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Revista e-Curriculum

versión On-line ISSN 1809-3876

e-Curriculum vol.18 no.2 São Paulo abr./jun 2020  Epub 15-Oct-2020

https://doi.org/10.23925/1809-3876.2020v18i2p994-1016 

Artigos

ESTRATÉGIAS PARA RESISTIR ÀS RESISTÊNCIAS: EXPERIÊNCIAS DE PESQUISA E DOCÊNCIA EM EDUCAÇÃO E TECNOLOGIA

STRATEGIES TO RESIST RESISTANCE: TEACHING AND RESEARCH EXPERIENCES IN EDUCATION AND TECHNOLOGY

ESTRATEGIAS PARA RESISTIR A LAS RESISTENCIAS: EXPERIENCIAS DE INVESTIGACIÓN Y ENSEÑANZA EN EDUCACIÓN Y TECNOLOGÍA

Giselle Martins dos Santos FERREIRAi 
http://orcid.org/0000-0002-8498-5390

Jaciara de Sá CARVALHOii 
http://orcid.org/0000-0003-1497-3930

Márcio Silveira LEMGRUBERiii 
http://orcid.org/0000-0001-9269-5695

Luiz Alexandre da Silva ROSADOiv 
http://orcid.org/0000-0002-2702-5617

i Doutora em Música pela Universidade de York. Professora Adjunta no Departamento de Educação da PUC-Rio. E-mail: giselle-ferreira@puc-rio.br.

ii Doutora em Educação pela Universidade de São Paulo. Professora Adjunta no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Estácio de Sá, PPGE/UNESA, desde 2015. E-mail: jsacarvalho@gmail.com.

iii Doutor em Educação pela UFRJ. Professor Adjunto no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Estácio de Sá, PPGE/UNESA, desde 2012. E-mail: mslemgruber@gmail.com.

iv Doutor em Ciências Humanas (Educação) pela PUC-Rio. Professor Adjunto no Departamento de Ensino Superior do Instituto Nacional de Educação de Surdos - DESU/INES, Rio de Janeiro, Brasil. Coordenador Adjunto do Programa de Pós-graduação em Educação Bilíngue do INES. E-mail: alexandre.rosado@gmail.com.


RESUMO

É difícil prever o futuro da educação brasileira, mas a presença cada vez mais marcante das tecnologias digitais em contextos educacionais parece ser uma tendência irrefreável. Proliferam novas siglas, acrônimos e rótulos apresentados como novidades, mas que, frequentemente, apenas reciclam velhas ideias. Enquanto a expansão da indústria que fornece artefatos digitais para fins supostamente educacionais se dá com o respaldo de políticas de fomento à inovação, as discussões pertinentes são predominantemente maniqueístas e marcadas por juízos de valor fortemente afetivos. Nesse contexto, para que seja possível enfrentar condições possivelmente adversas aos valores de uma educação focalizada na formação de cidadãos críticos, é preciso desafiar essa polarização. Fundamentado em estudos críticos e na experiência docente dos autores, este ensaio discute recursos e estratégias pedagógicas que visam a resistir às resistências fundadas em concepções simplistas da relação educação-tecnologia.

PALAVRAS-CHAVE: Educação e tecnologia; Abordagens críticas; Ideologia; Teorias do discurso; Metáforas.

ABSTRACT

It is difficult to predict the future of Brazilian education, but the ever-increasing presence of digital technologies in educational contexts seems to be an unstoppable trend. New acronyms and labels proliferate, presented as novelties that, often, only recycle old ideas. Whilst the expansion of the industry that supplies digital artefacts for supposedly educational purposes is supported on policies that foster innovation, pertaining discussions are predominantly polarised and marked by strongly affective value judgements. In this context, to face conditions that are possibly contrary to the values of an education for citizenship, it is necessary to challenge this polarisation. Based upon critical studies and the combined teaching experience of the authors, this essay discusses pedagogical strategies aimed at resisting resistances associated with simplistic conceptions of the relationship education-technology.

KEYWORDS: Education and technology; Critical approaches; Ideology; Theories f discourse; Metaphors.

RESUMEN

Es difícil predecir el futuro de la educación brasileña, pero la presencia cada vez más fuerte de las tecnologías digitales en contextos educativos parece ser una tendencia irrefrenable. Proliferan nuevas siglas, acrónimos y rótulos presentados como novedades, pero que a menudo sólo reciclan viejas ideas. Mientras que la expansión de la industria que fornece artefactos digitales para fines supuestamente educativos se da con el respaldo de política de fomento a la innovación, las discusiones pertinentes son predominantemente polarizadas y marcadas por juicios de valor afectivos. En este contexto, para afrontar condiciones posiblemente adversas a los valores de una educación focalizada en la formación de ciudadanos críticos, es preciso desafiar esa polarización. Anclado en estudios críticos y en la experiencia docente de los autores, este ensayo discute estrategias pedagógicas que apuntan a resistir a las resistencias fundadas en concepciones simplistas de la relación educación-tecnología.

PALABRAS CLAVE: Educación y tecnología; Abordagens críticas; Ideología; Teorias de discurso; Metáforas.

1 INTRODUÇÃO

O panorama atual da educação no Brasil suscita inquietações que se intensificam diariamente quando nos deparamos com notícias progressivamente mais preocupantes. Acumulam-se propostas de medidas inconsistentes com o complexo cenário de diversidade social, econômica e cultural do país, em um contexto de ameaças ao processo democrático brasileiro, fomentado em sua (re)construção desde a década de 1980. Em vez de se pensar em um projeto de país que tenha a formação humana como um de seus pilares, conferem-se poderes salvacionistas a uma educação que, diz-se, precisa ser ideologicamente “higienizada”1. Episódios recentes envolveram anúncios de cortes de verbas públicas a universidades federais condicionados à manifestações posicionadas contrariamente ao pensamento governista predominante2.

Crucialmente, aliadas a medidas que apoiam a precarização do trabalho, propostas pouco articuladas e que soam estranhas aos estudiosos da área - por exemplo, controle ideológico de textos didáticos, currículos e instrumentos de avaliação, ampliação do ensino a distância para outras faixas etárias3 - sugerem-se explicitamente como oportunidades de negócios para os fornecedores de artefatos (incluindo livros didáticos) e serviços supostamente direcionados à educação. De fato, circulam, até mesmo nas grandes mídias, indicações significativas de que pautas com valores anacrônicos, tais como a da educação domiciliar, ocultam poderosos interesses financeiros: nesse caso, a abertura de um amplo mercado de materiais didáticos para os pais ensinarem a seus filhos4.

