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Revista e-Curriculum

versão On-line ISSN 1809-3876

e-Curriculum vol.17 no.4 São Paulo out./dez. 2019  Epub 27-Jan-2020

https://doi.org/10.23925/1809-3876.2019v17i4p1502-1522 

Dossiê ABdC 2019: Confrontos e resistências nas políticas educacionais e curriculares no contexto atual

MASCULINIDADES NOS CURRÍCULOS DE “TROPA DE ELITE” E DE “PRAIA DO FUTURO”

MASCULINITIES IN THE “ELITE SQUAD” AND “FUTURO BEACH” CURRICULUM

MASCULINIDADES EN EL CURRÍCULUM DE “TROPA DE ÉLITE” E “PLAYA DEL FUTURO”

Evanilson Gurgel CARVALHO FILHOi 

Marlécio MAKNAMARAii 

i Doutorando em Educação pelo Programa de Pós-Graduação em Educação (PGEDU) da UFBA. Professor Substituto da Faculdade de Educação da Universidade Federal da Bahia. E-mail: evanilson.gurgel@ufba.br.

ii Doutorado em Educação pela Universidade Federal de Minas Gerais. Pós-Doutor pela School of Education/La Trobe University (Bolsa CAPES/PVEx). Docente do Centro de Educação da Universidade Federal de Alagoas. Sócio da ANPED, da ABRAPEC, da BioGraph e da SBEnBio, Docente Permanente do Programa de Pós-Graduação em Educação/UFBA; Docente Permanente do Programa de Pós-Graduação em Educação/UFRN. E-mail: maknamaravilhas@gmail.com.


RESUMO

O artigo toma como material empírico os modelos de masculinidades veiculados nos currículos de dois filmes brasileiros: “Tropa de Elite” e “Praia do Futuro”. Partimos do pressuposto oriundo do campo dos estudos culturais numa perspectiva pós-crítica em que o cinema é compreendido como um artefato cultural, portanto capaz de disseminar saberes e educar o seu público. O objetivo é analisar os diferentes modelos de masculinidades produzidos e visibilizados pelos currículos dos filmes. O argumento desenvolvido é que esses currículos operam de modos distintos a partir das representações de masculinidades de cada obra: a masculinidade hegemônica em “Tropa de Elite” e a masculinidade abjeta em “Praia do Futuro”. Concluímos que o cinema pode propiciar encontros potentes entre gêneros e sexualidades e o campo educacional, pois se por um lado um desses currículos reitera um modelo hegemônico hierárquico de masculinidade, por outro há vazamentos e escapes mais diversos e menos afeitos a normatividades.

PALAVRAS-CHAVE: Currículo; Cinema; Masculinidades; Gêneros; Sexualidades

ABSTRACT

The article takes as empirical material the models of masculinities conveyed in the curriculum of two brazilian films: “Elite Squad” and “Futuro Beach”. We start from the assumption arising from the field of cultural studies in a post-critical perspective in which cinema is understood as a cultural artifact, therefore capable of disseminating knowledge and educating your audience. The objective is to analyze the different models of masculinities produced and made visible by the film curriculum. The argument developed is that this curriculum operates in different ways from the representations of masculinities of each work: hegemonic masculinity in “Elite Squad” and abject masculinity in “Futuro Beach”. We conclude that the cinema can provide powerful encounters between genders and sexualities and the educational field, because if on one hand this curriculum reiterates a hierarchical hegemonic model of masculinity, on the other there are leaks and more diverse escapes and less affective to normativities.

KEYWORDS: curriculum; cinema; masculinities; genders; sexualities

RESUMEN

El artículo toma como material empírico los modelos de masculinidades transmitidos en el currículum de dos películas brasileñas: “Tropa de Élite” y “Playa del Futuro”. Partimos de la suposición que surge del campo de los estudios culturales en una perspectiva poscrítica en la que el cine se entiende como un artefacto cultural, por lo tanto, capaz de difundir el conocimiento y educar a su audiencia. El objetivo es analizar los diferentes modelos de masculinidades producidos y hecho visibles por el currículum cinematográfico. El argumento desarrollado es que este currículum opera de diferentes maneras a partir de las representaciones de masculinidades de cada trabajo: masculinidad hegemónica en “Tropa de Élite” y masculinidad abyecta en “Playa del Futuro”. Llegamos a la conclusión de que el cine puede proporcionar encuentros poderosos entre géneros y sexualidades y el campo educativo, porque si por un lado este currículum reitera un modelo hegemónico jerárquico de masculinidad, por otro lado hay filtraciones más diversas y menos afectos a las normatividades.

PALABRAS CLAVE: Curriculum; Cinema; Masculinidades; Géneros; Sexualidades

1 LUZ, CÂMERA, AÇÃO! CURRÍCULOS EM CENA.

O operador de câmera põe o rolo de película na bobina. Os furos nas laterais da película conectam-se nas rodas dentadas que repuxam o rolo, fazendo com que cada um dos fotogramas do longa-metragem presentes no cilindro pare diante da luz. Com a rapidez de uma exímia bordadeira, 24 fotogramas deslizam pelas lentes a cada segundo que se passa, velocidade suficiente para sorrateiramente enganar os/as espectadores/as desavisados/as e fazer com que o amontoado de fotogramas pareçam estar em movimento ininterrupto. Durante mais ou menos duas horas, um punhado de imagens convidam uma porção de sons para uma dança, corpo a corpo. Quando bailam a dois, imagem e som estão tão perigosamente próximos um do outro que se tornam uma só carne. É dessa movimentação libertina, desse encontro erótico, dessas matérias tão próximas que se confundem uma a outra que germina um filme, que um mundo novo nos é apresentado, que realidade e ficção se engravidam de possíveis, que um currículo pode nascer.

