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Revista e-Curriculum

versión On-line ISSN 1809-3876

e-Curriculum vol.17 no.3 São Paulo jul./sept 2019  Epub 28-Oct-2019

https://doi.org/10.23925/1809-3876.2019v17i3p1373-1392 

Artigos

JOGOS DIGITAIS E AS FUNÇÕES EXECUTIVAS NA INFÂNCIA: ALTERNATIVAS À DIVERSIFICAÇÃO DO CURRÍCULO

DIGITAL GAMES AND EXECUTIVE FUNCTIONS IN CHILDREN: ALTERNATIVES TO THE DIVERSIFICATION OF THE CURRICULUM

JUEGOS DIGITALES Y FUNCIONES EJECUTIVAS EN NIÑOS: ALTERNATIVAS A LA DIVERSIFICACIÓN DEL CURRÍCULO

Daniela Karine RAMOSi 

i Doutora em Educação. Professora Associada no Departamento de Metodologia de Ensino e no Programa de Pós-Graduação em Educação na Universidade Federal de Santa Catarina. E-mail: dadaniela@gmail.com.


RESUMO

Os jogos digitais, por apresentarem características como desafios progressivos, regras e feedback, criam experiências que podem contribuir com o aprimoramento das funções executivas. Essas funções integram um conjunto de habilidades cognitivas importantes à aprendizagem, bem como são fundamentais para o sucesso escolar e a inserção social e profissional dos sujeitos. Assim, este trabalho tem o objetivo de sistematizar evidências científicas relacionadas às contribuições do uso dos jogos digitais para o exercício das funções executivas, visando discutir as possibilidades e a importância de sua integração ao currículo escolar. Nesse sentido, apresenta-se os resultados de uma pesquisa bibliográfica realizada por meio de levantamento da literatura e de revisão sistemática em bases de dados. Desse modo, pretende-se ampliar a discussão e a reflexão sobre as inúmeras possibilidades de diversificação curricular para um desenvolvimento mais integral e holístico dos alunos, o qual contemple, de maneira intencional, o aprimoramento das funções executivas pelo uso dos jogos digitais.

PALAVRAS-CHAVE: Jogos Digitais; Funções Executivas; Escola; Currículo

ABSTRACT

Digital games, which present characteristics such as progressive challenges, rules and feedback, create experiences that can contribute to the improvement of the executive functions. These functions integrate a set of important cognitive abilities to learning and are fundamental for the school success and the social and professional insertion of the subjects. Thus, this paper aims to systematize scientific evidence related to the contributions of the use of digital games to the exercise of executive functions, aiming to discuss the possibilities and importance of their integration in the school curriculum. In this sense, a bibliographical research is carried out through a literature survey and a systematic review in databases. In this way, it aims to broaden the discussion and reflection on the innumerable possibilities of curricular diversification for a more holistic and integral development of the students, which intentionally contemplates the improvement of executive functions by the use of digital games.

KEYWORDS: Digital Games; Executive Functions; School; Curriculum

RESUMEN

Los juegos digitales, por presentar características como desafíos progresivos, reglas y feedback, crean experiencias que pueden contribuir con el perfeccionamiento de las funciones ejecutivas. Estas funciones integran un conjunto de habilidades cognitivas importantes al aprendizaje, así como son fundamentales para el éxito escolar y la inserción social y profesional de los sujetos. Así, este trabajo tiene el objetivo de sistematizar evidencias científicas relacionadas a las contribuciones del uso de los juegos digitales para el ejercicio de las funciones ejecutivas, buscando discutir las posibilidades y la importancia de su integración en el currículo escolar. En ese sentido, se realiza una investigación bibliográfica por medio de levantamiento de la literatura y de revisión sistemática en base de datos. De este modo, se pretende ampliar la discusión y la reflexión sobre las innumerables posibilidades de diversificación curricular para un desarrollo más integral y holístico de los alumnos, el cual contempla, de manera intencional, el perfeccionamiento de las funciones ejecutivas por el uso de los juegos digitales.

PALABRAS CLAVE: Juegos digitales; Funciones ejecutivas; Colegio; Currículo

1 INTRODUÇÃO

Os jogos digitais compartilham características importantes dos jogos em seu conceito mais amplo, como atividade que envolve regras e desafios, capaz de absorver o jogador intensamente (HUIZINGA, 1996). No digital, essas características estão presentes combinadas com o dinamismo visual, a interatividade e o feedback imediato (MURRAY, 2003; PRENSKY, 2012; SALEN; ZIMMERMAN, 2012). Os jogos digitais constituem-se como atividade lúdica, envolvendo uma série de ações limitadas por regras e pelo universo do game, os quais contextualizam as ações do jogador (SCHUYTEMA, 2008).