Diante deste cenário preocupante, parece inevitável a continuação de uma tendência já em curso: a expansão da presença das tecnologias digitais em contextos educacionais. Encontra-se em franco crescimento um mercado nacional para artefatos supostamente dedicados à educação, incluindo jogos eletrônicos, ambientes virtuais de aprendizagem e sistemas de “aprendizagem adaptativa”, dentre outras possibilidades introduzidas no país, sobretudo, a partir de ofertas aparentemente “generosas” das grandes corporações transnacionais oriundas do Vale do Silício (KWET, 2019). Em um contexto global de expansão de uma nova forma de capitalismo - segundo Zaboff (2019), o “capitalismo da vigilância” - possibilitado pela coleta e tratamento de grandes volumes de dados (Big Data5), empresas como a Google e a Microsoft tornam-se cada dia mais fortemente enraizadas não apenas no cotidiano dos nossos cidadãos, mas, também, no dia a dia de muitas de nossas escolas (BANNELL, 2017). É possível vislumbrar um processo de “uberização”6 do trabalho docente, especialmente pós-reforma trabalhista, em todos os níveis de escolarização, em um panorama no qual o “deslocamento radical” concretizado na base da substituição do humano pela máquina (BARRETO, 2017) não parece constituir apenas uma distopia possível dentre tantas outras em ampla circulação no imaginário contemporâneo. Enquanto o velho colonialismo adquire novas roupagens a partir da penetração de empresas como as GAFAM7 em escolas e governos ao redor do mundo (COULDRY; MEJIAS, 2018), parece-nos que o fortalecimento da indústria da tecnologia educacional permanece nas pautas nacionais atuais, por mais confusas que estas possam parecer à primeira vista.

O presente contexto, portanto, não é favorável para perspectivas de educação humanizadoras, emancipatórias, críticas entre tantas outras adjetivações que não menosprezam o caráter inerentemente político desse processo. Entretanto, é justamente no atual panorama que estas perspectivas se tornam ainda mais urgentes. Talvez hoje, valorizar o caráter eminentemente político da educação seja uma forma de resistência, cabendo apostar na criatividade - em acepções distintas da instrumental e/ou de mercado - para tornar cada vez mais explícito que não existe neutralidade em nossos atos humanos e, portanto, todo produto (digital, por exemplo) e qualquer processo resulta de uma intencionalidade a ser reconhecida (SELWYN, 2014; 2017). Assim, talvez a longevidade da democracia passe - também, obviamente - por reconhecer que o objetivo maior da educação seja provocar criticidade suficiente que comprometa os sujeitos à ação. Afinal, “ninguém luta contra as forças que não compreende, cuja importância não mede, cujas formas e contornos não discerne”, como já escreveu o (re)perseguido educador Paulo Freire (1979, p. 22). O fortalecimento da democracia passaria por uma educação que compreenda cidadania como um estado constante de “posse da realidade” (FREIRE, 1979, p. 16), como uma condição conquistada por meio do desenvolvimento permanente da criticidade (CARVALHO, 2017). É pedagógica a desnaturalização das relações, das presenças e das ausências, discernindo “contornos” das realidades. Em se tratando de tecnologias digitais, esses contornos parecem estar cada vez mais diluídos e imbricados de modo a se tornarem imperceptíveis no cotidiano.

2 EDUCAÇÃO E TECNOLOGIA: HEGEMONIA DE UM SENSO-COMUM?

O papel da pós-graduação como lócus importante de resistência a desenvolvimentos problemáticos no cenário nacional é inquestionável. Além de formarmos pesquisadores, que, obviamente precisam desenvolver sua criatividade e criticidade, formamos, também, formadores, não apenas para a Educação Superior, mas, também, para a Educação Básica. Nesse sentido, pensamos ser essencial explorarmos perspectivas outras acerca da presença das tecnologias digitais na atualidade, de forma geral, como porta de entrada para a discussão sobre essa centralidade, em particular, na educação. As discussões, correntes na área da Educação, sobre as tecnologias tendem a ser fortemente polarizadas, e os posicionamentos envolvidos têm constituído, via de regra, fortes pontos de resistência dos estudantes com quem temos lidado. Para auxiliá-los a desenvolver seu pensamento crítico, precisamos, como formadores de pesquisadores e professores, problematizar situações no sentido de criar estratégias de resistência a essas resistências, fundamentadas, primordialmente, em visões maniqueístas da tecnologia.

Por um lado, os discursos hegemônicos acerca das tecnologias digitais focalizam apenas naquilo que esses artefatos supostamente teriam a oferecer como “benefícios”. Trata-se de ideias insidiosas, em parte, porque permeiam não apenas o dito senso-comum, mas, também, muito do que se diz na literatura acadêmica e que se consagra nos textos das políticas públicas (BARRETO, 2009). De fato, uma parcela significativa da pesquisa na área da Educação e Tecnologia parece consistir em “comparações antes-depois” da inserção de artefatos em práticas pedagógicas, ou seja, tratam da mera substituição de suportes, quase sempre, com limitada atenção a questões pedagógicas fundamentais (ROSADO et al., 2017). Em alguns casos, justificam-se pesquisas meramente com base no surgimento de um recurso (um novo aplicativo, por exemplo), ou no crescimento de sua popularidade junto a determinado público de usuários. Desse modo, sustenta-se o discurso da inevitabilidade de transformações causadas pela tecnologia, e disseminam-se ideias sem fundamentação em empiria, ou seja, sem base na realidade vivida por pessoas em contextos de multiplicidade e diversidade.8

Em particular, rótulos da tecnologia educacional (SELWYN, 2015) - por exemplo, “aprendizagem adaptativa”, “metodologias ativas” e “pensamento computacional”, apenas para mencionar alguns dos mais recentes - tendem a ocultar formas contestáveis de reducionismo (por exemplo, a redução da discussão sobre a educação a uma discussão sobre a aprendizagem) e determinismo tecnológico. Em muitos casos, trata-se não de “inovações” possibilitadas pela tecnologia, mas, sim, de ideias conhecidas por estudiosos, em particular, da História da Educação.9 Poucas parecem ser as produções que adotam uma perspectiva histórico-crítica e/ou recorrem a teorias que subsidiem análises mais sóbrias (ROSADO et al., 2017). Nesse contexto, impera um fascínio quase-religioso por um assumido poder transformador (para melhor) de novos artefatos (FELINTO, 2005; BRETON, 2000).