1.1 Take I: “Tropa de Elite”

Luzes trêmulas e imagens desfocadas vão, pouco a pouco, sugerindo alguns elementos aparentemente banais: uma rua escura sem qualquer referência; um pedaço do céu que se confunde aos postes e seus emaranhados de fios, um pedaço do chão que se embaralha aos pés dos sujeitos que ali transitam; armas empunhadas em riste; corpos anônimos de homens, mulheres, crianças e adolescentes envolvidos por um ritmo frenético. Embalados ao som de um funk bastante conhecido1, somos posicionados a partir de cada um destes elementos que compõem o cenário: um baile funk numa favela carioca. As cenas dos corpos dançando ao gosto da música são sincronizadas com os cortes abruptos que mostram em uma tela escura os nomes dos atores e atrizes do longa-metragem. Depois, cada um dos elementos que outrora surgia timidamente em sua particularidade, se arregimentam e posicionam-se em uma única tomada. Vista por cima, uma multidão de corpos se aglomeram e dançam ao compasso da música. Assim é o início de “Tropa de Elite”, longa-metragem dirigido por José Padilha e protagonizado por Wagner Moura.

Em uma narração em off, ouvimos a apresentação do protagonista dessa história, cujo corpo em nenhum momento aparecera naquela abertura. “Meu nome é Capitão Nascimento”, nos alerta o personagem, ao qual não é reservado o direito de dançar alegremente como aqueles sujeitos que transitam no baile. Seu corpo exibe outros movimentos, outros suingues: “Eu chefiava a equipe alfa do BOPE. Eu já estava naquela guerra e estava começando a ficar cansado dela”. Sua voz ecoa por meio desta narração sem que sejamos capazes de vê-lo. Sua primeira aparição ocorre na cena em que, dentro de um carro, militares correm para mais uma das ações do BOPE em algum morro carioca. Tão logo surge em cena, somos apresentados à sua icônica indumentária que rapidamente se tornou alvo de desejo por uma parte considerável do público2. Seu ornamento não servia apenas para identificá-lo em meio às operações militares ou para exibir o seu labor por meio do corpo que se compõe como um elemento intrincado de uma máquina de guerra. Somando a boina com a insígnia do batalhão, o pesado coturno, a calça preta de brim liso, a gandola militar, o distintivo e o pesado armamento, temos como resultado alguns dos vários símbolos de sua masculinidade patriótica.

1.2 Take II: “Praia do Futuro”

Em outro longa-metragem, um salva-vidas tenta resgatar dois homens de um afogamento na Praia do Futuro em Fortaleza. Um deles regressa ao solo, o outro some na vastidão azulada do oceano. Donato, o salva-vidas, faz questão de dar a notícia ao sobrevivente que repousa em um hospital. Leva suas roupas, cumpre o protocolo, se mostra prestativo e afirma que a busca pelo corpo do amigo desaparecido continuará. Em estado de torpor, o homem mal reage às palavras de Donato; arranca a camisola hospitalar e fica despido diante do estranho sem nenhum pudor. Ao sair do hospital acompanhado do salva-vidas, o sobrevivente pede um cigarro. Donato não tem. Em silêncio, os homens caminham lado a lado. Um corte nos posiciona para uma cena que sem qualquer prenúncio revela os dois homens transando em um carro parado na beira da estrada. Ofegante, o alemão está por cima do salva-vidas, penetrando-o.

O salva-vidas é interpretado por Wagner Moura, o mesmo ator que outrora havia performado uma masculinidade hegemônica com o seu personagem em “Tropa de Elite”. Em “Praia do Futuro”, o ator surge atuando em um filme onde a sua protagonista se permite vivenciar um relacionamento com outro homem. Resultado: inúmeros casos de pessoas deixando as salas de cinema quando se deparavam com as cenas íntimas dos dois homens3. Alguns cinemas, inclusive, passaram a “alertar” aos seus pagantes incautos a temática homossexual do filme para que não houvesse nenhuma reivindicação do valor do ingresso por parte dos desistentes4.

Com o objetivo de compreender os diferentes modelos de masculinidades produzidos e visibilizados nos currículos dos filmes, o artigo analisa os currículos de “Tropa de Elite” (2007) e “Praia do Futuro” (2014) a partir de elementos da análise de representação. O argumento aqui perseguido é que tais currículo operam de modos distintos a partir das diferentes representações de masculinidades de cada filme: a masculinidade hegemônica em “Tropa de Elite” e a masculinidade abjeta em “Praia do Futuro”. O artigo está dividido em três tópicos para além dessa introdução. No primeiro, “O que é e o que quer o currículo do cinema?: estranhamentos para a constituição de novos modos de vida”, discutimos acerca do currículo a partir de uma perspectiva alinhada aos estudos culturais em sua vertente pós-crítica. No segundo tópico, “Entre a masculinidade hegemônica e a masculinidade abjeta: o masculino representado em “Tropa de Elite” e “Praia do Futuro””, analisamos os distintos modelos de masculinidades produzidas por ambos os filmes. Por fim, concluímos com algumas ponderações sobre o que o currículo dos filmes analisados produz e faz circular em termos de sentidos e sujeitos e finalizamos tecendo breves argumentos para a produção deste currículo que nomeamos de “currículo heroico”.

2 O QUE É E O QUE QUER O CURRÍCULO DO CINEMA?: ESTRANHAMENTOS PARA A CONSTITUIÇÃO DE NOVOS MODOS DE VIDA

O que aprendemos ao acompanhar as agruras de um policial militar diante da violência institucionalizada de um Estado? E o que há de se ensinar no currículo de um filme cujo protagonista homossexual evade de seu país de origem em busca de um lugar no qual possa vivenciar a sua sexualidade? Ao perseguirmos uma perspectiva analítica alinhada aos estudos culturais5 em sua vertente pós-crítica6, consideramos, a partir da noção de pedagogias culturais, que o educativo e o curricular transpõem os muros das escolas. Nessa perspectiva, currículo deixa de assumir a noção de um “processo de racionalização educacional, cuidadosa e rigorosamente especificados e medidos” (SILVA, 2016, p. 12) e passa a pôr em evidência que “a coordenação e a regulação das pessoas não se dá apenas pelos discursos circulantes nos espaços pedagógicos institucionalizados como as escolas e seus similares” (COSTA, 2005, p. 144). Ao abrir espaço para compreensões outras sobre currículo, passamos a trabalhar com a noção de artefatos cultuais, isto é, as produções gestadas no interior de uma cultura e que compõem uma poderosa e diversa maquinaria pedagógica cujos elementos “informam, produzem, disseminam saberes, educam” e, “mais do que isso, contribuem na construção de identidades culturais dos sujeitos” (FURLANI, 2009, p. 43).

