugir da imposição dos modelos hegemônicos, e inventar outros modos de fazer e viver.

O documentário Lixo Extraordinário é um dos mais belos exemplos de rede educativa, no qual histórias de vida, tensões e idiossincrasias se misturam no dia a dia da cidade. No cenário do Aterro de Jardim Gramacho, de onde se retiram, em média, 200 toneladas, por dia, de materiais recicláveis, Vik Muniz, nascido num bairro de classe média baixa em São Paulo (o que parece ter aguçado seu olhar e sua sensibilidade na busca de maior dignidade para aquelas pessoas), idealizou, por meio da arte, transformações na maneira de viver dos catadores de lixo desse aterro. À proporção que mostra a fragilidade do poder público e das políticas sociais implementadas nos diferentes governos, bem como a falta de conscientização da população em relação à coleta seletiva de lixo, Vik adota uma atitude política. Os conteúdos e valores que emergem sem retoques das imagens exibidas no filme vão deixando expostas a questão cultural, a desigualdade social, além da problemática ambiental referente à disposição de resíduos sólidos.

Onde o horizonte parece ofuscado pelo reino e por sua glória, o primeiro grande operador de protesto, de crise, de crítica ou de emancipação, deve ser chamado imagem, no que diz respeito a algo que se revela capaz de transpor o horizonte das construções totalitárias (Benjamin apudDIDI-HUBERMAN, 2011, p. 117-8).

Em condições críticas de pobreza e saneamento, os trabalhadores locais sobrevivem e resistem, desafiando poderes instituídos - ruidosa ou silenciosamente, marcando seus espaços, ou se locomovendo, de forma errante, ainda que seus gritos não sejam percebidos por muitos, como se pode constatar na manifestação dos catadores por melhores condições de vida, em frente à Prefeitura de Duque de Caxias. Nessa ambiência, plena de narrativas textuais e imagéticas, Vik se abre para o novo que constitui aquele ambiente - ‘dominado pelo tráfico, rodeado de indústrias de reciclagem, habitado por indivíduos excluídos da sociedade’ - e se questiona: O que seria importante para aquelas pessoas? A arte poderia modificá-las de forma efetiva? Como alcançar esse intento?

Responder a essas questões implica compreender que essas narrativas consistem em práticas ordenadoras de sentidos, de intervenções concretas que acontecem em contextos específicos, como parte de processos comunicativos amplos, pondo em cena praticantes culturais da e em comunicação (França, 2006). São histórias, contadas e recontadas pelos sujeitos do cotidiano, pela necessidade de transmitir ao outro o que vão acumulando quanto a conhecimentos e ações, assevera Alves (2008); o que exige de Vik escuta ativa; dialogar, ensinar e aprender; construir, desconstruir e reconstruir, provocar, acolher e respeitar; enfim, participar de uma rede de conversação, que emerge no pequeno grupo, face a face, olho no olho, e na perspectiva de colaboração. Como afirma Freire (1999, p.136),

É preciso que saibamos que sem certas qualidades e virtudes como a amorosidade, respeito aos outros, tolerância, humildade, gosto pela alegria, gosto pela vida, abertura para o novo, disponibilidade à mudança, persistência na luta, recusa aos fatalismos, identificação com a esperança, abertura à justiça, não é possível a prática pedagógico-progressista, que não se faz apenas com ciência e técnica.

No entanto, nada é preestabelecido: a iconografia vai sendo modelada a partir do movimento de interação, que aproxima artista e catadores. Esse tipo de abordagem demanda capacidade de associar aquilo que vê, lê e ouve ao que já lhe é conhecido e aprendido; entrelaçar múltiplos relatos; perguntar mais que responder e construir uma rede de comunicação que leva em conta a pertinência do que é arte (AMARAL, 2015).

3 NARRATIVAS DE EDUCAÇÃO: CONDIÇÕES DE VIDA E TRABALHO DO PROFESSOR-FORMADOR NA PÓS-GRADUAÇÃO DA UERJ

Inspiradas pelas ambiências criadas e cocriadas por Vik em seu documentário e em suas narrativas, corroboramos o pensamento de Alves (2008), quando afirma que é preciso compreender que a realidade cotidiana requer atenção redobrada e questionamento constante, para ir muito além do olhar que vê, incluindo sentimentos, sentidos e atitudes de compartilhamento, de cooperação, de colaboração, entre outros.