Diante dessas características, destacamos, ainda, que os jogos, por envolverem a prática repetida e o aumento progressivo dos desafios, criam experiências que podem contribuir com o aprimoramento das funções executivas (DIAMOND; LEE, 2011). De acordo com Rivero, Querino e Alves (2012), os jogos digitais apresentam uma rápida sucessão de estímulos, visuais ou auditivos, nos quais os jogadores necessitam focalizar sua atenção, precisam gerenciar diversas tarefas e manter a meta central para obterem sucesso no jogo. Todas essas características, em um ambiente altamente veloz e pouco previsível, tornam os jogos ferramentas poderosas no treino da atenção (RIVERO et al, 2012). Os jogos de ação, por exemplo, envolvem sucessão rápida de estímulos, a necessidade de manter o controle de variáveis simultaneamente e a visão periférica, podendo contribuir com o exercício de habilidades cognitivas (EICHENBAUM; BAVELIER; GREEN, 2014).

Palaus et al. (2017), ao reconhecerem que a interação com os jogos digitais se constitui como uma atividade popular, especialmente entre jovens, e que muitos estudos têm procurado analisar os efeitos sobre aspectos neurais e comportamentais, realizaram uma revisão sistemática para compreender a relação entre o uso desses jogos e seus correlatos neurais. Os resultados revelaram grande heterogeneidade no campo de estudo e estabeleceram ligações entre aspectos neurais e cognitivos, particularmente sobre a atenção, o controle cognitivo, as habilidades visuoespaciais, a carga de trabalho cognitiva e o processamento de recompensas (PALAUS et al., 2017).

Nesse sentido, muitos estudos têm apontado as contribuições do uso dos jogos digitais para o aprimoramento de funções cognitivas, como: melhor desempenho relacionado às habilidades visuais básicas e à atenção (LI et al., 2010); exercício das habilidades relacionadas à atenção, incluindo o aumento do número de objetos percebidos simultaneamente e a melhora na atenção seletiva e dividida (FENG; SPENCE; PRATT, 2007; DYE; BAVELIER, 2010); melhora no desempenho cognitivo, aprimorando a capacidade de fazer mais de uma tarefa ao mesmo tempo e tomar decisões (BOOT et al., 2008); e desenvolvimento das funções executivas (DIAMOND; LEE, 2011).

Diante das possibilidades de aprendizagem presentes nos jogos, as quais estão associadas à diversão, ao engajamento, ao exercício das funções cognitivas e ao próprio uso das tecnologias, enfatizamos neste trabalho a integração do uso dos jogos digitais ao currículo escolar, especialmente para o aprimoramento das funções executivas. Esse enfoque apoia-se no papel das funções executivas para o desempenho escolar, na importância de se favorecer uma formação integral e globalizadora dos alunos, na função emancipatória da escola, na oferta de condições para aprendizagem e na necessidade de inserção das tecnologias digitais.

Considerando esses aspectos, este trabalho tem o objetivo de sistematizar evidências científicas relacionadas às contribuições do uso dos jogos digitais para o exercício das funções executivas, visando discutir as possibilidades e a importância de sua integração ao currículo escolar. Desse modo, pretende-se ampliar a discussão e a reflexão sobre as inúmeras possibilidades de diversificação curricular para um desenvolvimento mais integral e holístico dos alunos, o qual contemple, de maneira intencional, o aprimoramento das funções executivas pelo uso dos jogos digitais.

2 JOGOS DIGITAIS, FUNÇÕES EXECUTIVAS E ESCOLA

As funções executivas envolvem o circuito neural do córtex pré-frontal e referem-se a funções cognitivas como a flexibilidade cognitiva, a inibição (autocontrole e autorregulação), a memória de trabalho, a resolução de problemas, o raciocínio e o planejamento (DIAMOND; LEE, 2011).

Essas funções envolvem a integração de “[...] um grupo de habilidades que nos ajudam a focar em múltiplos fluxos de informação ao mesmo tempo, monitorar erros, tomar decisões com base nas informações disponíveis, rever planos, se necessário, e resistir à tentação de deixar a frustração nos conduzir a ações precipitadas” (CENTER..., 2011, p. 1). Dentre essas funções, destacam-se três dimensões:

  1. memória de trabalho - consiste na capacidade de reter e manipular determinadas informações durante curtos períodos de tempo;

  2. controle inibitório - trata-se da habilidade de conter nossos impulsos, resistir às tentações e pensar antes de agir, permitindo uma atenção direcionada capaz de relativizar outros estímulos. Envolve, ainda, a capacidade de administrar nossas emoções mais intensas como raiva, frustração ou fúria, além de manter o foco diante de distrações;

  3. flexibilidade cognitiva - considerada a capacidade de ajustar agilmente nosso pensamento para atender diferentes exigências ou prioridades, permitindo que o sujeito se adapte a outros ambientes, aplique diferentes regras em diferentes contextos, reconheça e corrija erros, adeque planos conforme necessário e experimente diferentes estratégias para alcançar determinado objetivo. (CENTER..., 2011).