Tais instâncias culturais envolvem de filmes a músicas, passando por livros, novelas, séries de TV, peças publicitárias, campanhas e uma miríade de outros produtos que também são pedagógicos, “também têm uma pedagogia, também ensinam alguma coisa” (SILVA, 2016, p. 139). Se diversas são essas instâncias e se elas possibilitam o aprendizado de algo para alguém, podemos afirmar que há um currículo cultural7 “pensado de acordo com as forças que regem a dinâmica comercial, política, cultural predominante no mundo contemporâneo” (COSTA, 2005, p. 144). Consequentemente, se “outros currículos (além do escolar) [...] contribuem para a formação das pessoas e [...] disputam espaço na produção de sentidos e de sujeitos” (PARAÍSO, 2007, p. 24), o cinema - uma instância cultural; um artefato; uma mídia que “ocupa espaços de educadora” (PARAÍSO, 2004, p. 61) - também pode nos ensinar, também é detentor de um currículo.

Enxergamos um currículo do cinema porque o que está em jogo nesse artefato cultural é “a constituição de modos de vida, a tal ponto que a vida de muitas pessoas depende [...] [desse] currículo” (PARAÍSO, 2010a, p. 588). Já não somos capazes de entendê-lo tão somente a partir do viés artístico, da óptica do mercado ou na perspectiva de um despretensioso lazer. Outras luzes rebentam e se espraiam nessas conexões, algumas delas tão fortes que são capazes de alumiar a “vida daquelas pessoas que com ele se ocupam, daqueles que o perseguem” (PARAÍSO, 2010b, p. 11). Quando passamos a conceber que o cinema é, numa guinada felliniana8, “um modo divino de contar a vida” (FELLINI, 1986, p. 72), passamos a fabular uma tessitura pós-crítica que dê conta de compreender o currículo do cinema e as possíveis conexões a ser estabelecidas entre este artefato cultural e a compreensão dos diferentes modelos de masculinidade evocados pelos filmes que anunciamos em nossa introdução.

Tais conexões, quando vistas a partir de outras ópticas, nos pareciam distantes e inconcebíveis. Porém, à luz das teorias pós-críticas, elas tornam-se possíveis. Isto porque tal perspectiva favorece, a partir de confabulações com os estudos culturais, “o reconhecimento de que no mundo contemporâneo novas configurações culturais têm concorrido com a escola pelo privilégio sobre a educação das pessoas” (MAKNAMARA; PARAÍSO, 2013, p. 43) e que terminam por “incorporar e produzir significados, saberes e valores que concorrem para processos de subjetivação” (MAKNAMARA, 2016, p. 196). Se pensarmos a partir de uma perspectiva foucaultiana que “o sujeito é aquilo que dele se diz” (MAKNAMARA, 2016, p. 200), podemos inferir que a subjetividade já não pode ser entendida como “aquele lugar seguro e estável que a ‘teoria do sujeito’ nos levou a crer” (SILVA, 2000, p. 19). Passamos a entendê-la como “a produção dos modos de existência ou estilos de vida” (DELEUZE, 2013, p. 147) que opera por meio de práticas e processos heterogêneos nos quais “somos ‘fabricados’ como sujeitos de um certo tipo” (ROSE, 2001a, p. 34), que nos fazem relacionar consigo mesmos e com os demais sujeitos.

Tomando emprestado de Rose a noção de que “somos mais múltiplos, mais transientes e mais não subjetivados do que somos levados a acreditar” (ROSE, 2001b, p. 141), e que a subjetividade é “permeável, dividida, fragmentada” (MAKNAMARA, 2016, p. 201), somos autorizados/as a investigar “as diferentes esferas nas quais somos transformados/as em sujeitos de determinado tipo” (MAKNAMARA, 2016, p. 200-201), o que ressoa sobre o cinema, seus ensinamentos, e o que o seu currículo produz e faz circular. O cinema “desempenha uma função cultural” que ultrapassa as dimensões “do prazer e da história” (TURNER, 1997, p. 69), tornando-se um campo propício para “analisarmos os diferentes processos de significação envolvidas na manutenção, construção e desconstrução de determinados discursos” (BALESTRIN, 2011, p. 125). Logo, entendemos o cinema como “um espaço que corporifica relações sociais, formas de conhecimento, de saber-poder e como território de composições e experimentações; território em que jogamos parte significativa dos jogos de nossas vidas” (PARAÍSO, 2006, p. 1). O cinema constrói nossos corpos, nossos gêneros e nossas sexualidades “de forma tão sutil que nem percebemos o quanto somos capturadas/os e produzidas/os pelo que lá se diz” (GOELLNER, 2007, p. 29). Neste sentido, operamos uma análise de gênero a partir dos currículos de dois longas-metragens nacionais. Compreendemos gênero como um conceito que privilegia o escrutínio das expectativas sociais demandadas pelas distinções fundamentada nos sexos (BUTLER, 2013, 2016).

