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Revista e-Curriculum

versión On-line ISSN 1809-3876

e-Curriculum vol.18 no.1 São Paulo ene./marzo 2020  Epub 30-Sep-2020

https://doi.org/10.23925/1809-3876.2020v18i1p262-282 

Artigos

ANÁLISE DOS ELEMENTOS CURRICULARES DO CURSO DE LICENCIATURA EM COMPUTAÇÃO DO INSTITUTO FEDERAL DO TRIÂNGULO MINEIRO: FORMAÇÃO DOCENTE EM FOCO

CURRICULAR ANALYSIS OF THE COMPUTER DEGREE COURSE IN THE TRIÂNGULO MINEIRO FEDERAL INSTITUTE: TEACHER TRAINING IN FOCUS

ANÁLISIS DE LOS ELEMENTOS CURRICULARES DEL CURSO DE LICENCIATURA EN COMPUTACIÓN DEL INSTITUTO FEDERAL DEL TRIÁNGULO MINEIRO: FORMACIÓN DOCENTE EN FOCO

Elisa Antonia RIBEIROi 
http://orcid.org/0000-0002-0832-278X

Olenir Maria MENDESii 
http://orcid.org/0000-0002-8607-2632

i Doutorado e Pós-doutorado em Educação pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Professora em regime de dedicação efetiva do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Triângulo Mineiro (IFTM) e Professora do Programa de Pós-Graduação do IFTM. E-mail: elisa.ribeiro@iftm.edu.br.

ii Doutorado em Educação pela Universidade de São Paulo. Professora associada, nível III, da Universidade Federal de Uberlândia e professora do Programa de Pós-Graduação da UFU. E-mail: olenir@ufu.br.


RESUMO

Este artigo tem por objetivo analisar os limites e as possibilidades de formação do currículo do curso de Licenciatura em Computação de um Instituto Federal e a relação com as políticas públicas de formação de professores. Buscou-se responder quais são as determinações expressas nas Diretrizes Curriculares Nacionais e no Projeto Pedagógico, quando se trata de orientar a construção dos elementos ensino-aprendizagem-avaliação. Para tanto, realizou-se o estudo comparativo entre a legislação oficial, o Projeto Pedagógico e os 15 planos de ensino das disciplinas que compõem os núcleos formação geral e pedagógico. A pesquisa baseou-se na (re)leitura de Mainardes (2006), sobre o ciclo de políticas - contextos da influência, produção de textos e prática, e nas pesquisas sobre análise de projetos pedagógicos e planos de ensino, pois esse referencial permite observar os objetivos, as diretrizes e os elementos didáticos da ação docente, de modo a assegurar a identificação do caráter de ambivalência que as políticas curriculares tendem a promover. As reflexões produzidas assinalam para um direcionamento investigativo que se torna necessário e urgente em duas dimensões articuladas: o posicionamento das instituições em relação aos cursos de licenciatura e aos professores formadores que neles atuam e ao desenvolvimento de pesquisas relacionadas à prática desses professores. Propõe-se que os planos de ensino construídos coletivamente, aplicados e cumpridos, à luz dos saberes e dos conhecimentos interdisciplinares, dirigidos às questões ligadas ao campo da prática profissional, seus fundamentos metodológicos e suas formas de trabalhar em sala de aula devem refletir a intencionalidade da ação pedagógica.

PALAVRAS-CHAVE: Currículo; Professores formadores; Licenciatura em Computação; Instituto Federal

ABSTRACT

This article aims to analyze the limits and possibilities of curriculum formation of the Computing Teaching Degree Course at a Federal Institute and the relationship with the public policies of teacher training. It sought to answer what are the determinations expressed in the National Curricular Guidelines and in the Pedagogical Master Plan when it comes to guiding the construction of the teaching-learning-assessment elements For that, a comparative study was carried out between the official legislation, the Pedagogical Master Plan and the 15 teaching plans of the subjects that make up the general and pedagogical training centers. The research is based on the (re)reading of Mainardes (2006), about the policy cycle - contexts of influence, text production and practice, and in the researches about analysis of pedagogical master and teaching plans, as this framework allows to observe the goals, the guidelines and the didactic elements of the teaching action, ensuring the identification of the ambivalent character that the curricular policies tend to promote. The reflections produced in this study point to an investigative orientation that becomes necessary and urgent in two articulated dimensions: the positioning of the institutions in relation to courses that train teachers and the training professors who work in these courses and the development of research related to the practice of these professors. It proposes that teaching plans built collectively - applied and fulfilled - in the light of interdisciplinary knowledge, addressed to the issues related to the field of professional practice, its methodological foundations and ways of working in the classroom should reflect the intentionality of the pedagogical action.