Por outro lado, o posicionamento luddita, isto é, a rejeição de tudo aquilo que é considerado tecnologia, opõe-se a essa idealização ingênua. Nessa perspectiva, encaixa-se a objeção de que a utilização das tecnologias na educação é, essencialmente, uma expressão de políticas neoliberais do Estado mínimo que objetivam cortar gastos em programas educacionais públicos. Nesse sentido, as tecnologias constituem um “mal” que precisa ser fortemente combatido. Apesar da força explicativa das bases teóricas que, em geral, apoiam esse tipo de crítica, predomina uma visão tecnológico-determinista da relação entre o humano e a técnica, que pouca atenção dá às possibilidades de subversão de usos de artefatos: se, por um lado, tecnologias são produzidas com propósitos específicos, sua apropriação em diferentes contextos, ainda que, com limites, pode se dar a partir de propósitos significativamente distintos. Com pouco ou nenhum recurso a dados empíricos, retirados de contextos reais de utilização e apropriação de artefatos, é difícil avançar a crítica para além de objeções, ainda que importantes, à tecnocracia e ao determinismo tecnológico que a têm sustentado (DUSEK, 2009).

Em resumo, ambos os extremos tendem a ignorar a complexidade da relação entre o humano e o técnico. Além disso, em ambos os casos, as concepções acerca dessa relação tendem a ser associadas a juízos de valor de forte teor emocional. Ama-se ou odeia-se a tecnologia. A tecnologia encanta alguns e amedronta outros. Em algumas esferas de discussão sobre a educação, a tecnologia é simplesmente ignorada como contingência significativa de praticamente todas as atividades do ser humano. Em outras, que conferem centralidade à presença de tecnologias na educação, restringe-se a discussão a questões relativas a “como” - como utilizar um dado artefato em sala de aula -, sem consideração ao “porquê” de tal utilização. Tais noções reducionistas, funcionalistas e instrumentalistas da tecnologia circulam amplamente e, em nossa experiência, constituem o ponto de partida de grande parte dos ingressantes em cursos de pós-graduação. Não pensamos ser uma coincidência que a maioria daqueles com quem temos lidado, que se propõem a estudar temáticas da Educação e Tecnologia, defendam, ao menos inicialmente, um posicionamento excessivamente otimista, expresso em hipérboles e outros tipos de imagens que personificam objetos inanimados. Vejamos alguns posicionamentos capturados de falas dos participantes pertencentes a uma de nossas disciplinas sobre Educação e Tecnologia ministrada no primeiro semestre de 2018.

Sobre a inevitabilidade da tecnologia percebemos construções semelhantes a “A tecnologia já está presente na educação”, ou seja, um fato dado e aceito, gerando regras transmutadas em frases como “A tecnologia deve ser usada como um meio para propósitos educacionais” e “[As tecnologias] devem estar voltadas para o bem-estar e desenvolvimento geral”. Essas tecnologias também realizam ações, como em “A tecnologia e a educação se relacionam na medida em que uma pode auxiliar a outra a se desenvolver e também a criar meios para desenvolver cognitivamente um indivíduo” e em “A tecnologia pode ser uma aliada da educação”, um tipo de otimismo personificado em objetos que, sabemos, são inanimados. Se elas são consideradas objetos, também são consideradas agentes voltados ao aumento da eficiência de ações educacionais, quando se diz “Elas podem se relacionar de maneira a melhorar a relação ensino/aprendizagem”, “A tecnologia na educação pode facilitar a construção de novos conhecimentos” e “O uso da tecnologia na educação pode facilitar o processo de ensino/aprendizagem”. A tecnologia, como objeto e promotor de ações e melhorias educacionais, torna-se, assim, neutra, apolítica, o que se reflete em manifestações como “A tecnologia pode ser usada como ferramenta, recursos tecnológicos no processo de ensino/aprendizagem” e em “A educação, com suas demandas, influencia/incentiva a procura por novas ferramentas que auxiliem de alguma forma o desenvolvimento do indivíduo.”

Conforme sugerem esses exemplos, que poderiam ter sido retirados de propagandas, blogs ou mesmo de alguns textos acadêmicos, a tecnologia (de fato, a tecnologia digital) é tomada como um dado inescapável, e a sua “integração” em práticas pedagógicas é vista como uma demanda incontrovertida. De modo geral, a linguagem prescritiva (deve) reflete formas usuais de falar sobre a educação fundamentadas em uma visão ingenuamente otimista da relação educação/tecnologia, expressa, nos excertos, pelas palavras destacadas em negrito - “auxiliam”, “melhoram”, “facilitam”. Além disso, “aumento da qualidade”, “em favor” e o repetido uso do termo “ferramenta”, ideia normalmente associada a questões de eficiência, sugerem uma perspectiva da tecnologia como neutra, ou seja, que seu impacto é função apenas dos propósitos com os quais é utilizada. De maneira geral, a tecnologia é concebida primordialmente em termos que personificam artefatos, e seu uso na educação é tomado como indiscutível para além de aspectos instrumentais (o “como”). Crucialmente, desafios ou problemas não são usualmente sugeridos, como não são oferecidos comentários que apontem para questões políticas e/ou econômicas, bem como especificidades pedagógicas. O extrato a seguir, também fala de um de nossos alunos, encapsula quase todos esses aspectos, que parecem caracterizar os discursos hegemônicos da tecnologia educacional:

A educação e a tecnologia podem se relacionar otimizando o processo de ensino-aprendizagem, gerando inclusão para aqueles que não têm acesso às tecnologias e proporcionando reflexão sobre o rumo que a sociedade tem tomado.

Tais discursos apresentam, com frequência, diferentes saídas tecnológicas para ditos problemas que não são explicitados ou que não seriam, de fato, próprios da educação. No lugar de apontar o que corrigir e aprimorar, empregam-se adjetivos para qualificar qualquer processo educacional que não envolva tecnologias digitais como anacrônico e, consequentemente, incapaz de contribuir com a formação de sujeitos produtivos em uma atualidade marcada pela presença de artefatos digitais. Além do uso de adjetivos, tentativamente sustentam-se essas ideias por meio de argumentos de autoridade10, em geral, de empreendedores, gestores, engenheiros e, sobretudo, profissionais estrangeiros ligados a centros de pesquisa, fundações e empresas de tecnologia. Lamentavelmente, no lugar de especificidades diretamente relevantes à educação, predominam as generalidades, as generalizações infundadas e os argumentos superficiais (SELWYN, 2015).