Como efeito, o cinema não é apenas esse modo divino de contar a vida como nos apresentou Fellini (1986), e o que definitivamente não é pouco. Mas o cinema registra, representa, reapresenta, inventa e reinventa a vida. O cinema ficcionaliza a vida, pois “vivifica” a ficção de nossas vidas. Portanto, o cinema é, ele próprio, a vida! Tem cheiro e sabor de vida, porque verbaliza e imagina novos modos de vida possíveis. Desse modo, atravessa as nossas vidas com suas imagens, suas luzes, suas potencialidades e possibilidades. E se o cinema é vida, ele é também pura biologia: possui um coração que pulsa, lateja, bombeia e deseja. Porque é capaz de respirar novos ares, de oxigenar e expandir a vida, de tracejar através de seus discursos e representações formas até então inimagináveis de se viver. Porque é glutão, e assim como Macabéa de “A Hora da Estrela”, sente-se faminto. “Não de comida”, mas confunde-se ao “gosto doloroso” que lhe sobe “do baixo-ventre e arrepia o bico dos seios e os braços vazios sem abraços” (LISPECTOR, 1995, p. 50) quando não é capaz de ultrapassar as normas hegemônicas de gêneros e sexualidades, quando lhe faltam estratégias de resistência e subversões. Porque em suas carnes arqueja a fome de possíveis, de multiplicação de significados, de proliferação de sentidos.

Consideramos que o cinema pode também estranhar a vida. E o faz, por exemplo, quando trai a lógica normativa, quando desconfia da ordem de gênero na qual somos maquinados, quando evidencia práticas sexuais dissidentes, quando se inquieta quanto ao modo binário de vivenciar nossos corpos... Portanto, nem só de “ordenamentos [...], organizações [...], sequenciações [...], estruturações [...], enquadramentos [...], divisões [...]” (PARAÍSO, 2010b, p. 12) viveria o currículo de cinema. Como currículo, o cinema também pode “abrir-se ao desejo, cavar diferenças, agenciar forças e potências na vida” (PARAÍSO, 2010a, p. 588), pondo em suspeição os “raciocínios generificados” (PARAÍSO, 2016a) geralmente circulados neste artefato. Quando expande, contagia e prolifera outros modos de vida, o currículo do cinema pode, finalmente, viver. E se o currículo do cinema vive, por que deveríamos nós, educadoras e educadores, nos furtar das possibilidades orquestradas por meio deste artefato? Ora, o currículo do cinema ensina “modos de ser, estar e fazer considerados adequados e desejáveis” (PARAÍSO, 2002, p. 96). Que modos relativos ao masculino têm sido produzido pelos currículos dos filmes aqui analisados? Que representações de masculinidades têm sido veiculadas por meio de suas imagens como sendo a maneira correta ou adequada de “ser homem”? É com essa inquietação que investimos no pressuposto de que um currículo é “feito da mesma matéria dos sonhos, dos filmes e da vida” (PARAÍSO, 2015, p. 55) e, portanto, capaz de ser um propiciador de encontros potentes entre cinema e Educação.

3 ENTRE A MASCULINIDADE HEGEMÔNICA E A MASCULINIDADE ABJETA: O(S) MASCULINO(S) REPRESENTADO(S) EM “TROPA DE ELITE” E “PRAIA DO FUTURO”

É improvável que houvesse em 2007 alguma escola na qual os seus/uas alunos/as não estivessem comentando a febre do momento: “Tropa de Elite”. Dirigido por José Padilha, o filme tornou-se um verdadeiro fenômeno cultural quando “vazou” no mercado pirata meses antes de chegar aos cinemas9. Nos corredores e nos pátios, as cenas eram bastante comuns: miríades de adolescentes entoando as músicas da trilha sonora - “Tropa de Elite, osso duro de roer. Pega um, pega geral, também vai pegar você!” -, recitando as frases mais marcantes do longa - “Pede pra sair!”; “Você é moleque!” -, fazendo empréstimos do DVD pirata entre os/as colegas que se aglomeravam em listas de espera e comentando sobre o icônico personagem Capitão Nascimento, protagonista do longa-metragem.

Em uma breve pesquisa no Youtube podemos encontrar vídeos de adolescentes reproduzindo, reinventando, imitando e reiterando as cenas, falas, gestos e modos do Capitão Nascimento e dos demais personagens do longa. São materiais datados da época do lançamento do primeiro filme, evidenciando o quão enraizado a personagem e sua obra ficaram na cultura popular desde o seu surgimento. Em um desses vídeos, uma turma de ensino médio recria o trailer do filme em inglês.10 Noutro, um garoto registra o cotidiano em sua escola e enquanto conversa com os colegas, reproduz algumas das falas do Capitão Nascimento: “é você que tá traficando nessa escola?”, “esse aqui é o dono do morro!”11. Nos deparamos também com adolescentes refazendo uma cena de invasão ao morro em sala de aula, com direito a violência policial, palavrões proferidos, corpos estirados ao chão e sons de tiros12. “Os moleques do teatro” de uma escola, assim descrito na página do vídeo, reinventam a icônica “cena do saco” em sala de aula13.

São crianças e jovens performando posições de sujeito14 relativamente ao masculino, com características autoritárias. O fardamento militar do personagem tornou-se uma insígnia de masculinidade. A sua boina virou um objeto de desejo entre os garotos. Sua virilidade passou a ser norma. Suas falas ecoavam através da boca dos alunos. Trata-se, portanto, de um currículo “claramente masculino (...), a expressão da cosmovisão masculina” (SILVA, 2016, p. 94). O currículo do filme “Tropa de Elite” ensinava, a partir da representação masculina de seu protagonista e em meio a gritos de guerra, palavrões vociferados e cenas gráficas de violência, as formas de “preservar a estabilidade, integridade e coesão do Estado e os valores de sua nação, incluindo os patriarcais ligados à bravura, à coragem e à honra nacional” (JESUS; FERNANDES, 2014, p. 2, tradução nossa).

A primeira vista parecia apenas uma comoção pueril e um tanto inocente, uma combinação extravagante entre a fragilidade dos corpos juvenis com a necessidade de mostrarem-se imponentes e robustos desde a mais tenra idade, cuja inspiração era oriunda de um personagem fictício que ensinava “uma infinidade de práticas, comportamentos, sonhos e desejos que não podem ser desconhecidos da educação” (PARAÍSO, 2004, p. 60). E haveria como desconsiderarmos este fenômeno cultural do campo educacional? Ora, “muitas das representações disponibilizadas pelos discursos veiculados por diferentes artefatos culturais não apenas ‘chegam’ às escolas” - a exemplo dos vídeos mencionados acima - “mas também entram em conflito com o que nelas se ensina” (MAKNAMARA, 2011, p. 51).