KEYWORDS: Curriculum; Teacher trainers; Computing Teaching Degree; Federal Institute

RESUMEN

Este artículo tiene por objetivo analizar los límites y las posibilidades de formación del currículo en el curso de Licenciatura en Computación de un Instituto Federal y la relación con las políticas públicas de formación de profesores. Se buscó responder cuáles son las determinaciones expresadas en las Directrices Curriculares Nacionales y en el Proyecto Pedagógico, cuando se trata de orientar la construcción de los elementos enseñanza-aprendizaje-evaluación. Para ello, se realizó el estudio comparativo entre la legislación oficial, el Proyecto Pedagógico y los 15 planes de enseñanza de las asignaturas que componen los núcleos de formación general y pedagógica. La investigación se basó en la relectura de Mainardes (2006), sobre el ciclo de políticas - contextos de la influencia, producción de textos y práctica, y en las investigaciones sobre análisis de proyectos pedagógicos y planes de enseñanza, pues este referente permite observar los objetivos, las directrices y los elementos didácticos de la acción docente, de manera que aseguren la identificación del carácter de ambivalencia que las políticas curriculares tienden a promover. Las reflexiones producidas señalan un direccionamiento investigativo que se vuelve necesario y urgente en dos dimensiones articuladas: el posicionamiento de las instituciones en relación a los cursos de licenciatura y a los profesores formadores que en ellos actúan y al desarrollo de las investigaciones relacionadas a la práctica de esos profesores. Se propone que los planes de enseñanza construidos colectivamente, aplicados y cumplidos, a la luz de los saberes y de los conocimientos interdisciplinarios, dirigidos a las cuestiones ligadas al campo de la práctica profesional, sus fundamentos metodológicos y formas de trabajar en el aula, deben reflexionar sobre la intencionalidad de la acción pedagógica.

PALABRAS CLAVE: Currículo; Profesores formadores; Licenciatura en Computación; Instituto Federal

1 INTRODUÇÃO

O presente artigo, decorrente das atividades do estágio pós-doutoral, realizado no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Uberlândia, objetiva analisar os limites e as possibilidades de formação do currículo do curso de Licenciatura em Computação (LC) ofertado pelo Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Triângulo Mineiro (IFTM - Campus Uberlândia Centro) e a relação com a implementação das Diretrizes Curriculares Nacionais para a Formação Inicial e Continuada dos Profissionais do Magistério da Educação Básica (DCN) (BRASIL, 2015a). A problematização estabelecida foi investigar quais são as determinações expressas nas DCN e no Projeto Pedagógico, quando se trata de orientar a construção dos elementos ensino-aprendizagem-avaliação.

Dessa forma, buscou-se levantar e analisar quais são as disposições pedagógicas delineadas no Projeto Pedagógico do Curso (PPC) de Licenciatura em Computação (IFTM, 2017c), reformulado em atendimento às DCN que dão as coordenadas para a formação inicial e continuada dos profissionais para o magistério, e nos planos de ensino das disciplinas que compõem os Núcleos Formação Geral e Pedagógica. Para o escopo da pesquisa, os objetivos foram: i) comparar o que preconizam as DCN para a Formação Inicial e Continuada dos Profissionais do Magistério da Educação Básica, Resolução CNE/CP Nº 2, de 1 de julho de 2015 (BRASIL, 2015a), tendo por base o Parecer CNE/CP Nº 2 (BRASIL, 2015b), aprovado pelo Conselho Pleno do Conselho Nacional de Educação (CNE), em 9 de junho de 2015, e homologado pelo Ministério da Educação (MEC) em 24 de junho de 2015, com o atual PPC, implementado no ano de 2017; ii) analisar os elementos curriculares ensino-aprendizagem-avaliação nos planos de ensino (2017-2018) referentes às disciplinas do Núcleo de Formação Geral e Pedagógica.

Outra questão suscitada foi investigar se o PPC (IFTM, 2017c) e os planos de ensino demandam e orientam na direção da elaboração de uma concepção de formação em consonância às necessidades contemporâneas para o exercício da docência, ou mantêm-se no postulado de uma formação designada por modelo epistêmico de racionalidade técnica e instrumental (MORGADO, 2005). O pressusposto ensejado é que as coordenadas originárias do documento oficial encontram limites executáveis, considerando como as formas de organização das instituições têm afetado o trabalho do professor formador, pontualmente, e o distanciamento existente por parte das instituições formadoras em relação às escolas de Educação Básica.

Diversos estudos sobre professores formadores dos cursos de licenciatura, como os de Gatti (2018, 2010, 2008), Freitas (2014, 2002), Passos (2018, 2007), Souza (2016) e outros, vêm demonstrando que tem havido um grande engajamento e esforço intelectual coletivo, envolvendo professores, gestores, pesquisadores e estudantes, na discussão e na produção de estudos que não deixem margens para dúvidas quando o tema é a formação inicial e continuada e seus resultados no cotidiano da escola brasileira. O documento oficial, Parecer CNE/CP nº 2/2015, menciona, dentre outros problemas, que

[...] os estudos apontam problemas relativos ao “repertório de conhecimento dos professores em formação; ao tratamento de conteúdos e dos modos de gerar, difundir e avaliar conhecimentos; às oportunidades para desenvolvimento cultural; às concepções de prática educacional (BRASIL, 2015b, p. 4).

Diante disso, a pesquisa insere-se no movimento de interlocução com estudos que recolhem elementos da análise contextual e de produção de textos no tocante à forma e ao conteúdo que os professores formadores (re)produzem os conhecimentos relativos ao cumprimento de normas institucionais. Gatti (2018, p. 19) destaca que “[...] a formação dos que atuam como formadores de professores está se tornando preocupação de gestores e pesquisadores, ou seja, há preocupação com suas qualificações”.