3 PRÓ-VOCAÇÕES

A fim de promover reflexões sobre dimensões ignoradas ou obscurecidas por discursos hegemônicos, é fundamental questionar generalizações que são tomadas como premissas sem problematização. Nesse sentido, é essencial construir-se práticas curriculares que focalizem em identificar e questionar elementos do senso comum que nos caberia, como educadores, desconstruir. Inspiram-nos os pressupostos da “mediatização” (FREIRE, 1987) e da “mediação pedagógico-dialética”, pela qual, aos educadores, cabe promover tensões entre o “saber imediato e o saber mediato” (OLIVEIRA et al., 2007, p. 142). No lugar de facilitador e intermediário - aquele que faz a ponte entre os ditos conteúdos e os educandos -, o professor se posicionaria como um provocador da educação pelos sujeitos. Em vez de valorizar a síntese/conclusão, o atual “lacre” que encerra irrevogavelmente a discussão, o conhecimento seria considerado um processo, ou seja, dinâmico e em permanente construção pelo diálogo.

Nesse sentido, pensamos a estruturação desse processo a partir das bases teóricas que adotamos em nossas próprias pesquisas, as quais oferecem conceitos e ideias que nos permitem propor provocações que vão de encontro a premissas e preconcepções. Em particular, temos trabalhado com três conceitos centrais como eixos estruturantes de atividades de leitura, discussão e escrita: ideologias, discursos e metáforas. Cada um desses eixos claramente demandaria estudo bem mais aprofundado no caso de adoção, por orientandos, em seus projetos de pesquisa, mas temos trabalhado, com relativo sucesso, tratando-os de forma introdutória e sequencial no contexto de disciplinas obrigatórias para mestrandos e doutorandos. Dessa forma, integramos nossas atividades pedagógicas e de pesquisa oferecendo subsídios teóricos iniciais para que nossos orientandos possam desenvolver suas respectivas propostas de trabalho a partir de fundamentações mais sólidas.

A provocação que invariavelmente tomamos como nosso ponto de partida, concerne à natureza da área da Educação e Tecnologia, que propomos não se referir apenas a artefatos em si, nem, simplesmente, a questões instrumentais implicadas em seu uso, mas, também (e fundamentalmente), às “práticas e atividades que os rodeiam”, aos “significados que as pessoas lhes atribuem” e às “relações sociais e estruturas às quais as tecnologias se ligam” (SELWYN, 2011/2016a, p. 3). É preciso ressaltar que, por envolver decisões e ações humanas, nada há de neutro na tecnologia (FEENBERG, 2005). Porém, a partir do ocultamento da estreita ligação entre empresas, institutos e poder público formou-se um consenso de que as tecnologias educacionais são “apolíticas” (WILLIAMSON, 2017). De fato, seu uso corriqueiro na educação vem tornando-as “ideologicamente invisível” (NYE, 2006, p. 29), e é preciso problematizar essa invisibilidade, inclusive no tocante ao livro didático, raramente reconhecido como um dos produtos tecnológicos mais bem-sucedidos na história da educação. Nesse sentido, a questão da ideologia, o infame cavalo de batalha do conservadorismo corrente, precisa ser discutida.

3.1 Atenção a crenças e premissas: a questão da ideologia

Eagleton (1997) elenca 17 significados possíveis para o termo, mas uma primeira aproximação pode partir de uma concepção de ideologia como uma forma de senso comum produzido a partir de interesses de grupos dominantes (GIDDENS; SUTTON, 2016). De forma a aprofundar a discussão e posicioná-la, especificamente, no âmbito da Educação, sugerimos a leitura de Selwyn (2014/2016b, p. 17-34), que elenca a seguinte tipologia de ideologias: a) ideologia libertária, que valoriza a “primazia do indivíduo”, a quem seria conferido todo poder por meio da “liberdade individual, autorresponsabilidade e empreendedorismo pessoal”; b) ideologia neoliberal, que expande esse “conjunto de significados e entendimentos” promovendo a crença de liberdade, seja do consumidor seja do mercado, “com o domínio dos interesses privados sobre o funcionamento do Estado” (BALL apud SELWYN, 2014/2016b); e, por fim, c) ideologia da “Nova Economia”, relacionada à “natureza e necessidades do capitalismo contemporâneo”.

Ainda segundo Selwyn (2014/2016b), essas ideologias alimentam a tecnologia educacional que, por sua vez, também as sustenta, em um fluxo de retroalimentação baseado na disseminação de valores tais como a (desmedida) centralidade do estudante no processo educativo, a necessidade de melhorar as eficiências da educação, o comunitarismo, o anti-institucionalismo e o tecno-fundamentalismo. Ampliando a discussão a partir de seu posicionamento em um cenário mais amplo que situa, em contexto histórico, os valores do empreendedorismo e autonomia veiculados pelos discursos neoliberais e libertários, adotamos Barbrook e Cameron (2017) e Weller (2015). Em particular, Weller (2015, p. 3, tradução nossa) critica o que denomina de “retórica do Vale do Silício”, baseada nas ideias de que, para qualquer problema, “uma solução tecnológica é possível e existe (...), que forças externas irão transformar ou perturbar [disrupt] todos os setores [de atividade humana] (...) e que uma revolução completa é necessária”, noção consistente com o neotecnicismo discutido por Freitas (2012). Em conjunto, esses textos destacam aspectos basilares da ideologia hegemônica da tecnologia educacional e apoiam uma perspectiva histórico-crítica das ditas “inovações” dessa indústria.

Esses e outros aspectos ideológicos da tecnologia educacional podem ser contextualizados de forma mais tangível para os alunos a partir de materiais livremente acessíveis na Internet. Nesse sentido, uma atividade pertinente seria solicitar a busca e seleção de páginas da Web com material textual e/ou audiovisual sobre educação e tecnologia, a partir do qual pudessem contribuir com reflexões para uma discussão em grupo sobre aspectos ideológicos dessa relação. Dentre o material selecionado por um dos grupos com o qual trabalhamos em esquema de docência em equipe (primeiro semestre de 2018), por exemplo, incluíram-se postagens em blogs, homepages de empresas e matérias jornalísticas com rica base textual e imagética. Em particular, a frase “torne-se um professor e aumente a sua renda”, tentativamente sloganizada em uma propaganda de curso para formação a distância de professores veiculada em 201711, sugere a profissão docente como um “bico”¸ e possibilitou uma discussão interessante sobre o papel da tecnologia na precarização do trabalho docente via reformas que a educação brasileira vem sofrendo. A imagem usada na propaganda reflete valores e pautas promovidas tanto pela ideologia libertária (todo poder ao indivíduo!) quanto pelas ideologias neoliberal e da “Nova Economia”, que já havíamos discutido com o grupo a partir dos textos mencionados anteriormente.

