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Revista e-Curriculum

versión On-line ISSN 1809-3876

e-Curriculum vol.17 no.3 São Paulo jul./sept 2019  Epub 28-Oct-2019

https://doi.org/10.23925/1809-3876.2019v17i3p788-793 

Editorial

REVISTA E-CURRICULUM: ESPAÇO DE DEMOCRATIZAÇÃO DO SABER E DE AFIRMAÇÃO DA ÁREA DE CONHECIMENTO EDUCAÇÃO

Antonio CHIZZOTTIi 

Maria Elizabeth Bianconcini de ALMEIDAii 

i Professor Doutor da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo PUC-SP. E-mail: anchizo@uol.com.br

ii Docente da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), Faculdade de Educação, Programa de Pós-Graduação em Educação: Currículo, linha de pesquisa de Novas Tecnologias em Educação. Bolsista PQ 1C do CNPq. E-mail: bethalmeida@pucsp.br


Ao longo da existência da revista e-Curriculum, muitos conflitos, enfrentamentos e desafios foram colocados em destaque, evidenciando a reflexão epistemológica, o estatuto da ciência e das disciplinas, a teoria do currículo e o currículo escolar, considerando os avanços, ainda que contraditórios, propiciados pela teoria e pela prática do Currículo na história da educação contemporânea.

As últimas edições da revista e-Curriculum mostram a ênfase em estudos sobre o currículo com foco nas políticas curriculares brasileiras convulsionadas pela proposição e aprovação de novos documentos norteadores de propostas das distintas esferas da educação, com destaque para a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e a reforma do ensino médio.

Neste ano de 2019, o pensamento e as ações de professores e pesquisadores se encontram abalados por um ideário que tenta atribuir aos educadores a causa de todas as mazelas da educação, desmerecendo o fazer e o pensar sobre a educação, a identidade docente e sua formação, com a consequente depreciação da educação como ciência e área do conhecimento.

Por compreender a educação como uma prática cultural, marcada pela diversidade de pensamentos e práticas cotidianas, com significados e sentidos continuamente negociados, a revista e-Curriculum se pauta pelo respeito à pluralidade de pensamentos, pelo diálogo na divergência, pelo exercício da democracia e pela partilha de saberes. Caracteriza-se assim, como um espaço de lutas em prol da justiça social, educacional e curricular e de socialização do conhecimento sobre temas candentes da educação e do currículo, explicitados tanto em artigos decorrentes das submissões de fluxo contínuo como aqueles aglutinados em dossiês temáticos mediante chamadas públicas específicas.

Com o objetivo de privilegiar a comunicação de processos e resultados da pesquisa científica democratizando o acesso e o uso do conhecimento, aspectos essenciais ao desenvolvimento do saber acadêmico, a edição do volume 17, número 3, da Revista e- Curriculum, retrata o empenho de editores, equipe técnica e pareceristas para impulsionar a tramitação da revisão de trabalhos submetidos à avaliação e brinda os leitores com artigos estruturados em um dossiê temático internacional e outros artigos decorrentes da demanda contínua.

O dossiê temático intitulado "Em busca da justiça curricular: as possibilidades do currículo escolar na construção da justiça social" é composto de 13 artigos, sendo 5 internacionais, 6 nacionais e 2 construídos em parcerias de autores nacionais e internacionais, tendo como convidadas da organização as professoras Branca Jurema Ponce, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, PUC-SP, e Carlinda Leite, da Universidade do Porto, Portugal. As características peculiares desse dossiê são abordadas na apresentação elaborada pelas organizadoras, que adotam a justiça curricular como um dos princípios fundamentais para a consecução da justiça social.

Por sua vez, a demanda contínua da presente edição é constituída por 11 artigos e uma resenha, que versam sobre diferentes temáticas relacionadas com políticas curriculares, ensino médio, formação de professores, políticas públicas e tecnologias, de autores de quatro regiões do país - nordeste, centro-oeste, sudeste e sul -, que descortinam a complexidade evidenciada nos problemas e contextos investigados, a diversidade teórico-metodológica e a pluralidade de configurações curriculares.