Nesse viés do campo das políticas educacionais de formação, Passos (2018) deslinda, em artigo recente, que ainda são inexpressivos os estudos que se preocupam em investigar as práticas dos professores formadores, em outras palavras, “[...[ o que fazem efetivamente nas salas de aula e os desafios enfrentados, especialmente os relativos aos conhecimentos profissionais e ao processo de aprender a ensinar para atuar nesse segmento” (PASSOS, 2018, p. 89).

Outro panorama que consolida que essa discussão é relevante e pertinente, trata-se de como tem sido, nas últimas décadas, a defesa promovida por pesquisadores em educação a favor do ideal paradigmático de formação de professores. De acordo com Papi e Martins (2010), o alargamento do interesse por pesquisas na área da formação de professores deve-se ao momento histórico que vivemos. As novas demandas constituem-se em um fértil campo de pesquisa, impulsionando a proposição de novas ações docentes desencadeadas tanto pela formação inicial como por meio da formação continuada.

Empregaram-se na produção desta pesquisa, quando do tratamento sobre as arenas, os lugares, os sujeitos e as forças políticas que moveram a elaboração dos documentos oficiais, os constructos teóricos erigidos por Mainardes (2006), especificamente com base no artigo Abordagem do ciclo de políticas: uma contribuição para a análise de políticas educacionais. Nesse trabalho, o autor discute as contribuições da policy cycle approach (abordagem do ciclo de políticas) para a análise de políticas educacionais. Em conformidade ao pensamento de Mainardes (2006), a abordagem foi formulada por Ball e Bowe (1992) e tem sido utilizada em diferentes contextos como referencial teórico analítico para o estudo de políticas educacionais. Essa abordagem “[...] destaca a natureza complexa e controversa da política educacional, enfatiza os processos micropolíticos e a ação dos profissionais que lidam com as políticas no nível local, e indica a necessidade de se articularem os processos macro e micro na análise de políticas educacionais” (MAINARDES, 2006, p. 49).

A análise de políticas públicas com base na abordagem do ciclo de políticas considera-a formada por um ciclo contínuo, constituído por cinco contextos principais. Esses contextos estão inter-relacionados, não têm uma dimensão temporal ou sequencial e não são etapas lineares. Ao utilizar o ciclo de políticas nesta pesquisa, o contexto de influência foi investigado por meio de pesquisa bibliográfica e pesquisa documental da legislação e da produção técnica dos organismos supranacionais1, que podem ser considerados lugares de articulação de influência. Nesse contexto, a proposição de qual deve ser o conteúdo das políticas e como os discursos políticos são construídos, estando ele frequentemente relacionado aos interesses mais estreitos e às ideologias dogmáticas. Nessa arena, grupos de interesse disputam para influenciar a definição das finalidades sociais da educação e do que significa ser educado. “Atuam nesse contexto as redes sociais dentro e em torno de partidos políticos, do governo e do processo legislativo” (MAINARDES, 2006, p. 51).

A análise do contexto da produção de texto envolveu o estudo dos documentos legais que norteiam a política - Resolução CNE/CP Nº 2/2015 (BRASIL, 2015a), Parecer CNE/CP Nº 2/2015 (BRASIL, 2015, b) e Resolução CNE/CES Nº 5, de 16 de novembro de 2016 (BRASIL, 2016). Os textos políticos normalmente estão articulados à linguagem do interesse público mais geral, representam, portanto, a política. Mainardes (2006) adverte que os textos políticos “[...] não são, necessariamente, internamente coerentes e claros, e podem também ser contraditórios [...]”, “[...] são o resultado de disputas e acordos, pois os grupos que atuam dentro dos diferentes lugares da produção de textos competem para controlar as representações da política” (MAINARDES, 2006, p. 52). Desse modo, políticas são intervenções textuais; entretanto, elas não são autoaplicadas na sua integralidade, carregam limitações e possibilidades. “As respostas a esses textos têm consequências reais. Essas consequências são vivenciadas dentro do terceiro contexto, o contexto da prática” (MAINARDES, 2006, p. 53).

O contexto da prática procedeu ao levantamento e à análise da concepção de educação e de formação docente instituída e da tendência político-pedagógica materializada nos elementos curriculares do Projeto Pedagógico do Curso de Licenciatura em Computação e nos Planos de Ensino das disciplinas que integram os Núcleos de Formação Geral e Pedagógico. Para tanto, considerou-se de que forma os textos da política foram interpretados pela Comissão2 responsável pela (re)formulação do PPC, e como e de que forma os professores formadores fizeram a interpretação dessas diretrizes, bem como as possíveis contradições e os conflitos existentes entre os textos e a implementação.

Resultados de pesquisas que focalizam documentos oficiais, como projetos pedagógicos e planos de ensino, permitem observar os objetivos, as diretrizes e os elementos didáticos da ação docente, assegurando identificar o caráter de ambivalência que as políticas curriculares tendem a promover. Cria-se, com este estudo, a expectativa de contribuir com estratégias de luta para o rompimento do caráter preponderantemente tecnicista, dual e sem significado político, a que a formação de professores, no Brasil, vem sendo imputada.