Tais valores e ideologias reverberam, também, em uma outra amostra de material selecionado pelos alunos do mesmo grupo: a homepage de um site que se apresenta como “um blog sobre planejamento, gestão e treinamentos online”, no qual figura, sugestivamente, como imagem de cabeçalho, uma xícara de café12. Não parece tratar-se, porém, de um cafezinho tradicional à brasileira, mas, sim, de um tipo de café servido em uma franquia de alguma rede transnacional, preparado por baristas especializados a partir de ingredientes pré-processados e de uma máquina. O café, bem de consumo historicamente fundamental ao país, sugere-se, na imagem, como um produto globalizado. Teríamos aqui um exemplo ilustrativo da tendência, cada vez mais proeminente, de adoção, na educação, de lógicas da esfera da produção em escala mundial, na qual modificações são pensadas e postas em prática a partir de um foco na gestão e adoção de “mais” tecnologias, sem que se dê, necessariamente, consideração a demandas e questões locais. Assim, justificam-se as perspectivas macro, distantes e destacadas do cotidiano, que defendem pautas e prioridades bem diferentes daquilo que se apresenta no chão da sala de aula. Ecoa, nesses materiais, a “retórica do Vale do Silício” criticada por Weller (2015). Nesse mesmo sentido, o posicionamento das tecnologias no cerne da “revolução” que educação precisa sofrer está, também, fortemente representado em outros dois exemplos selecionados por nossos alunos: o slogan “Venha para a universidade X, seja digital” e “Matricule-se e receba um tablet”. Nesses casos, o “digital” sugere-se como forma de qualificar as instituições pertinentes como “inovadoras”, na esteira, inclusive, de demandas de políticas vigentes (incluindo o próprio PNE 2014-2014 - Brasil, 2014): inovar, nos discursos de marketing, significa lançar mão de artefatos digitais, obscurecendo-se a falta de atenção a questões pedagógicas, de fato, centrais ao processo educacional.

Na mesma direção, mas com escopo ampliado para além da educação, um anúncio da Cisco afirma que a empresa oferece “a melhor tecnologia do mundo para seus clientes”, que, por sua vez, deve ajudar a “transformar o sistema educacional do Brasil em um padrão de classe mundial”13. Múltiplos questionamentos podem ser sugeridos a partir dessa afirmação. Uma pergunta inicial poderia ser: por que os clientes da Cisco devem, como indica o texto, ajudar a transformar o sistema educacional do Brasil? Crucialmente, poderíamos indagar: qual seria o ‘padrão de classe mundial’ a partir do qual a Cisco compara o sistema brasileiro? Como sugere Freitas (2012), as ideias dos reformadores empresariais nos EUA vêm sendo adotadas largamente nas políticas públicas brasileiras, e a ampliação do uso de tecnologias na educação poderia ser vista como um elemento central na pauta dos reformadores empresariais. Possivelmente, a afirmação no anúncio refere-se ao padrão de educação estadunidense, mas falhas e problemas no país de origem já foram apontadas por pesquisadores como Cuban (2001) e Ravitch (2011), que revelaram decorrências bastante problemáticas de mudanças promovidas por uma aliança entre políticos, empresários e fundações empenhadas em consertar a educação.

Essa discussão remete a questionamentos que foram muito importantes na educação brasileira no final dos 1970 e na década de 1980; em particular, destacamos as fortes críticas de Durmeval Trigueiro Mendes (1985) à “racionalidade tecnocrática” e de Saviani (1980/2008) ao conceito de “pedagogia tecnicista”. Mais recentemente, Freitas (2012, p. 383) refere-se ao advento de um neotecnicismo:

O tecnicismo se apresenta, hoje, sob a forma de uma “teoria da responsabilização”, meritocrática e gerencialista, onde se propõe a mesma racionalidade técnica de antes na forma de “standards”, ou expectativas de aprendizagens medidas em testes padronizados, com ênfase nos processos de gerenciamento da força de trabalho da escola (controle pelo processo, bônus e punições), ancorada nas mesmas concepções oriundas da psicologia behaviorista, fortalecida pela econometria, ciências da informação e de sistemas, elevadas à condição de pilares da educação contemporânea.

Esse neotecnicismo, com forte aposta na tecnologia e lógica consistente com a retórica do Vale do Silício, conforme já sugerido, seria o caminho para mudar o sistema educacional e, assim, “revolucionar o ensino” - slogan de outro anúncio trazido por alunos nossos para discussão em grupo. Observe-se, na postagem de blog intitulada “Tecnologias e Educação: como as inovações podem revolucionar o ensino”14, que a revolução não será protagonizada pelo professor - em tese, responsável pelo ensino -, mas, sim, pela tecnologia. Dessa forma, é possível apontar, em material trazido pelos próprios alunos, que objetos aparecem como “sujeitos” de ações, articulando a discussão sobre os recortes midiáticos com a argumentação de Barreto (2017). Em particular, abre-se, aqui, espaço para discussão do deslocamento radical que a autora critica, provocado pela recontextualização das TIC nas políticas em termos de duas tendências: por um lado, a criação de alternativas que possam gerar novas possibilidades para práticas pedagógicas; por outro, “a promoção de diversas formas de substituição tecnológica, apontando para a expropriação do trabalho docente, na medida do deslocamento do professor para a posição de quem executa tarefas bastante específicas, ainda que relacionadas à docência” (BARRETO, 2017, p. 126).

Em articulações dessa natureza, os estudantes podem construir uma nova “razão de ser” (FREIRE, 1979) a partir da compreensão de que a expansão do uso de tecnologias na educação não se deve, em particular, ao desenvolvimento tecnológico impulsionado, em parte, pelo avanço científico. Em muitos casos, trata-se, porém, de uma descoberta que pode desestabilizar e sensibilizar o estudante, mas, em nossa experiência, impulsiona uma busca por visões e ações alternativas. Como poderiam, como professores, atuar na modalidade a distância, por exemplo, ou realizar atividades presenciais com uso de tecnologias sem se posicionarem como reféns do contexto atual? Reconhecer questões relativas a escolhas e mudanças de linguagem pode ser, então, introduzido como um novo ponto de partida.