São três os artigos que enfocam distintos aspectos relacionados com a política curricular de formação de professores, respaldados por análises documentais mediante distintos fundamentos teóricos, que mostram fragilidades ocasionadas pela tendência de homogeneização do currículo, interpretações ambíguas e prevalência de mecanismos de regulação que induzem a fragmentação do conhecimento.

O artigo de Kátia Costa Lima Corrêa de Araújo, da Universidade Federal de Pernambuco, se apoia na teoria do discurso para analisar o debate em torno da política curricular de formação de professores (1996-2006) identificando demandas, antagonismos e disputas hegemônicas sobre os sentidos do Estágio Supervisionado evidenciados em documentos curriculares do Ministério da Educação/Conselho Nacional de Educação e da Associação Nacional pela Formação dos Profissionais da Educação (ANFOPE). O estudo contribui para o reconhecimento do modus operandis da hegemonização.

Lucineide Mendes Pires, da Universidade Estadual de Goiás, e Lana de Souza Cavalcanti, da Universidade Federal de Goiás, analisam o currículo evidenciado nos Projetos Pedagógicos de cursos de Licenciatura em Geografia de instituições públicas, à luz da recomendação da flexibilização curricular proposta pelas Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação de Professores da Educação Básica (DCN), tendo identificado semelhança entre as estruturas organizacionais, bem como inadequações ou incoerências na dimensão pedagógica, na prática como componente curricular e no estágio supervisionado, com indícios de diferentes interpretações por parte dos construtores de currículo.

A formação do pedagogo para a educação especial é estudada em artigo de Allan Rocha Damasceno e Andressa Silva Pereira, ambos da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, adotando como fundamento a Teoria Crítica da Sociedade, que orienta a análise das ementas e dos programas apresentados nas matrizes curriculares dos cursos oferecidos por duas universidades públicas do Estado do Rio de Janeiro. Como resultados identificam embates ideológicos subjacentes à seleção de conhecimentos com vistas a legitimar certos saberes com a primazia da regulação, homogeneização e segmentação.

A política curricular de formação de agrônomos é estudada com foco na educação ambiental de cursos de Agronomia oferecidos por Universidades Federais Rurais brasileiras, em artigo de autoria de Monica Lopes Folena Araújo e Cirdes Nunes Moreira, da Universidade Federal Rural de Pernambuco. O estudo identificou enfoques distintos da educação ambiental - conservadora, regionalista e integral, sendo as duas últimas com viés de sustentabilidade em uma perspectiva cultural, ética e humanística, denotando concepções contraditórias entre os cursos analisados.

No que tange à formação de professores a distância, as autoras Luciana Boff Turchielo, da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro e Rosane Aragón, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), descrevem e analisam um estudo desenvolvido sobre o desenvolvimento do pensamento reflexivo na formação de professores em um curso de licenciatura em Pedagogia, na modalidade a distância, promovido pela UFRGS, sustentado pela integração entre a teoria e a prática e pelo diálogo entre a universidade e a escola. Os resultados evidenciam que os sujeitos participantes desse curso reorganizam e reconstroem o conhecimento, refletem, problematizam e articulam a prática pedagógica com a teoria.

O ensino médio assume papel relevante nesta edição da Revista e-Curriculum, com três artigos que tratam das disputas, tensões e do debate ideológico engendrados em torno da Reforma do Ensino Médio, do currículo e da avaliação, evidenciando a conscientização das ameaças à democracia por meio das políticas educacionais.

Alaim Souza Neto, da Universidade Federal de Santa Catarina, examina a reforma do Ensino Médio e a terceira versão da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), complementada com outros documentos vigentes sobre o ensino médio. Entre os resultados da análise documental, o texto caracteriza as disputas e os interesses evidenciados na política curricular em relação ao processo de formação humana, apresentando algumas tensões engendradas em torno do currículo e possíveis impactos para a formação do estudante do Ensino Médio.

O artigo de Álamo Pimentel, da Universidade Federal do Sul da Bahia, trata das disputas políticas e do debate ideológico sobre o modelo educacional que orienta a Reforma do Ensino Médio. Por meio da análise de discurso associada com a perspectiva pós-colonial, o artigo reconhece as marcas neoliberais manifestas na propaganda da reforma veiculada em filmes publicitários do governo federal, o proselitismo pedagógico, a conversão ideológica e a produção de hegemonia presentes nas políticas culturais e educacionais.