Sobre as representações relativas ao masculino, Grossi (2004) aponta que há a construção de um modelo hegemônico de masculinidade na qual a agressividade emerge como comportamento esperado e estimulado para os homens. Inicia-se na infância, com a hiperatividade dos meninos compreendida como uma característica inata, metamorfoseando-se posteriormente na agressividade e na violência. Em nossa sociedade ocidental, inúmeros são os lugares onde se aprende o que é ser homem (WELZER-LANG, 2001) e reserva-se ao esporte “um dos lugares centrais da constituição da masculinidade” (GROSSI, 2004, p. 8). Desta forma, a personagem do Capitão Nascimento evoca dois importantes modos de constituir-se como alguém lido socialmente como homem. O primeiro é esculpido na violência extrema, como nas cenas em que invade o morro e reprime hostilmente traficantes ou quando assume o seu desejo em “meter bala nesses filhos da puta”. O esporte também emerge quando o personagem prepara um curso intensivo com o objetivo de encontrar o substituto do seu posto de capitão. “Seus corpos já nos pertencem”, vocifera o protagonista enquanto homens se digladiam, disputam por comida no chão e tentam ultrapassar os limites biológicos de seus corpos.

Em outro momento, enquanto vigia um morro carioca, o Capitão Nascimento ouve os batimentos cardíacos do filho por um telefonema dado pela sua esposa que está realizando um ultrassom. Em poucos minutos, o roteiro do filme lapida a sua protagonista de modo a exemplificar algumas das principais características da masculinidade hegemônica que Grossi (2004) pontua: a honra, isto é, o “poder econômico que um homem tem para sustentar a família” (GROSSI, 2004, p. 13), o que reflete diretamente em seu trabalho pesado que envolve o corpo masculino e a força física, a paternidade e a ausência (GROSSI, 2004). Noutra cena, ao chegar em casa depois de um dia exaustivo de trabalho e enquanto é recepcionado pela esposa que avisa sobre o jantar, Nascimento pontua: “não precisa esquentar [a comida] não”. Uma cena tão prosaica é capaz de nos rememorar alguns dos estereótipos mais banais de gênero - e por isto mesmo comumente reiterados socialmente: o homem trabalhador, a esposa que o recepciona, o jantar que o aguarda.

Usando o corpo quase como um escudo, evocando uma “masculinidade patriótica” associada com a “força, a brutalidade e a heterossexualidade agressiva” (JESUS; FERNANDES, 2014, p. 2, tradução nossa), Capitão Nascimento trazia sobre si as marcas de uma cultura “as quais podem ser lidas e assim indicar onde esse corpo se constituiu” (SANTOS, 1997, p. 86). Um corpo lido como masculino é constituído por meio de discursos que conferem a materialidade a este corpo - regras, normas, classificações, condutas esperadas, tudo aquilo que faz esse corpo ser lido de uma forma e não de outra. Identificamos “a masculinidade com homens: com qualquer coisa que os homens pensem e façam, qualquer coisa que pensem e façam para ser homens ou qualquer coisa que as mulheres não sejam” (PISCITELLI, 1998, p. 149-150). Nesse aspecto, o personagem exibe “elementos do cidadão-soldado, determinado a lutar e sacrificar-se em prol da comunidade política em que ele é simplesmente um membro” (JESUS; FERNANDES, 2014, p. 2, tradução nossa).

Tal produção discursiva que confere materialidade ao gênero, própria da teoria da performatividade de Judith Butler, é capaz de explicar o motivo do personagem masculino do filme ser representado desse modo. Para Butler (2013, p. 154), performatividade de gênero é “uma prática reiterativa e citacional pela qual o discurso produz os efeitos que ele nomeia”. Portanto, performatividade não é um ato voluntário e não é oriundo daquilo que o sujeito poderia decidir sobre si. Capitão Nascimento reproduz exatamente o que se espera em relação ao gênero masculino de um indivíduo em sua posição de poder. A impressão de que esses atos são “naturais” ou “inatos” deriva da sua cristalização “no tempo para produzir a aparência de uma substância, de uma classe natural do ser” (BUTLER, 2016, p. 59). Logo, a representação do masculino autoritário e da heterossexualidade agressiva do personagem não só é um produto direto desta “ideia de gênero” (BUTLER, 2016, p. 199) fabricada para o masculino, como também concorre para a manutenção deste mesmo modelo de masculinidade e a sua perpetuação através dos ensinamentos do currículo deste filme. Isto porque o currículo do cinema constitui os sujeitos discursivamente, uma vez que somos por ele transformados e aprendemos a nos reconhecer como homens e mulheres a partir de suas representações (MEYER, 2007). Consequentemente, através da autoridade, da violência e do patriotismo, o currículo de “Tropa de Elite” ensinava ao seu público os modos de se reconhecerem e de se portarem como homens legítimos, como podemos observar a partir dos vídeos citados no início deste tópico.

Entretanto, há uma fissura quanto à noção de masculinidade evocada pelo currículo do longa “Praia do Futuro”. No lugar do fardamento militar e da postura imperiosa, surge em tela Donato, um salva-vidas homossexual. Apesar de serem filmes extremamente distintos em termos de argumento, roteiro e direção, houve falsas expectativas para que as características do personagem principal de “Praia do Futuro” fossem contínuas àquelas evocadas pelo personagem principal de “Tropa de Elite”, uma vez que se trata do mesmo ator interpretando os personagens principais (JESUS; FERNANDES, 2014). Consequentemente, há um choque quando parte desse público se depara com o personagem fazendo sexo com outro homem, sobretudo na condição de passivo, ainda nos doze minutos de projeção.