3.2 Atenção aos discursos

Outra forma de provocação que contribui para desestabilizar o senso comum diz respeito à linguagem que os próprios estudantes costumam usar quando relacionam educação e tecnologia: a “linguagem da aprendizagem” criticada por Biesta (2013). Segundo Ball (2013, p. 144), essa linguagem não se encontra apartada do que parece constituir uma “nova totalidade social” que integra, também, a noção de aprendizagem ao longo da vida (BALL, 2013). A disseminação de tais ideias não apenas vem restringindo a educação - em geral, pensada pelos estudiosos como um processo de formação humana - à aprendizagem, mas, também, expõe sua nova configuração como uma transação econômica. Como explica Biesta (2013, p. 52), a “nova linguagem da aprendizagem se ajusta bem à estrutura do pensamento neoliberal”, na qual o aprendente seria um consumidor, o professor e/ou a instituição teriam o único propósito de satisfazer necessidades de aprendizagem de um futuro ator do mercado de trabalho e, sobretudo, a educação seria algo a ser simplesmente “entregue”15.

Em nossa experiência, muitos estudantes observam, inicialmente um pouco desorientados, que a tecnologia não é o foco de discussão das implicações da mudança da linguagem, nem, tampouco, nos três cenários de aprendizagem e subjetividade examinados por Ball (2013, p. 144): “o aprendiz pré-escolar e a ‘maternagem total’; o aprendiz da educação pós-obrigatória e a sociedade de trabalho; e o aprendiz adulto e a ‘autoajuda’”. Entretanto, a discussão desses textos pode promover compreensões sobre como as tecnologias vêm sendo usadas para expandir e sustentar esses discursos. Como exemplo, citamos outra página de Web selecionada pelo grupo de 2018, que anuncia “Mais tecnologia nas escolas para ampliar a aprendizagem dos estudantes do ES”16, ou seja, mais uma vez, constrói a tecnologia como agente promotor. A naturalização de construções discursivas tais como essas reside em sua constituição como premissas - “sabe-se que...” - tomadas, via de regra, como se fossem a única forma de pensar ou abordar determinado assunto. É preciso problematizá-las.

De modo geral, pós-graduandos que atuam em empresas de tecnologia, sobretudo no desenvolvimento ou gestão de sistemas, e, frequentemente, também são docentes nessas áreas, tendem a se mostrar surpresos com a oportunidade de colocar em xeque algo que lhes parece perfeitamente natural: que a tecnologia seria o “motor” de um mundo repleto de possibilidades de aprendizagem. No processo de questionar tais premissas, já testemunhamos reações bastante fortes e, em alguns casos, relativamente agressivas, de alunos inicialmente formados, em particular, em áreas técnicas. Aliás, é tamanha a força dos discursos da aprendizagem que a esmagadora maioria dos alunos com quem temos trabalhado não distingue, pelo menos, inicialmente, “aprendizagem” de “educação”, tratando-as como sinônimos. Assim, fica claro para nós que, para além das relações entre tecnologia e aprendizagem, é preciso discutir assuntos considerados, lamentavelmente, fora do escopo de discussões na área, de modo geral: concepções de educação, de ensino, de aprendizagem e, crucialmente, do papel do professor. Em outras palavras: é preciso desnaturalizar não somente ideias simplistas da tecnologia, mas também, primordialmente, discursos que constroem questionamentos relativos à tecnologia de maneira apartada de outras discussões na área da Educação, principalmente da sua história.

3.3 Atenção às metáforas

Uma estratégia que nos é particularmente cara no trabalho de aguçar a sensibilidade dos alunos na leitura crítica de textos sobre tecnologias educacionais é a de evidenciar e analisar as metáforas que lhes são fundantes. Esse movimento vai em sentido contrário à tradição fortemente enraizada, desde a modernidade, na filosofia e ciência ocidentais. Nessa concepção, hegemônica até a metade do século XX, as metáforas eram vistas tão somente como figuras de linguagem visando adornar um discurso. Por isso, deveriam ser evitadas no pensamento sério, como advertiram filósofos da modernidade do porte de Descartes, Locke e Hobbes. Para ilustrar essa posição, cabe lembrar que este último, no “Leviatã”, explicita como um dos abusos da linguagem o uso de “palavras de maneira metafórica, ou seja, com um sentido diferente daquele que lhes foi atribuído, e deste modo enganam os outros” (HOBBES, 1997, p. 44). Max Black, um dos filósofos envolvidos no processo de resgate da metáfora, chegou a proclamar ironicamente: “Não cometerás metáfora” (BLACK, 1962, p. 25, tradução nossa).

Além de Black, vários pensadores defenderam as metáforas como importantes recursos argumentativos. Assim é que, a partir de autores como Richards (1936/1964), Perelman e Tyteca-Olbrechts (1996) e Lakoff e Johnson (1980), falamos em metáforas fundamentais, conceituais ou raízes: metáforas que balizam a visão de um campo ou objeto, “que escapam ao controle da experiência, e que tratam de estruturar um domínio da realidade, de sugerir uma nova visão das coisas, fundamento de uma concepção filosófica ou teológica” (PERELMAN, 1987, p. 209). A escolha de uma metáfora fundamental, mais do que a preferência por uma determinada figura de linguagem, traz uma maneira de se conceber algo. Já na Antiguidade clássica, Aristóteles defendia que as metáforas não eram meros ornamentos, mas uma forma de conhecimento, conforme Umberto Eco, em seu livro póstumo (2017, p. 328), esclarece:

Na Poética, ele diz que entender as boas metáforas significa “saber discernir o semelhante ou o conceito afim”. O verbo que usava era theorêin, que vale por discernir, investigar, comparar, julgar. Mas Aristóteles retornou com mais delonga a esta função cognitiva da metáfora na Retórica, em que dizia que é agradável aquilo que suscita admiração porque nos faz descobrir uma analogia insuspeita, ou seja, “coloca debaixo de nossos olhos” (assim se exprimia ele) algo que nunca tínhamos notado, de modo que somos levados a dizer “veja, é isso mesmo, e eu não sabia”.

O papel cognitivo da metáfora tende a passar despercebido, e aí reside muito de sua eficácia persuasiva: um tropo que se naturaliza, que não é percebido como tal. Em nossa prática docente, no sentido inverso, intencionamos instigar os alunos a destacarem e refletirem sobre metáforas fundamentais que dão suporte a textos estudados sobre a tecnologia educacional.