Na interação com os jogos digitais, essas dimensões são fortemente exercitadas, por exemplo, quando fazemos uso da memória de trabalho guardando as regras e os objetivos até a conclusão de um desafio ou missão do jogo, ou retemos a sequência de movimentos e direções após a consulta em um mapa para chegar a um lugar específico no cenário de jogo. O controle inibitório se manifesta quando é preciso esperar a hora certa para realizar uma ação, como analisar as características do avatar que se aproxima antes de partir para o ataque. E a dimensão da flexibilidade cognitiva pode ser associada à necessidade de levantar hipóteses para solucionar um problema que aparece no jogo, testando diferentes estratégias para obter o melhor desempenho.

Além disso, quando prevemos o uso de jogos digitais no contexto escolar, podemos ampliar o potencial de exercício dessas dimensões. No desenvolvimento das funções executivas, a experiência e a interação com o meio desempenham papel fundamental; assim, o contexto escolar, enquanto um ambiente social repleto de possibilidades e experiências, torna-se enriquecedor e propício ao desenvolvimento dessas funções. O uso dos jogos digitais nesse espaço pode se constituir de forma mais efetiva e intencional para o aprimoramento das funções executivas, por isso enfatizamos a integração ao currículo escolar das atividades pautadas no uso de jogos digitais.

As características do cotidiano escolar corroboram o fato de que as funções executivas “[...] geralmente se manifestam em ambiente que demandam criatividade, respostas rápidas a problemas novos, planejamento e flexibilidade cognitiva” (OLIVEIRA-SOUZA et al., 2013, p. 291). E as atividades desenvolvidas especialmente na Educação Infantil e no Ensino Fundamental, por envolverem fortemente a interação social, os jogos e as brincadeiras, criam um ambiente favorável ao desenvolvimento dessas funções.

Além do ambiente escolar, destacamos que há alguns jogos simples ou minigames que, segundo Prensky (2010), são curtos e individuais, costumam oferecer um desafio único e problemas repetitivos, cujas regras são dominadas com facilidade e rapidez; os quais, por suas características, podem ser mais facilmente utilizados na escola. Entre esses tipos de jogos, há alguns que envolvem mais fortemente o uso das habilidades cognitivas, por suas dinâmicas, seus desafios e sua jogabilidade, mesmo que não tenham sido desenvolvidos com esse objetivo (RAMOS, 2013). Esses jogos que envolvem o exercício das habilidades cognitivas podem ser adjetivados como cognitivos. Em jogos como a Hora do Rush1, por exemplo, no qual o jogador precisa movimentar vários carros para manobrar um carro específico, é preciso estar focado no desafio, planejar as ações e exercitar a capacidade de resolução de problemas.

Os jogos cognitivos podem ser definidos como “[...] um conjunto de jogos variados que trabalham aspectos cognitivos, propondo a intersecção entre os conceitos de jogos, diversão e cognição” (RAMOS, 2013, p. 20). Desse modo, parte-se do reconhecimento da contribuição que os jogos oferecem ao desenvolvimento infantil e coloca-se ênfase nos aspectos cognitivos. Esses jogos podem ter diferentes formatos, desde tradicionais, como jogos de desafios ou tabuleiro, aos digitais. Os jogos cognitivos digitais propõem desafios que exigem o exercício de aspectos cognitivos como memória, raciocínio lógico, cálculo, criatividade, resolução de problemas, atenção e concentração, por exemplo. Esses jogos podem ser apresentados em diferentes formatos e, de modo geral, são jogos simples, apresentam níveis de dificuldade crescentes e podem reproduzir os jogos de tabuleiro, utilizando o meio digital (RAMOS, 2013).

O uso desse tipo de jogos no contexto escolar torna-se viável, considerando que não requerem períodos extensos de interação, podem ser facilmente compreendidos por crianças de várias idades e não necessitam de tecnologias robustas, ao mesmo tempo em que se voltam, mais pontualmente, para o exercício das funções executivas, sem perder o potencial lúdico, divertido e motivador.

3 ESTUDOS SOBRE O USO DOS JOGOS DIGITAIS NA ESCOLA PARA O EXERCÍCIO DAS FUNÇÕES EXECUTIVAS

Apesar de muitas pesquisas apontarem para as contribuições dos jogos digitais para o desenvolvimento das funções cognitivas (MACKEY et al., 2011; RUEDA; CHECA; CÓMBITA, 2012, OEI; PATTERSON, 2013; CASTELLAR et al., 2015), esses estudos são relativamente recentes, muitos se voltam para o público adulto (FENG; SPENCE; PRATT, 2007; DYE; BAVELIER, 2010; LI et al., 2010) e poucas são as discussões relacionadas ao seu uso com esse propósito no contexto escolar.

A realização de um levantamento, sistemático ou não, em bases de dados ou em mecanismos de busca, revela que poucos são os estudos que propõem intervenções com o uso de jogos digitais para o aprimoramento das funções executivas no contexto escolar. Grande parte dos resultados obtidos, relacionados ao uso de jogos e funções executivas, é decorrente de estudos causais comparativos (LI et al., 2010) ou de intervenções realizadas em laboratórios (PETTY; COELHO, 2012; FENG; SPENCE; PRATT, 2007), ou ambientes domésticos dos participantes (NOUCHI et al., 2013).