Esse cenário nos fez refletir sobre a disposição hierárquica dos vários modos de masculinidades distribuídas em uma pirâmide de poder que Connell (2003) utiliza em seus estudos sobre gêneros. Para Connell, no topo da pirâmide temos a masculinidade hegemônica, aquela que incorpora a forma legítima de ser homem, e abaixo dela teríamos outros modelos que se posicionam em relação ao hegemônico: são as masculinidades cúmplices, as masculinidades subordinadas, as resistentes e as abjetas. Configura-se, portanto, uma ordem que está fundada sobre o entendimento que, dada a hierarquia piramidal, um determinado grupo de homens dominaria outros grupos, a partir dos códigos que sustentariam esse modelo hegemônico de masculinidade. Um exemplo que para nós é muito preciso de como as ascensões e quedas na pirâmide de masculinidades são mais comuns do que suporíamos é justamente aquele pelo qual passou o ator Wagner Moura em seu percurso no cinema brasileiro: da representação da masculinidade hegemônica do seu protagonista de “Tropa de Elite”, o ator “desceu” em direção a outra posição mais abjeta quando passou a interpretar um personagem homossexual em “Praia do Futuro”.

O conceito de gênero como uma maquinaria que produz e naturaliza “as noções de masculino e de feminino” (BUTLER 2006, p. 70) opera a partir da heterossexualidade compulsória com vistas a assegurar a coerência entre gênero, sexo e sexualidade - que não pode ser outra senão heterossexual (BUTLER 2006, 2013, 2016). O protagonista de “Praia do Futuro” abandona os discursos regulatórios do que é compreendido como próprio do universo masculino, que “asseguram para o homem a posição de mando sobre a mulher e justificam isso de modo ‘divino’” (SEFFNER, 2008, p. 18). O seu maquinário corporal não se permite submeter às mesmas regras que regulam e materializam o corpo de Capitão Nascimento. O currículo do filme evidencia isso através dos closes em seu porte físico, as inúmeras cenas em que a personagem permanece despida e em seu primeiro encontro sexual com um homem - um claro exemplo de hook up, expressão norte-americana que define “encontros sexuais e sem compromisso, marcados pela efemeridade e rapidez” (MISKOLCI, 2014, p. 281).

Pelo seu caráter subversivo, por romper e desestabilizar as fronteiras de gênero e sexualidade, Donato constitui-se em um modelo de masculinidade abjeta. Por abjeção entendemos o “espaço que a coletividade costuma relegar aqueles e aquelas que considera uma ameaça ao seu bom funcionamento, à ordem social e política” (MISKOLCI, 2016, p. 24). Dito de outro modo, trata-se de “algo pelo que alguém sente horror ou repulsa como se fosse poluidor ou impuro, a ponto de ser o contato com isso temido como contaminador e nauseante” (MISKOLCI, 2016, p. 43). Por geralmente ser mantido fora de vista, por ser colocado na fronteira, por ser demarcado como poluidor e perigoso, a inscrição daqueles descritos/as como “anormais” costuma ser um processo “marcado por formas muito violentas de recusa (...) do que a sociedade quer evitar como “contaminante”, seja uma identidade de gênero diferente das mais conhecidas ou formas de desejo fora do modelo de voga” (MISKOLCI, 2016, p. 43). Isso explicaria, possivelmente, o motivo da significativa evasão do público nas exibições de “Praia do Futuro” quando o filme entrou em cartaz em nosso país.

É possível vislumbrar este conceito operando através dos currículos aqui analisados: No longa “Tropa de Elite”, o protagonista é um cidadão-soldado que preza pela ordem, valoriza a preservação da integridade do Estado, possui um corpo útil, disciplinado, um corpo maquinado pela bravura e pelo autoritarismo, um corpo dócil15. Em outro, de nada serve o corpo de Donato à ordem social e política. Embora sua profissão de salva-vidas represente a “coragem e a bravura nos aparatos políticos e sociais do Estado brasileiro”, Donato “incorpora uma masculinidade homossexual (...) que é oprimida e deve se isolar das instituições patriarcais para ser reinventado livremente” (JESUS; FERNANDES, 2014, p. 2, tradução nossa), forçando-o a deixar o país em busca de vivenciar os seus desejos em outro lugar mais acolhedor com as sexualidades dissidentes.

Donato contrapõe com uma das principais definições sobre masculinidade na cultura ocidental, onde um sujeito lido como masculino é, obrigatoriamente, sexualmente ativo (GROSSI, 2004). Nesse entendimento “ser ativo, no senso comum a respeito de gênero, significa ser ativo sexualmente, o que para muitos significa penetrar o corpo da/o outra/o” (GROSSI, 2004, p. 6). Ao permitir ser penetrado, Donato se distancia ainda mais do que é nomeado como próprio do masculino: “a penetração é significante de passividade, portanto de feminilidade” (GROSSI, 2004, p. 9). No currículo do filme observa-se o peso da representação de um homem sexualmente passivo quando Donato reencontra em Berlim o seu irmão mais novo depois de muitos anos sem vê-lo: “Por que é que tu foi embora, hein? Responde agora, pô! Por que é que tu sumiu? Tu é um viado egoísta que gosta de dar o cu escondido na porra desse polo norte!”. Donato subverte a ordem que qualifica o ânus como um órgão de função meramente excretória e elege-o “além da sua função fisiológica, como fonte de erotismo e gozo sexual” (SILVA, 2007, p. 79), desconfiando de qualquer noção singular, adequada e legítima para vivenciar a sua masculinidade.

Sendo o gênero um conceito que permite o exame dos processos de produção daquilo que é naturalizado para homens e mulheres, Donato rompe diretamente com a “norma produtora, reguladora e normalizadora dos corpos” lidos como masculinos (BUTLER, 2006, p. 208). É um destes “corpos deslegitimados” e que apesar do seu vigor físico e a sua aptidão decorrente de seu trabalho como salva-vidas, “deixa de contar como corpo”, uma vez que não coaduna com “o esperado para o seu sexo” (BUTLER, 2013, p. 169-170). Entretanto, em que pese as normas regulatórias, o corpo de Donato paradoxalmente serve para “circunscrever os contornos daqueles que não são normais: os sujeitos que importam” (LOURO, 2004, p. 5). Dito de outro modo, Capitão Nascimento e Donato coexistem: o “normal”, o “masculino”, o “patriótico”, o “homem” só existe porque existe o outro, porque existe Donato: o “anormal”, o “efeminado”, o “abjeto”, aquele que sequer poderia ser considerado como “homem de verdade” por permitir ser penetrado. Não há como desconsiderar a potência deste currículo.