Assumindo, com a escritora Ursula Le Guin, que “toda ficção é metáfora” (LE GUIN, 2017, posição 266, tradução nossa), além de textos acadêmicos e material on-line que os próprios alunos selecionam e contribuem, utilizamos, também, filmes, séries televisivas e obras literárias, na esteira de experimentações pedagógicas anteriores (ROSADO et al., 2015)17. Nesse sentido, uma primeira aproximação à discussão de metáforas que temos conduzido parte das metáforas epistemológicas do livro “Cidades Invisíveis”, do escritor italiano Italo Calvino (2003). A partir de excertos dessa obra, é possível encorajar nos alunos a percepção do quanto o escritor, ao descrever cidades - em diálogos fictícios entre Marco Polo e o imperador Kublai Kahn - fala de questões filosóficas que envolvem o conhecimento humano e a linguagem utilizada para expressá-lo18. Em nossa experiência, independentemente das escolhas que fazemos, delineia-se um percurso surpreendente para os alunos, que, via de regra, manifestam sua estranheza ao se defrontar com um texto literário como subsídio para discussões teóricas. Buscamos deliberadamente, em nossos usos de filmes, séries de TV e clássicos da literatura, provocar estranhamentos, a partir de nosso entendimento de ser precisamente esse o papel fundamental da Arte.

Na sequência dessa primeira discussão, poderiam ser introduzidas algumas metáforas conceituais da educação, incluindo o processo educacional como percurso (o caminho e suas variantes) ou como cultivo - com a analogia que lhe subjaz: o professor está para o aluno, assim como o agricultor está para a planta - despertando a metáfora adormecida do jardim de infância. A metáfora conceitual da educação que, em nossa experiência, sempre parece render mais comentários é a do “preenchimento do aluno pelo professor”, tanto em sua versão crítica do depósito na concepção bancária do ensino, em Paulo Freire (1968/1987), quanto, sobretudo, na analogia da sala de aula como tipografia, na “Didática Magna” de Comênio (1995). Nessa, é importante chamar a atenção para a equiparação do aluno à folha em branco para ser impressa. Apesar do reconhecimento da contribuição de Comênio para o alargamento do acesso à educação, a discussão precisa avançar no sentido de destacar o lugar de passividade trazido por metáforas milenares que enfatizam o educando como um ser vazio a ser preenchido por outrem. Nesse sentido, encorajamos a reflexão crítica sobre metáforas que são muito comuns na fala dos professores: o “conteúdo” do currículo que precisa ser “passado” de professor a aluno por meio do processo de transposição didática.

Um aspecto fundamental da metáfora de Comênio, que oferece um contraponto muito interessante às metáforas contemporâneas das tecnologias educacionais é o papel do professor. Essa metáfora é, de fato, um ponto de partida bastante feliz para a discussão de metáforas da Educação e Tecnologia. Se, por um lado, se evidenciou uma centralidade no recurso didático - no caso, o livro impresso - por outro, o aspecto humano não foi obscurecido, pois, na sala de aula comeniana, a voz do professor é a tinta que possibilita a impressão, dando vida, ao ler e explicar os livros impressos trazidos para estudo. Metáforas que descrevem duas das ideias mais populares da área - Recursos Educacionais Abertos (BOLL et al., 2018; FERREIRA; CARVALHO, 2018) e Objetos de Aprendizagem (OTSUKA, 2018) - como peças Lego ou puzzle, associam a ideia de recursos pedagógicos a fragmentos reutilizáveis em contextos diferentes de seu contexto de produção (LEMGRUBER; FERREIRA, 2018). Porém, essas metáforas obscurecem questões relativas ao papel dos sujeitos envolvidos na produção, seleção e reutilização de tais recursos. Nessas metáforas, associadas a contextos de automação e aprendizagem autônoma, o humano - professor e aluno - está ausente. Propomos, assim, um questionamento: será possível resgatá-los a partir de uma dimensão estética, como sugerido em uma nova metáfora - a construção de mosaicos (LEMGRUBER; FERREIRA, 2018)?

A metáfora fundamental que, acreditamos, deve ser a mais profundamente discutida é a da tecnologia como ferramenta, que constitui uma das formas mais frequentes de conceber as tecnologias. A metáfora encapsula a noção de que o “impacto” de um artefato depende exclusivamente das formas como ele é utilizado, o que reforça sua concepção como neutro. Além disso, remete, como um de seus possíveis pressupostos, à ideia de que haveria algo a ser consertado. Nessa perspectiva, as “ferramentas tecnológicas” seriam utilizadas para melhorar ou “consertar” a educação (FERREIRA; LEMGRUBER, 2018), ideias consistentes com o solucionismo tecnológico (MOROZOV, 2013), que, segundo Selwyn (2017, p. 92), expressa “a esperança de que novas tecnologias solucionarão problemas e limitações profundamente enraizados na educação”. Assim, é possível destacar a premissa (muitas vezes sequer explicitada) que concorre decisivamente para essa construção discursiva: a educação está “quebrada” e precisa ser reparada, sem que se discutam nem as causas de tal “defeito”, nem outras possíveis “soluções”. Em contraste com a tipografia de Comênio, a metáfora contemporânea da tecnologia como ferramenta deixa obscurecido o papel do professor, e o humano figura como o elemento de imperfeição no encontro educacional (FERREIRA; LEMGRUBER, 2018).

4 CONCLUSÕES

O termo provocações é polissêmico. No senso comum, evoca a ideia de algo negativo, em geral, desmedido, até agressivo. Pode-se denunciar que alguém está provocando. Diz-se ser um provocador-agitador um elemento infiltrado em uma manifestação política, por exemplo. Nossa leitura, porém, refletida na grafia diferenciada da palavra no título da seção central deste artigo - pró-vocações - remete à ideia de instigar uma manifestação, de criar desequilíbrio no que estava anteriormente assentado. Pensamos em “pró-vocar” como uma forma de desenvolver uma sensibilidade para perceber algo, para ver diferentemente aquilo que se naturaliza. Tal concepção é consistente com a noção de problematização em sentido freireano, como estímulo para a produção de uma contrapalavra. Em outras palavras: mais do que encorajar o aluno a dizer o que Freire disse, por exemplo, provocamos para que ele diga algo sobre o que Freire disse, como citações em trabalhos acadêmicos que não devem ser colchas de retalho de citações literais, mas pretextos - pré-textos - para a contrapalavra do autor. Nesse sentido, consideramos o aluno como uma folha que traz um texto e que pode produzir um intertexto com o saber do professor e/ou dos textos estudados.