Uma aproximação com o foco no tema deste trabalho foi realizada por meio de uma revisão sistemática feita em três bases de dados: Science Direct, Eric e Scielo, utilizando a combinação das seguintes palavras-chave: funções executivas, jogos, escola ou educação, considerando o período entre 2007 e 2016. Não houve resultados da busca com os termos em português, enquanto em inglês foram encontrados 23 trabalhos no total, e, após a análise, considerando o título e o resumo, restaram três trabalhos que poderiam ser relacionados à temática. Os critérios de inclusão utilizados foram pesquisas que propunham a discussão e o aprofundamento teórico ou aplicado do jogo para o exercício das funções executivas. A Figura 1, a seguir, apresenta um esquema sobre as buscas realizadas na revisão sistemática.

Fonte: autoria própria.

Figura 1 Esquema explicativo da revisão sistemática realizada. 

Trabalhos como o de Buckner e Kim (2012) não foram considerados por abordarem o modo como os conflitos que crianças e jovens da Palestina interferem negativamente no desenvolvimento das funções executivas e os dispositivos móveis foram utilizados para avaliar e estabelecer correlações, não como intervenção.

Dos três trabalhos selecionados, apenas o trabalho de Lopez-Rosenfeld et al. (2013) apresenta o jogo Mate Marote, que pode ser utilizado em intervenções educativas, oferecendo estatísticas de uso, e foi utilizado no contexto escolar para treinar o controle inibitório. Os outros dois trabalhos selecionados propõem intervenções com base no uso de jogos para crianças em idade escolar.

O trabalho de Petty e Coelho (2012) discute a intersecção entre o uso de jogos e as funções executivas, resgatando pesquisas em laboratório que vêm sendo desenvolvidas há mais de duas décadas no Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo. Entretanto, não descreve resultados relacionados ao uso dos jogos digitais, nem intervenções feitas em sala de aula ou integradas ao currículo escolar.

O terceiro trabalho propõe-se a fazer uma revisão de pesquisas que abordam jogos e aprendizagem, discutindo os amplos efeitos que os jogos podem oferecer em relação, por exemplo, às habilidades perceptivas e cognitivas (EICHENBAUM; BAVELIER; GREEN, 2014).

Independentemente dos resultados obtidos na revisão sistemática, catalogamos vários outros estudos que abordam a temática. Muitos desses estudos têm reforçado os efeitos do uso dos jogos digitais sobre as funções cognitivas. Como, por exemplo, a pesquisa realizada por Oei e Patterson (2013) envolvendo cinco grupos compostos por participantes não jogadores que foram orientados a jogar em um dispositivo móvel durante uma hora por dia, cinco dias por semana, durante quatro semanas. Cada grupo jogou determinado tipo de jogo. Foram utilizados diferentes tipos de jogos, como de ação, memória espacial, de objetos escondidos e de simulação de vida baseada em agentes. A avaliação dos participantes foi realizada a partir de quatro tarefas comportamentais - antes e depois do treinamento com os jogos - para avaliar os efeitos de transferência. Os resultados revelaram melhorias em diferentes aspectos cognitivos e indicaram que o treinamento de habilidades cognitivas específicas frequentemente exercitadas em um jogo digital melhora o desempenho em tarefas que compartilham características e habilidades similares.

Dentre muitos estudos que têm apontando contribuições do uso dos jogos para o aprimoramento das funções executivas, destacamos, ainda, o estudo desenvolvido por Nouchi et al. (2013) realizado com 32 voluntários distribuídos em dois grupos, em que um jogou um jogo comercial para treinamento cerebral e outro o jogo de quebra-cabeça Tetris. Os participantes jogaram cerca de 15 minutos em pelo menos 5 dias por semana, durante 4 semanas, e foram avaliados antes e depois do treinamento com relação a várias funções cognitivas, como memória de trabalho, atenção e velocidade de processamento. Os resultados obtidos revelaram melhoras com relação às funções executivas, à memória e à velocidade de processamento em adultos jovens no grupo participante do jogo comercial para treinamento cerebral. No grupo que jogou Tetris, os efeitos benéficos encontrados referiram-se às funções executivas, à memória de trabalho e à velocidade de processamento (NOUCHI et al., 2013).

As pesquisas que avaliam as associações entre o uso de jogos digitais e o desenvolvimento de funções cognitivas são desenvolvidas tanto com adultos como com crianças. Considerando o público-alvo da Educação Básica, especialmente do Ensino Fundamental, destacamos no Quadro 1 alguns trabalhos que foram desenvolvidos com crianças, descrevendo a amostra e a descrição de como as intervenções foram realizadas e avaliadas.

Quadro 1 Informações de publicações relacionadas ao uso de jogos digitais por crianças. 