Foi-se o tempo em que poderíamos considerar o cinema como um mero registro histórico “ou como reflexo de objetos que lhe são anteriores” (SILVA, 2010, p. 43). Hoje já não há mais como e nem por quê entendê-lo assim. Entre sua política e sua poética, o cinema é constituído por discursos que “formam sistematicamente os objetos de que falam” (FOUCAULT, 2005, p. 56); “fazem algo mais além de designar” (SILVA, 2010, p. 43). Quando filmes como “Tropa de Elite” evocam uma heterossexualidade agressiva que incide sob o corpo de seu protagonista, eles não estão apenas falando sobre, mas também criando essa heterossexualidade; criando uma representação16 da heterossexualidade. E se “quem fala pelo outro controla as formas de falar do outro” (SILVA, 2010, p. 34, grifos do autor), falar da heterossexualidade como norma e representá-la como força, potência e como útil ao Estado é, ao mesmo tempo, relegar aqueles e aquelas que não se enquadram nessa norma - tal qual Donato de “Praia do Futuro” - o jugo de uma abjeção.

E “se mesmo com os investimentos para controlar a diferença no currículo, tudo aí ainda vaza” (PARAÍSO, 2010a, p. 588), seguimos como quem observa a imensidão do universo e as suas estrelas, para fazer coro a rima visual de Connell (1995) sobre a “constelação de masculinidades” que coexistem. Afinal, como podemos observar pelos currículos aqui analisados, “uma determinada forma hegemônica de masculinidade tem outras masculinidades agrupadas em torno dela” (CONNELL, 1995, p. 189), de modo que a construção desses diversos modelos não ocorre de maneira igualitária, mas sempre em meio a tensões e conflitos.

4 NOTAS FINAIS: UM CURRÍCULO HEROICO

“Embora nada, nada vá os afastar

Nós podemos vencê-los, apenas por um dia

Oh, nós podemos ser heróis, apenas por um dia”

(“Heroes”, David Bowie)

Não é por acaso que elegemos o trecho da canção “Heroes” do cantor britânico David Bowie como epígrafe deste derradeiro tópico. Também não é pelo fato de ter sido a escolha musical do diretor Karim Aïnouz para pontuar a metáfora central da obra (um herói dividido ao meio) nos créditos finais de seu longa-metragem “Praia do Futuro”. Evocar uma canção em que a esperança surge através de uma figura heroica, capaz de “vencê-los” nem que seja por um dia é uma escolha, sobretudo, política. Isto porque a composição afina-se com nossas trajetórias no campo dos estudos de gêneros e sexualidades na Educação. Em nossos anseios de somar forças para que seja possível entrever uma centelha de luz capaz de encandear o breu que tenta escurecer as nossas práticas pedagógicas (e aqui citamos projetos conservadores como “Escola Sem Partido”17), Bowie parece cantar conosco. Como educadoras e educadores que avalizam a importância de se discutir e problematizar as temáticas de corpos, gêneros e sexualidades nos currículos, bem sabemos - e por vezes sentimos - que “as armas dispararam acima de nossas cabeças”18. Afinal, a escola tem sido exaustivamente um alvo certeiro de vigilância e normalização (JUNQUEIRA, 2012) e o estampido desses disparos pode até momentaneamente nos deixar ensurdecidos devido ao zumbido causado pelo rastilho de pólvora do conservadorismo. Porém, acreditamos ser preciso muito mais que isso para nos impedir de sermos heróis e heroínas, mesmo que por um dia. Porque como tão confiantemente David Bowie entoa, “nós podemos vencê-los”, ainda que não seja “para todo o sempre”.

Sim, podemos ser heróis e heroínas. Se “para todo o sempre” ou “só por um dia”, ainda é difícil afirmar com precisão. Gostaríamos de finalizar este artigo com as possibilidades do breve instante: heróis e heroínas por um dia, por uma aula, por um efêmero momento no espaço escolar, por estratégias diárias de resistência. Aprendemos com Virgínia Woolf e sua Mrs. Dalloways19 a beleza que reside na tessitura do dia, de um dia. Por fim, heróis e heroínas que, através de um currículo, este currículo heroico que aqui sugerimos, não se atemorizam com a pungência de cada um dos tic-tacs do relógio que apontam o tempo que desliza de nossas mãos. Pelo contrário. Não há receio, pois não há “metas” estipuladas para cumprir em um dado período, uma vez que a visão organizacional de currículo proposta por Bobbit em seu “The Curriculum” (1918) e que bebe da influência da administração científica de Taylor não se alinha a nossa perspectiva pós-crítica. Aqueles e aquelas que se valem de um currículo heroico para minimizar o caos impetrado por políticas reacionárias encontram no seu próprio cotidiano a possibilidade de sempre se reinventar.

Nosso objetivo ao trazer essas discussões sobre as posições de sujeito relativamente ao masculino demandadas por dois filmes em particular é a de propor um currículo que não deslegitime os ditos “corpos abjetos”, considerados sem peso e sem importância. Pudemos concluir com a análise dos currículos desses filmes que, ao ensinar modos de se ver e de se entender o masculino, o cinema pode propiciar encontros potentes entre gêneros e sexualidades e o campo educacional. Se por um lado um desses currículos reitera um modelo hegemônico hierárquico de masculinidade, como no exemplo de “Tropa de Elite”, por outro há vazamentos e escapes mais diversos e menos afeitos a normatividades, como pudemos aprender com o currículo de “Praia do Futuro”.