Na qualidade de docentes-pesquisadores, implicados com nossas práticas pedagógicas, no âmbito de uma universidade pública como a UERJ, temos consciência do papel social assumido pelo professor universitário no cenário educacional, na medida em que se torna responsável pela formação profissional dos estudantes. Nesse processo e, sob influência de questões pessoais e profissionais, pensa e age, constituindo diferentes saberes que integram a sua própria identidade docente.

Mas, como trabalhar nessa direção, em meio a um cenário de desolação, impotência e incerteza, decorrente da crise política e econômica do Estado, que atinge o “coração” dessa Universidade, reconhecida pela excelência acadêmica e pioneira na adoção do sistema de cotas no Rio. Em seis décadas de existência, a UERJ vive uma situação jamais experimentada: salas e corredores, distribuídos em 12 andares divididos em cinco blocos, completamente desertos, estudantes cotistas e de outras modalidades com suas bolsas de estudo (Residência, Proatec, IC, Prociência, Extensão) atrasadas e sem previsão de pagamento, bandejão do campus Maracanã fechado, por falta de recursos para pagar prestadores de serviços, e servidores técnico-administrativos e docentes abatidos, sem qualquer condição material e/ou psicológica para assumirem suas atividades.

Esse quadro nos reporta a Certeau (2013), no capítulo quatro dessa obra, quando trava um diálogo bem interessante com Michel Foucault, deixando transparente a preocupação com a dimensão micropolítica das articulações sociais. Enquanto Foucault (1981) se dedica à reflexão sobre formas específicas de relações de poder, como, por exemplo, as práticas disciplinares voltadas para o controle do corpo, com vistas à docilidade e utilidade dos sujeitos, Certeau (idem) enfatiza as formas de mobilização dos sujeitos, que se valem de lacunas deixadas pela esfera normativa da sociedade para perturbar, transgredir ou estabelecer outras formas de organização social, ainda que sob a aparência de reprodução da ordem.

Essas formas cotidianas, que caracterizam ‘maneiras de fazer’, mediante apropriação criativa do espaço social, comportam, em si, um viés estético (forma de fazer dos sujeitos sociais); um viés ético (não aceitação passiva do já instituído); e um viés polêmico (caracterizado por intervenções nas relações de forças), que fazem emergir microrresistências, mobilizadas a partir das táticas cotidianas. Reconhece que, a par do universo construído pelas indústrias de consumo cultural e tecnológico, os indivíduos podem exercitar sua capacidade de autonomia e liberdade, resistindo, moral e politicamente, e manifestando, nas práticas diárias, sua capacidade criativa, afirmativa e fundante, representada por ‘astúcias’ e ‘engenhosidades’, para transformar ou se distanciar daquilo que lhe é imposto, contrapondo-se às estratégias das grandes instituições.

Como se pode observar, a vida em sociedade não pode ser dissociada da vida na escola: tudo se relaciona e se imbrica. Ao optar por produzir arte ‘com os catadores’ e não ‘sobre os catadores’, Vik rompe com a noção de que a aquisição do conhecimento demanda dividir e classificar para, em seguida, determinar relações sistemáticas entre aquilo que foi dissociado, pondo em xeque a visão monocultural do saber, que elegeu a cientificidade como critério único de verdade, e a universidade e os seus intelectuais como os legítimos representantes desse saber, tal como denuncia Santos, M. (Op. cit.). Isso pode ser percebido nas falas de Tião:

Gosto muito de livro. Nietzsche tem uma filosofia maneira. Quando achei, no lixo, o livro “O Príncipe”, de Nicolau Maquiavel, me deu uma neurose de ler. O autor escreve sobre os príncipes italianos da época. Aquela loucura que parece até o Rio de Janeiro - cada um, com sua gangue, com seu grupo; não importa o que o governante faça para manter sua autoridade. Maquiavel fala sobre Moisés, que se tornou um líder, porque Deus confiou sua palavra a ele; Cesar Borgia, porque era um papa perverso [...].

É nessa perspectiva que identificamos a luta dos professores, pesquisadores e estudantes da UERJ que, desde 2015, vêm resistindo, científica e socialmente, aos poderes instituídos, mediante ações ousadas e inovadoras (aulas coletivas dentrofora do campus; encontros semanais para orientação de dissertações e teses, no âmbito dos grupos de pesquisa; e manutenção de eventos anteriormente programados, como IX Seminário Internacional As Redes Educativas e as Tecnologias e o XIII Seminário do Laboratório Educação e Imagem, realizado, no âmbito do Programa de Pós-graduação em Educação - PROPED (Imagem 2), além de buscar o apoio da sociedade, tornando visível a situação da Instituição, dado que sua existência está em jogo.