Autores, ano Título Amostra Intervenção
WATERS et al., 2015 Look for good and never give up: a novel attention training treatment for childhood anxiety disorders 59 crianças diagnosticadas com transtorno de ansiedade. 31 crianças fizeram parte do grupo participante e 28 crianças ficaram no grupo controle. No grupo participante, as crianças completaram 12 sessões de tratamento em casa no computador. A atenção foi avaliada pré e pós-intervenção e seis meses depois do tratamento.
GOODMAN et al., 2015 The transfer effects of working memory training on executive functioning skills of children with attention difficulties Foram testadas 21 crianças (17 meninos e 4 meninas) que foram encaminhadas de serviços acadêmicos por causa de dificuldades de atenção ou encaminhadas com preocupações sobre a aprendizagem. A média de idade no início do estudo foi de 10,1 anos. Cada criança participou de 25 sessões de treinamento da memória de trabalho interativo por meio de jogos de computador. As crianças foram avaliadas por teste psicológico - NEPSY. Pais e professores também responderam a questionários.
DOVIS et al., 2015 Improving executive functioning in children with ADHD: training multiple executive functions within the context of a computer game 89 crianças com diagnóstico clínico de TDAH (entre 8 e 12 anos) foram escolhidas para treinamento das capacidades visuoespacial WM, inibição e flexibilidade cognitiva. Ao longo de três meses, foram feitas 25 sessões de treino baseado em jogos de computador. As crianças foram avaliadas com base na aplicação de várias tarefas, testes e escalas, antes, logo depois do treinamento e três meses depois.
CASTELLAR et al., 2015 Cognitive abilities, digital games and arithmetic performance enhancement: a study comparing the effects of a math game and paper exercises Participaram 52 crianças com em média 7 anos, as quais foram divididas em dois grupos. Um grupo resolveu exercícios de matemáticas em papel e o outro utilizou um jogo digital educativo de matemática. As crianças foram avaliadas com base na resolução de exercícios, na aplicação subtestes psicológicos do WISC, escalas de satisfação e avaliação das experiências por entrevista.
RUEDA; CHECA; CÓMBITA, 2012 Enhanced efficiency of the executive attention network after training in preschool children: immediate changes and effects after two months Participaram 37 crianças pré-escolares de 5 anos, divididas em dois grupos - controle e participante. O grupo participante realizou 10 sessões de 45 minutos de treinamento computadorizado de atenção. Ambos os grupos foram avaliados, por meio de uma série de tarefas, antes, depois e dois meses após o treimento e, ainda, a função cerebral foi examinado com um sistema de electroencefalograma de alta densidade.
SHIN et al., 2012 Effects of game technology on elementary student learning in mathematics Realizaram dois estudos: 1) envolveu 41 alunos da segunda série (7 e 8 anos); 2) 50 estudantes da segunda série de três turmas. O segundo estudo analisou a aprendizagem dos alunos, considerando os aspectos de desempenho no jogo, atitudes em relação ao jogo e em relação à matemática, gênero e etnia Primeiro estudo: durante um período de 4 meses, propôs o uso de jogos eletrônicos em condições que variavam. Segundo estudo: utilizaram por 5 semanas jogos tradicionais e eletrônicos, na sequência, por 13 semanas, utilizaram jogos eletrônicos de 2 a 3 vezes por semana.
MACKEY; HILL; BUNGE, 2011 Differential effects of reasoning and speed training in children 28 crianças com idades entre 7 e 10 anos entre organizadas em dois grupos. Propôs um programa de treinamentos utilizando jogos de computador e jogos não eletrônicos, duas vezes na semana por 60 minutos, durante oito semanas. A avaliação foi realizada por meio da aplicação de testes de inteligência não verbal e rapidez cognitiva no início e no fim do treinamento.
MILLER; ROBERTSON, 2010 Using a games console in the primary classroom: Effects of ‘Brain Training’ programme on computation and self-esteem O projeto foi desenvolvido com 71 crianças (10-11 anos) em três classes distintas. O primeiro grupo jogou no console o jogo Brain Training. O segundo grupo jogou no computador o Brain Gym. Ambos os grupos foram submetidos a sessões de 20 minutos diários de jogos por 10 semanas. O terceiro configurou-se como sendo controle. Para medir aspectos cognitivos, foi aplicado um teste com 100 questões (Number Challenge) antes e depois da intervenção em todos os grupos e aplicou-se uma escala para avaliar a auto-percepção (Burnett Self Scale).
ROSAS et al., 2003 Beyond Nintendo: Design and assessment of educational video games for first and second grade students Participaram 1.274 estudantes dos primeiro e segundo anos de escolaridade, menos favorecidas economicamente. Propôs o uso de videogames projetados especificamente para alcançar os objetivos educacionais, por 30 horas durante três meses. As crianças foram avaliadas em relação à aquisição e compreensão de leitura, ortografia, habilidades matemáticas e sobre a sua motivação para usar videogames.

Fonte: dados de pesquisa.