Propomos a construção de um currículo insubordinado, que conhece bem os limites e sabe das “dores e das delícias” de como é viver entre fronteiras - esse lugar que, como já bem nos apontou Louro (2015), é um lugar que não só vem sendo constantemente atravessado, como também é um lugar social no qual muitas identidades dissidentes acabam por fixar moradia. A operacionalização de um currículo heroico é no riso, na alegria, nos jogos de subversão, na impertinência, na irreverência.

Mas o que quer um currículo heroico? Nesses tempos em que blockbusters de super-heróis reúnem numerosas salas de cinema, garantem uma fatia generosa da bilheteria mundial e se transformam em ícones da cultura pop, é no mínimo estranho relegar a um currículo à figura de um herói. Parece ser também um projeto curricular bastante ambicioso, de forma a causar a impressão a algum/a desavisado/a de que um currículo heroico, por definição, anseia sanar todas as problemáticas do campo da educação. Ledo engano. Não pleiteamos a salvação de todos os males, mas pedimos por uma reflexão “de forma equilibrada, tanto da experiência masculina quanto da feminina” (SILVA, 2016, p. 94). É, por excelência, um currículo queer, que causa estranhamento, perturba a nossa tranquilidade, nos desassossega e nos retira da passividade. Em um currículo heroico a sexualidade não é escamoteada dos espaços escolares, tampouco é desprezada pelas/os profissionais da educação ou tida como desimportante para esse campo. Assim, compõe-se num currículo que seja no fustigante sol da Praia do Futuro, nos tons cinzentos de Berlim ou nas favelas do Rio de Janeiro, jamais deixa seus alunos ou suas alunas à revés. Um currículo que, como diria David Bowie, pode ser um herói, uma heroína, pelo menos um dia.

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NOTAS

1 “Nesse país todo mundo sabe falar/que favela é perigosa, lugar ruim de se morar/é muito criticada por toda a sociedade/mas existe violência em todo canto da cidade”. Rap das Armas – Tropa de Elite. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=vlJ2AZxIOiM>. Acesso em: 22. Ago. 2019.

2Como podemos observar nas seguintes notícias veiculadas durante o período de exibição do longa “Tropa de Elite”: “Farda do Bope vira moda após o Tropa de Elite” http://noticias.terra.com.br/brasil/noticias/0,,OI1955723-EI306,00 Farda+do+Bope+vira+moda+apos+o+Tropa+de+Elite.html. Acesso em 31. Jul. 2018. “Roupas de Capitão Nascimento serão leiloadas no Rio” http://entretenimento.r7.com/cinema/noticias/roupas-de-capitao-nascimento-serao-leiloadas-no-rio-20101211.html. Acesso em 31. Jul. 2018.

3Disponível em: http://blogs.odia.ig.com.br/lgbt/2014/05/22/profecia-de-wagner-moura-se-cumpre-espectadores-abandonam-sessoes-de-praia-do-futuro/. Acesso em: 05 ago. 2018.

4Disponível em: http://www.pragmatismopolitico.com.br/2014/05/cinema-avisa-na-bilheteria-que-praia-futuro-tem-cenas-gays.html. Acesso em: 05. Ago. 2018.

5Ao grafarmos “estudos culturais”, nos referimos ao campo de estudos que toma por objeto “qualquer artefato que possa ser considerado cultural” (PARAÍSO, 2001, p. 69).

6As teorizações “pós-críticas” se inspiram nas abordagens teóricas comumente designadas como “pós”(pós-estruturalismo, pós-modernismo, pós-colonialismo, pós-feminismo), sem deixar de lado “outras abordagens que, mesmo não usando em seus nomes o prefixo “pós”, fizeram deslocamentos importantes em relação às teorias críticas”: o Multiculturalismo, a Filosofia da Diferença, os Estudos Culturais, os Estudos de Gênero, a Teoria Queer etc. (MEYER; PARAÍSO, 2014, p. 19)

7Embora aqui diferenciamos o currículo cultural daquele entendido como currículo escolar para fins de análise, concordamos com Paraíso (2001) quando ela argumenta que não há currículo que não seja cultural, posto que todo currículo, mesmo o escolar, é produzidos a partir de relações sociais.

8Federico Fellini foi um dos mais importantes diretores de cinema de todos os tempos e que conclamou a feitura de um “cinema-falsidade”, borrando a fronteira entre sonho e realidade.

9Disponível em: http://www1.folha.uol.com.br/fsp/ilustrad/fq2908200721.htm. Acesso em: 12. Mar. 2018.

10Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=9FNwkjbFydY. Acesso em: 05. Ago. 2018.

11Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=7Nb5HmkNwBA. Acesso em: 05. Ago. 2018.

12Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=xV0ePA_FTGQ. Acesso em: 05. Ago. 2018.

13Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=SYjylMTxuG0. Acesso em: 05. Ago. 2018.

14Para Foucault, posições de sujeito correspondem aos modos de ser que são produzidos em meio a discursos e relações de poder (FOUCAULT, 1993).

15A noção de corpos dóceis é oriunda de Foucault, que diz que um corpo dócil é aquele “corpo que pode ser submetido, que pode ser utilizado, que pode ser transmitido e aperfeiçoado” (FOUCAULT, 1999, p. 125).

16Por representação entendemos, à luz de Silva (2010, p. 32) como “a face material, visível, palpável, do conhecimento”.

17Sobre os diferentes projetos reacionários que intentam dirimir as discussões acerca de gênero nas escolas, ver Paraíso (2016b) e Junqueira (2018, 2019).

18 “And the guns, shot above our heads (over our heads)”, trecho da canção Heroes.

19Mrs. Dalloways é uma obra literária escrita por Virginia Woolf e que se passa totalmente durante um dia de junho de 1923, pós primeira guerra mundial. No livro, a personagem principal Clarissa Dalloway está preparando um jantar a ser realizado no final daquele dia em sua casa.

Recebido: 02 de Setembro de 2019; Aceito: 06 de Novembro de 2019

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