Fonte: http://www.uerj.br/lendo_noticia.php?id=1241

Imagem 2 Evento Supera Rio UERJ 

Aberto à população, esse ato visou reunir parlamentares, especialistas, estudantes e membros da administração central da UERJ em um amplo debate, no qual foram avaliadas alternativas de superação dos impactos da crise estadual, como sugere a Imagem 3, além de se constituir um ato em defesa da universidade pública, gratuita, de qualidade e socialmente referenciada. Como ressalta Didi-Huberman (op. cit.), as imagens nos transportam. Diante delas, o passado e/ou o presente se reconfigura(m), dado que as narrativas não buscam um tempo homogêneo e vazio; mas um tempo saturado de agoras. A Imagem 3 nos remete a cenas cotidianas do período de greve enfrentado pela UERJ, seja na Universidade, no Palácio Guanabara ou mesmo nas ações promovidas para distribuição de cestas básicas ao funcionalismo público.

Fonte: https://www.google.com.br/ imagem

Imagem 3 Cenas do Cotidiano UERJ 

Da mesma forma que privilegiamos, em nossas pesquisas, currículos que questionam prescrições e determinismos, e focam nas mudanças e na busca de uma identidade narrativa, interagirmos com a comunidade acadêmica, em particular, e a sociedade, em geral, mediante atividades formativas presenciais e/ou virtuais (Facebook, WhatsApp, Instagram, Ambientes Virtuais de Aprendizagem - AVA, entre outras), considerando o aprendizado como localizado na história de vida, para melhor compreendê-lo, de forma individual e coletiva.

No contexto das discussões sobre a formação do professor-formador, bem como sobre as condições pelas quais esses profissionais trabalham, destacamos significativas reflexões sobre a relevância dos conhecimentos pedagógicos e epistemológicos que definem e caracterizam a docência. Essas questões, cada vez mais presentes nas narrativas docentes, geram tensões, dado que a docência, independentemente do nível de ensino em que aconteça, constitui uma ação humana. Reconhecer essa dimensão é assumir sua constituição histórica e social e, por conseguinte, entendê-la como parte integrante da identidade profissional do professor; o que justifica a urgência de (re)significar os processos formativos a partir dos conhecimentos pedagógicos, inerentes e necessários à profissão docente.

Os cursos de pós-graduação stricto sensu priorizam a formação para a pesquisa científica em detrimento da formação para a docência, conforme exige a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Brasileira (Lei nº. 9.394/96). A esse respeito, Cunha (2010, p. 34) pondera que “a própria carreira dos professores da Educação superior, na grande maioria dos casos, se alicerça em dispositivos ligados à produção científica decorrente da pesquisa e pouco faz menção aos saberes necessários ao ensino”.

Ainda que haja uma constante reivindicação por parte desses profissionais quanto à ampliação de espaços de discussão sistemática do fazer pedagógico, isso ainda ocorre de forma tímida, ficando na dependência da maneira pela qual cada instituição, em particular, concebe a formação do formador e como esta é contemplada nos respectivos planos de desenvolvimento institucional. Nessa perspectiva, esses programas acabam dando especial atenção às linhas de pesquisa e a sua organicidade com as disciplinas, projetos e produtos de pesquisa, teses e dissertações, estrutura curricular e publicações, estabelecendo um hiato entre o concebido e o vivido pelos pós-graduandos, em geral, em relação à docência.

Mas, como trabalhar aspectos da realidade brasileira nos cotidianos universitários se ainda praticamos modelos de currículo que remetem à noção de trajetória, movimento programado, predeterminado, normativo, linear, sequencial, constituído por etapas e séries? Alves (2008) afirma que, nos cotidianos escolares, paralelamente a situações de aprendizagem, baseadas em saberes científicos definidos nos currículos oficiais, movimentos quase imperceptíveis de resistência vão se constituindo pelos professores em busca de novas propostas e outras ações, conhecimentos e significações, sustentados em suas competências e experiências de vida. Nesse sentido, assevera a autora, os saberes científicos não podem ser entendidos como verdades absolutas e orientadoras de um caminho a ser trilhado, mas como limites que permitem ir até certo ponto. É preciso, pois, fugir das amarras teórico-metodológicas, revelando, valorizando e dialogando com saberes comuns, forjados na cultura, no dia a dia das cidades, e das tecnologias, pois como afirma Freire (2000), não há verdades que não possam ser problematizadas; e, se há verdades, provoca Habermas (1989), é porque é discutível. A Imagem 4 retrata ações de resistência engendradas pelos funcionários públicos, em geral e, em especial docentes da UERJ, diante do estado de precariedade da Instituição.