De modo geral, os estudos dividem os participantes em dois grupos, um participante e outro controle, para analisar os efeitos do uso dos jogos (ROSAS et al., 2003; MILLER; ROBERTSON, 2010; MACKEY; HILL; BUNGE, 2011; RUEDA; CHECA; CÓMBITA, 2012; WATERS et al., 2015; CASTELLAR et al., 2015). Como exemplo, destacamos o estudo desenvolvido com 37 crianças pré-escolares de 5 anos, que foram divididas em dois grupos (controle e participante), demonstrando que é possível melhorar a atenção por meio do treinamento, pois as crianças treinadas (grupo participante) ativaram a rede de atenção executiva mais rapidamente e de forma mais eficiente do que as crianças não treinadas (RUEDA; CHECA; CÓMBITA, 2012).

Nessa perspectiva metodológica, Miller e Robertson (2010) desenvolveram um estudo com o objetivo de investigar como um jogo que trabalha a agilidade mental pode influenciar na aprendizagem e na auto-percepção de alunos. Para tanto, o projeto foi desenvolvido com 71 crianças (10-11 anos) em três classes distintas. No primeiro grupo, os alunos jogaram no console o jogo Brain Training. No segundo grupo, de comparação, os alunos jogaram no computador o Brain Gym, muito similar ao proposto no primeiro grupo. Ambos os grupos foram submetidos a sessões de 20 minutos diários de jogos por 10 semanas. Por fim, o terceiro grupo configurou-se como sendo controle e não foi submetido às sessões de jogos. Para medir aspectos cognitivos, foi aplicado um teste com 100 questões (Number Challenge) antes e depois da intervenção em todos os grupos, e aplicou-se uma escala para avaliar a auto-percepção (Burnett Self Scale). Os resultados revelaram ganhos significativos, principalmente nos grupos que participaram das atividades com jogos, tanto na precisão como na rapidez na realização de cálculos (MILLER; ROBERTSON, 2010).

Alguns estudos desenvolvidos com crianças têm avaliado o uso dos jogos digitais em crianças que possuem algum transtorno, destacando-se crianças com TDAH. O estudo desenvolvido por Dovis et al. (2015) com 89 crianças com diagnóstico clínico de TDAH, propôs a realização de 25 sessões durante três meses, revelando melhoras significativas em medidas visuoespaciais, memória de curto prazo, desempenho inibitório e controle de interferências, mas apenas no grupo participante. Foram encontradas melhoras também na flexibilidade, no raciocínio, nos comportamentos motivacionais e nos comportamentos em geral (DOVIS et al., 2015).

Outro estudo, conduzido por Waters et al. (2015), avaliou o uso de jogos de computador com crianças diagnosticadas com transtorno de ansiedade. Após 12 sessões em casa, as avaliações pré e pós-intervenção e seis meses depois do tratamento, revelou-se melhora na atenção e maior consolidação do aprendizado e da memória durante o tratamento.

O uso de testes psicológicos também é recorrente em estudos que procuram avaliar os efeitos do uso dos jogos digitais sobre as funções executivas (MILLER; ROBERTSON, 2010; MACKEY; HILL; BUNGE, 2011; GOODMAN et al., 2015; DOVIS et al., 2015; CASTELLAR et al., 2015). Destacamos o estudo de Goodman et al. (2015), que investigou melhoras em relação às funções executivas, em especial a memória de trabalho, em crianças com dificuldades de atenção. Para tanto, os autores propuseram 25 sessões utilizando jogos de computador para o treinamento da memória de um aplicativo para treinamento cerebral a 21 crianças (17 meninos e 4 meninas). Após o treinamento, as crianças foram avaliadas com base em testes psicológicos. Os resultados das análises de ANOVA para medidas repetidas revelaram melhoras na memória - F (1,19) = 6,71, p = 0,025 -, e a pontuação obtida na Bateria de Avaliação Neuropsicológica Infantil - NEPSY, que avalia a atenção, foi superior após o treinamento (p = 0,035) (GOODMAN et al., 2015). Além disso, o estudo indica que os professores perceberam mudanças nas crianças em sala de aula.

A pesquisa desenvolvida por Mackey, Hill e Bunge (2011) tinha como objetivo verificar se um treinamento intensivo pode melhorar as habilidades cognitivas em crianças. Para tanto, propôs um programa de treinamentos utilizando jogos de computador e jogos não eletrônicos, enfatizando o planejamento, a integração relacional, a rápida detecção visual e a rápida resposta motora. A avaliação foi realizada por meio da aplicação de testes de inteligência no início e no fim do treinamento, demonstrando que o treinamento promoveu uma melhora significativa tanto na fluidez quanto na rapidez dos processos cognitivos.

Habilidades específicas também têm sido associadas ao uso de jogos digitais, como as habilidades aritméticas e visuomotoras. Um estudo desenvolvido por Castellar et al. (2015) comparou o desempenho nas habilidades aritméticas, memória de trabalho e habilidades visuomotoras em 52 crianças com em média sete anos, divididas em dois grupos. Um deles resolveu exercícios de matemáticas em papel e o outro utilizou um jogo digital educativo de matemática. Os resultados sugeriram melhor desempenho na aritmética entre os jogadores e ganhos significativos em relação à memória de trabalho comparando os dois grupos.