2 RECUPERANDO OS ANTECEDENTES DOS BASTIDORES DAS DCN

Avanços e retrocessos têm demarcado a trajetória dos cursos de formação do profissional do magistério da Educação Básica. A descontinuidade desse processo sinaliza a interferência de fatores, de natureza tanto política quanto cultural. A ausência de uma política de estado, por exemplo, que manifeste compromisso em garantir a necessária formação docente com a qualidade que demanda a sociedade contemporânea, assim como o conflito institucional revelado, dentre outros indicadores, pela permanência do posicionamento dos acadêmicos em relação à natureza e ao valor do conhecimento científico, compromete a qualidade da formação (BORDAS, 2009).

Além de ser uma resposta aos diversos estudos e pesquisas que “[...] apontam para a necessidade de se repensar a formação docente” (BRASIL, 2015b, p. 21), o Parecer CNE/CP Nº 2/2015 é, também, uma resposta aos acontecimentos que ocorreram no espaço-tempo de sua produção, entre os quais destacamos: a aprovação da Emenda Constitucional No 59, de 11 de novembro de 2009 (BRASIL, 2009) que, dentre outras determinações, ampliou a educação obrigatória do Ensino Fundamental para educação de 4 a 17 anos; a realização de diversas conferências nacionais de educação, como políticas e movimentos que avançaram no entendimento da valorização dos profissionais da educação como resultante da efetiva articulação entre formação inicial e continuada; e, mais recentemente, a aprovação do Plano Nacional de Educação (2014-2024), Lei No 13.005, de 25 de junho de 2014 (BRASIL, 2014), que trouxe no bojo de suas 20 metas, cinco delas direcionadas à profissionalização e à formação de profissionais do magistério.

Em ato constitutivo, o CNE instalou a Comissão Bicameral, de Formação de Professores, formada por Conselheiros da Câmara de Educação Superior e da Câmara de Educação Básica, designada para planejar, debater, promover o envolvimento da sociedade na discussão, preparar e encaminhar o texto das DNC para aprovação. Esse processo, contudo, não foi simples, nem tampouco célere, devido a várias intercorrências3.

Após ampla discussão do conteúdo nas reuniões de trabalho, o texto teve como base a incorporação das contribuições da audiência pública e, também, de outros documentos e sugestões recebidas. Por unanimidade, em 4 de maio de 2015, a Comissão Bicameral aprovou a minuta de Resolução e logo a encaminhou para deliberação do Conselho Pleno do CNE, em sessão, agendada para o dia 9 de junho de 2015. Nessa data, o Parecer e, consequentemente, a minuta de Resolução foram aprovados por unanimidade pelos membros do Conselho Pleno do Conselho Nacional e encaminhados para o MEC que os homologou, sem alterações, em 24 de junho de 2015, em sessão pública no MEC, revogando as Diretrizes de 2002, instituídas pela Resolução CNE/CP Nº 1, de 18 de janeiro de 2002 (DOURADO, 2015).

2.1 A ênfase da formação docente no quadro geral das DCN

A formação de profissionais para o magistério da Educação Básica no Brasil historicamente tem sido marcada por disputas de concepções sobre o lócus, o que ensinar, tempo de integralização curricular, relação entre bacharelado e licenciatura, dicotomia teoria e prática, entre outras questões de grande relevância. As DNC vêm contribuir materialmente para a alteração do modelo formativo - baseado na racionalidade técnica e instrumental, até então ensejado para os cursos de licenciatura.

A antiga Resolução CNE/CP Nº 1/2002, de forma tímida, pretendeu romper com o modelo fundado na epistemologia da racionalidade técnica, reconhecido por modelo epistêmico de racionalidade técnica e instrumental, que, mais poderosamente, “[...] configurou o pensamento acerca das profissões e das relações institucionais entre investigação, educação e prática” (SCHÖN, 1998, apud MORGADO, 2005, p. 34). No entanto, são as DNC que vêm definir que a formação deve ter por eixo a

[...] educação contextualizada a se efetivar, de modo sistemático e sustentável, nas instituições educativas, por meio de processos pedagógicos entre os profissionais e os estudantes articulados nas áreas de conhecimento específico e/ou interdisciplinar, nas políticas, gestão, fundamentos e teorias sociais e pedagógicas para a formação ampla e cidadã e o aprendizado nos diferentes níveis, etapas e modalidades da educação básica, baseados em princípios formativos definidos (BRASIL, 2015b, p. 21).

De igual modo, a documentação oficial enfatiza a organicidade no processo formativo e sua institucionalização ao entender que o projeto de formação deve ser elaborado e desenvolvido por meio da articulação entre a instituição de Educação Superior, o sistema de ensino e as instituições de Educação Básica, envolvendo a consolidação de Fóruns Estaduais e Distrital Permanentes de Apoio à Formação Docente, em regime de cooperação e de colaboração.