A centralidade dada às narrativas, na pesquisa com os cotidianos, objetiva melhor compreender os significados subjetivos das experiências vividas e a natureza das memórias individual e coletiva. Ao contarmos uma história, enfatiza Alves (2008), somos narradores praticantes dos relatos que nos chegam inserindo, neles, o fio de nossos modos de contar, exercendo, dessa forma, a arte de contar histórias, fundamental no processo de aprenderensinar, acrescida do prazer de contar histórias, o prazeroso ato da pertinência do que é científico.

Fonte: https://www.google.com.br/ imagem

Imagem 4 Formas de resistência 

Concordamos com essas ideias, enfatizando a necessidade de se multiplicarem as teorias, os conceitos, os fatos, as fontes e os métodos, estabelecendo variadas e complexas relações entre eles, tendo em vista aproximar teoria e prática pedagógicas, local e global, ordem e caos, ciberespaço e cidade, mediante a criação de atos de currículoiii, ou currículos em ação, conceito-dispositivo que leva em conta a práxis curricular e nos permite entender como os currículos são concebidos, modificados e praticados, por seus atores/autores, e como esses mudam seus atos, ou agem para conservar, de alguma forma, suas concepções, práticas e realizações, como mostram as narrativas, a seguir (Imagens 5, 6 e 7, respectivamente).

Nilda Alves (três de agosto, às 20h49):

Eu, começando um grupo Black Block de velhinhas com mais de 75 para quebrar todos os bancos no Brasil!!!!!!! Ver nosso símbolo abaixo!!!! Quem mais vem?????

Fonte: https://www.facebook.com/alves.nilda.9

Imagem 5 - Imagem compartilhada no Facebook 

Como ressalta Alves (2008), é preciso beber em todas as fontes; o que requer aceitar o múltiplo, pois o cotidiano é tecido por caminhos que se entrecruzam, interdependem-se e se inter-relacionam; o que implica ir para além das fontes de conhecimento tradicionalmente aceitas - conceituadas, categorizadas, classificadas e enumeradas, interessando-se por aquilo que é contado (relatos) pela memória, pelo documento, pela fotografia e pelo acontecimento. É preciso incorporar a parte e o todo de cada expressão individual, assumindo o diferente e o heterogêneo, tendo em vista desvencilhar-se dos espaços de ritos dispensáveis e de repetições e processos equivocados.

Edmea Santos (4 de agosto, às 09h47)

Uerj viva!!! Esperamos todos e todas na próxima semana. Evento sobre Estudos da Infância na nossa Faculdade de Educação. Atenção para programação e atividades divulgadas pela Rita Ribes! #uerjresiste! Resiste em rede e com autoria.

Fonte: https://www.facebook.com/UniversidadedoEstadodoRiodeJaneiro/photos

Imagem 6 Folder do evento Estudos da Infância compartilhado no Facebook 

Fonte: https://www.facebook.com/rita.ribes

Imagem 7 Professores da Uerj no evento sobre Infância: visagens 

Ao elaborar a dialética da ação em um processo coletivo e único de construção dos quadros, Vik Muniz interveio na realidade social investigada, pondo em evidência as práticas sociais, que emergem de diferentes contextos (lixão, comunidade), para além dos muros de seu atelier (laboratório de imagens). Nilda Alves e Rita Ribes nos propõem uma reflexão sobre como as ambiências político-formativas do contexto contemporâneo estão fortemente marcadas pelo digital em rede, sejam em atividades políticas, sociais, econômicas e/ou educacionais, dentrofora das redes. Com efeito, esses múltiplos contextos extrapolam o contexto da formação acadêmica, atravessando-a. Alves (2010) afirma que a formação de professoras se dá em múltiplos espaçostempos. São eles: (a) o das práticas da formação acadêmica; (b) o das práticas pedagógicas cotidianas; (c) o das práticas políticas de governo; (d) o das práticas políticas coletivas dos movimentos; (e) o das práticas das pesquisas em educação; (f) o das práticas de produção e “usos” de mídias; e (g) o das práticas nas cidades, com destaque para o princípio da orientação coletiva e a importância do olhar do outro (Alves; Garcia, 2000).