Shin et al. (2012) também relatam os efeitos dos jogos digitais sobre a aprendizagem em matemática em dois estudos. A análise dos resultados pautou-se na regressão múltipla para determinar a relação entre as notas dos alunos em matemática e as características dos alunos. Também foram realizadas análises descritivas por sexo, nível de habilidade, raça, etnia e dados coletados por meio de entrevistas sobre atitudes em relação ao jogo. Os resultados dos dois estudos revelaram que o uso de jogos digitais na sala de aula foi benéfico para os alunos de todos os níveis de aprendizagem de habilidades aritméticas (SHIN et al., 2012).

Por fim, outro estudo que destacamos foi o desenvolvido por Rosas et al. (2003), que, apesar de utilizar videogame, destaca-se por propor intervenções em escolas em desvantagem econômica no Chile e por envolver uma amostra de 1.274 alunos. As crianças usaram videogames projetados especificamente para alcançar os objetivos educacionais dos primeiro e segundo anos de escolaridade, para a matemática básica e compreensão de leitura. Os grupos experimentais jogaram os videogames durante uma média de 30 horas durante um período de três meses. Os resultados mostraram diferenças significativas entre os grupos experimental e controle, em matemática, na leitura e na escrita, concluindo-se que a introdução de videogames pode ser uma ferramenta útil na promoção da aprendizagem na sala de aula.

A partir dos estudos descritos, observamos que o uso de jogos digitais pode contribuir para o desenvolvimento das funções executivas. Esses ganhos reforçam a importância de estudar, discutir e refletir sobre as possibilidades de utilizar jogos para o aprimoramento de funções tão fundamentais ao desenvolvimento e à aprendizagem de crianças inseridas no contexto escolar.

4 DESDOBRAMENTOS CURRICULARES PARA A INTEGRAÇÃO DOS JOGOS DIGITAIS NA ESCOLA

Neste trabalho, o currículo é entendido “como as experiências escolares que se desdobram em torno do conhecimento, em meio a relações sociais, e que contribuem para a construção das identidades de nossos/as estudantes” (MOREIRA; CANDAU, 2007, p. 18). Assim, a proposição do uso integrado dos jogos digitais ao currículo

[...] significa que essas tecnologias passam a compor o currículo, que as engloba aos seus demais componentes e assim não se trata de ter as tecnologias como um apêndice ou algo tangencial ao currículo e sim de buscar a integração transversal das competências no domínio das TDIC com o currículo, pois este é o orientador das ações de uso das tecnologias (ALMEIDA; SILVA, 2011, p. 8).

Por isso, enfatizamos o uso desses jogos no contexto escolar, assim como a importância de ações de formação voltadas para os professores, visando garantir maior autonomia e fundamentos conceituais para o uso de jogos digitais, com o propósito de favorecer o aprimoramento das funções executivas de modo a resguardar uma formação mais globalizadora.

Apesar das crescentes contribuições que a neurociência vem oferecendo para compreender os processos de aprendizagem, ainda é muito pouco abordada (ou inexistente) nos currículos de formação dos professores. Sigman et al. (2014) evidenciam que, apesar da relação fundamental entre a aprendizagem escolar e o funcionamento do cérebro, neurociência e educação são áreas que pouco se relacionam. Como um dos desafios para a aproximação dessas áreas, os autores registram que os conceitos fundamentais do cérebro precisam compor a formação do professor, para se tornar ferramenta científica e favorecer a sua aproximação com os conhecimentos da neurociência.

Esses conhecimentos podem tornar-se parte do currículo escolar, por sua abordagem ou pela proposição de atividades que contribuam com o seu exercício. Sem desconsiderar que o conhecimento escolar “[...] é uma construção específica da esfera educativa, não como uma mera simplificação de conhecimentos produzidos fora da escola [...] tem características próprias que o distinguem de outras formas de conhecimento” (MOREIRA; CANDAU, 2007, p. 22).

De outro modo, o próprio uso de jogos digitais no contexto escolar sofre resistência pela sua associação com o entretenimento (SANTAELLA; FEITOZA, 2009) e pela sua característica de atividade não séria (HUIZINGA, 1996). Esse aspecto configura-se como um desafio às práticas pedagógicas que propõem o uso de forma integrada ao currículo e ações de formação para os professores.

Apesar disso, cabe enfatizar que o uso dos jogos digitais relacionado ao aprimoramento das funções cognitivas pode contribuir para que a escola cumpra sua função emancipatória, de modo a compensar as “[...] diferenças de origem que se introjetam nas formas de conhecer, sentir, esperar e atuar dos indivíduos” (PÉREZ GÓMEZ, 1998, p. 16). Isso porque crianças com dificuldades relacionadas às funções executivas acabam se beneficiando mais do uso dos jogos digitais, o que oferece a possibilidade de essas crianças alcançarem níveis próximos de seus pares, o que garante melhores condições de aprendizagem (DIAMOND, 2012).

Diante disso, o uso dos jogos digitais no contexto escolar de forma integrada ao currículo, pode oferecer contribuições ao processo de ensino e aprendizagem, bem como apresentar alternativas lúdicas com base no uso das tecnologias digitais para o aprimoramento das funções executivas. Essas funções são fundamentais para o sucesso escolar e a inserção social e profissional dos sujeitos.