3 A OFERTA DO CURSO DE LICENCIATURA EM COMPUTAÇÃO NO IFTM - CAMPUS UBERLÂNDIA CENTRO: UNIDADE DE ANÁLISE

O Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Triângulo Mineiro (IFTM) foi implantado pela Lei Nº 11.892, de 29 de dezembro de 2008 ( BRASIL, 2008), originário da transformação e fusão das autarquias Centro Federal de Educação Tecnológica de Uberaba e Escola Agrotécnica Federal de Uberlândia. Atualmente, é composto pela Reitoria, localizada no município de Uberaba, e os campi Campina Verde, Ituiutaba, Paracatu, Patos de Minas, Patrocínio, Uberaba, Uberaba Parque Tecnológico, Uberlândia e Uberlândia Centro. A destacada lei conferiu aos Institutos Federais de Educação, Ciência e Tecnologia (IF) a condição legal de instituições de Educação Superior, Básica e Profissional, pluricurriculares e multicampi, especializados na oferta de educação profissional e tecnológica nas diferentes modalidades de ensino, com base na conjugação de conhecimentos técnicos e tecnológicos com as suas práticas pedagógicas.

A oferta de curso de formação docente, enquanto objetivo dos IF, está sumariamente definida, no Art. 7º, inciso VI, “[...] ministrar em nível de educação superior” (BRASIL, 2008, p. 1). No mesmo artigo, interessa-nos grifar a alínea (b), “cursos de licenciatura, bem como programas especiais de formação pedagógica, com vistas na formação de professores para a educação básica, sobretudo nas áreas de ciências e matemática, e para a educação profissional” (BRASIL, 2008, p. 1).

A criação dos IF vem no bojo das políticas expansionistas, cunhadas nos últimos 15 anos, para a educação profissional e tecnológica, como ação estatal para impulsionar o crescimento, dirimir as desigualdades de acesso ao nível superior, pactuar com as coordenadas das agências internacionais, em uma aparente ambiguidade, pelo intermédio do esforço público de expansão e do duplo esforço público de transferência de recursos para a expansão do Ensino Superior, via setor privado. Assim, traduz-se a força mantenedora dessas agências:

Diferentemente da cooperação internacional institucionalizada historicamente por meio de acordos bi e multilaterais, que envolviam interesses históricos, culturais, científicos e tecnológicos na produção do conhecimento desinteressado, a internacionalização da educação em geral e do ensino superior em particular vem sendo posta e imposta pelos organismos supranacionais, por mediação do Estado e de blocos econômicos regionais, em prol dos interesses imediatos do capital (SILVEIRA, 2012, n.p.).

Aproveitando a onda expansionista da educação profissional e tecnológica, em 1º de fevereiro de 2010, por meio de ato presidenciável, foi inaugurado, pela Presidente da República, o Campus Avançado Uberlândia, cuja administração pedagógica e financeira estava sob a responsabilidade do IFTM Campus Uberlândia. Em 23 de abril de 2013, por meio da Portaria Nº 330, publicada no Diário Oficial da União, no dia 24 de abril de 2013, o Campus Avançado Uberlândia passou a ser denominado Campus Uberlândia Centro, sendo mais um dos campi que integram a atual estrutura organizacional do IFTM. A oferta do Curso de Licenciatura em Computação aconteceu no 2º semestre desse mesmo ano, com a oferta de 30 vagas no período noturno. Até o ano de 2014, a entrada para o Curso de Licenciatura em Computação atendia à modalidade semestral. O curso passou por dois processos de reconhecimento, obtendo a nota 4, e, no Exame Nacional de Curso (Enade), o curso alcançou as notas 4 e 5.

3.1 (Re)Estruturação curricular do curso de Licenciatura em Computação do IFTM Campus Uberlândia Centro

O processo de revisão e adequação do PPC teve início no ano de 2016, e aprovação em 2 de maio de 2017, pela Resolução ad referendum Nº 34/2017 (IFTM, 2017a), e, em 24 de agosto de 2017, teve o PPC aprovado pela Resolução Nº 34/2017 (IFTM, 2017b). A carga horária total do PPC (IFTM, 2017c) ficou definida em 3.025 horas, uma pequena elevação da carga horária em relação ao antigo PPC (IFTM, 2010) que era de 2.925 horas. O aumento da carga horária foi em atendimento ao novo dimensionamento que o componente curricular - Prática - assume nas DNC.

Observou-se um aumento significativo do número de disciplinas sem acréscimo de carga horária, deixando perceptível a fragmentação curricular. No PPC anterior, eram 43 disciplinas, sendo que o somatório dos Núcleos Formação Geral e Pedagógica totalizava 14 disciplinas. A Tabela 1 apresenta a reorganização curricular do Curso de Licenciatura em Computação em atendimento às DNC, a Tabela 2 demonstra o quantitativo de planos e a amostra, e o Quadro 1 apresenta nomeadamente as disciplinas selecionadas.

Tabela 1 Reorganização da estrutura curricular do Curso  

Núcleos estruturantes Quantidade de componentes curriculares Carga horária
Formação geral 10 465
Formação pedagógica 11 480
Formação específica 24 1.470
Prática + Estágio Supervisionado 9 610
Total Curso 54 3.025

Fonte: Elaborada pelas autoras com base no PPC (IFTM, 2017c).

Tabela 2 Planos de ensino (2017 e 2018) Períodos (1º, 2º, 3º e 4) 

Núcleos estruturantes Quantidade de disciplinas Amostragem Planos de ensino
Formação geral 9 10
Formação pedagógica 4 5
Formação específica 13 Não se aplica
Prática + estágio supervisionado 2 Não se aplica

Fonte: Elaborada pelas autoras com base no PPC (IFTM, 2017c).