A avaliação em larga escala na educação integral do ensino médio é analisada em artigo de Katharine Ninive Pinto Silva e Maria Lucivânia Souza dos Santos, da Universidade Federal de Pernambuco, segundo a visão de gestores, docentes e técnicos educacionais da rede pública de ensino desse estado. Os resultados evidenciam que as atividades do tempo integral centradas no reforço escolar em disciplinas que norteiam tais avaliações gera o estreitamento curricular pactuado com a correção de fluxo escolar com vistas à melhoria do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB).

Para além do currículo escolar, a pesquisa sobre capital cultural e letramento, é apresentada no artigo de Leda Maria de Oliveira Rodrigues e Heloisa Marcassa Monteiro, da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. A pesquisa foi realizada junto a participantes do Projeto Espetáculo no âmbito do Programa Fábricas de Cultura, da Secretaria da Cultura do Governo do Estado de São Paulo, desenvolvido no Jardim São Luís, em São Paulo. Os resultados mostram aumento do capital cultural dos participantes, propiciando o desenvolvimento de habilidades e competências relevantes ao letramento. Observa-se nessa iniciativa das políticas de educação e cultura o potencial de contribuir para a melhoria do capital cultural de estudantes.

Ao adentrar os documentos oficiais curriculares voltados ao ensino de língua portuguesa na educação básica, Emerson de Pietri, da Universidade de São Paulo, enfoca o tratamento pedagógico da heterogeneidade linguística em contexto de ensino brasileiro. Com base em conceitos originários em estudos discursivos franceses e respectivos processos de tradução, o estudo mostra distintas formações discursivas, com conceitos, concepções de língua, de sujeito e de ensino concorrentes, resultando em processos desiguais de distribuição de bens linguísticos contrapondo-se aos princípios da justiça social.

Outra temática com frequente presença em artigos da revista e-Curriculum se refere a tecnologias e educação. A presente edição veicula um artigo, de autoria de Daniela Karine Ramos, da Universidade Federal de Santa Catarina, que trata de uma pesquisa bibliográfica realizada por meio de levantamento e revisão sistemática da literatura em bases de dados relacionada jogos digitais. Os resultados mostram as possibilidades dos jogos digitais para a diversificação curricular e o desenvolvimento mais integral e holístico na infância.

Por fim, na sessão de resenhas, Gabriel Francisco Cevallos Martínez, Handherson Leyltton Costa Damasceno e Társio Roberto Lopes Macedo, da Universidade Federal da Bahia, apresentam o livro de autoria de Sérgio Amadeu da Silveira, intitulado "Privacidade e redes digitais: a comercialização de dados no ciberespaço", que assume uma visão crítica ao questionar a privacidade e a venda de dados pessoais nas redes da internet.

Entende-se que a pluralidade dos artigos publicados nesta edição da revista e- Curriculum mostra a diversidade da área de conhecimento científico denominada educação, os embates das políticas curriculares analisadas e a heterogeneidade das práticas curriculares, que são desveladas por meio de rigorosa análise à luz das teorias basilares abraçadas pelos autores. A par disso, a publicação do dossiê temático "Em busca da justiça curricular: as possibilidades do currículo escolar na construção da justiça social", apresenta a justiça curricular como um processo contínuo de construção do currículo, considerado como um elemento fulcral nas experiências dos sujeitos históricos em busca da justiça social como possibilidade de superação das desigualdades, de respeito às diferenças e aos diferentes e de práticas democráticas, divergindo das propostas hegemônicas de currículo.

Desse modo, os aspectos destacados na presente edição legitimam a manutenção e ampliação de investimentos na educação como campo de saber científico e como prática curricular e cultural.

A Comissão Editorial da revista e-Curriculum agradece a todos que contribuíram com suas produções submetendo artigos à crítica do Comitê Científico, bem como àqueles que se dedicaram à emissão de pareceres, ao trabalho de gestão, suporte técnico e publicação da presente edição, e convida os leitores a visitar os trabalhos que compõem esta edição.

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