Ao refletir sobre sua experiência, a fim de reorientar suas ações, como ressaltado numa cena em que, em conversa com seu amigo Fábio e esposa, Vik indaga sobre o que fazer com aquelas pessoas, após a conclusão da obra. Como lhes dizer que terão de voltar àquela realidade? Como assumir que não poderão mantê-los fora dali? Esses questionamentos, compartilhados e discutidos, testemunham o compromisso e a implicação do artista com sua arte e com seus propósitos.

Nessa perspectiva, Fresquet (2013) afirma que “as artes se revelam uma janela para descobrir um mundo inacabado, ávido de transformações e de memórias para projetar futuros” (p. 9), invadindo as certezas da educação, de forma a provocá-la. Assim, trabalhar nessa direção requer implicação; um mergulho nas inúmeras lógicas que presidem a vida cotidiana, considerando a relevância de todos os seus elementos constitutivos, em suas tantas relações e consequências, para que evitemos tecer generalizações indevidas.

Para Borba (2001), a implicação consiste no ato de se dobrar, voltar-se para dentro, pois é por meio de nossas implicações psicoafetivas, estrutural-profissionais e histórico-existenciais que iremos produzir, com nossas marcas, os alicerces de nossas obras (Barbier, 2007), tornando-nos, pelo menos, coautores do que será produzido (Ardoino, 1998). Isso nos remete à relação professor e aluno, no que se refere ao processo de aprendizagem, nos diferentes espaçostempos educativos; o que exige a adoção de metodologias que se alinhem aos princípios de colaboração, dialogicidade e interatividade, para que, a exemplo de Vik, nos apropriemos positivamente das narrativas desses praticantes culturais, a fim de compormos nossos próprios “quadros de referências” - processo que, inevitavelmente, vai nos transformar e transformar o outro.

Apesar de toda a turbulência decorrente da crise do Estado do Rio de Janeiro, com reflexos perversos para o funcionamento da Universidade, as atividades da Pós-Graduação não sofreram solução de continuidade, sendo desenvolvidas em outros espaçostempos (Facebook, E-mail, WhattsApp), como pode ser visto nas narrativas transcritas, a seguir, extraídas da página do Grupo Cibercultura, Redes Sociotécnicas e Currículos Online, visualizada na Imagem 8, adiante.

Olá turma! Na semana que vem não teremos aula presencial por conta do Redes. Nos encontraremos no dia 12/06. Para esta data, leiam o livro a seguir. Livro completo. Faremos estudos de caso e teremos esta obra como referência teórica. O livro é de minha autoria e pode ser acessado pelo link a seguir. Baixem app do kindle em seus tablet. Temos alguns capítulos em minha pasta na xerox (eu autorizo a cópia). Espero que gostem. Alguns alunos já conhecem. Mesmo assim. Peço que releia com atenção, com novos olhares ... sentindo-se determinada.

Pessoal, antes de entrarmos nos fenômenos condicionados pela Web 2.0 , e as redes sociais. Penso que seja interessante falarmos sobre alguns fundamentos, como por exemplo: hipertexto, hipermídia, interatividade, simulação.

Vamos por partes. Comecemos pelo hipertexto. Aqui temos um texto que já faz relação com conteúdos online Vamos conversar?

Fonte: https://www.facebook.com/search/top/?q=cibercultura%20redes%20sociot%C3%A9 cnticas%20e%20curr%C3%ADculos%20online

Imagem 8 Print da página do Grupo Cibercultura, Redes Sociotécnicas e Currículos Online 

Os processos produtivos engendrados por Vik possibilitaram grandes emoções aos catadores, despertando-lhes o orgulho e a autoestima, trazendo-lhes esperança de dias melhores, como mostra a fala de Tião, ao telefone com sua mãe: “[...] Valeu a pena tudo o que fiz até hoje (...). Ninguém acreditava em mim (...). Vendeu 100 mil reais! É como se eu fosse um pop star”. Agora sou obra de arte!”. Essa alegria também é compartilhada por seus companheiros de trabalho, envolvidos nas obras, aos serem convidados para uma exposição de Vik, no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro. A valorização dos saberes, fazeres e dizeres de cada um, expressa nas obras expostas e nas entrevistas concedidas por esses atores, é motivo de orgulho dessas pessoas.