Quadro 1 Disciplinas selecionadas 

1º Período Disciplinas 2º Período Disciplinas 3º Período Disciplinas 4º Período Disciplinas
História da Educação* Fundamentos Filosóficos da Educação* Didática Políticas Públicas
Metodologia Científica * Teorias da Aprendizagem I Teorias da Aprendizagem II Direito e Diversidade
Matemática Discreta
Produção de Texto*
Inglês Instrumental

Fonte: Elaborado pelas autoras com base no PPC (IFTM, 2017c).

*Disciplina ofertada por diferentes professores, coube a análise de dois planos.

4 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS

Nesta seção, apresentamos os dados coletados e os resultados a partir do cotejamento entre o PPC e os 15 planos de ensino analisados, tendo como referência os elementos curriculares ensino-aprendizagem-avaliação. Foram estabelecidas variáveis a priore que serviram de parâmetro para o levantamento da frequência que aparecem nos planos.

4.1 O elemento ensino nos planos: análise da ementa, conteúdo programático e bibliografia

Ementa, listagem dos conteúdos programáticos e bibliografia, como itens do plano de ensino, constituem conteúdo de análise que possibilitam reconhecer quais são as tendências político-pedagógicas norteadoras da ação pedagógica. A análise das ementas e dos conteúdos programáticos dos 15 planos de ensino buscou verificar se as questões - interdisciplinaridade, formação docente, formação docente-digital e ensino da computação e tecnologias - eram mencionadas e/ou destacadas no plano do professor formador. A Tabela 3 demonstra que, dos 15 planos, três anunciam essas temáticas como proposta de ação pedagógica, sem estabelecer detalhamento de como serão desenvolvidas.

Tabela 3 Elemento de análise/ Ensino/Variável Ementa/Conteúdo 

Variável Ementa/Conteúdo Demonstração nos Planos Frequência (N= 15)
Inclusão do conteúdo interdisciplinaridade Zero
Inclusão do conteúdo formação docente 2
Inclusão do conteúdo formação docente e formação digital 3
Inclusão do conteúdo ensino da computação e tecnologias 3

Fonte: Elaborada pelas autoras com base nos Planos de Ensino (2017, 2018).

A ausência dessas temáticas nos planos de ensino de um curso de formação de profissionais para a Educação Básica, especificamente em se tratando do curso de Licenciatura em Computação, cujo estatuto científico articula as áreas da Computação, Informática, Tecnologias e Pedagogia, tende a demonstrar que o conjunto dos professores formadores expressa a dificuldade de estabelecer um significado de currículo que seja admitido integralmente por todos. Gimeno Sacristán (2000, p. 15), em relação à descrição de currículo, demonstra

[...] é difícil ordenar num esquema e num único discurso coerente todas as funções e formas que parcialmente o currículo adota, segundo as tradições de cada sistema educativo, de cada nível ou modalidade escolar, de cada orientação filosófica, social e pedagógica, pois são múltiplas e contraditórias as tradições que se sucederam e se misturaram nos fenômenos educativos (GIMENO SACRISTÁN, 2000, p. 15).

A bibliografia foi tomada como variável que suscita reflexão, pois é por meio dela que o professor formador irá construir e (re)construir suas concepções sobre os vários campos do conhecimento científico, filosófico e das experiências e até mesmo constituindo a sua identidade ideológica. É o lugar de onde, como, de que forma, a favor de quem, contra quem o professor formador “fala”. Na análise dos 15 planos de ensino, chamou atenção a escassa indicação para o uso da Web, sistema hipertextual que opera por meio da internet, como oportunidade de ampliação e de atualização de informações e fortalecimento do paradigma da autoaprendizagem. Constatou-se que, embora o PPC (IFTM, 2017c) tenha sido resultante de um processo de revisão e atualização frente às demandas das atuais DNC, o mesmo sentido não foi produzido em relação à atualização da bibliografia, conforme reforçado pela Tabela 4.

Tabela 4 Elemento de análise/ Ensino/Variável Bibliografia 

Variável Bibliografia Demonstração nos Planos/Frequência de valorização (N= 15)
Livro 15
Periódico 8
Pesquisa na web e sites educativos 3
Atualização/cinco últimos anos 2006 1 2007 3 2008 1 2009 3 2010 2 2011 3

Fonte: Elaborada pelas autoras com base nos Planos de Ensino (2017, 2018).

4.2 O elemento Aprendizagem nos planos: análise das competências e habilidades

É consenso entre muitos pesquisadores que fatores externos e internos influem no processo de aprendizagem. Para alguns, prepondera a influência dos fatores externos à escola, por exemplo, as questões socioeconômicas, a qualidade da formação do docente; outros apostam que a infraestrutura da escola, a gestão e a organização curricular detêm mais impacto na aprendizagem. Perante a diversidade de entendimentos, e, por isso mesmo, a compreensão de como, de que forma, qual o tempo da aprendizagem é complexa, não tem consenso entre os teóricos, mas, sim, aproximações. Em qualquer contexto, a finalidade da organização escolar é promover e garantir a aprendizagem de seus estudantes; deve, portanto, existir a coerência do currículo com o perfil desejado do egresso. O PPC (IFTM, 2017c) delineia o perfil esperado do egresso a partir da descrição das competências e das habilidades demandadas por um dado contexto social-econômico-político e as do próprio estatuto da profissionalidade.