Assim pensamos o fio condutor de nosso trabalho docente, de forma geral: para além da transmissão de conhecimentos, partimos de uma intencionalidade pedagógica que visa estimular o desenvolvimento, em doutorandos e mestrandos no início de suas trajetórias como pesquisadores, de uma criticidade, uma autonomia intelectual, mesmo com limitações. Parece-nos que, neste momento de forte polarização em nosso país, é fundamental que resistamos, como educadores, às resistências fundamentadas em concepções simplistas da relação entre a educação e a tecnologia. Nesse sentido, para que possamos desafiar certezas, precisamos criar espaços seguros de discussão, nos quais os participantes se sintam acolhidos e ouvidos, inclusive, em ocasionais inquietações identitárias que tais desafios possam ocasionar. Imagens, cultura pop e clássicos da literatura e do cinema convidam os estudantes a mobilizar conhecimentos que já trazem e a expandir suas formas de pensar, auxiliando na criação de pontes com os modos de argumentar e articular ideias mais afeitos ao trabalho acadêmico. Crucialmente, porém, a criticidade que intencionamos encorajar não é um “resultado” esperado, mas, sim, uma direção que enxergamos e tentativamente problematizamos junto com os nossos alunos. Agimos com a esperança de lhes abrir novos horizontes e, quiçá, criar novos, ainda que pequenos, espaços de resistência à desumanização que caracteriza, cada dia mais fortemente, a existência contemporânea.

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NOTAS

1 Ver como exemplo esta matéria disponível em: https://g1.globo.com/educacao/noticia/2018/12/11/escola-sem-partido-entenda-o-que-ocorre-apos-o-arquivamento-e-o-que-esta-em-jogo-com-o-projeto-de-lei.ghtml. Acesso em: 25 maio 2019.

2 Ver como exemplo esta matéria disponível em: https://oglobo.globo.com/sociedade/mec-vai-cortar-verba-de-universidades-que-tiverem-baixo-desempenho-fizerem-balburdia-23631766. Acesso em: 08 jun. 2019.

3 Ver como exemplo esta matéria disponível em: https://g1.globo.com/educacao/noticia/2018/11/08/novas-diretrizes-do-ensino-medio-sao-aprovadas-pelo-conselho-nacional-de-educacao.ghtml. Acesso em: 28 maio 2019

4 Ver como exemplo esta matéria disponível em: https://g1.globo.com/politica/blog/andreia-sadi/post/2019/01/25/damares-educacao-domiciliar-permite-a-pais-ensinar-mais-conteudo-e-gerenciar-aprendizado.ghtml. Acesso em: 05 maio 2019.

5 Grandes dados ou Big Data referem-se, de forma geral, a conjuntos extensos e (supostamente) exaustivos de dados colhidos na Internet, nem sempre mediante a autorização dos usuários; incluem, além de dados sobre a utilização de sites e serviços on-line, informações pessoais (compartilhadas, por exemplo, em plataformas de redes sociais como o Facebook). Trata-se de uma área de pesquisa e desenvolvimento em forte expansão, mas que suscita, sobretudo, muitos questionamentos éticos (c.f. Amadeu, 2017). Ainda assim, constitui a base das alegações sobre as atuais tecnologias de inteligência artificial (Williamson, 2017).

6 Nos referimos aqui aos motoristas do aplicativo UBER, em que direitos e garantias trabalhistas são esquecidas em nome de uma flexibilidade do trabalho (trabalhar a qualquer hora, para quem quiser e em qualquer lugar), uma aparente liberdade laboral, parte do imaginário da ideologia libertária, que resulta em relações, no mínimo, questionáveis entre empresas e trabalhadores. Disponível em: https://theintercept.com/2019/04/08/uberizacao-das-relacoes-de-trabalho/. Acesso em: 20 maio 2019

7 Sigla para: Google, Amazon, Facebook, Apple e Microsoft.

8 Uma ideia que circula amplamente é a dos “nativos digitais”. Thomas (2010) discute, em contribuições baseadas em dados empíricos, que se trata de uma abstração infundada. Na literatura nacional, porém, a crítica é recente (por exemplo, PISCHETOLA; HEINSFELD, 2018), e a noção tende a figurar, sem problematização, como eixo teórico em pesquisas com bases empíricas frágeis, metodologias discutíveis e carência de substância crítica.

9 Por exemplo, a noção da “sala de aula invertida” baseia-se em ideias inteiramente consistentes com propostas escolanovistas, incluindo a aprendizagem experiencial de Dewey (BACICH, 2018), mas esse tipo de relação é raramente mencionado pelos defensores dessa e de outras propostas ditas “inovadoras”.

10 Na Teoria da Argumentação (PERELMAN; TYTECA-OBRECHT, 1996), “argumentos de autoridade” têm sua eficácia persuasiva a partir do prestígio desfrutado pelo orador, pessoa ou instituição, perante o auditório a que se destinam.

11 A campanha foi duramente criticada: “Luciano Huck pede desculpas por propaganda ‘infeliz’ que cita professores…”. Disponível em: https://tvefamosos.uol.com.br/noticias/redacao/2017/10/14/luciano-huck-pede-desculpas-por-campanha-publicitaria-que-cita-professores.htm?cmpid=copiaecola. Acesso em: 27 fev. 2018.

12 Disponível em: https://www.edools.com/sala-de-aula-invertida/. Acesso em 27 fev. 2018.

13 Disponível em: https://leoamorimdotcom.wordpress.com/2012/03/16/anuncio-crn/. Acesso em: 27 fev. 2018.

14 Postagem de blog de empresa de aplicativos móveis, disponível em: https://usemobile.com.br/tecnologia-e-educacao/. Acesso em: 28 jun. 2018.

15 De fato, trata-se, aqui, de uma metáfora fundamental diretamente traduzida do inglês: delivery of education (ou content). Referimos o leitor à próxima seção, que apresenta, especificamente, questionamentos a partir de metáforas.

16 Disponível em: http://www.aquinoticias.com/espirito-santo/2018/02/mais-tecnologia-nas-escolas-para-ampliar-a-aprendizagem-dos-estudantes-do-es. Acesso em: 27 fev. 2018.

17 Nas discussões sobre metáforas, ocasionalmente utilizamos imagens como base para uma primeira aproximação baseada na livre associação de ideias; tal seria a nossa estratégia em discussões sobre metáforas como rede, nuvens, labirinto, rizoma e outras metáforas fundamentais do conhecimento na atualidade (LEMGRUBER; OLIVEIRA, 2011).

18 As diversas contribuições incluídas no volume organizado por Lemos (2016) oferecem outras alternativas interessantes.

Recebido: 15 de Junho de 2019; Aceito: 18 de Março de 2020

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