Leide: [...] Você hoje é arte! (...). A gente se põe muito pequena. E as pessoas lá fora acham a gente tão grande, tão bonita!

Magna: [...] Você não tem noção! Eu tinha vergonha de falar que trabalhava no lixão. Depois que comecei a trabalhar com Vik, conto pra todo mundo.

Zumbi: [...] Olha o pai, filhote, que bonito!

De forma similar, os professores da UERJ, em sua militância, resistiram (e ainda resistem) com seus projetos e percursos formativos, que emergem por força das mudanças na rotina da Universidade, na expectativa de que essa situação se resolva. Como docentes- pesquisadores, vivenciam as redes educativas como campo de pesquisa-formação multirreferencial, procurando aprender ao mesmo tempo em que ensinam e pesquisam, pesquisando e ensinando enquanto aprendem. Como enfatiza Santos (2007, p. 13-4),

Pesquisador não é aquele que constata o que ocorre, mas também aquele que intervém como sujeito de ocorrências. Ser sujeito de ocorrências no contexto de pesquisa e prática pedagógica implica conceber a pesquisa-formação como processo de produção de conhecimentos sobre problemas vividos pelo sujeito em sua ação docente.

Nessa perspectiva, tecem conhecimentos em rede, com outros praticantes culturais, possibilitando que outras narrativas que tenham sentido para eles, emerjam. Isso implica ‘olhar entre’, olhar de forma reflexiva, dando condições para que emerjam diferentes sentimentos e múltiplas formas de pensar, colocando em evidência, como enfatiza Alves (2008), suas falas, que se repetem uma infinidade de vezes nas redes tecidas e retecidas, nas diversas formas de dizer e nos tantos sentidos possíveis que constroem as representações sociais. Nesse sentido, e a título de ilustração, apresentamos narrativas retiradas do WhatsApp do Grupo Pesquisa Docência, no dia 04.07.2017:

[10:22, 4/7/2017] Frida:@Edméa já tive aqui uma ideia. Vou propor a criação de um museu virtual da UERJ. Assim poderemos discutir alguns conceitos e colocar em prática o uso de apps e outras interfaces. Q tal?

[10:22, 4/7/2017] Frida: Em tempos de #uerjresiste acredito q resgatar a memória da uerj seria mto importante!

[10:24, 4/7/2017] Frida: O que acham, GPDOCs?

[10:24, 4/7/2017] Frida: Quem quiser embarcar nessa, só falar! @Shenia Mineiro Martins ?!?!

[11:13, 4/7/2017] Edméa: Todos e todas! Reservem as segundas das 13 às 19 para o Gpdoc. Atenção! Mesmo não se matriculando na disciplina, vcs devem frequentar, pois será espaço de estudo. Grupo será para orientação coletiva; e vamos inovar também no coletivo da orientação de análise de dados.

[11:40, 4/7/2017] Joelma: Sim. Muito legal, @Frida. Essa ideia de registrar com artefatos antigos tbm é muito interessante.

[12:08, 4/7/2017] Shenia Mineiro Martins: Estou fazendo tudo isso, Mea. Comprei os livros dos principais teóricos do grupo e devo terminar meu pré projeto, já em agosto. Tb tenho me preparado para a prova escrita, embora provas sem bibliografia me deixem nervosa. Nunca deixei de passar em uma prova, mas se por acaso acontecer, continuarei no grupo trabalhando e tentarei quantas vezes for preciso.

O retorno financeiro obtido com a venda das reproduções de Retratos do Lixo possibilitou que todos os catadores envolvidos com essas produções mudassem suas vidas para melhor. No entanto, o encerramento do lixão de Gramacho, em 2012 - necessário devido aos riscos ao meio ambiente e à saúde da população -, não foi acompanhado de políticas de revitalização do bairro, ou da ajuda para inserção dos catadores no mercado de trabalho.

Apesar dos atrasos salariais constantes, da insegurança, da angústia e do aumento do stress geral, esforços têm sido envidados, por parte da comunidade acadêmica uerjiana, para que a Instituição se mantenha VIVA, na expectativa de que a adesão ao regime de recuperação fiscal pelo Governo do Estado permita reequilibrar as finanças estatais, com vistas a regularizar suas atividades de ensino, pesquisa e extensão.