No caso em estudo, a respeito do curso de Licenciatura em Computação, a construção do perfil profissional do egresso teve como referência as coordenadas do

Currículo de Referência para Cursos de Licenciatura em Computação da Sociedade Brasileira de Computação (SBC, 2002), [...] a Resolução CNE nº 2/2015, [...] a experiência acumulada até o momento e o legado da realização de cursos do gênero em outras instituições do território nacional (IFTM, 2017c, p. 19).

O rol de competências e habilidades (Tabela 5) foi selecionado a partir das DCN (BRASIL, 2015b, p. 25-26) e do PPC (IFTM, 2017c, p. 19-20), com o propósito de fazer o cotejamento com os objetivos da disciplina e a lista de conteúdos programáticos definidos pelo professor formador.

Tabela 5 Elemento de análise/ Aprendizagem/Variável Perfil do Egresso 

Variável Perfil do Egresso (Competências e Habilidades) Frequência (N= 15)
Atuar com ética e compromisso com vistas à construção de uma sociedade justa, equânime, igualitária. 6
Compreender e participar da construção de processos educativos e de aprendizagem, de forma a estabelecer relações e integrar as áreas de computação e educação de maneira transversal e multidimensional. Zero
Relacionar as tecnologias de informação e comunicação para o desenvolvimento da aprendizagem. 3
Realizar trabalho cooperativo e compreender a sua importância. 15
Compreender os efeitos da Computação como elemento de transformação da realidade. Zero
Contribuir para destacar a importância da Computação como chave de leitura do mundo contemporâneo. Zero
Pesquisar, compreender e avaliar criticamente informações. 15
Produzir novos conhecimentos e gerir a própria aprendizagem. 15
Promover uma visão que integre reflexões teórico-práticas, através dos estudos das Ciências da Educação em diálogo multidisciplinar com suas tecnologias. 4
Contribuir para a aprendizagem empreendedora, na perspectiva de valorização dos indivíduos, de suas capacidades, do alargamento da sua visão de sociedade, e da sua perspectiva de transformação dos espaços de produção econômica, de expressão cultural e de cidadania. Zero

Fonte: Elaborada pelas autoras com base nos Planos de Ensino (2017, 2018).

4.3 O Elemento Avaliação nos planos: análise da concepção e procedimentos avaliativos

O PPC (IFTM, 2017c) apresenta a concepção de avaliação educacional e conduz como esse processo deve ser desenvolvido para o atendimento às finalidades de formação (Tabelas 6 e 7). “A epistemologia que orienta o processo de avaliação de ensino-aprendizagem, no contexto deste curso, está balizada no paradigma dialógico que busca, constantemente, na avaliação uma forma de acompanhamento da aprendizagem dos discentes” (IFTM, 2017c, p. 107).

Tabela 6 Elemento de análise/ Avaliação/Variável concepção de avaliação 

Concepção de avaliação Frequência (N=15)
Prática de exame Zero
Medida educacional 1
Instrumento para a classificação e regulação do desempenho do aluno 7
Qualitativa e crítica 1
Reprodução do texto do PPC (item avaliação) 1
Não está contemplada no Plano de Ensino 5

Fonte: Elaborada pelas autoras com base nos Planos de Ensino (2017, 2018).

Tabela 7 Elemento de análise/ Avaliação/Variável procedimentos 

Procedimentos avaliativos Frequência (N=15)
Prova 8
Seminário 6
Atividades individuais em sala de aula 5
Produção (resumos, fichamentos, sínteses) 5
Atividades em grupo em sala 3
Atividades empregando as tecnologias informacionais 3
Autoavaliação 3
Lista de exercícios 3
Relatório de filme 3
Discussão de obra 2
Participação em eventos 2
Projeto integrador 2
Projetos 2
Comprometimento com o curso 1
Frequência 1
Participação em sala de aula 1
Projeto de Pesquisa 1
Prova com consulta 1
Prova de desempenho didático ( Microaulas) 1

Fonte: Elaborada pelas autoras com base nos Planos de Ensino (2017, 2018).

De um lado, o atual PPC (IFMT, 2017c) buscou modificar o paradigma de currículo balizado no ensino, formação de orientação usual de conteúdo que deve ser assimilado/decorado/devolvido na forma da prática de exames, para uma orientação que se baseia na perspectiva da aprendizagem, conhecimentos, saberes e experiências esperados como resposta ao processo formativo pelo egresso do curso, tendência que acena com as DCN. Por outro, o mesmo PPC (IFTM, 2017c) não consegue traduzir de forma abrangente as dimensões consagradas no perfil esperado do egresso, enquanto as DNC estabelecem conhecimentos e saberes, como tradução de competências e habilidades necessárias à formação do profissional, o Currículo de Referência para cursos de Licenciatura em Computação (SBC, 2002) caminha na direção paradigmática do modelo de formação por competências/ habilidades. No texto das DNC, as palavras “conhecimentos” e “saberes” aparecem 47 e nove vezes, e as palavras competências e habilidades, quatro e sete vezes, respectivamente.