O próprio ambiente escolar oferece condições que potencializam as contribuições que o uso dos jogos digitais pode proporcionar. O uso em sala de aula pode agregar as interações sociais que tendem a ocorrer nesse espaço, que supõe regras, auxílio mútuo, colaboração e respeito, o que pode favorecer ainda mais o desenvolvimento das funções executivas, como autorregulação e autocontrole, que interferem nas interações sociais presentes e futuras. Além disso, o controle executivo durante a infância tem sido apontado como um forte preditor da competência no contexto escolar e social (SIGMAN et al., 2014).

Além disso, em sala de aula temos a mediação pedagógica do professor que poderá oferecer orientações, auxílio e condições para que os objetivos delineados com as atividades sejam alcançados. Isso porque a mediação “viabiliza a relação entre a experiência sociocultural da humanidade expressa em saberes, procedimentos, modos de agir, valores, e a internalização dessa experiência” (LIBÂNEO, 2012, p. 4).

Ao mesmo tempo, reconhecemos a importância do meio e das experiências para a consolidação do desenvolvimento das funções executivas e valorizamos o ambiente escolar, como um meio que proporcione experiências ricas, poderosas e que resultem em marcas duradouras. As funções executivas são desenvolvidas

[...] por meio da prática e são reforçadas pelas experiências através das quais elas são aplicadas e lapidadas. Fornecer o apoio do qual as crianças precisam para construir essas habilidades em casa, em programas das creches e pré-escolas, e em outros ambientes que elas vivenciam regularmente é uma das responsabilidades mais importantes da sociedade (CENTER..., 2011, p. 1).

Esses aspectos são reforçados por Diamond e Lee (2011) a partir da revisão de vários estudos que propuseram atividades para aprimoramento das funções executivas em crianças, sistematizando algumas considerações, como:

  1. a inserção de atividades para o treinamento das funções executivas integradas ao currículo escolar oferece resultados positivos;

  2. há um espectro amplo de atividades que podem melhorar as funções executivas, desde que as crianças dediquem tempo às atividades como práticas repetidas;

  3. os melhores resultados são produzidos quando as crianças se sentem motivadas, envolvem a alegria e a diversão, requerem o exercício vigoroso, favorecem os sentimentos de pertença e aceitação social e propõem níveis progressivos;

  4. os programas promissores envolvem o desenvolvimento cognitivo, emocional e social da criança.

A importância da experiência, do exercício e da interação social reforça a necessidade de avaliação do uso dos jogos cognitivos para o aprimoramento das funções executivas de forma integrada ao currículo e, ainda, a valorização da mediação pedagógica, o que remete à necessidade de formação dos professores para a diversificação das atividades escolares.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Este trabalho realizou uma aproximação com estudos e pesquisas que associam o uso dos jogos digitais para o aprimoramento das funções executivas, procurando apontar para as possibilidades de seu uso no contexto escolar para contribuir com os processos de desenvolvimento e aprendizagem da criança.

Essa aproximação revelou que já temos fortes indícios relacionados às contribuições dos jogos para o aprimoramento das funções executivas, especialmente em relação à atenção, a capacidade de resolução de problemas e a memória. Entretanto, evidenciam-se poucos trabalhos voltados para o uso no contexto escolar, o que remete à necessidade de realizar estudos e pesquisas para orientar a integração do uso dos jogos ao currículo.

Reforçamos ainda que, apesar da importância das funções executivas para a aprendizagem e o desenvolvimento humano, essas não se configuram como objetivos explícitos em projeto pedagógicos ou planejamentos de ensino. Por isso, a importância de investir na formação dos professores e promover aproximações, por meio de ações de extensão ou pesquisa, para fomentar a discussão e o estudo desses conceitos. É preciso reconhecer o espaço escolar como um ambiente favorável ao desenvolvimento das funções executivas, por seu caráter social que supõe a interação norteada por regras, negociações e acordos de convivência que ocorrem de forma mediada, bem como pelas rotinas escolares, atividades desenvolvidas e jogos que fazem parte do cotidiano escolar.

Dentre as limitações desta pesquisa, cabe ressaltar que a revisão de literatura foi realizada em um recorte temporal; possivelmente outros estudos, inclusive mais atuais, poderiam trazer contribuições à discussão. Nesse mesmo sentido, outras bases de dados poderiam enriquecer os resultados da busca.

As lacunas identificadas na literatura por meio da revisão realizada poderiam orientar a realização de novas pesquisas empíricas sobre o uso de jogos digitais no contexto da escola de modo a fundamentar de forma mais consistente a integração dessa tecnologias no contexto escolar e a proposição de iniciativas para a formação de professores.

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NOTA

Disponível em: http://www.quickflashgames.com/games/the-garage-man/. Acesso em: 25 maio 2019.

Recebido: 27 de Setembro de 2017; Aceito: 05 de Junho de 2019

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