4 CONCLUSÃO

Discutimos, neste artigo, a inter-relação cidades e cotidianos escolares, à luz do documentário “Lixo Extraordinário” e de nossas experiências como docentes-pesquisadoras neste momento singular e dramático em que a UERJ, a despeito de não paralisar suas atividades, atinge um patamar insuportável que a impede de exercer, de forma efetiva, suas funções.

Procuramos aproximar linguagens e práticas utilizadas pelos praticantes culturais nesses espaçostempos, nos quais a vida segue em fluxo contínuo. Da mesma forma que o cotidiano escolar não é a escola, o cotidiano da cidade não é a cidade; ambos são meros lugares, nos quais a vida só pode ser vivida quando esses lugares são praticados, dado que a vida cotidiana é a vida das pessoas.

Estabelecemos a relação entre nossas pesquisas e os diferentes saberesfazeres cotidianos, sem, contudo, subestimar os modos clássicos de produção do conhecimento, ou seja, as contribuições advindas do cientificismo. Intentamos, porém, propor um olhar multifacetado para as possibilidades que as práticas cotidianas podem nos oferecer, dado que as experiências nos permitem exercitar nossas itinerâncias.

Desse modo, consideramos os cotidianos escolares como espaçostempos de produções, imbricação de saberes, criações, imaginações, artimanhas e significações diversas, nos quais, como pesquisadores implicados, enredamo-nos, transformando aqueles que lá atuam, ao mesmo tempo em que somos por eles transformados. Nessa perspectiva, procuramos, a exemplo dos habitantes de Bauciiv - que, com binóculos e telescópios apontados para baixo não se cansam de examinar a cidade folha por folha, pedra por pedra, formiga por formiga, contemplando fascinados a própria ausência -, colocar todos os nossos sentidos para entrever o que se esconde, ouvir as diferentes expressões que emergem das inúmeras ações e narrativas que, muitas vezes, somente na aparência são iguais e repetitivas.

No movimento práticateoriaprática, apreendemos a realidade da UERJ, atentas a tudo o que nela se passa, repete-se, ou se inova. Enfrentamos, dessa forma, as incertezas e dificuldades, conscientes de que, ao lado da grande luz irradiada dos grandes poderes, pequenos pirilampos, próximos uns aos outros, atraem-se e, quando parecem ter desaparecido, ressurgem em outros lugares, fazendo emergir sua pequena luz como uma imagem de resistência.

REFERÊNCIAS

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i Adotamos o uso dos termos espaçostempos, fazeressaberesfazeres, dentrofora, entre outros, escritos de forma diferenciada, pois nos inspiramos no referencial teórico de Alves (2008) sobre as pesquisas nos/dos/com os cotidianos. Para a autora: “A junção de termos e a sua inversão, em alguns casos, quanto ao modo como são ‘normalmente’ enunciados, nos pareceu, há algum tempo, a forma de mostrar os limites para as pesquisas nos/dos/com os cotidianos, do modo dicotomizado criado pela ciência moderna para analisar a sociedade” (ALVES, 2008, p.11).

ii Programa disponibilizado em:<http://culturaecurriculo.fde.sp.gov.br/programa.aspx>. Acesso em: 10 fev. 2016.

iii Termo cunhado por Macedo (2013) para o qual os atos de currículo são, ao mesmo tempo, uma construção epistemológica, cultural e político-pedagógica uma vez que, interativamente e numa incessante atribuição de sentidos, todas as pessoas envolvidas nas questões curriculares, a partir da sua posição política, são atores curriculantes. O autor percebe o “Ato” como uma ação concreta inserida em um mundo vivo, intencional, praticado por alguém situado. Criamos atos de currículo no tensionamento da/na relação entre currículo e formação, entretecidas, implicadas aos âmbitos da intimidade e da negociação. Os atos de currículo se fazem por uma incessante construção etnometódica, indexalizada aos sentidos dos atores curriculantes.

iv Bauci é uma, entre as incontáveis cidades do imenso império do conquistador mongol, descrita pelo viajante Marco Polo para Kublai Khan, no livro Cidades Invisíveis, de Ítalo Calvino.

Recebido: 22 de Agosto de 2017; Aceito: 02 de Abril de 2018

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