Conclui-se que essa ambiguidade registrada na descrição do perfil esperado do egresso e a fixação do objetivo geral do curso não abrangem amplamente e de forma condizente o que a sociedade almeja desse profissional. Acredita-se que a pouca clareza da descrição do perfil esperado do egresso e do objetivo geral do curso prescrevem um currículo concentrado nas disciplinas de base específica que não dialogam com as disciplinas pedagógicas (articulação fundamental na formação de professores).

Outra questão alheia ao PPC diz respeito ao tratamento à formação continuada - inovação pedagógica - citada pelas atuais DCN como condição para a elevação da qualidade da Educação Básica, percebida na análise devido à econômica menção recebida na escrita do documento. Igualmente, não há menção à definição de metas e estratégias, visando promover a articulação da graduação com a pós-graduação, e entre pesquisa e extensão como princípio pedagógico essencial ao exercício e ao aprimoramento do profissional do magistério e da prática educativa.

Mais uma questão que chamou atenção foi a pouca importância conferida à estratégia de articulação com os sistemas, redes e instituições de Educação Básica e Superior, tratada no PPC, sendo uns dos princípios abrangidos pelas DCN. Ao compreender a intencionalidade do PPC, é possível identificar a propensão da instituição ao contexto de formação dos profissionais para o magistério da Educação Básica, capacitando o pesquisador na produção de interpretações mais acuradas da tendência político-pedagógica que os planos de ensino tendem a revelar.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

As aproximações elaboradas sobre os elementos curriculares ensino-aprendizagem-avaliação demonstram que o conjunto dos professores formadores não tem clareza do perfil profissional esperado do egresso e do objetivo geral do curso com reflexo na construção dos planos de ensino. Além do que, não há indicativo de movimentação com a finalidade de progredir na articulação pesquisa-ensino-extensão. Ficou demonstrado, por meio do levantamento, que discussões sobre formação docente, formação docente-digital e ensino da computação e tecnologias estão presentes em apenas 20% das ementas e dos conteúdos programáticos.

A questão da interdisciplinaridade definida no PPC e enfatizada nos demais documentos oficiais não está em construção pelo corpo social em uma postura de “atitude pedagógica”, no dizer de Fazenda (1987 p. 8-9). A “atitude pedagógica” diz respeito à promoção e à manutenção do diálogo, a “[...] única condição de possibilidade da interdisciplinaridade” (FAZENDA, 1987 p. 9). Uma possibilidade de impulsionar a vivência da “atitude pedagógica” é o movimento em direção às experiências que articulam pesquisa-ensino-extensão.

Os professores formadores dedicam-se ao desenvolvimento do conteúdo programático prioritariamente pela adoção do livro, como instrumento de informação, a despeito da prática de acesso a outras fontes. Igualmente, essa opção metodológica coopera para a lentidão de renovação dos saberes acadêmicos, garantindo seu status de “professor - profissional técnico”4 (MORGADO, 2005, p. 34).

Poucas inovações pedagógicas foram verificadas no que concerne aos métodos aplicados em sala de aula. O foco, ainda, é na aula expositiva, professor expositor e estudante ouvinte. Fica o diferencial por conta da inclusão da perspectiva do método estudo de caso de contextos escolares. Perpetua o modelo tradicional de ensino - fragmentação dos saberes da docência, dicotomia teoria/prática e hierarquização dos saberes.

Esses limites apontados reproduzem-se no entendimento do papel da avaliação como elemento integrador do processo de ensino-aprendizagem, pois a finalidade da avaliação deveria estar a serviço do estudante, garantindo sua plena aprendizagem. Evidência disso é que a metade dos planos de ensino difunde que a finalidade da avaliação é servir de instrumento de classificação e regulação do desempenho do estudante, e a prova é a técnica empregada para a regulação.

Por fim, não se tem um encerramento, tão menos o encarceramento das análises das tendências político-pedagógicas dos elementos curriculares do PPC e seu reflexo nos Planos de Ensino. As reflexões produzidas assinalam para um direcionamento investigativo que se torna necessário e urgente em duas dimensões articuladas: o posicionamento das instituições em relação aos cursos de Licenciatura e aos professores formadores que neles atuam e o desenvolvimento de pesquisas relacionadas à prática desses professores.

Diante desse quadro, como contribuição, propõe-se que os planos de ensino construídos coletivamente à luz dos saberes e dos conhecimentos interdisciplinares, dirigidos às questões ligadas ao campo da prática profissional, seus fundamentos metodológicos e suas formas de trabalhar em sala de aula e postos para serem aplicados e cumpridos, devem refletir a intencionalidade da ação pedagógica.

REFERÊNCIAS

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NOTAS

Ao lado do World Bank, a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), a Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) e o Fundo Monetário Internacional (FMI) podem ser considerados agências que exercem influência sobre o processo de criação de políticas nacionais.

2 Portaria nº 21, de 11 de março de 2016, que designa os membros da comissão responsável pela revisão e atualização do Projeto Pedagógico do Curso de Licenciatura em Computação.

3 Adensamento sobre os bastidores ver Dourado (2015).

4 Uma análise relativa a outros modelos de profissionalidade docente pode ser consultada em Contreras (1999).

Recebido: 22 de Fevereiro de 2019; Aceito: 17 de Novembro de 2019

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